Preconceito é um problema em casos de câncer de mama na população trans

O câncer de mama é o tipo da doença que mais acomete as mulheres no mundo, presente tanto em países desenvolvidos como subdesenvolvidos, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer. A instituição ainda mostra que a doença ocupa a primeira posição em mortalidade por câncer entre as mulheres no Brasil. Diante dessa gravidade, a campanha de conscientização acerca dos cuidados necessários para um diagnóstico precoce recebe expressiva atenção durante o mês de outubro, em que se recomendam o autoteste e os exames para idades determinadas.

No entanto, ainda há uma falta de reflexão acerca dos perigos do câncer de mama voltados à população não cisgênero, ou seja, aquela que se identifica com o sexo com o qual nasceu. Homens trans, por exemplo, também apresentam chances de desenvolver câncer de mama, mesmo após a mastectomia, e precisam tomar os cuidados necessários, como autoteste, mamografia e exames rotineiros. Além dessa reflexão, Ana Amorim, professora do Programa de Atenção Primária à Saúde da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e presidente da Associação Brasileira Profissional para Saúde Integral de Pessoas Travestis, Transexuais e Intersexo (Abrasitti), aponta que a própria negligência e a dificuldade no acesso aos serviços de saúde por essa população também fazem parte da conscientização sobre o tema.

Barreiras do preconceito 

A própria exclusão social da população não cisgênero, principalmente das pessoas trans, atinge uma série de direitos essenciais, como o acesso à saúde. A professora destaca que essas barreiras não impactam apenas os diagnósticos precoces a partir de exames preventivos, como também afetam a manutenção básica da saúde. “As pessoas têm sintomas e elas tendem a demorar mais para buscar serviços de saúde por conta dessas barreiras sociais que são colocadas para as pessoas trans de uma maneira mais geral”, afirma.

As inúmeras barreiras a essa população se estabelecem no Brasil – país que mais mata pessoas trans no mundo desde 2008, de acordo com os relatórios Trans Murder Monitoring (TMM) da organização Transgender Europe (TGEU). José Roberto Filassi, professor da Faculdade de Medicina da USP e chefe do Setor de Mastologia do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, chama a atenção para a relação entre a transfobia e a falta de discussão sobre os perigos do câncer de mama nessa população: “Tendo em vista que o Brasil é o campeão mundial de assassinatos de pessoas trans e a expectativa de vida dessa população é de 35 anos, por isso, talvez, o câncer de mama não chame atenção, porque a preocupação começa a aparecer, com maiores chances, nas mulheres após os 40 anos”.

Além da violenta realidade enfrentada por essa parcela, Ana Amorim também alerta sobre as transfobias institucionalizadas nos serviços de saúde, em que se reproduzem negligência e desrespeito aos direitos das pessoas trans. A falta da opção de nome social em prontuários eletrônicos e a restrição de alguns exames de acordo com o sexo de registro da pessoa são exemplos muito comuns no serviço público, segundo a professora.

Essa violência e preconceito, mesmo quando não produzidos pelos agentes de saúde, Ana explica, permanecem presentes nos ambientes dos serviços na forma, na medida em que são alvo de desrespeitos e até mesmo olhares discriminatórios. “Isso também afasta as pessoas trans do serviço de saúde, uma vez que elas não se sentem seguras para estar no serviço e se sentem ainda mais vulnerabilizadas”, aponta a especialista.

Impactos do preconceito

Uma das principais preocupações mencionadas por Ana Amorim trata do atendimento ginecológico, isto é, aquele voltado para questões relacionadas à vulva, vagina, útero, ovários e mamas. Situações de gestação, por exemplo, muitas vezes são enquadradas apenas como um atendimento direcionado à mulher e não a qualquer indivíduo que possua um útero.

“É importante enfatizarmos que identidade de gênero é completamente diferente de características corporais, assim, não é porque uma pessoa tem certo corpo que ela tem certa identidade de gênero”, explica Ana. Assim, essa conduta deve se estender para além da população transexual e englobar qualquer outra identidade de gênero, a fim de promover um serviço de saúde voltado para a necessidade corporal específica de cada um sem vinculá-lo a uma categoria identitária de gênero.

Essa desorganização no momento de atender à população não cisgênero, conforme a professora, pode impactar muito negativamente na saúde mental dos pacientes. “É muito frequente que pessoas trans relatem que os atendimentos em serviços de saúde são grandes motivadores de sintomas ansiosos e de questões que geram problemas emocionais”, pontua.

Formação profissional

O preparo dos profissionais de saúde para atender não só à população trans, mas qualquer outra parcela mais vulnerabilizada da sociedade, se mostra essencial para um atendimento mais efetivo, na visão dos especialistas. O professor Filassi ressalta que o despreparo profissional, ao lado da sensação de insegurança dos pacientes, não será meramente solucionado por meio de decreto e um esforço de diversas frentes será fundamental.

Com tamanha agressão, o registro dessas ocorrências se faz necessário para um diagnóstico melhor do cenário e a possível elaboração de políticas públicas. A professora esclarece a dinâmica dos serviços de saúde e sua importância: “Espero que  as pessoas tenham acesso às informações, que reconheçam os seus direitos e saibam que as ouvidorias nos serviços de saúde são importantes, não só para que haja uma penalidade, caso algo aconteça, mas, principalmente, para que os serviços possam identificar os pontos de fragilidade e melhorar as suas condições”. Além disso, “profissionais de saúde devem tentar estar mais atentos de como podemos oferecer um cuidado não excludente que possibilite que todas as identidades e as populações também se sintam confortáveis em entrar no serviço”, avalia Ana.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira

FONTE: Jornal da USP

Comer em família faz bem para a saúde

Reunir a família em torno da mesa para compartilhar refeições, seja em ocasiões especiais ou no cotidiano, não apenas fortalece os laços familiares, mas também pode ter impactos positivos na saúde. A comensalidade, entendida como a prática de “comer coletivamente” ou “comer junto”, é uma dimensão humana fundamental.

Esse hábito remonta à pré-história, quando hominídeos se reuniam ao redor de fogueiras para compartilhar alimentos. A própria palavra “comensalidade” tem origem em mensa, termo em latim que significa mesa. Portanto, ao falar de comensalidade, referimo-nos à interação social durante as refeições, envolvendo o compartilhamento daquilo que é consumido. Esse convívio à mesa representa uma característica intrinsecamente humana de interação e integração na sociedade.

Para Patrícia Jaime, professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP e coordenadora acadêmica da Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares Saudáveis e Sustentáveis, “a ideia de comensalidade é importante porque ela traz um aspecto crucial da alimentação, que é o como comemos. É comum falarmos sobre o que comemos, mas temos dado pouca atenção aos modos de comer”.

Guia Alimentar para a População Brasileira destaca-se ao abordar esse tema de maneira pioneira. Ele apresenta três orientações fundamentais: comer com regularidade e atenção, escolher ambientes apropriados e compartilhar as refeições em companhia — todas interligadas ao conceito de comensalidade.

Convívio e saúde

Na atualidade, é bastante frequente a presença de distrações durante as refeições, como televisores e celulares, quando há tempo para uma refeição adequada. É comum consumir alimentos rapidamente diante de uma tela, sem dedicar a devida atenção ao que estamos ingerindo ou às pessoas ao nosso redor.

Para Patrícia, esse modo de comer pode acarretar consequências negativas para a saúde. “As ramificações dessas transformações são diversas. Ao ingerirmos rapidamente, corremos o risco de consumir mais do que o necessário, uma vez que o organismo leva um tempo para nos proporcionar a sensação de saciedade. Além disso, a mastigação reduzida dificulta a digestão”, destaca a professora.

Segundo a nutricionista, compartilhar a refeição pode ter um impacto significativo no cotidiano de uma pessoa. “Comer diante da TV, escolhendo alimentos de fácil consumo no sofá, é completamente distinto de quando nos alimentamos em companhia, à mesa, de preferência após preparar a receita com um parceiro ou com a família”, explica.

*Estagiário sob supervisão de Cinderela Caldeira e Paulo Capuzzo

FONTE: Jornal da USP

Cientistas brasileiros projetam melhorias em válvula cardíaca inovadora

Uma válvula com design inovador, projetada para pacientes com estenose aórtica, ficou mundialmente conhecida como Válvula Aórtica de Wheatley. O diferencial do dispositivo está na possibilidade de se dispensar o paciente de fazer tratamentos adicionais com anticoagulantes, usualmente adotados nestes casos após a inserção da prótese, via transplante. Pesquisadores da USP e Unicamp vinculados ao Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (Cemeai) trabalham no aprimoramento do projeto, que pode revolucionar a vida de milhões de pessoas afetadas pela doença.

Estenose

De acordo com a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista (SBHCI), a estenose atinge de 2% a 5% da população mundial e é decorrente da degeneração da válvula aórtica, dificultando a saída do sangue do coração para a aorta – principal vaso sanguíneo do coração – e comprometendo a circulação. Sendo mais comum em idosos, o aumento no número de casos dessa condição tem sido elevado nos países subdesenvolvidos, onde as doenças cardíacas reumáticas são preponderantes.

Em quadros graves de estenose aórtica, a única alternativa viável para garantir uma melhoria na qualidade de vida do paciente é um transplante. Esta operação consiste em substituir a válvula natural disfuncional por uma artificial (ou prótese). Há vários tipos de próteses disponíveis, e a escolha vai depender do cenário vivido por cada paciente. Em geral, as poliméricas, feitas com polímeros, são aquelas que possuem maior vida útil. Porém, elas requerem tratamento com medicamentos anticoagulantes na fase pós-operatória.

Os anticoagulantes são utilizados para “afinar” o sangue, ou seja, impedem a formação de coágulos e facilitam a circulação sanguínea. Esse tipo de tratamento medicamentoso requer extremo cuidado e atenção do paciente, sobretudo com sangramentos, para evitar risco de complicações.

À frente do trabalho com a Válvula de Wheatley estão os pesquisadores do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP José Alberto Cuminato e Gustavo Buscaglia, com o auxílio de Hugo Luiz Oliveira, atualmente professor da Unicamp. Eles buscam desenvolver modelos matemáticos e simulações computacionais de maneira a aprimorar o dispositivo.

Hugo Luiz Oliveira desenvolveu pesquisas sobre modelos matemáticos e simulações computacionais de maneira a aprimorar a Válvula de Wheatley – Foto: Reprodução/Youtube

Entendendo a Válvula de Wheatley

A maior incidência da estenose na população idosa mundial estimulou o surgimento de técnicas de substituição de válvulas do corpo humano pelas artificiais desde a década de 1960. Porém, o procedimento é invasivo e o tratamento demanda elevados custos financeiros. Sendo assim, como oferecer uma alternativa mais viável economicamente sobretudo para países em desenvolvimento?

Foi pensando nesse contexto que o professor, pesquisador e cirurgião cardíaco escocês David J. Wheatley decidiu, em 2012, empenhar seus próprios recursos para custear os protótipos que iniciaram a criação de uma válvula polimérica com folhetos em forma “S”.

“Ao patentear este dispositivo, Wheatley pretendia proteger a válvula inovadora de interesses comerciais predatórios, o que desviaria o projeto de sua finalidade. O objetivo central é colocar à disposição da população um dispositivo aórtico altamente eficiente com custo reduzido, favorecendo, sobretudo, países de baixo e médio nível de desenvolvimento econômico”, explica Hugo Oliveira.

Ponte Europa – Brasil

Ilustração de coração com estetoscópio. O pesquisador aponta que para o funcionamento da válvula é necessário compatibilizar várias necessidades e funções disciplinares – Foto: rawpixel.com/Freepik

Após um longo período de dedicação ao estudo e ao tratamento de doenças em válvulas cardíacas em diferentes partes do mundo, Wheatley confeccionou protótipos de sua válvula inovadora e realizou testes laboratoriais preliminares. Entretanto, o britânico precisava aprofundar seus conhecimentos sobre o comportamento mecânico do dispositivo, problema intrinsicamente de matemática e engenharia, por isso acionou o colega Sean McKee, da Universidade de Strathclyde, no Reino Unido.

Curiosamente, McKee foi orientador de doutorado de José Alberto Cuminato, em Oxford, e atualmente pertence ao corpo docente de Strathclyde. Daí o elo entre a universidade britânica e o Cemeai em prol do desenvolvimento da válvula de Wheatley. A ideia original era utilizar a modelagem matemática e a simulação computacional para oferecer ainda mais eficácia ao equipamento. Neste contexto, Oliveira embarcou no desafio e relata que os resultados têm sido satisfatórios.

“Trata-se de um modelo matemático bastante complicado de se fazer. É necessário compatibilizar várias necessidades e funções disciplinares. David Wheatley, como cirurgião cardíaco, possui uma experiência fisiológica, cirúrgica, funcional do dispositivo. A válvula se abre quando o sangue emerge do ventrículo esquerdo (quando o coração contrai) e se fecha para evitar que o sangue retorne da aorta quando o coração relaxa. Estas observações da realidade precisam ser traduzidas em equações matemáticas passíveis de serem resolvidas por um computador”, conta Oliveira.

Ele explica que a dinâmica do movimento envolve conceitos da Mecânica dos Sólidos, Mecânica dos Fluídos, métodos numéricos não lineares, técnicas de remalhamento automático, contato de corpos flexíveis e computação de alto desempenho. “Mesmo com todas essas complexidades envolvidas, nós conseguimos implementar um modelo que está em fase operacional, inclusive, sendo capaz de reproduzir com fidelidade os dados observados experimentalmente.”

Dessa forma, o Cemeai está à frente de um projeto único no Hemisfério Sul – como o próprio Oliveira narra – de modelagem matemática e simulação computacional de forma a testar melhorias na evolução tecnológica da válvula muito antes de se avançar para testes clínicos, economizando tempo e recursos.

Dispor de um modelo computacional de alta fidelidade reduz não apenas o tempo empregado na concepção da válvula e de seus mecanismos intrínsecos, como também os custos envolvidos na produção física de protótipos e testes experimentais.

Etapas do processo

Para conseguir a aprovação dos mais importantes órgãos reguladores de saúde no planeta, há diversas etapas a serem cumpridas. Oliveira lembra que antecipar situações adversas futuras da válvula pode ser muito importante para os pacientes.

Por exemplo, os pacientes com estenose aórtica na atualidade têm três alternativas de tratamento: com válvulas mecânicas, válvulas poliméricas e os dispositivos com componentes biológicos. No último caso, não há a necessidade de medicamentos anticoagulantes.

Entretanto, a contrapartida é a obrigação de se trocar a válvula, em média, a cada dez anos. “Se o paciente recebe uma válvula que tenha componentes biológicos, ele não precisa tomar o anticoagulante. O problema é que a válvula precisa ser substituída ao longo do tempo. Ou seja, será necessário fazer uma nova operação para a troca assumindo todos os todos os inconvenientes e os riscos de uma cirurgia convencional”, completa Oliveira.

A equipe do Cemeai se propôs a realizar a modelagem computacional da Válvula de Wheatley a fim de reproduzir o seu comportamento mecânico em condições de serviço. Esta ação permite que quaisquer melhoramentos eventualmente apontados possam ser testados virtualmente, sem a necessidade de produção de novas peças a cada alteração proposta.

Um exemplo de prótese biológica de válvula – Imagem: Reprodução/ Robertolyra/English Wikipedia via Wikimedia Commons

Os experimentos vão no sentido de garantir que a válvula abra e feche rapidamente e que a tensão de cisalhamento (forças em sentidos opostos, mas na mesma direção) no fluxo sanguíneo esteja sempre acima de um limite crítico. Com isso, o sistema evita a formação de trombos (coágulos, que podem originar trombose) e garante uma vida útil maior do que a válvula convencional.

Testes de simulação computadorizada para aperfeiçoar a Válvula Aórtica de Wheatley – Imagem: Divulgação /Hugo Oliveira

Para alcançar o resultado proposto, Oliveira e a equipe do Cemeai testaram vários softwares. A opção que melhor se adequou foi o solver (software para resolução matemática) LS-DYNA, que permitiu reproduzir fielmente no computador o desempenho mecânico e fluidodinâmico que a Válvula Aórtica de Wheatley apresenta em condições controladas de vazão e pressão.

Desde 2019, o LS-DYNA faz parte do pacote tecnológico da ANSYS, empresa líder mundial no ramo de simulações de softwares de engenharia. O solver foi escolhido pelo grupo do Cemeai por sua capacidade de simular com precisão e eficiência os fenômenos físicos não lineares necessários para descrever o comportamento da válvula.

Exposição do projeto chegou à Câmara

O trabalho atraiu olhares no Brasil e no exterior. A ANSYS convidou Oliveira para uma sessão pública na Câmara dos Deputados, em Brasília, onde foi discutido o papel vital dos experimentos com simulação computacional para impulsionar a inovação em tratamentos e dispositivos.

A sessão ocorreu no último dia 4 de outubro, apresentada pela deputada Sílvia Cristina Chagas (PL) com a presença de membros da Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (Anvisa) e do Comitê Nacional de Ética em Pesquisa em Saúde (Conep). Durante a sessão na Câmara, Oliveira debateu os desafios e as propostas revolucionárias de seu projeto matemático e a importância de um parecer da principal autoridade nacional na área para dar continuidade ao projeto.

“Pudemos estar presentes em Brasília e relatar que tal tecnologia está madura o suficiente e a estamos aplicando na realidade”, reforça Oliveira.

Na sessão aberta, o engenheiro expôs os resultados de sua pesquisa também na presença da Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia em Saúde (Abimed) e da Avicenna Alliance, uma associação global com o objetivo de tornar a medicina in silico (baseada em simulações computacionais) uma prática padrão no setor de saúde.

“O encontro foi muito positivo. Nós conseguimos estabelecer um diálogo muito importante junto à Anvisa, que se mostrou interessada nas abordagens in silico. Os próximos passos caminham na direção de agências reguladoras da Europa e Estados Unidos, ou seja, traçar diretrizes para auxiliar a confecção e a apresentação de estudos in silico para fins de homologação”, opina Oliveira.

Detalhe de apresentação de Oliveira na Câmara dos Deputados, em Brasília – Foto: Reprodução/TV Câmara

“A pesquisa desenvolvida no Cemeai está em linha com os melhores e mais exigentes padrões de qualidade internacionais. Para nós, brasileiros, participar de um projeto desta amplitude significa poder impactar positivamente a vida de milhares de pessoas, trazendo melhoria de qualidade de vida, reduzindo custos, ampliando o acesso a dispositivos cardíacos de alta eficiência. Em última instância, trata-se de um projeto de extrema relevância pública, em que a ciência de ponta é colocada em prol do benefício de todos”, conclui o pesquisador.

O projeto foi protagonista do Prêmio Pós-Doc USP, honraria concedida pela instituição na Escola Politécnica (Poli) da USP em outubro deste ano. A Modelagem Matemática e Simulação Numérica da Válvula Aórtica de Wheatley, título do trabalho, recebeu o prêmio na Área de Ciências Exatas e da Terra.

*Da Assessoria de Comunicação do Cemeai, com edição de Luiza Caires

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Rede colaborativa busca reabilitar pessoas com doenças genéticas

A Faculdade de Medicina (FM) da USP lançou o Centro Integrado de Doenças Genéticas (Cigen), uma rede colaborativa formada por oito institutos do Hospital das Clínicas (HC) e duas instituições parceiras. Um dos institutos referência na área é o Departamento de Genética do Instituto de Biociências (IB) da USP.

Magda Carneiro Sampaio, professora titular do Departamento de Pediatria da FM da USP e presidente do conselho diretor do Instituto da Criança e do Adolescente (ICr) do HC, explica que a rede integra serviços clínicos, serviços multiprofissionais e laboratórios.

Principais objetivos 

Tendo em vista que as doenças genéticas, em sua maioria, não apresentam tratamento visando à cura, as principais medidas concentram-se na reabilitação dos pacientes. “O principal objetivo do Cigen é oferecer e expandir o tratamento diagnóstico e, eventualmente, tratamento e reabilitação para pessoas com doenças genéticas”, informa a professora Magda.

Outros aspectos também abordados pelo centro são a capacitação de profissionais médicos e não médicos, incentivo à pesquisa e elaboração de políticas públicas voltadas para a área de doenças genéticas, raras ou não.

Avanços na área 

A professora comenta que os avanços no âmbito da genética e genômica humana enfrentam desafios para baixar os custos de recursos, como o exoma completo – maior exame do genoma humano disponível para analisar a hereditariedade. “Também temos a ideia de formar um biobanco com todo material que já existe”, acrescenta Magda.

O biobanco, dessa forma, irá unir tanto dados genéticos quanto as informações clínicas dos respectivos casos. Essa ação poderá contribuir, segundo a especialista, para diversos segmentos, por exemplo, na discussão de doenças de alto custo e na judicialização de casos.

Especialidades envolvidas

A pediatria ocupa um lugar de destaque no estudo da área, na medida em que as enfermidades genéticas aparecem desde muito cedo nos indivíduos. Além da clínica médica e imunologia.

Apesar de áreas mais frequentes que outras, as doenças genéticas se envolvem com inúmeras especialidades, que podem contribuir no seu estudo de diversas maneiras. Assim, a formulação do Cigen, a partir de uma óptica de rede colaborativa, apresenta um grande potencial.

FONTE: Jornal da USP

Mapeamento do cérebro ajuda a identificar e prever consequências de doença que afeta idosos

Ao envelhecer, nosso desempenho intelectual e alguns aspectos do nosso comportamento se alteram. Um dos fatores que levam a esse processo é a doença cerebral de pequenos vasos (DCPV). A chance de ter a condição aumenta com a idade, afetando 5% das pessoas com 50 anos e, teoricamente, a grande maioria das pessoas com mais de 80 anos.

A DCPV causa 25% dos acidentes vasculares cerebrais e contribui para 45% dos casos de demência. Além disso, o quadro cria pequenas lesões que levam a microsangramentos e infartos cerebrais silenciosos, entre outras alterações.

“Ao longo da juventude até chegar ao envelhecimento, é possível promover modificações do nosso estilo de vida de tal forma a evitar que ela ocorra ou, pelo menos, retardar o aparecimento da doença e o comprometimento da saúde cerebral”, avalia o pesquisador Pedro Henrique Rodrigues da Silva, do Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP

Ele ganhou o Prêmio Capes de Tese 2023 na área de Medicina II em razão de uma pesquisa que ajuda a entender melhor a relação das redes cerebrais com a cognição e os efeitos causados pela DCPV. O prêmio, concedido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), reconhece os trabalhos de doutorado mais originais e relevantes de cada ano.

As lesões pontuais podem ser vistas através de neuroimagens e, portanto, normalmente são associadas à região do cérebro onde ela se encontra. “No entanto, pesquisadores começaram a perceber que o mesmo grupo de pacientes, com a mesma idade, mesmo grau de lesão e no mesmo local apresentava desfechos diferentes, afetando regiões distantes do cérebro”, conta Pedro da Silva.

Isso levou o físico a fazer uma avaliação interdisciplinar dos efeitos desses danos não apenas através das estruturas que conectam os neurônios, os axônios, mas também por conexões previstas por modelos matemáticos, conhecidas como redes funcionais. Além da física e da medicina, o cientista trabalhou com conceitos avançados da química, da computação, da estatística, da psicologia e da biologia.

Conexões entre redes estruturais e redes funcionais do cérebro – Imagem: Reprodução/Brain Connectivity/Artigo de Renata Ferranti Leoni e Pedro Henrique Rodrigues da Silva

A ideia foi costurar essas informações e usar a neuroimagem para mapear como uma lesão local, a hiperintensidade de substância branca, afetaria outras áreas do cérebro, como conta o pesquisador. “Enquanto físico médico com foco em neuroimagem, a minha maior contribuição é fazer o melhor uso das ferramentas para mapear e compreender as alterações cerebrais, a sua associação com o desfecho de um grupo de pacientes para, a partir disso, começar a delinear fenótipos e acompanhar intervenções a partir dos marcadores estabelecidos com essas análises.”

Na prática, isso significaria facilitar o diagnóstico, prever o que pode acontecer com um paciente e criar um tratamento mais personalizado.

O pesquisador classifica a DCPV como uma síndrome de desconexão. Isso significa que ela pode afetar diferentes regiões cerebrais ao invés de uma única, onde o pequeno machucado foi encontrado. A perda da ligação entre essas áreas cerebrais pode resultar em problemas de memória e dificuldade no processamento de informações.

Renata Ferranti Leoni, professora do InBrain Lab da FFCLRP que orientou o projeto, esclarece que mais doenças como essa estão aparecendo porque as pessoas hoje vivem mais. “Antigamente não se falava muito desse tipo de doença, como o Alzheimer, porque a nossa expectativa de vida era menor. Então, entender como o cérebro funciona pode ajudar nas prevenções, para que outras pessoas não cheguem a desenvolver essas doenças.”

O tráfego de informações na nossa cabeça

A comunicação entre os neurônios é a base dos nossos pensamentos e comportamentos. Porém, há uma contradição entre as regiões do cérebro que são vistas trabalhando ao realizar uma tarefa e as conexões feitas pelos axônios. “Há regiões que, mesmo não tendo uma ligação estrutural, estão trabalhando sincronizadamente. Elas podem estar trabalhando juntas sem necessariamente estarem ligadas diretamente por axônios”, sugere a professora.

Segundo os modelos matemáticos funcionais, as diferentes áreas do cérebro trabalham em conjunto para processar informações mais rapidamente, como detalha Pedro. “A rede de velocidade de processamento de informação seria composta de oito regiões do cérebro que têm um padrão de conectividade funcional, seja na execução da tarefa ou em repouso. Esses padrões se correlacionam, até certo ponto, com os padrões de conectividade estrutural, porém não totalmente.”

Mapas cerebrais de desconexão associados a velocidade psicomotora ajustados para idades, sexos, escolaridade e sintomas depressivos. Imagem: Brain Topography.Mapas cerebrais de desconexão associados a velocidade psicomotora ajustados para idades, sexos, escolaridade e sintomas depressivos – Imagem: Reprodução/Brain Topography/Artigo de Renata Ferranti Leoni e Pedro Henrique Rodrigues da Silva

No início de um aprendizado, como a alfabetização e aulas de piano, o cérebro parece uma árvore de Natal. São muitas regiões do cérebro “acesas”, trabalhando muito e gastando bastante energia e, logicamente, demorando para concluir uma tarefa. “Após o aprendizado, essa rede se reorganiza, se especializa e se torna mais eficiente para executar aquela mesma tarefa. Então, não necessariamente a diminuição da atividade é pior”, explica Pedro.

A velocidade é prejudicada com a DCPV porque, ao danificar um ponto específico do cérebro, toda uma rede é afetada. Assim, os padrões funcionais precisam se reorganizar para conseguir voltar a performar a mesma atividade já aprendida.

Desconexão

Nos últimos anos, pesquisadores perceberam que identificar as lesões nos axônios não era suficiente para prever as perdas cognitivas em pacientes.

Enquanto um poderia não apresentar sintomas, outro poderia ter um déficit gravíssimo. O desfecho pode variar de acordo com a estratégia adotada em cada cérebro para compensar uma mesma obstrução.

“Às vezes o cérebro tenta recompensar um condição, mas faz isso de maneira errada, que é negativa. A pessoa até faz, mas sempre tem uns ‘brancos’ ou acontecem coisas inesperadas. Até que chega um ponto em que o cérebro ‘joga a toalha’, porque o esforço foi muito intenso”, complementa o físico.

O pesquisador defende uma mudança de olhar nesses diagnósticos. “Precisamos ir por camadas: identificar a lesão, como ela afeta as redes estruturais, as redes funcionais e como essas redes estão associadas aos testes neuropsicológicos ou testes clínicos aplicados.”

Atualmente, são também consideradas doenças de desconexão a depressão, a ansiedade, a demência e a esquizofrenia. Porém, seriam necessários testes similares aos da pesquisa para confirmar se elas se enquadram nessa classificação pelos mesmos motivos.

Segundo Pedro, estamos no período das “grandes navegações” no cérebro e entender essa organização ajuda a propor tratamentos mais eficazes.

Redes cerebrais

As redes estruturais navegam através das fibras dos axônios, que ligam diferentes regiões do cérebro. Já as redes funcionais viajam por regiões distintas no espaço cerebral, podem ser monitoradas através do fluxo sanguíneo e não correspondem completamente às redes estruturais.

Pedro conta que a rede funcional é um modelo matemático que explica melhor algumas execuções de tarefas e condições clínicas. “A priori, acreditava-se que, ao mapear a estrutura cerebral, ou seja, as fibras de substância branca, seria possível entender o funcionamento do cérebro, correlacionar com as várias medidas de testes neuropsicológicos e associar com as diversas condições clínicas, mas começou-se a perceber que, pelo menos com a neuroimagem que nós temos, esse mapeamento não explicava todos os desfechos clínicos e cognitivos dos pacientes.”

Há uma divergência entre a rede funcional e as conexões estruturais de neurônios. Por isso podemos dizer que a estrutura coloca limites às redes funcionais, mas não as determina completamente.

Entender como uma região influencia ou causa atividade em outra durante uma atividade é interessante para o estudo da DCPV pois pode abrir caminhos para a elaboração de melhores estratégias de diagnóstico, de tratamento e de melhoria na qualidade de vida dos pacientes.

Testes

Na sua pesquisa, Pedro avaliou a conectividade das regiões cerebrais em indivíduos saudáveis e comparou com trabalhos anteriores, realizados com pessoas com DCPV pela Universidade Radboud de Nimega, nos Países Baixos.

Esses estudos indicavam que a quantidade de tempo necessária para processar um conjunto de informações pode ser medida com a aplicação de um teste de substituição de letras por dígitos. “Esses testes conseguem identificar déficits de velocidade de processamento da informação no início da doença”, comenta Renata.

Como as letras e os dígitos são previamente conhecidos, o teste não depende de processos visuais e de memória complexos. Ou seja, isola melhor a velocidade de processamento de outros fatores como a memória e a atenção.

Nesses experimentos, a rede funcional foi observada por ressonância magnética através do fluxo sanguíneo. Quando estimulados a realizar uma tarefa, demandando energia, os neurônios fazem aumentar o fluxo de oxigênio fornecido pelos vasos.

Além da colaboração dos neerlandeses, o pesquisador contou com a colaboração de radiologistas e neuropsicólogos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP).

Mais informações: e-mails pedrojoanabrit@usp.br, com Pedro Henrique Rodrigues da Silva, e leonirf@usp.br, com Renata Ferranti Leoni

*Estagiário sob orientação de Fabiana Mariz

**Estagiárias sob supervisão de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Ondas de frio e de calor aumentam risco de mortalidade entre idosos

Nos últimos dias, o Brasil vem registrando recordes de temperaturas. A última segunda-feira (15 de novembro) foi o dia mais quente de 2023 na capital paulista, alcançando a máxima de 37,4ºC, que foi repetida no dia seguinte, terça. Os dados são do Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE) da Prefeitura de São Paulo.

Eventos climáticos extremos como este aumentam os riscos à saúde, como confirmado em pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Em tese de doutorado, a pesquisadora Sara Lopes de Moraes analisou o impacto das ondas de frio e de calor na mortalidade de pessoas com 65 anos de idade ou mais em São Paulo. A pesquisa aponta que as pessoas mais afetadas e com maior risco de mortalidade estão na periferia da cidade, sendo o frio mais associado a doenças do coração e o calor a acidentes vasculares cerebrais.

A questão das mudanças climáticas tem estado em destaque nos últimos anos, e a pesquisadora conta que queria colaborar com políticas públicas na área de clima e saúde. “As pessoas idosas são as mais vulneráveis, pois seu sistema fisiológico é mais debilitado e elas podem apresentar doenças preexistentes como hipertensão, problemas cardiovasculares e diabete”, explica Sara Lopes. Por isso, eventos extremos de temperatura aumentam o risco à saúde desse grupo.

Vulnerabilidade

Mas a vulnerabilidade não está relacionada apenas às condições genéticas e fisiológicas, como também ao fator socioeconômico e à situação de moradia. A pesquisa revelou que as pessoas mais afetadas pelas ondas de calor e de frio encontram-se nas periferias da cidade de São Paulo.

Além disso, as pessoas de baixa renda apresentam maior risco de mortalidade quando comparadas às de classes mais abastadas. A pesquisadora concluiu, também, que as ondas de frio estão associadas principalmente às doenças cardiovasculares e isquêmicas do coração, enquanto as ondas de calor tendem a causar acidentes vasculares cerebrais.

Risco de doenças em ondas de frio (à esquerda) e em ondas de calor (à direita) entre pessoas com 65 anos ou mais. Os dados foram coletados na cidade de São Paulo de 2006 a 2015. Os números no mapa indicam os agrupamentos de mortalidade de alto risco – Imagem: Sara Lopes de Moraes/Reprodução/Tese de Doutorado

Para combater os impactos dos eventos climáticos extremos, Sara Lopes destaca a importância da criação de áreas verdes e da redução dos gases causadores do efeito estufa. Ela opina, ainda, que os projetos da Prefeitura podem ser expandidos para além das pessoas em situação de rua, protegendo também os moradores das periferias e os trabalhadores que passam muito tempo no transporte público.

No Canadá, por exemplo, existem locais de resfriamento durante as ondas de calor, que fornecem ar condicionado e hidratação para aqueles que precisam. Por fim, a pesquisadora sugere que os jornais alertem a população quanto aos riscos gerados pelas mudanças no tempo.

*Assessoria de Comunicação da FFLCH, com edição de Júlio Bernardes

FONTE: Jornal da USP

Desafios do Sono no Brasil: Impacto, Causas e Alternativas

Cerca de 73 milhões de brasileiros enfrentam distúrbios do sono, revelam estudos da Associação Brasileira do Sono (ABS). Apesar de sua prevalência, especialistas destacam um aumento nas últimas décadas, influenciado por fatores como idade, gênero e posição socioeconômica.

Insônia e suas Origens

A insônia, marcada pela dificuldade em manter o sono contínuo e pela latência aumentada, afeta o bem-estar diário. Dra. Rosa Hasan, do Instituto de Psiquiatria (IPq) da USP, aponta que as doenças mentais, especialmente depressão e ansiedade, são as principais causas.

Origens e Impactos na Vida Cotidiana

A insônia, muitas vezes sintoma inicial, pode se tornar crônica, impactando negativamente o desempenho acadêmico, profissional e a saúde cardiovascular. Jovens, devido ao uso excessivo de redes sociais, agora estão mais propensos a esse problema.

Uso de Medicamentos e Alertas Médicos

O Zolpidem, amplamente usado para tratar insônia, apresenta riscos de dependência. Dra. Rosa destaca o aumento do uso de medicamentos e adverte contra a automedicação, enfatizando a necessidade de receitas individualizadas.

Tratamentos Alternativos e Abordagem Individualizada

Apesar do aumento do uso de medicamentos, o tratamento padrão envolve terapias psicológicas e comportamentais. Dra. Rosa propõe uma abordagem mais controlada para medicamentos, promovendo conscientização sobre seu uso cauteloso.

Conclusão

Enfrentar os desafios do sono no Brasil requer uma compreensão profunda das causas e a promoção de abordagens individualizadas. Conscientizar o público sobre os riscos associados ao uso indiscriminado de medicamentos é fundamental para uma gestão eficaz desse problema crescente.

FONTE: Jornal da USP

Dicas para cuidar da saúde mental no trabalho

Saúde mental e trabalho estão intrinsecamente ligados. Enquanto boas condições laborais podem afetar de forma positiva o bem-estar da mente, as jornadas exaustivas combinadas com metas abusivas, conflitos com colegas e falta de reconhecimento e autonomia têm impactos negativos sobre a saúde(1,2).

Entre os principais problemas associados ao trabalho, os mais comuns são síndrome de burnout, depressão e ansiedade.

Nessas situações, é comum sentir o coração acelerar ao ter que lidar com colegas ou situações rotineiras e experimentar ansiedade e pânico na hora de sair para trabalhar(2).


A síndrome de burnout é marcada por estresse, exaustão extrema e sensação de esgotamento físico desencadeada justamente pelo excesso de trabalho(3).

Os sintomas associados ao burnout surgem de forma leve, mas pioram com o tempo e podem vir acompanhados de fadiga, insônia, desesperança, mudanças repentinas de humor e alterações nos batimentos cardíacos(3).

O burnout é tratado com psicoterapia e mudanças no estilo de vida. Principalmente para incluir a prática regular de atividade física e exercícios de relaxamento para aliviar o estresse e controlar os sintomas da doença(3).

O que fazer para melhorar sua saúde mental?

Cuidar da saúde mental envolve a implementação de estratégias que aliviem o estresse no trabalho e as pressões da vida cotidiana. Aqui estão algumas dessas estratégias(3):

  • Considere discutir com seus superiores sobre a possibilidade de flexibilizar as horas de trabalho para que você consiga administrar todas as suas atividades ou adaptar as suas tarefas para diminuir o nível de estresse(1);

  • Busque conselhos de alguém que você considera resiliente sobre as dificuldades que está enfrentando. Pode ser um colega de trabalho, um amigo ou mesmo um membro da família. Se não se sentir à vontade para pedir conselhos, tente perceber como essa pessoa responde às situações desafiadoras da vida(4);

  • Em vez de definir um objetivo ambicioso, estabeleça pequenas metas que conduzam sua vida profissional e pessoal a um objetivo maior(3);

  • Mantenha distância de pessoas negativas, especialmente daquelas que frequentemente se queixam do trabalho(3);

  • Reserve tempo para cuidar do seu bem-estar físico. Isso inclui ter uma quantidade de sono adequada e o envolvimento em atividades de controle do estresse (como ioga ou meditação) (4);

  • Pratique exercícios físicos regularmente. Durante a atividade o corpo libera hormônios que ajudam a reduzir os níveis de estresse e aumentam a sensação de bem-estar(4);

  • Invista em momentos de lazer e procure ter um espaço na agenda para estar junto de amigos e familiares(3);

  • Dedique-se a atividades que quebrem a sua rotina diária, como passeios, jantares em restaurantes ou idas ao cinema(3).

Cuidar da saúde mental no local de trabalho é fundamental para assegurar uma boa qualidade de vida, já que dedicamos uma parte significativa do nosso tempo à nossa atividade profissional.

Acompanhe o blog do FazBem para conhecer outras dicas de saúde e bem-estar!

Referências bibliográficas:

1. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Mental health at work. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/mental-health-at-work. Acesso em: 06 out 2023. 

2. ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE MEDICINA DO TRABALHO. Disponível em: https://www.anamt.org.br/portal/2019/04/22/transtornos-mentais-estao-entre-as-maiores-causas-de-afastamento-do-trabalho/. Acesso em: 06 out 2023. 

3. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Síndrome de Burnout. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout. Acesso em: 06 out 2023. 

4. MAYO CLINIC. Strengthening your mental fitness. Disponível em: https://mentalhealthandwellbeing.mayo.edu/understanding-mental-health/strengthening-your-mental-fitness/. Acesso em: 06 out 2023. 

BR-26996. Material destinado ao público geral. Nov/2023

FONTE: Blog FazBem

Doença de Crohn tem registrado crescimento nos países em desenvolvimento

estudo Tendências temporais na epidemiologia das doenças inflamatórias intestinais no sistema público de saúde no Brasil: um grande estudo de base populacional, publicado na revista The Lancet Regional Health Americas, apontou que a doença de Crohn cresce 12% ao ano no Brasil, com maior frequência nas regiões Sul e Sudeste.

O médico Alexandre de Sousa Carlos, do Departamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), explica que são vários os fatores que propiciam a inflamação intestinal.

Início da infecção

O médico comenta a complexidade do entendimento sobre o início da doença no indivíduo: “A gente acha que deve haver uma predisposição genética aliada a fatores ambientais e a uma desregulação da microbiota intestinal, que auxilia na imunidade. Então esses três fatores propiciam um desajuste do sistema imunológico, que ataca o próprio trato gastrointestinal”.

O especialista discorre que os fatores ambientais, que ainda estão sendo estudados, são: estresse; dieta rica em gorduras e alimentos processados; tabagismo; e uso excessivo de anti-inflamatórios e antibióticos.

Sintomas e tratamento da doença de Crohn

De acordo com Souza Carlos, a doença possui um espectro clínico variado e isso dificulta o diagnóstico em alguns casos. “Os sintomas mais clássicos são diarreia, que tende a ser crônica e pode ter sangramento ou muco nas fezes, dor abdominal que não melhora com analgésicos simples e perda de peso e apetite.” Ele observa ainda que isso independe da dieta do indivíduo, pois é a inflamação do trato gastrointestinal que está provocando esses sinais.

A doença é crônica, isto é, ela não possui cura conhecida até o momento, portanto, o tratamento deve ser realizado pelo resto da vida do paciente, discorre Souza Carlos. “Quanto mais precoce dermos o diagnóstico, quanto mais intervirmos com a medicação correta, menos sequelas o paciente vai ter.” Ele ainda complementa que o objetivo dos médicos é de cicatrizar a inflamação, para que dessa forma a pessoa tenha uma vida com menos dificuldade.

Complicações

Segundo o médico, existem duas principais representantes quando se trata de doença inflamatória intestinal, sendo elas a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa. Na segunda enfermidade, é possível identificar como principais complicações o fato de que, nos casos graves, deve ser feita uma cirurgia para retirada de todo o intestino grosso, visto que nenhuma medicação funciona mais. Além disso, caso o paciente esteja sofrendo há mais de dez anos com a doença, o risco de câncer intestinal aumenta.

Por outro lado, a doença de Crohn também apresenta uma diminuição do calibre do intestino, condição na qual é necessária uma operação para que o paciente consiga se alimentar novamente. Ademais, dependendo da intensidade da inflamação, pode ocorrer uma perfuração no intestino, que ocasiona uma infecção generalizada e, como consequência, uma cirurgia de emergência.

Prevenção

A primeira coisa é propagar a informação correta para o paciente e para a própria comunidade médica saber dessa doença, que não tem cura mas que pode ser controlada, daí a importância de um diagnóstico precoce. O especialista comenta um estudo que aponta uma demora no diagnóstico dos pacientes: “Há uma média de um ano a um ano e meio para o diagnóstico. Quando falamos de um paciente que possui uma assistência mais fácil ao sistema de saúde, ele vai conseguir diminuir esse intervalo, mas é preocupante, sim, esses intervalos para diagnosticar.

Souza Carlos afirma que um dos temas mais estudados atualmente, nessa área, é a de prevenção da doença de Crohn. Para isso, ele diz que é necessário que o indivíduo possua um estilo de vida saudável, combatendo os fatores ambientais estabelecidos com a prática regular de atividade física e uma dieta equilibrada.

FONTE: Jornal da USP

Micoses endêmicas: descobertas podem ajudar na formulação de tratamentos

As infecções fúngicas, mais conhecidas como micoses, afetam milhares de brasileiros todos os anos: em 2016, estimava-se que mais de 3,8 milhões de pessoas sofriam de alguma forma grave da doença, segundo um estudo realizado pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). Embora sejam comuns, as micoses são consideradas negligenciadas no âmbito da saúde pública, seja por conta da subnotificação de casos, seja pela ausência de tratamentos eficientes e medidas terapêuticas. Para mudar esse cenário, uma pesquisa do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP investigou a elaboração de novas abordagens vacinais e terapêuticas para o combate a micoses endêmicas, por meio da análise de diferentes espécies de fungos. O trabalho recebeu o Prêmio Capes de Tese.

As infecções endêmicas são aquelas com maior prevalência em determinadas partes do mundo. As analisadas na pesquisa são a histoplasmose, causada pelo fungo Histoplasma capsulatum, e a esporotricose, causada pelo Sporothrix brasiliensis, que têm registros de aparição consideráveis no Brasil. O Histoplasma foi utilizado no avanço dos conhecimentos para a formulação de uma possível vacina antifúngica que serviria para diferentes tipos de micose. Já o Sporothrix foi usado na análise da resposta do sistema imunológico a sua infecção.

“As estratégias que nós desenvolvemos podem ser aliadas aos tratamentos antifúngicos que já temos disponíveis no mercado para diminuir a dosagem dos fármacos e assim tentar desenvolver uma terapia personalizada que possa garantir um maior sucesso no tratamento do paciente” explica ao Jornal da USP Brenda Kischkel, doutora pelo ICB e responsável pela pesquisa.

Uma vacina, vários fungos

Por apresentarem células eucarióticas – aquelas que possuem seu material genético envolvido por um núcleo – similares às humanas, a pesquisadora destaca o desafio na elaboração de uma vacina antifúngica. “Os componentes das células do fungo acabam tendo uma certa correspondência com as humanas. Então, se a vacina for desenvolvida a partir de uma proteína inteira de um fungo, existe uma chance muito alta dessa ser semelhante com as humanas, o que causaria uma reação alérgica numa pessoa”, diz. Por esse motivo, uma vacina peptídica, que utiliza peptídeos (fragmentos de proteína), foi escolhida para ser formulada.

A imunidade pode ser dividida em dois campos: a inata, que é a linha de frente contra infecções e já se faz presente a partir do momento do nascimento, e a adquirida, que retém a memória de um invasor em particular e se desenvolve para um ataque mais eficaz no futuro. As vacinas trabalham a partir da imunidade adquirida.

Para desenvolvê-la, o fungo Histoplasma capsulatum foi dado a uma célula dendrítica, um leucócito do sistema imunológico inato, que o ingere por fagocitose. A célula digere o invasor e acaba apresentando pedaços de proteína em sua superfície, que se encaixa perfeitamente em um receptor de uma célula T – glóbulos brancos envolvidos na imunidade adquirida. “Ela [célula T] vai reconhecer esses fragmentos e vai ser ativada, sofrendo uma expansão colonial para lutar contra esse patógeno”, explica Kischkel.

Então, com a utilização de ferramentas de bioinformática, os pesquisadores colocaram a célula dendrítica infectada em cultura, para assim realizar uma triagem de potenciais peptídeos que poderiam ser utilizados na concepção do imunizante. “A partir dessa análise nós descobrimos que determinados peptídeos eram iguais em mais de uma espécie de fungo, o que poderia resultar no desenvolvimento de uma vacina que não fosse apenas para o Histoplasma, mas que funcionasse também para outras quatro espécies. Ou seja, uma potencial vacina panfúngica”, coloca a pesquisadora.

Além disso, de acordo com o professor Carlos Taborda, do ICB, o orientador da pesquisa, a vacina iria modelar a imunidade para treinar a defesa do corpo contra esses invasores, podendo auxiliar tanto na redução do tempo de tratamento quanto no impedimento de uma reinfecção. “A análise dos potenciais antígenos vacinais que atuam como indutores favoráveis à resposta imune agrega um conhecimento que é importantíssimo para qualquer desenvolvimento de medicamento ou imunizante”, explica. O estudo não chegou a contemplar a fórmula completa para a vacina, porém, as pesquisas avançam no Departamento de Microbiologia do ICB.

Histoplasma capsulatum é responsável pela transmissão da histoplasmose. A doença pode ser contraída a partir da respiração de partículas do fungo presentes na natureza – em cavernas habitadas por morcegos ou durante o manuseio do solo, por exemplo. Os sintomas clínicos variam, indo desde infecções assintomáticas até casos graves que afetam especialmente pacientes imunossuprimidos.

A infecção tem impacto no sistema pulmonar e se manifesta com sintomas como febre, tosse, dores de cabeça e musculares, além de dificuldades em respirar. A histoplasmose é atualmente considerada uma das micoses sistêmicas (aquelas que têm como porta de entrada o trato respiratório) mais significativas nas Américas, com uma ampla ocorrência em todas as regiões do Brasil.

Resposta inflamatória da esporotricose

A resposta do sistema imunológico à infecção por Sporothrix brasiliensis também foi explorada pelos pesquisadores. O fungo é conhecido por transmitir a esporotricose, uma micose subcutânea que causa feridas que se assemelham a picadas de inseto na pele. A principal via de infecção é o contato do fungo com feridas, muitas vezes desencadeadas por lesões provocadas por espinhos, palha ou fragmentos de madeira. A transmissão também pode ocorrer por meio de arranhões ou mordidas de animais contaminados.

Foi revelado que as feridas causadas pela destruição do tecido pelo fungo representam uma ação inflamatória exacerbada do corpo humano. Existe uma estimulação da produção de citocinas, mais precisamente as intituladas interleucinas 1, ou “IL1”, que são proteínas produzidas pelas células de defesa do organismo cuja função é acirrar o processo de destruição do patógeno. “Quando observamos o tecido da pessoa sendo destruído durante uma infecção fúngica, muitas vezes não é o fungo o responsável. Na verdade, aquela é uma reação exacerbada do próprio hospedeiro tentando se defender contra o fungo. E se essas citocinas vão sendo produzidas, elas acabam estimulando a fabricação de mais citocinas, desencadeando um loop”, explica Kischkel. Com essa descoberta, os pesquisadores constataram que um medicamento que iniba tal citocina na pele seria vantajoso para o tratamento desta micose.

S. brasiliensis pode se disseminar diretamente de um animal infectado para uma pessoa ou para outros animais e deixá-los doentes com esporotricose – Imagem: Divulgação/CDC

Atualmente, o Brasil passa por uma explosão de casos de esporotricose. De acordo com o Ministério da Saúde, o Estado do Rio de Janeiro apresentou um aumento significativo de registros da doença: de 579 ocorrências em 2013, o número disparou para 1.518 em 2022.

Doença negligenciada

“As infecções fúngicas são doenças negligenciadas e de baixa visibilidade. Existe falta de recursos para estudos clínicos e estudos porque elas atingem principalmente pessoas em vulnerabilidade e sem acesso a determinados medicamentos”, coloca Taborda. Os fungos podem ser encontrados em ambientes úmidos e com presença de vegetação, o que coloca populações em áreas rurais e moradias precárias no principal grupo de risco dessas infecções. Além disso, as micoses também podem representar uma ameaça a pacientes com algum grau de imunossupressão. A partir disso, os pesquisadores reforçam a importância de iniciativas que pesquisem alternativas para o tratamento de micoses endêmicas.

A tese de doutorado Explorando as vias de inflamação em infecções fúngicas endêmicas e potenciais novas estratégias de tratamento, de Brenda Kischkel, realizada sob orientação do professor Carlos Taborda, foi ganhadora do Prêmio Capes de Tese na categoria de Ciências Biológicas III. É possível encontrar o trabalho no banco de teses da USP.

Mais informações: e-mail brendakischkel@gmail.com, com Brenda Kischkel; e-mail taborda@usp.br com Carlos Taborda

*Estagiária sob orientação de Fabiana Mariz

**Estagiária sob orientação de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP