Sociedade de Dermatologia lança Guia de Cuidados e Higiene

A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) lança nesta segunda-feira (29) o Guia de Cuidados e Higiene, visando esclarecer a população em relação a hábitos simples, mas sobre os quais muitas pessoas têm dúvidas.

A publicação, que estará disponível gratuitamente no site da entidade, revela os cuidados básicos e diários com a higiene do corpo que podem evitar micoses e outras doenças contagiosas que afetam a pele, o cabelo e as unhas. O guia tem linguagem acessível e didática e traz esclarecimentos sobre informações falsas e, muitas vezes, distorcidas, que são veiculadas em redes sociais. A SBD preparou também dois podcasts (conteúdos em áudio) com orientações sobre os problemas causados por fungos na forma de micoses que afetam pele e unhas, principalmente.

Como maior órgão do corpo humano, a pele acaba sendo suscetível a doenças, como infecções causadas por fungos ou bactérias que, se não forem diagnosticadas e tratadas, podem se agravar e atingir  órgãos internos. Neste contexto, a higiene é o melhor caminho para uma pele saudável, adverte a entidade.

Banhos

Coordenadora do Departamento de Micologia da SBD e autora do guia, Rosane Orofino disse que, com a publicação, as pessoas vão saber, por exemplo, que tomar banho uma vez por dia é suficiente para a limpeza corporal. “Pelo menos uma vez. Tem gente que não toma nenhuma”, alerta.

Ela criticou, por outro lado, a mania de limpeza excessiva, que considera tão prejudicial como a falta de limpeza. “A mensagem é essa: não exagere nem para um lado, nem para o outro. Lavar o rosto compulsivamente várias vezes ao dia, tomar banho três, quatro vezes ao dia, isso não faz bem. Não é benefício à pele nem à saúde.”

Ainda em relação ao banho, ela afirma que o ideal é que seja com água morna, próxima de 37°C, a temperatura normal do corpo, uma vez que banhos muito quentes ressecam a pele. Se a intenção for tomar uma ducha antes de sair para fazer exercícios, o banho pode ter a temperatura de morna para fria. “Banhos mais frios podem ser tomados se a intenção é despertar o corpo para um exercício”, sugeriu.

Outra dica é secar bem, logo após o banho, as regiões da pele com dobras. Segundo a médica, fungos e bactérias gostam muito de ambiente quente e úmido e, por isso, infecções de pele são tão frequentes em países de clima tropical e subtropical.

“A gente deve manter todas essas regiões de dobras bem arejadas. É por isso também que não se deve repetir uma meia, antes de lavá-la. Suas escamas estão naquela meia e você vai se reinfectar. As escamas são invisíveis. A gente troca a pele diariamente, só que a gente não vê. E os fungos ficam ali, vivos, vamos dizer assim, por muito tempo, porque a pele é uma comidinha para o fungo. A queratina, camada mais superficial da pele, é comida para o fungo. Esses são chamados de queratinofílicos, eles gostam de queratina. E a queratina tem no solo, na vegetação, na pele dos animais e na pele do ser humano. Os fungos se alimentam disso também”.

Ambientes coletivos

Os cuidados com a higiene evitam que as pessoas tenham problemas como micoses que, em geral, são adquiridas em ambientes coletivos. A médica citou locais como vestiários, banheiros e piscinas públicas, em academias de ginástica onde a pessoa mistura escamas de sua pele, que são invisíveis, com as de outras pessoas que podem conter fungos ou bactérias. “O cuidado é importante. Não só os locais higienizarem os pisos, mas também a gente ter precaução.”

No entorno de uma piscina, deve-se usar chinelos de dedo. Quando for fazer ginástica ou pilates, em academias, é recomendável usar proteção para o pé, seja tênis ou meia antiderrapante. Em cadeiras utilizadas em piscinas, o ideal é que elas sejam higienizadas com frequência ou que a pessoa, na hora de deitar, coloque uma toalha sobre ela para que seu corpo não tenha contato direto com aquele móvel. “A micose ou a sarna podem ser pegas em locais onde a pessoa fica muito tempo, sem proteção, com a pele em contato direto com esses locais”.

O mesmo ocorre em relação a colchonetes ou aparelhos em academias de ginástica ou musculação. “A pele úmida já tirou a barreira. A barreira física dela vai embora. Por isso, a gente usa creme hidratante depois do banho. Se a gente está suando em um lugar onde uma pessoa tem uma micose, deixou as escamas ali e a gente está atritando com uma pele úmida, é capaz de adquirir uma doença de pele. A solução é higienizar os aparelhos e colchonetes com hipoclorito, colocar uma toalha ou estar vestido. A roupa também protege”.

Roupas

Roupas íntimas, como calcinhas e cuecas, devem ser lavadas diariamente. Deve-se trocar a roupa de cama pelo menos uma vez por semana, porque as pessoas suam e têm uma flora de bactérias. As colchas podem ser substituídas em intervalos maiores, de três em três meses. Para os travesseiros, a recomendação é que sejam usados protetores e que sejam lavados a cada três meses. O ideal, porém, é trocar os travesseiros a cada ano.

No caso de roupas, como blusas e camisas, vale usar uma vez e lavar. No caso de calças jeans, o correto seria lavar com frequência. Em dias muito quentes, no verão, por exemplo, como a umidade e o calor são alimentos para bactérias e fungos, é melhor lavar a peça após usar, por conta do suor.

Compartilhamento

Outro cuidado essencial para a saúde da pele é não compartilhar toalhas e sabonetes em barra. Os especialistas alertam: só é possível dividir produtos de higiene para o corpo quando não há contato direto da substância com as mãos, como em sabonetes líquidos ou em gel. Mesmo no caso de marido e mulher, esses itens não devem ser compartilhados. Rosane alertou que uma pessoa pode ter sarna e, se outra usar a mesma toalha, pode adquirir essa doença, que também é infecciosa. O mesmo deve ser feito em relação a escovas de dente. “A regra básica é que objetos de uso pessoal não devem ser compartilhados com ninguém, nem com a pessoa que é íntima sua”, ressaltou a dermatologista.

Ainda em relação a sabonetes, o guia da SBD destaca ser necessário cuidado com o tipo que é utilizado, porque o uso indiscriminado de produtos antissépticos provoca o ressecamento da pele e a remoção da camada protetora de gordura. Portanto, artigos desse tipo só devem ser utilizados sob recomendação médica, de preferência do dermatologista, e usados durante um tempo específico. “Eles são remédios, não são só sabonetes”.

Calçados

Em relação a calçados, se forem laváveis podem ir na máquina de lavar ou ficar de molho em balde com água e sabão. Já os não laváveis devem ser deixados em área arejada por 24 horas. Se a pessoa estiver tratando de micose nos pés ou nas unhas, o Guia aconselha o uso de desinfetante em spray, deixando depois em área arejada por 24 horas antes do próximo uso. O ideal é usar tênis e calçados fechados com meias, que podem ser lavadas normalmente sem contaminar o calçado.

Remédios

O Guia da SBD adverte ainda que a automedicação precisa ser evitada. Nenhum remédio deve ser usado sem indicação médica. O uso de antifúngicos ou outros medicamentos sem ter um diagnóstico correto pode mascarar a doença de base, havendo também risco de desenvolver alergia ao medicamento.

A orientação geral é que, quando surgirem irritações, incômodos ou coceiras, entre outros sintomas, a pessoa deve se consultar com um médico dermatologista o mais rápido possível. Essa ação proporcionará o melhor diagnóstico e o tratamento imediato, destacou o presidente da SBD, Mauro Enokihara

Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil – Brasília

FONTE: Agência Brasil

Varizes esofágicas requerem atenção aos sintomas e aos riscos

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Você já ouviu falar em varizes esofágicas? Elas ocorrem quando os vasos sanguíneos do esôfago, que é o tubo que conecta a boca ao estômago, ficam dilatados, podendo provocar sangramento.  A gastroenterologista Fernanda Fernandes Souza, professora da Divisão de Gastroenterologia do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, explica que essas varizes surgem quando os vasos sanguíneos do esôfago se  rompem sob pressão na veia, em decorrência de  cirrose hepática.

As hepatites C e B , o consumo exagerado de álcool e a conhecida “gordura no fígado” são algumas das principais causas das varizes no esôfago. O sangramento digestivo é uma das piores complicações que a pessoa pode ter: os primeiros sintomas visíveis são vômitos com sangue e fezes escurecidas, segundo Fernanda.

Diagnóstico e tratamento

O diagnóstico é confirmado com exames de imagem e, quanto mais precoce, maior a possibilidade de evitar complicações.

O tratamento utilizado para prevenir o sangramento das varizes do esôfago depende da gravidade do problema, mas em geral são usados medicamentos betabloqueadores e, em casos mais graves, se recorre à cirurgia.

Por Sandra Capomaccio

FONTE: Jornal da USP

Estudo desvenda mecanismo de câncer pediátrico cerebral raro

Um estudo conduzido por pesquisadores de Brasil, Austrália, Áustria e Estados Unidos avançou no entendimento de um tipo de câncer pediátrico sem opções de tratamento farmacológico e com baixa taxa de sobrevivência. Os resultados, publicados na revista Neuro-Oncology, abrem caminho para a busca de terapias mais específicas.

“Os chamados ependimomas são tumores do sistema nervoso central bastante heterogêneos e sem muitas opções de tratamento além de cirurgia e radioterapia. Nosso estudo teve como foco o chamado ependimoma supratentorial com fusão entre os genes C11orf95 e RELA [ST-RELA, na sigla em inglês], um subgrupo frequente na população pediátrica, agressivo, de prognóstico ruim e sem tratamento específico”, esclarece Taciani de Almeida Magalhães, primeira autora do estudo, realizado durante seu doutorado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O trabalho integra um Projeto Temático coordenado por Luiz Gonzaga Tone, professor da FMRP, que orientou a pesquisa de doutorado e é um dos coautores do artigo.

Esse tipo de ependimoma afeta sobretudo crianças com idade em torno de 8 anos (no momento do diagnóstico). A taxa de sobrevivência de cinco anos após o tratamento é de aproximadamente 30%, particularmente nos pacientes em que a retirada total do tumor por meio de cirurgia não é possível.

Não há medicamentos específicos e, portanto, a única opção terapêutica disponível, além da cirurgia, é a radioterapia, que pode causar sérias sequelas cognitivas e motoras nas crianças.

Os pesquisadores descobriram, com o auxílio de diferentes técnicas, que nesse tumor a chamada via de sinalização celular Hedgehog (Hh) está bastante ativada. Por isso, em laboratório, trataram tumores com o Sonidegib – medicamento que inibe a via Hh e, atualmente, está em testes clínicos para outros tipos de câncer que afetam o sistema nervoso central.

Ao avaliar os tumores tratados, porém, os pesquisadores observaram que eles perderam determinadas estruturas conhecidas como cílios primários e, em decorrência disso, se tornaram resistentes à droga. Era preciso trazer os cílios de volta.

De volta à bancada, o grupo constatou que a formação dos cílios era regulada por uma proteína específica, a AURKA. Não por acaso presente em outros tumores, a proteína tinha também um inibidor específico em testes clínicos, o Alisertib.

Além do Sonidegib, os pesquisadores passaram então a tratar os tumores com o Alisertib. Os cílios primários não se perderam e o Sonidegib pôde atuar, promovendo a morte das células tumorais com sucesso, sem afetar as saudáveis.

À esquerda, células tumorais (em azul) com cílios preservados (em vermelho); ao centro, depois do tratamento com Sonidegib, cílios são perdidos; à direita, cílios recuperados após combinação de Sonidegib com Alisertib – Foto: Taciani Magalhães/USP

Com a combinação de drogas funcionando no modelo in vitro, coube aos pesquisadores fazer os testes em animais, por meio de uma colaboração com cientistas da Austrália. Camundongos que desenvolveram o tumor no cérebro foram tratados com a combinação. Para a surpresa dos pesquisadores, porém, os animais não tiveram nenhum aumento de sobrevida em comparação aos camundongos-controle, que não receberam tratamento.

O grupo acredita que a camada que recobre os vasos sanguíneos do cérebro para protegê-los do meio externo, a chamada barreira hematoencefálica, esteja impedindo o medicamento de chegar até o local a ser tratado.

“Outros estudos mostram que inibidores da proteína AURKA, aquela que promove a perda dos cílios primários, não chegam até o cérebro. É uma possível explicação para o fato de nosso tratamento não ter funcionado em animais”, explica Magalhães, que atualmente realiza estágio de pós-doutorado na Harvard Medical School, nos Estados Unidos. Antes, a pesquisadora havia realizado parte do doutorado na mesma instituição.

Alternativas

Agora, os pesquisadores buscam outros medicamentos com a mesma ação que consigam ultrapassar a barreira hematoencefálica e, quem sabe, finalmente chegar mais perto de um tratamento inédito para esses tumores.

“Mesmo a combinação não tendo alcançado o sucesso esperado no modelo animal, agora conhecemos os mecanismos moleculares do tumor e, portanto, temos um caminho a seguir que até então não era conhecido”, afirma a pesquisadora.

Para Elvis Terci Valera, professor da pós-graduação do Programa de Saúde da Criança e do Adolescente da FMRP, que também colaborou com o estudo, a descoberta abre perspectiva para estudos clínicos utilizando gerações mais modernas de drogas inibidoras da via Hh e da proteína AURKA, com melhor penetração no sistema nervoso central.

“Outra estratégia seria aplicar essas drogas mais modernas diretamente no liquor cefalorraquidiano, líquido que circula no cérebro e na medula espinhal. Opções como essa poderiam ser avaliadas a fim de reverter a resistência ao tratamento”, conclui Valera.

O estudo Activation of Hedgehog signaling by the oncogenic RELA fusion reveals a primary cilia-dependent vulnerability in supratentorial ependymoma pode ser lido em: https://academic.oup.com/neuro-oncology/advance-article-abstract/doi/10.1093/neuonc/noac147/6596001.

Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

André Julião/Agência Fapesp

FONTE: Jornal da USP

Medicamento para tratar déficit de atenção misturado com álcool coloca em risco a saúde dos jovens

Autorizado pela Anvisa para o tratamento do transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e, mais recentemente, para a compulsão alimentar, o Venvanse tem assumido função recreativa entre os jovens e preocupado autoridades de saúde. Venvanse é o nome comercial de um fármaco derivado de anfetaminas, a lisdexanfetamina, que é de uso controlado e vendido apenas com prescrição médica.

Especialista em Psiquiatria da Infância e Adolescência da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, o professor Erikson Felipe Furtado adverte quanto aos perigos do uso indiscriminado da droga, seja para ficar acordado e eufórico em festas e eventos, seja para aumentar o foco em tarefas específicas, elevando a concentração.

Por ser “um psicoestimulante, que tem elevado risco de induzir dependência”, entre outros, Furtado afirma que a utilização do remédio não deve ser desviada de sua função originária, com riscos para os usuários, independentemente do efeito procurado.

 Efeitos agudos tóxicos

Ao fazer a associação do Venvanse com bebidas alcoólicas, os jovens tentam contrabalançar o efeito sedativo do álcool. Furtado esclarece que o psicoestimulante pode mascarar o cansaço de uma longa noite de festa, “mas isso não significa que não houve um desgaste físico e mental, o indivíduo está tendo um gasto energético e isso vai aparecer em algum momento”.

O desejo de aumentar a experiência sensorial é também um dos principais objetivos desses jovens. Os efeitos do álcool com o estimulante podem proporcionar uma sensação maior de euforia. O médico alerta, no entanto, que a combinação pode inibir as sensações desagradáveis decorrentes da bebida, impedindo que o usuário perceba sinais fisiológicos de que chegou no limite.

Além desses efeitos agudos tóxicos, Furtado aponta para a dupla sensibilização à ocorrência de dependência. “Cada uma dessas substâncias, tanto o álcool como a lisdexanfetamina, pode induzir à dependência, mas as duas combinadas têm uma potencialização no risco de ocorrência de dependência.”

Uso implica riscos

O especialista conta que, mesmo quando há prescrição médica, é sempre necessário o acompanhamento e monitoramento do paciente. O uso de derivados de anfetaminas implica sempre um risco para o surgimento de efeitos indesejáveis próprios dessa classe de substância.

Furtado conta que, ao usar esse medicamento, pode haver alterações cardiovasculares, alterações metabólicas e renais, alterações no funcionamento e regulação normal do apetite e do sono como também no nível de vigilância, implicando em longo prazo, na desregulação das funções do organismo.

Além disso, podem ocorrer alterações no humor e nas funções cognitivas, como no controle de impulso e nos processos mentais de raciocínio e julgamento. Furtado alerta que “pessoas com instabilidade emocional podem ser suscetíveis a risco mais elevado de alterações no humor e sintomas mentais graves como delírios e alucinações”.

Para aqueles pacientes com histórico de psicose, como esquizofrenia e bipolaridade, suas condições podem ser precipitadas ou provocadas pelo uso das substâncias. Da mesma maneira, os famosos tiques nervosos podem ser exacerbados ou até mesmo surgirem no indivíduo que estava assintomático.

Fácil acesso

Apesar de ser um remédio tarja preta, de uso controlado, que necessita de receita médica para ser adquirido, esses jovens conseguem com facilidade acesso ao medicamento. Furtado explica que esse é um problema de saúde pública, que esbarra em costumes sociais e configura um ato ilícito, contra normas de vigilância sanitária e policial.

A entrada clandestina do produto no País, o falseamento de receitas e simulação de problemas de saúde são as principais formas de acesso ao medicamento, na opinião do especialista.

Para combater o uso e venda indevidos, Furtado acredita que levar informação a esse grupo específico sobre os efeitos colaterais, combatendo fake news, pode ser o melhor caminho. Estar presente nas mídias sociais, onde esses jovens estão, é muito importante na propagação de informação de qualidade. “É plenamente possível se divertir e ter uma noite gostosa, agradável, sem fazer o uso dessas substâncias”, destaca Furtado.

Por Ana Beatriz Fogaça

FONTE: Jornal da USP

Doença venosa crônica é fator de risco para problemas cardiovasculares

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em todo o mundo, principalmente as doenças cardiovasculares arteriais, como derrame, infarto, insuficiência da circulação decorrente do diabetes. Estudos recentes, como a pesquisa publicada no European Heart Journal, da European Society of Cardiology, levantam a tese de que indivíduos com doença venosa crônica (DVC) frequentemente têm fatores de risco para doença cardiovascular e que essa relação aumenta proporcionalmente com a gravidade da DVC. Os indivíduos com DVC têm, ainda, risco três vezes maior de morte por todas as causas, em comparação com aqueles que não apresentam sinais clínicos da doença.

O angiologista e cirurgião vascular Rodrigo Kikuchi, membro da Comissão Científica da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV), explicou à Agência Brasil que a doença vascular mais prevalente, ou seja, a que mais existe na população, é a doença venosa, que são as varizes ou dilatações de veia.

Kikuchi disse que, ao contrário do que se pensava anteriormente, que as doenças cardiovasculares e venosas não tinham relação, o que se tem descoberto, cada vez mais, é que “ambas as doenças têm um componente inflamatório, tanto da parte da circulação arterial, aquela que leva oxigênio, como a doença venosa, que traz o sangue de volta ao coração”.

Recentemente, estudos chegaram à conclusão que existe uma relação entre as pessoas que têm a DVC com uma maior ocorrência da doença cardiovascular. “Como se a DVC também fosse um preditor de ter a doença cardiovascular arterial”. Segundo Kikuchi, isso é interessante porque “se a doença venosa é muito mais prevalente e a gente evita a progressão para uma doença venosa mais severa, hoje acredita-se que também estamos prevenindo a doença cardiovascular e, consequentemente, as mortes por doença cardiovascular”.

De acordo com a SBACV, a DVC atinge em torno de 38% da população brasileira, sendo mais comum em mulheres (45%) do que em homens (30%), de todas as faixas etárias, e mais recorrente acima dos 70 anos de idade (70%).

Manifestações

A doença venosa se manifesta de diferentes formas, mas os sinais visuais mais comuns são vasinhos e varizes acompanhados de sintomas como dor, inchaço, sensação de peso nas pernas, coceira, pele ressecada, câimbras noturnas com frequência e formigamento. “Tudo isso já pode ser um indicativo de ter uma DVC. Não necessariamente ter aquelas veias enormes. Mas só o fato de a pessoa ter algum sintoma desses já vale uma avaliação médica mais precisa, com um angiologista ou cirurgião vascular”, recomenda.

Rodrigo Kikuchi disse que 60% das pessoas que têm DVC acabam demonstrando progressão ao longo de 10 anos. “Ou seja, mais da metade demonstram progressão da doença para uma doença mais avançada ao longo de 10 anos. Por isso, o cuidado tem que ser contínuo”, recomenda. Caso não seja tratada, a DVC pode evoluir para alterações da pele, causando úlceras, alerta o médico.

“Essa é a parte da doença venosa crônica mais avançada e a gente tem que evitar que chegue nesse ponto. Quanto mais evolui na doença crônica, mais a pessoa tem correspondência na doença cardiovascular. É isso que tem sido avaliado, justamente pelos componentes inflamatórios que a DVC tem em comum com a doença arterial. É uma inflamação do corpo que acaba levando a uma possibilidade de ter a trombose arterial, que é o risco de infarto, derrame e tudo o mais”.

Prevenção

Para evitar ter a DVC e, em consequência, uma doença cardiovascular, Rodrigo Kikuchi disse que a prevenção é a mesma, fazer exercícios, ter boa alimentação, controlar o peso, fazer atividades físicas de fortalecimento e não ficar só caminhando.

“Isso tem a ver com mudança de estilo de vida, que é a principal medida, tanto para doença venosa, como para doença cardiovascular”. Em relação à doença venosa inicial, destacou a terapia compressiva, que se refere ao uso de meias elásticas para aliviar sintomas. Existem também alguns medicamentos indicados para a fase inicial ou sintomática da doença venosa.

O médico alertou que o retorno venoso ineficiente não ocorre apenas por causa das veias. A obesidade é outro motivo, porque o paciente acima do peso tem uma pressão maior no abdômen, o que complica o retorno do sangue. Da mesma forma, a inatividade física é outro fator prejudicial, porque a falta de musculatura faz com que o indivíduo tenha menos potência e capacidade de contração muscular da perna. “Esse movimento é que melhora o retorno venoso”, ressaltou.

Embora não haja uma relação direta do tabagismo com o surgimento de veias ou varizes, acredita-se atualmente, pelo processo inflamatório que o tabagismo causa, que esse hábito também machuca a parede venosa, da mesma forma que acontece com a parede arterial. “O tabagismo ligado a infarto e derrame é o principal fator de risco evitável das doenças cardiovasculares que a gente tem. É não fumar”.

Campanha

Neste mês de agosto, a SBACV promove a campanha #Agosto Azul Vermelho de conscientização da população sobre a saúde vascular, estimulando uma mudança de hábito de vida, que é saudável para a saúde venosa e arterial.

A SBACV quer que os pacientes tenham consciência da saúde vascular, tanto na parte venosa como na parte arterial. Kikuchi lembrou que o diagnóstico deve ser feito pelo angiologista ou cirurgião vascular, “para que possa tomar medidas preventivas e para que a população cresça melhor”.

Em parceria com o laboratório francês Servier, a SBACV coordena uma chamada para que as pessoas olhem suas pernas e saibam o que está por trás dos vasinhos, varizes e das pernas pesadas, além de falar sobre prevenção e a importância de acompanhamento médico. “Que olhe suas pernas e saiba que são elas que o levam para todo lugar, para que você tome essa consciência e ame e cuide das suas pernas. Essa é a ideia da campanha”, disse o angiologista.

FONTE: Agência Brasil

Testes revelam resistência de bactéria causadora de diarreia

Análise dos genes da bactéria Campylobacter coli, causadora de diarreia em seres humanos, revela que o micro-organismo pode resistir ao controle da proliferação em alimentos, uma das principais fontes de contaminação. A conclusão é de pesquisa da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP. O estudo foi realizado com bactérias coletadas em seres humanos, animais, alimentos e ambiente nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Ribeirão Preto. Os resultados poderão servir para nortear estratégias de prevenção da contaminação, inclusive no preparo de alimentos.

“A doença decorrente da infecção por bactérias do gênero Campylobacter é uma zoonose de distribuição mundial com repercussões significativas em termos de saúde pública e com um elevado impacto socioeconômico”, afirma a professora Juliana Pfrimer Falcão, da FCFRP, que orientou a pesquisa de doutorado de Carolina Nogueira Gomes. “Usualmente, esse gênero de bactérias causa gastroenterite (diarreia)”.

A campilobacteriose é clinicamente indistinguível das infecções causadas por outros micro-organismos, como Salmonella e Shigella, por exemplo. “A principal rota de transmissão de Campylobacter, especificamente das espécies Campylobacter coli e Campylobacter jejuni, para seres humanos, é a manipulação e o consumo de carne de frango malcozida”, relata a professora, “atividades em águas recreacionais, contato com animais portadores, incluindo animais de estimação, e consumo de leite não pasteurizado”.

As linhagens de Campylobacter coli estudadas são provenientes das coleções de Campylobacter (CCAMP) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e do Instituto Adolfo Lutz (IAL) de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. “Elas foram isoladas de seres humanos, animais, alimentos e ambiente nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte (Minas Gerais) e Ribeirão Preto, no período de 1995 a 2011”, afirma Juliana.

Placa com colônia da bactéria Campylobacter coli cultivada em laboratório para estudos sobre sua resistência a condições de estresse – Foto: cedida pela pesquisadora


Virulência

As amostras foram analisadas quanto a presença de 16 genes relacionados a virulência e foi avaliada a sobrevivência dessas linhagens após a exposição a diferentes condições de estresse, tais como: flutuação de temperatura, tolerância de presença de 7,5% de coleto de sódio (NaCl) e sobrevivência ao estresse ácido e oxidativo. “A exposição da bactéria a condições de estresse tem como objetivo imitar as etapas de processamento de alimentos, a transmissão do ambiente para o hospedeiro humano e a sobrevivência durante a infecção”, conta Carolina.

Os resultados demonstraram que a sobrevivência frente a diferentes condições de estresse é uma característica dependente da linhagem da bactéria. “Entretanto, as altas taxas de crescimento e sobrevivência das linhagens estudadas são resultados importantes, pois demonstram que essas linhagens não teriam seu crescimento inibido por algumas das medidas de controle de crescimento bacteriano utilizadas em alimentos”, aponta a pesquisadora. “Assim, além dos dados caracterizarem as linhagens circulantes no Brasil, eles podem servir para nortear estratégias de prevenção da contaminação por Campylobacter.

De acordo com Juliana e Carolina, as principais formas de evitar a contaminação pela bactéria são lavagem das mãos antes, durante e após o preparo de alimentos e depois de tocar em animais, seus alimentos ou pertences. “Tábuas de corte e facas utilizadas no preparo de carnes, frango e frutos do mar devem ser usadas separadamente dos demais alimentos e higienizadas corretamente”, explica a professora. “Os alimentos devem ser cozidos na temperatura adequada e não se deve consumir leite não pasteurizado e água não tratada.”

 

 

O estudo teve a colaboração da pesquisadora Marta Inês Cazentini Medeiros, do IAL de Ribeirão Preto, e da pesquisadora Sheila da Silva Duque, da Fiocruz, que concederam as linhagens utilizadas nesse trabalho. Além disso, a professora Fátima Maria Helena da Silva auxiliou na realização das análises estatísticas.

Mais informações: e-mail jufalcao@fcfrp.usp.br, com a professora Juliana Pfirmer Falcão

FONTE: Jornal da USP

Tratar esclerose múltipla com células-tronco é mais eficaz que medicação

O transplante com células-tronco da medula óssea do próprio paciente para combater a esclerose múltipla é mais eficaz do que a medicação disponível no mercado. Esta é a conclusão de estudo feito por pesquisadores do Brasil, Suécia, Inglaterra e Estados Unidos.

Os resultados foram apresentados em março no encontro anual da European Society for Blood and Marrow Transplantation e publicados na Neurology. uma revista científica de alto impacto. “Os resultados comprovam que os transplantes apresentam melhores resultados do que as medicações utilizadas para o tratamento da esclerose múltipla”, afirma a professora Maria Carolina de Oliveira, pesquisadora do Centro de Terapia Celular (CTC) da USP e da Divisão de Imunologia Clínica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

De acordo com ela, “parte da pesquisa ainda continua e os pacientes serão acompanhados por mais tempo e novos resultados devem ser apresentados em dois ou três anos. O objetivo é ver como a resposta ao transplante se sustenta em acompanhamento mais prolongado”, explica.

Ao todo, nos quatro países, participaram 110 voluntários, dos quais 55 foram transplantados e 55 receberam tratamento convencional. “Dos transplantados, apenas três (6%) reativaram a doença após o transplante. No outro grupo, tratado com a medicação disponível no País, 33 (60%)”, afirma Maria Carolina.

No entanto, o transplante deve ser aplicado apenas aos pacientes que estejam na fase de surto remissiva da doença. “É a fase em que o paciente tem surtos de perda neurológica súbita. Passa a ter dificuldade para andar e mexer os membros. Esses surtos acumulam incapacidades neurológicas e o transplante tem que ser realizado antes que chegue à fase progressiva”, explica.

Para identificar a possibilidade de transplante, os médicos utilizam a escala neurológica EDSS para medir o grau de comprometimento que a doença já provocou no paciente. Se estiver entre 2,5 e 5,5, o paciente pode ser transplantado. Fora desse parâmetro, não. O paciente não pode estar em cadeira de roda ou acamado, situações que acontecem nas fases mais avançadas da doença.

Experiência

O Hospital das Clínicas da FMRP tem experiência de 16 anos em transplante de medula óssea para pacientes com esclerose múltipla. Começou, em 2002, com o professor Júlio Voltarelli. Esses procedimentos não são pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A verba utilizada é de projetos de pesquisas. “Pretendemos, com esses resultados, convencer as autoridades a incluir este tipo de transplante na lista do SUS”, afirma Maria Carolina.

Entre os 90 transplantes realizados no HC-FMRP, “2/3 melhoraram. Sendo que deste total, metade manteve a doença controlada e na outra metade houve progressão ao longo do tempo. Isso porque a maioria desses pacientes foi transplantada na fase tardia, já degenerativa, da doença. O transplante funciona melhor nas fases mais precoces, inflamatórias da doença”, explica.

Infográfico: Adaptado de BruceBlaus via Wikimedia Commons CC BY-SA 4.0

Custo

O estudo não levantou custos comparativos entre o transplante e a medicação, mas a reportagem apurou que o transplante tem custo estimado de R$ 22 mil, considerando o uso de instrumental e a medicação usada durante o procedimento (não fazem parte deste valor os custos de salários da equipe e internação). Já a medicação tem preço aproximado de R$ 12 mil ao mês.

Um estudo de pesquisadores poloneses, apresentado também no encontro da European Society for Blood and Marrow Transplantation, comparou os gastos médios de 102 pacientes com esclerose múltipla no ano anterior ao transplante àqueles de um ano após o procedimento. A média de gastos anuais caiu de 4.520 euros para 810 euros.

O artigo Non-myeloablative hematopoietic stem cell transplantation (HSCT) is superior to disease modifying drug (DMD) treatment in highly active Relapsing Remitting Multiple Sclerosis (RRMS): interim results of the Multiple Sclerosis International Stem cell Transplant (MIST) Randomized Trial (S36.004) tem autoria deRichard K. BurtRoumen BalabanovJohn A. SnowdenBasil SharrackMaria Carolina de Oliveira e Joachim Burman, e pode ser acessado no site da revista Neurology.

Com informações de Marcos de Assis / Assessoria de Imprensa do Hemocentro de Ribeirão Preto

FONTE: Jornal da USP

Declínio cognitivo é maior para quem consome mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados

Pães de forma, macarrão instantâneo, refrigerantes: os ultraprocessados são produtos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de sua composição final não lembrar a comida de verdade. Vários estudos mostram os prejuízos que eles causam à saúde. Uma das pesquisas mais recentes foi realizada por cientistas da USP com base no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) e mostra que o consumo de ultraprocessados é um dos fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. Os resultados mostraram que a queda cognitiva ao longo da vida foi 28% maior entre os participantes que consumiram mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados. Isso equivale, por exemplo, a comer três pães de forma todos os dias.

Os dados estão sendo apresentados durante a Conferência Internacional da Associação de Alzheimer, que acontece ao longo desta semana, entre 31 de julho e 4 de agosto, em San Diego, nos Estados Unidos.

O Elsa-Brasil é um estudo epidemiológico nacional realizado desde 2008 por várias instituições como a USP, UFES, Fiocruz, UFBA, UFMG e UFRGS, que acompanha o estado de saúde de cerca de 15 mil funcionários. A ideia é investigar a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto) e outras associadas. Os participantes, com idades entre 35 e 74 anos, são de várias regiões do País. No próximo mês de agosto, eles serão novamente convocados para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para essas doenças, consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Entre vários outros aspectos da saúde, o Elsa é o estudo com a maior amostra e o maior tempo de avaliação da performance cognitiva no Brasil. Os dados das três primeiras ondas (entre 2008 e 2010, 2012 e 2014 e de 2017 a 2018) embasaram uma série de artigos que encontraram associações de piora do desempenho cognitivo com diversos fatores, como, por exemplo, enxaquecasconsumo de álcool, inflamação e, principalmente, doenças vasculares como a hipertensão.

Fatores sociais também se mostram relevantes: um dos artigos mostrou que a adesão à dieta MIND (Mediterranean-DASH Intervention for Neurodegenerative Delay), criada para reduzir o risco de doenças que afetam a memória e a mente, só mostrou eficiência nesse objetivo em pacientes de alta renda, com melhores condições materiais de se alimentar de forma saudável. Em outro, os pesquisadores observaram que o estresse relacionado à rotina de trabalho também está associado ao declínio cognitivo.

Durante a conferência em San Diego, a equipe do Elsa apresenta dois novos estudos longitudinais, ainda não publicados, baseados no acompanhamento dos participantes durante as três primeiras ondas, que identificaram dois fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo: o consumo de ultraprocessados e o impacto do acúmulo de gordura nas artérias. 

Consumo de ultraprocessados

O estudo sobre ultraprocessados foi realizado pela pesquisadora Natália Gonçalves em colaboração com outros integrantes do Elsa, inclusive, o grupo de pesquisa do professor Carlos Augusto Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública (FSP), um dos órgãos diretamente envolvidos na elaboração do Guia Alimentar para a População Brasileira.

A pesquisa utilizou os dados de 10.775 pessoas coletados nas três primeiras ondas do Elsa para classificar a alimentação dos participantes de acordo com os quatro grupos descritos pelo Guia: não processados (vegetais, frutas, cereais etc.), ingredientes culinários (azeites, sal, óleos), alimentos processados (com modificações leves como adição de sal ou açúcar) e ultraprocessados, “alimentos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de que a sua composição final nem lembra comida de verdade” (pães de forma, macarrão instantâneo, marmitas prontas, refrigerantes, entre outros).

A partir disso, os pesquisadores dividiram as pessoas em quatro grupos, de acordo com a porcentagem de ultraprocessados na dieta, e descobriram que as pessoas que comem mais desse tipo de produto (acima de 20% da ingestão diária) têm uma queda 28% maior na performance cognitiva do que as que comem menos (abaixo de 20%).

Para tornar mais palpável o que isso significa, a pesquisadora explica que 20% de calorias diárias vindas de ultraprocessados equivalem a, por exemplo, míseras três fatias de pão de forma por dia.

“Esses resultados, além de inéditos, são muito importantes pois apontam para um comportamento que as pessoas podem modificar e, com isso, possivelmente diminuir a chance de declínio cognitivo ao longo dos anos”, diz Natália ao Jornal da USP.

Além dela, o artigo Higher consumption of ultra-processed foods is related to cognitive decline in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil) tem como coautores Naomi Vidal Ferreira, Claudia Kimie Suemoto e Renata Bertazzi Levy, da Faculdade de Medicina da USP; Neha Khandpur, Euridice Martinez Steele, Dirce M. Marchioni, da Faculdade de Saúde Pública da USP; Paulo Andrade Lotufo e Isabela Judith Martins Bensenor, do Hospital Universitário da USP; Paulo Caramelli, da UFMG, e Sheila Maria Alvim de Matos, da UFBA.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: Claudia Suemoto, em cksuemoto@usp.br, Naomi Vidal Ferreira, em naomivferreira@gmail.com, e Natália Gonçalves, em natalia.g@fm.usp.br

Texto: Sebastião Moura
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

OMS aponta cobalto como provável causador de câncer

A carcinogenicidade do elemento químico é maior entre trabalhadores que se expõem ao cobalto em fábricas e mineradoras, mas também pode ocorrer em pessoas que ingerem alimentos contaminados

Como um componente da molécula da vitamina B12, em pequenas quantidades, o cobalto é essencial para o bom funcionamento do organismo. No entanto, em excesso, esse elemento químico pode causar diversas doenças, geralmente associadas à exposição desse mineral no trabalho. Agora, um estudo encomendado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) da Organização Mundial da Saúde (OMS) traz mais evidências para o que já se suspeitava: o cobalto também pode causar câncer.

Publicado na revista Lancet Oncology, o trabalho foi realizado por cientistas de treze países, entre eles o farmacêutico-bioquímico Thomas Prates Ong, professor do departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e membro do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC). Participaram do estudo 31 especialistas de diversas áreas (epidemiologistas, biólogos, químicos, toxicologistas, patologistas, farmacêuticos entre outros), com experiência reconhecida em pesquisas sobre câncer. Ong contribuiu na área de nutrição, câncer e epigenética (modificações hereditárias que ocorrem nas funções genéticas sem alterações no DNA).

Os cientistas fizeram uma revisão de centenas de artigos, analisando a carcinogenicidade de nove agentes: cobalto (metal, sais solúveis, dois tipos de óxidos, sulfetos e outros compostos de cobalto), antimônio (trivalente e pentavalente) e tungstênio para munição de armas (contém níquel e cobalto). Para o metal cobalto e os compostos de cobalto, partículas moleculares de todos os tamanhos foram incluídas na avaliação.

As evidências de associação ao câncer foram suficientes para o metal, sais e um tipo de óxido de cobalto. “O cobalto e o antimônio registraram o mais alto índice de carcinogenicidade nos parâmetros do IARC, classificando-se como prováveis elementos carcinogênicos. Já o tungstênio registrou evidências menores, então segue sendo um possível carcinogênico”, afirma. “Concluímos que o cobalto induz a formação de tumores ao proporcionar um aumento das inflamações e mutações. Além disso, modifica o padrão epigenético ao causar alterações na forma como as células se proliferam, se diferenciam e morrem”, acrescenta.

Contaminação de alimentos

Segundo o estudo, “o cobalto é usado em muitas indústrias, inclusive na fabricação de ferramentas de corte e retificação, em pigmentos e tintas, vidro colorido, implantes médicos, galvanoplastia e, cada vez mais, na produção de baterias de íon-lítio”. Para o trabalhador dessas indústrias, a exposição ao cobalto se dá, principalmente por inalação de poeira e contato com a pele.

Para a população em geral, a ingestão de alimentos contaminados é a principal fonte de exposição, podendo ocorrer também pela fumaça de cigarro, poluição do ar e implantes médicos. No caso dos alimentos, a contaminação geralmente se dá quando os resíduos da fabricação de produtos que usam o cobalto chegam aos rios, ao solo e às plantações. “É um problema grave porque coloca em risco um amplo número de pessoas, com o consumo de alimentos e água contaminados, e por isso é muito importante o processo de fiscalização”, afirma Ong.

Um consumo normal de cobalto pela alimentação varia entre 5 e 50 microgramas (μg) por dia, com uma concentração no plasma sanguíneo de até 0,2 μg/litro. Sabe-se que acima de 7 μg/litro de plasma, sintomas de toxicidade podem ocorrer e o excesso de cobalto no organismo é eliminado principalmente pela urina.

Os alimentos que mais contêm cobalto são nozes, vegetais folhosos, cerais, chocolate, café, peixes e manteiga. A vitamina B12, que contêm esse metal, é encontrada em carnes e derivados do leite, porém a ingestão diária de 2,4 μg dessa vitamina – quantidade considerada ideal pela Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos (conhecida como Institute of Medicine) – contêm apenas 0,1 μg de cobalto. Mas, segundo evidências científicas, o consumo de alimentos que naturalmente contêm cobalto não representa riscos à saúde.

Texto: Assessoria de Comunicação da FCF

Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Preconceitos ligados à depressão podem retardar diagnóstico e tratamento

A gravidade da depressão no Brasil é desencadeada pela demora na procura médica e início do tratamento. A constatação veio a partir de uma pesquisa liderada pelo Instituto IPSOS, que diz que os brasileiros demoram cerca de três anos e três meses para, então, procurarem ajuda médica e iniciarem o tratamento da depressão. O quadro reflete não somente os desafios encontrados no combate à doença, como também expõe preconceitos de uma doença que avança aos poucos no processo de aceitação relacionado à condição mental dos enfermos.

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DMS-5), criado pela Associação Americana de Psiquiatria, a depressão é a condição em que o paciente se encontra com “humor triste, vazio ou irritável, acompanhado de alterações somáticas e cognitivas que afetam significativamente a capacidade de funcionamento do indivíduo”. E o Brasil apresenta 11,3% de pacientes nessa condição.

Demora no tratamento

Num cenário como esse, a questão envolvendo a demora por um tratamento efetivo traz sérias consequências. A médica Doris Hupfeld Moreno, supervisora do Programa de Transtornos Afetivos (Progruda) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP, comenta que, como qualquer outra manifestação clínica, a demora no início do tratamento leva a uma piora significativa, já que, “quanto mais tempo a pessoa fica doente, maiores as consequências biológicas”. O ciclo social também é afetado, uma vez que pode desencadear prejuízos no relacionamento familiar, no núcleo de amigos e no âmbito profissional.

A depressão possui múltiplos fatores, que vão desde as alterações químicas cerebrais até disfunções crônicas e histórico familiar. É principalmente por causa da falta de conhecimento sobre a doença que surgem os estigmas vinculados à doença. Leila Salomão, professora do Instituto de Psicologia, explica melhor os fatores por trás do problema: “Os estigmas sociais existem. Aí entra o preconceito de culpabilizar o deprimido, então, a pessoa se sente envergonhada.”

Esse é um dos principais motivos que ocasionam a morosidade na busca por um tratamento. E, em complemento, a professora Leila destaca que a busca fica dificultada quando “ela é aumentada pela falta de compreensão, de diálogo e pelas formas rudes de enfrentar conflitos”, em decorrência de uma postura “de censura, de crítica preconceituosa” em relação à depressão.

Passos importantes no combate à depressão

Como outras doenças, as especialistas defendem a importância de um tratamento regular para a depressão. Leila Salomão frisa a relevância de se atuar em “todas as linhas de prevenção”, indo desde o acesso à informação e à educação adequada até a prestação de apoio às famílias dos enfermos. No que diz respeito ao tratamento, a psiquiatra Doris Hupfeld destaca que, para cada quadro clínico, a medicação certa e na dosagem correta deve ser indicada pelo profissional da área qualificada.

Ela também adiciona que: “Os caminhos em políticas públicas para amparar os acometidos pela depressão e investir em ambulatórios de saúde mental, mais CAPS [Centro de Atenção Psicossocial] para a população”, são algumas das medidas práticas que podem trabalhar em conjunto com um tratamento eficiente, para diminuir o estigma que envolve a doença e o número de acometidos pela depressão.

Por Fernanda Real

FONTE: Jornal da USP