Medicamento para tratar déficit de atenção misturado com álcool coloca em risco a saúde dos jovens

Autorizado pela Anvisa para o tratamento do transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e, mais recentemente, para a compulsão alimentar, o Venvanse tem assumido função recreativa entre os jovens e preocupado autoridades de saúde. Venvanse é o nome comercial de um fármaco derivado de anfetaminas, a lisdexanfetamina, que é de uso controlado e vendido apenas com prescrição médica.

Especialista em Psiquiatria da Infância e Adolescência da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, o professor Erikson Felipe Furtado adverte quanto aos perigos do uso indiscriminado da droga, seja para ficar acordado e eufórico em festas e eventos, seja para aumentar o foco em tarefas específicas, elevando a concentração.

Por ser “um psicoestimulante, que tem elevado risco de induzir dependência”, entre outros, Furtado afirma que a utilização do remédio não deve ser desviada de sua função originária, com riscos para os usuários, independentemente do efeito procurado.

 Efeitos agudos tóxicos

Ao fazer a associação do Venvanse com bebidas alcoólicas, os jovens tentam contrabalançar o efeito sedativo do álcool. Furtado esclarece que o psicoestimulante pode mascarar o cansaço de uma longa noite de festa, “mas isso não significa que não houve um desgaste físico e mental, o indivíduo está tendo um gasto energético e isso vai aparecer em algum momento”.

O desejo de aumentar a experiência sensorial é também um dos principais objetivos desses jovens. Os efeitos do álcool com o estimulante podem proporcionar uma sensação maior de euforia. O médico alerta, no entanto, que a combinação pode inibir as sensações desagradáveis decorrentes da bebida, impedindo que o usuário perceba sinais fisiológicos de que chegou no limite.

Além desses efeitos agudos tóxicos, Furtado aponta para a dupla sensibilização à ocorrência de dependência. “Cada uma dessas substâncias, tanto o álcool como a lisdexanfetamina, pode induzir à dependência, mas as duas combinadas têm uma potencialização no risco de ocorrência de dependência.”

Uso implica riscos

O especialista conta que, mesmo quando há prescrição médica, é sempre necessário o acompanhamento e monitoramento do paciente. O uso de derivados de anfetaminas implica sempre um risco para o surgimento de efeitos indesejáveis próprios dessa classe de substância.

Furtado conta que, ao usar esse medicamento, pode haver alterações cardiovasculares, alterações metabólicas e renais, alterações no funcionamento e regulação normal do apetite e do sono como também no nível de vigilância, implicando em longo prazo, na desregulação das funções do organismo.

Além disso, podem ocorrer alterações no humor e nas funções cognitivas, como no controle de impulso e nos processos mentais de raciocínio e julgamento. Furtado alerta que “pessoas com instabilidade emocional podem ser suscetíveis a risco mais elevado de alterações no humor e sintomas mentais graves como delírios e alucinações”.

Para aqueles pacientes com histórico de psicose, como esquizofrenia e bipolaridade, suas condições podem ser precipitadas ou provocadas pelo uso das substâncias. Da mesma maneira, os famosos tiques nervosos podem ser exacerbados ou até mesmo surgirem no indivíduo que estava assintomático.

Fácil acesso

Apesar de ser um remédio tarja preta, de uso controlado, que necessita de receita médica para ser adquirido, esses jovens conseguem com facilidade acesso ao medicamento. Furtado explica que esse é um problema de saúde pública, que esbarra em costumes sociais e configura um ato ilícito, contra normas de vigilância sanitária e policial.

A entrada clandestina do produto no País, o falseamento de receitas e simulação de problemas de saúde são as principais formas de acesso ao medicamento, na opinião do especialista.

Para combater o uso e venda indevidos, Furtado acredita que levar informação a esse grupo específico sobre os efeitos colaterais, combatendo fake news, pode ser o melhor caminho. Estar presente nas mídias sociais, onde esses jovens estão, é muito importante na propagação de informação de qualidade. “É plenamente possível se divertir e ter uma noite gostosa, agradável, sem fazer o uso dessas substâncias”, destaca Furtado.

Por Ana Beatriz Fogaça

FONTE: Jornal da USP

Doença venosa crônica é fator de risco para problemas cardiovasculares

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em todo o mundo, principalmente as doenças cardiovasculares arteriais, como derrame, infarto, insuficiência da circulação decorrente do diabetes. Estudos recentes, como a pesquisa publicada no European Heart Journal, da European Society of Cardiology, levantam a tese de que indivíduos com doença venosa crônica (DVC) frequentemente têm fatores de risco para doença cardiovascular e que essa relação aumenta proporcionalmente com a gravidade da DVC. Os indivíduos com DVC têm, ainda, risco três vezes maior de morte por todas as causas, em comparação com aqueles que não apresentam sinais clínicos da doença.

O angiologista e cirurgião vascular Rodrigo Kikuchi, membro da Comissão Científica da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV), explicou à Agência Brasil que a doença vascular mais prevalente, ou seja, a que mais existe na população, é a doença venosa, que são as varizes ou dilatações de veia.

Kikuchi disse que, ao contrário do que se pensava anteriormente, que as doenças cardiovasculares e venosas não tinham relação, o que se tem descoberto, cada vez mais, é que “ambas as doenças têm um componente inflamatório, tanto da parte da circulação arterial, aquela que leva oxigênio, como a doença venosa, que traz o sangue de volta ao coração”.

Recentemente, estudos chegaram à conclusão que existe uma relação entre as pessoas que têm a DVC com uma maior ocorrência da doença cardiovascular. “Como se a DVC também fosse um preditor de ter a doença cardiovascular arterial”. Segundo Kikuchi, isso é interessante porque “se a doença venosa é muito mais prevalente e a gente evita a progressão para uma doença venosa mais severa, hoje acredita-se que também estamos prevenindo a doença cardiovascular e, consequentemente, as mortes por doença cardiovascular”.

De acordo com a SBACV, a DVC atinge em torno de 38% da população brasileira, sendo mais comum em mulheres (45%) do que em homens (30%), de todas as faixas etárias, e mais recorrente acima dos 70 anos de idade (70%).

Manifestações

A doença venosa se manifesta de diferentes formas, mas os sinais visuais mais comuns são vasinhos e varizes acompanhados de sintomas como dor, inchaço, sensação de peso nas pernas, coceira, pele ressecada, câimbras noturnas com frequência e formigamento. “Tudo isso já pode ser um indicativo de ter uma DVC. Não necessariamente ter aquelas veias enormes. Mas só o fato de a pessoa ter algum sintoma desses já vale uma avaliação médica mais precisa, com um angiologista ou cirurgião vascular”, recomenda.

Rodrigo Kikuchi disse que 60% das pessoas que têm DVC acabam demonstrando progressão ao longo de 10 anos. “Ou seja, mais da metade demonstram progressão da doença para uma doença mais avançada ao longo de 10 anos. Por isso, o cuidado tem que ser contínuo”, recomenda. Caso não seja tratada, a DVC pode evoluir para alterações da pele, causando úlceras, alerta o médico.

“Essa é a parte da doença venosa crônica mais avançada e a gente tem que evitar que chegue nesse ponto. Quanto mais evolui na doença crônica, mais a pessoa tem correspondência na doença cardiovascular. É isso que tem sido avaliado, justamente pelos componentes inflamatórios que a DVC tem em comum com a doença arterial. É uma inflamação do corpo que acaba levando a uma possibilidade de ter a trombose arterial, que é o risco de infarto, derrame e tudo o mais”.

Prevenção

Para evitar ter a DVC e, em consequência, uma doença cardiovascular, Rodrigo Kikuchi disse que a prevenção é a mesma, fazer exercícios, ter boa alimentação, controlar o peso, fazer atividades físicas de fortalecimento e não ficar só caminhando.

“Isso tem a ver com mudança de estilo de vida, que é a principal medida, tanto para doença venosa, como para doença cardiovascular”. Em relação à doença venosa inicial, destacou a terapia compressiva, que se refere ao uso de meias elásticas para aliviar sintomas. Existem também alguns medicamentos indicados para a fase inicial ou sintomática da doença venosa.

O médico alertou que o retorno venoso ineficiente não ocorre apenas por causa das veias. A obesidade é outro motivo, porque o paciente acima do peso tem uma pressão maior no abdômen, o que complica o retorno do sangue. Da mesma forma, a inatividade física é outro fator prejudicial, porque a falta de musculatura faz com que o indivíduo tenha menos potência e capacidade de contração muscular da perna. “Esse movimento é que melhora o retorno venoso”, ressaltou.

Embora não haja uma relação direta do tabagismo com o surgimento de veias ou varizes, acredita-se atualmente, pelo processo inflamatório que o tabagismo causa, que esse hábito também machuca a parede venosa, da mesma forma que acontece com a parede arterial. “O tabagismo ligado a infarto e derrame é o principal fator de risco evitável das doenças cardiovasculares que a gente tem. É não fumar”.

Campanha

Neste mês de agosto, a SBACV promove a campanha #Agosto Azul Vermelho de conscientização da população sobre a saúde vascular, estimulando uma mudança de hábito de vida, que é saudável para a saúde venosa e arterial.

A SBACV quer que os pacientes tenham consciência da saúde vascular, tanto na parte venosa como na parte arterial. Kikuchi lembrou que o diagnóstico deve ser feito pelo angiologista ou cirurgião vascular, “para que possa tomar medidas preventivas e para que a população cresça melhor”.

Em parceria com o laboratório francês Servier, a SBACV coordena uma chamada para que as pessoas olhem suas pernas e saibam o que está por trás dos vasinhos, varizes e das pernas pesadas, além de falar sobre prevenção e a importância de acompanhamento médico. “Que olhe suas pernas e saiba que são elas que o levam para todo lugar, para que você tome essa consciência e ame e cuide das suas pernas. Essa é a ideia da campanha”, disse o angiologista.

FONTE: Agência Brasil

Testes revelam resistência de bactéria causadora de diarreia

Análise dos genes da bactéria Campylobacter coli, causadora de diarreia em seres humanos, revela que o micro-organismo pode resistir ao controle da proliferação em alimentos, uma das principais fontes de contaminação. A conclusão é de pesquisa da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP. O estudo foi realizado com bactérias coletadas em seres humanos, animais, alimentos e ambiente nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Ribeirão Preto. Os resultados poderão servir para nortear estratégias de prevenção da contaminação, inclusive no preparo de alimentos.

“A doença decorrente da infecção por bactérias do gênero Campylobacter é uma zoonose de distribuição mundial com repercussões significativas em termos de saúde pública e com um elevado impacto socioeconômico”, afirma a professora Juliana Pfrimer Falcão, da FCFRP, que orientou a pesquisa de doutorado de Carolina Nogueira Gomes. “Usualmente, esse gênero de bactérias causa gastroenterite (diarreia)”.

A campilobacteriose é clinicamente indistinguível das infecções causadas por outros micro-organismos, como Salmonella e Shigella, por exemplo. “A principal rota de transmissão de Campylobacter, especificamente das espécies Campylobacter coli e Campylobacter jejuni, para seres humanos, é a manipulação e o consumo de carne de frango malcozida”, relata a professora, “atividades em águas recreacionais, contato com animais portadores, incluindo animais de estimação, e consumo de leite não pasteurizado”.

As linhagens de Campylobacter coli estudadas são provenientes das coleções de Campylobacter (CCAMP) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e do Instituto Adolfo Lutz (IAL) de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. “Elas foram isoladas de seres humanos, animais, alimentos e ambiente nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte (Minas Gerais) e Ribeirão Preto, no período de 1995 a 2011”, afirma Juliana.

Placa com colônia da bactéria Campylobacter coli cultivada em laboratório para estudos sobre sua resistência a condições de estresse – Foto: cedida pela pesquisadora


Virulência

As amostras foram analisadas quanto a presença de 16 genes relacionados a virulência e foi avaliada a sobrevivência dessas linhagens após a exposição a diferentes condições de estresse, tais como: flutuação de temperatura, tolerância de presença de 7,5% de coleto de sódio (NaCl) e sobrevivência ao estresse ácido e oxidativo. “A exposição da bactéria a condições de estresse tem como objetivo imitar as etapas de processamento de alimentos, a transmissão do ambiente para o hospedeiro humano e a sobrevivência durante a infecção”, conta Carolina.

Os resultados demonstraram que a sobrevivência frente a diferentes condições de estresse é uma característica dependente da linhagem da bactéria. “Entretanto, as altas taxas de crescimento e sobrevivência das linhagens estudadas são resultados importantes, pois demonstram que essas linhagens não teriam seu crescimento inibido por algumas das medidas de controle de crescimento bacteriano utilizadas em alimentos”, aponta a pesquisadora. “Assim, além dos dados caracterizarem as linhagens circulantes no Brasil, eles podem servir para nortear estratégias de prevenção da contaminação por Campylobacter.

De acordo com Juliana e Carolina, as principais formas de evitar a contaminação pela bactéria são lavagem das mãos antes, durante e após o preparo de alimentos e depois de tocar em animais, seus alimentos ou pertences. “Tábuas de corte e facas utilizadas no preparo de carnes, frango e frutos do mar devem ser usadas separadamente dos demais alimentos e higienizadas corretamente”, explica a professora. “Os alimentos devem ser cozidos na temperatura adequada e não se deve consumir leite não pasteurizado e água não tratada.”

 

 

O estudo teve a colaboração da pesquisadora Marta Inês Cazentini Medeiros, do IAL de Ribeirão Preto, e da pesquisadora Sheila da Silva Duque, da Fiocruz, que concederam as linhagens utilizadas nesse trabalho. Além disso, a professora Fátima Maria Helena da Silva auxiliou na realização das análises estatísticas.

Mais informações: e-mail jufalcao@fcfrp.usp.br, com a professora Juliana Pfirmer Falcão

FONTE: Jornal da USP

Tratar esclerose múltipla com células-tronco é mais eficaz que medicação

O transplante com células-tronco da medula óssea do próprio paciente para combater a esclerose múltipla é mais eficaz do que a medicação disponível no mercado. Esta é a conclusão de estudo feito por pesquisadores do Brasil, Suécia, Inglaterra e Estados Unidos.

Os resultados foram apresentados em março no encontro anual da European Society for Blood and Marrow Transplantation e publicados na Neurology. uma revista científica de alto impacto. “Os resultados comprovam que os transplantes apresentam melhores resultados do que as medicações utilizadas para o tratamento da esclerose múltipla”, afirma a professora Maria Carolina de Oliveira, pesquisadora do Centro de Terapia Celular (CTC) da USP e da Divisão de Imunologia Clínica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

De acordo com ela, “parte da pesquisa ainda continua e os pacientes serão acompanhados por mais tempo e novos resultados devem ser apresentados em dois ou três anos. O objetivo é ver como a resposta ao transplante se sustenta em acompanhamento mais prolongado”, explica.

Ao todo, nos quatro países, participaram 110 voluntários, dos quais 55 foram transplantados e 55 receberam tratamento convencional. “Dos transplantados, apenas três (6%) reativaram a doença após o transplante. No outro grupo, tratado com a medicação disponível no País, 33 (60%)”, afirma Maria Carolina.

No entanto, o transplante deve ser aplicado apenas aos pacientes que estejam na fase de surto remissiva da doença. “É a fase em que o paciente tem surtos de perda neurológica súbita. Passa a ter dificuldade para andar e mexer os membros. Esses surtos acumulam incapacidades neurológicas e o transplante tem que ser realizado antes que chegue à fase progressiva”, explica.

Para identificar a possibilidade de transplante, os médicos utilizam a escala neurológica EDSS para medir o grau de comprometimento que a doença já provocou no paciente. Se estiver entre 2,5 e 5,5, o paciente pode ser transplantado. Fora desse parâmetro, não. O paciente não pode estar em cadeira de roda ou acamado, situações que acontecem nas fases mais avançadas da doença.

Experiência

O Hospital das Clínicas da FMRP tem experiência de 16 anos em transplante de medula óssea para pacientes com esclerose múltipla. Começou, em 2002, com o professor Júlio Voltarelli. Esses procedimentos não são pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A verba utilizada é de projetos de pesquisas. “Pretendemos, com esses resultados, convencer as autoridades a incluir este tipo de transplante na lista do SUS”, afirma Maria Carolina.

Entre os 90 transplantes realizados no HC-FMRP, “2/3 melhoraram. Sendo que deste total, metade manteve a doença controlada e na outra metade houve progressão ao longo do tempo. Isso porque a maioria desses pacientes foi transplantada na fase tardia, já degenerativa, da doença. O transplante funciona melhor nas fases mais precoces, inflamatórias da doença”, explica.

Infográfico: Adaptado de BruceBlaus via Wikimedia Commons CC BY-SA 4.0

Custo

O estudo não levantou custos comparativos entre o transplante e a medicação, mas a reportagem apurou que o transplante tem custo estimado de R$ 22 mil, considerando o uso de instrumental e a medicação usada durante o procedimento (não fazem parte deste valor os custos de salários da equipe e internação). Já a medicação tem preço aproximado de R$ 12 mil ao mês.

Um estudo de pesquisadores poloneses, apresentado também no encontro da European Society for Blood and Marrow Transplantation, comparou os gastos médios de 102 pacientes com esclerose múltipla no ano anterior ao transplante àqueles de um ano após o procedimento. A média de gastos anuais caiu de 4.520 euros para 810 euros.

O artigo Non-myeloablative hematopoietic stem cell transplantation (HSCT) is superior to disease modifying drug (DMD) treatment in highly active Relapsing Remitting Multiple Sclerosis (RRMS): interim results of the Multiple Sclerosis International Stem cell Transplant (MIST) Randomized Trial (S36.004) tem autoria deRichard K. BurtRoumen BalabanovJohn A. SnowdenBasil SharrackMaria Carolina de Oliveira e Joachim Burman, e pode ser acessado no site da revista Neurology.

Com informações de Marcos de Assis / Assessoria de Imprensa do Hemocentro de Ribeirão Preto

FONTE: Jornal da USP

Declínio cognitivo é maior para quem consome mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados

Pães de forma, macarrão instantâneo, refrigerantes: os ultraprocessados são produtos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de sua composição final não lembrar a comida de verdade. Vários estudos mostram os prejuízos que eles causam à saúde. Uma das pesquisas mais recentes foi realizada por cientistas da USP com base no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) e mostra que o consumo de ultraprocessados é um dos fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. Os resultados mostraram que a queda cognitiva ao longo da vida foi 28% maior entre os participantes que consumiram mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados. Isso equivale, por exemplo, a comer três pães de forma todos os dias.

Os dados estão sendo apresentados durante a Conferência Internacional da Associação de Alzheimer, que acontece ao longo desta semana, entre 31 de julho e 4 de agosto, em San Diego, nos Estados Unidos.

O Elsa-Brasil é um estudo epidemiológico nacional realizado desde 2008 por várias instituições como a USP, UFES, Fiocruz, UFBA, UFMG e UFRGS, que acompanha o estado de saúde de cerca de 15 mil funcionários. A ideia é investigar a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto) e outras associadas. Os participantes, com idades entre 35 e 74 anos, são de várias regiões do País. No próximo mês de agosto, eles serão novamente convocados para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para essas doenças, consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Entre vários outros aspectos da saúde, o Elsa é o estudo com a maior amostra e o maior tempo de avaliação da performance cognitiva no Brasil. Os dados das três primeiras ondas (entre 2008 e 2010, 2012 e 2014 e de 2017 a 2018) embasaram uma série de artigos que encontraram associações de piora do desempenho cognitivo com diversos fatores, como, por exemplo, enxaquecasconsumo de álcool, inflamação e, principalmente, doenças vasculares como a hipertensão.

Fatores sociais também se mostram relevantes: um dos artigos mostrou que a adesão à dieta MIND (Mediterranean-DASH Intervention for Neurodegenerative Delay), criada para reduzir o risco de doenças que afetam a memória e a mente, só mostrou eficiência nesse objetivo em pacientes de alta renda, com melhores condições materiais de se alimentar de forma saudável. Em outro, os pesquisadores observaram que o estresse relacionado à rotina de trabalho também está associado ao declínio cognitivo.

Durante a conferência em San Diego, a equipe do Elsa apresenta dois novos estudos longitudinais, ainda não publicados, baseados no acompanhamento dos participantes durante as três primeiras ondas, que identificaram dois fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo: o consumo de ultraprocessados e o impacto do acúmulo de gordura nas artérias. 

Consumo de ultraprocessados

O estudo sobre ultraprocessados foi realizado pela pesquisadora Natália Gonçalves em colaboração com outros integrantes do Elsa, inclusive, o grupo de pesquisa do professor Carlos Augusto Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública (FSP), um dos órgãos diretamente envolvidos na elaboração do Guia Alimentar para a População Brasileira.

A pesquisa utilizou os dados de 10.775 pessoas coletados nas três primeiras ondas do Elsa para classificar a alimentação dos participantes de acordo com os quatro grupos descritos pelo Guia: não processados (vegetais, frutas, cereais etc.), ingredientes culinários (azeites, sal, óleos), alimentos processados (com modificações leves como adição de sal ou açúcar) e ultraprocessados, “alimentos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de que a sua composição final nem lembra comida de verdade” (pães de forma, macarrão instantâneo, marmitas prontas, refrigerantes, entre outros).

A partir disso, os pesquisadores dividiram as pessoas em quatro grupos, de acordo com a porcentagem de ultraprocessados na dieta, e descobriram que as pessoas que comem mais desse tipo de produto (acima de 20% da ingestão diária) têm uma queda 28% maior na performance cognitiva do que as que comem menos (abaixo de 20%).

Para tornar mais palpável o que isso significa, a pesquisadora explica que 20% de calorias diárias vindas de ultraprocessados equivalem a, por exemplo, míseras três fatias de pão de forma por dia.

“Esses resultados, além de inéditos, são muito importantes pois apontam para um comportamento que as pessoas podem modificar e, com isso, possivelmente diminuir a chance de declínio cognitivo ao longo dos anos”, diz Natália ao Jornal da USP.

Além dela, o artigo Higher consumption of ultra-processed foods is related to cognitive decline in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil) tem como coautores Naomi Vidal Ferreira, Claudia Kimie Suemoto e Renata Bertazzi Levy, da Faculdade de Medicina da USP; Neha Khandpur, Euridice Martinez Steele, Dirce M. Marchioni, da Faculdade de Saúde Pública da USP; Paulo Andrade Lotufo e Isabela Judith Martins Bensenor, do Hospital Universitário da USP; Paulo Caramelli, da UFMG, e Sheila Maria Alvim de Matos, da UFBA.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: Claudia Suemoto, em cksuemoto@usp.br, Naomi Vidal Ferreira, em naomivferreira@gmail.com, e Natália Gonçalves, em natalia.g@fm.usp.br

Texto: Sebastião Moura
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

OMS aponta cobalto como provável causador de câncer

A carcinogenicidade do elemento químico é maior entre trabalhadores que se expõem ao cobalto em fábricas e mineradoras, mas também pode ocorrer em pessoas que ingerem alimentos contaminados

Como um componente da molécula da vitamina B12, em pequenas quantidades, o cobalto é essencial para o bom funcionamento do organismo. No entanto, em excesso, esse elemento químico pode causar diversas doenças, geralmente associadas à exposição desse mineral no trabalho. Agora, um estudo encomendado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) da Organização Mundial da Saúde (OMS) traz mais evidências para o que já se suspeitava: o cobalto também pode causar câncer.

Publicado na revista Lancet Oncology, o trabalho foi realizado por cientistas de treze países, entre eles o farmacêutico-bioquímico Thomas Prates Ong, professor do departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e membro do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC). Participaram do estudo 31 especialistas de diversas áreas (epidemiologistas, biólogos, químicos, toxicologistas, patologistas, farmacêuticos entre outros), com experiência reconhecida em pesquisas sobre câncer. Ong contribuiu na área de nutrição, câncer e epigenética (modificações hereditárias que ocorrem nas funções genéticas sem alterações no DNA).

Os cientistas fizeram uma revisão de centenas de artigos, analisando a carcinogenicidade de nove agentes: cobalto (metal, sais solúveis, dois tipos de óxidos, sulfetos e outros compostos de cobalto), antimônio (trivalente e pentavalente) e tungstênio para munição de armas (contém níquel e cobalto). Para o metal cobalto e os compostos de cobalto, partículas moleculares de todos os tamanhos foram incluídas na avaliação.

As evidências de associação ao câncer foram suficientes para o metal, sais e um tipo de óxido de cobalto. “O cobalto e o antimônio registraram o mais alto índice de carcinogenicidade nos parâmetros do IARC, classificando-se como prováveis elementos carcinogênicos. Já o tungstênio registrou evidências menores, então segue sendo um possível carcinogênico”, afirma. “Concluímos que o cobalto induz a formação de tumores ao proporcionar um aumento das inflamações e mutações. Além disso, modifica o padrão epigenético ao causar alterações na forma como as células se proliferam, se diferenciam e morrem”, acrescenta.

Contaminação de alimentos

Segundo o estudo, “o cobalto é usado em muitas indústrias, inclusive na fabricação de ferramentas de corte e retificação, em pigmentos e tintas, vidro colorido, implantes médicos, galvanoplastia e, cada vez mais, na produção de baterias de íon-lítio”. Para o trabalhador dessas indústrias, a exposição ao cobalto se dá, principalmente por inalação de poeira e contato com a pele.

Para a população em geral, a ingestão de alimentos contaminados é a principal fonte de exposição, podendo ocorrer também pela fumaça de cigarro, poluição do ar e implantes médicos. No caso dos alimentos, a contaminação geralmente se dá quando os resíduos da fabricação de produtos que usam o cobalto chegam aos rios, ao solo e às plantações. “É um problema grave porque coloca em risco um amplo número de pessoas, com o consumo de alimentos e água contaminados, e por isso é muito importante o processo de fiscalização”, afirma Ong.

Um consumo normal de cobalto pela alimentação varia entre 5 e 50 microgramas (μg) por dia, com uma concentração no plasma sanguíneo de até 0,2 μg/litro. Sabe-se que acima de 7 μg/litro de plasma, sintomas de toxicidade podem ocorrer e o excesso de cobalto no organismo é eliminado principalmente pela urina.

Os alimentos que mais contêm cobalto são nozes, vegetais folhosos, cerais, chocolate, café, peixes e manteiga. A vitamina B12, que contêm esse metal, é encontrada em carnes e derivados do leite, porém a ingestão diária de 2,4 μg dessa vitamina – quantidade considerada ideal pela Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos (conhecida como Institute of Medicine) – contêm apenas 0,1 μg de cobalto. Mas, segundo evidências científicas, o consumo de alimentos que naturalmente contêm cobalto não representa riscos à saúde.

Texto: Assessoria de Comunicação da FCF

Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Preconceitos ligados à depressão podem retardar diagnóstico e tratamento

A gravidade da depressão no Brasil é desencadeada pela demora na procura médica e início do tratamento. A constatação veio a partir de uma pesquisa liderada pelo Instituto IPSOS, que diz que os brasileiros demoram cerca de três anos e três meses para, então, procurarem ajuda médica e iniciarem o tratamento da depressão. O quadro reflete não somente os desafios encontrados no combate à doença, como também expõe preconceitos de uma doença que avança aos poucos no processo de aceitação relacionado à condição mental dos enfermos.

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DMS-5), criado pela Associação Americana de Psiquiatria, a depressão é a condição em que o paciente se encontra com “humor triste, vazio ou irritável, acompanhado de alterações somáticas e cognitivas que afetam significativamente a capacidade de funcionamento do indivíduo”. E o Brasil apresenta 11,3% de pacientes nessa condição.

Demora no tratamento

Num cenário como esse, a questão envolvendo a demora por um tratamento efetivo traz sérias consequências. A médica Doris Hupfeld Moreno, supervisora do Programa de Transtornos Afetivos (Progruda) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP, comenta que, como qualquer outra manifestação clínica, a demora no início do tratamento leva a uma piora significativa, já que, “quanto mais tempo a pessoa fica doente, maiores as consequências biológicas”. O ciclo social também é afetado, uma vez que pode desencadear prejuízos no relacionamento familiar, no núcleo de amigos e no âmbito profissional.

A depressão possui múltiplos fatores, que vão desde as alterações químicas cerebrais até disfunções crônicas e histórico familiar. É principalmente por causa da falta de conhecimento sobre a doença que surgem os estigmas vinculados à doença. Leila Salomão, professora do Instituto de Psicologia, explica melhor os fatores por trás do problema: “Os estigmas sociais existem. Aí entra o preconceito de culpabilizar o deprimido, então, a pessoa se sente envergonhada.”

Esse é um dos principais motivos que ocasionam a morosidade na busca por um tratamento. E, em complemento, a professora Leila destaca que a busca fica dificultada quando “ela é aumentada pela falta de compreensão, de diálogo e pelas formas rudes de enfrentar conflitos”, em decorrência de uma postura “de censura, de crítica preconceituosa” em relação à depressão.

Passos importantes no combate à depressão

Como outras doenças, as especialistas defendem a importância de um tratamento regular para a depressão. Leila Salomão frisa a relevância de se atuar em “todas as linhas de prevenção”, indo desde o acesso à informação e à educação adequada até a prestação de apoio às famílias dos enfermos. No que diz respeito ao tratamento, a psiquiatra Doris Hupfeld destaca que, para cada quadro clínico, a medicação certa e na dosagem correta deve ser indicada pelo profissional da área qualificada.

Ela também adiciona que: “Os caminhos em políticas públicas para amparar os acometidos pela depressão e investir em ambulatórios de saúde mental, mais CAPS [Centro de Atenção Psicossocial] para a população”, são algumas das medidas práticas que podem trabalhar em conjunto com um tratamento eficiente, para diminuir o estigma que envolve a doença e o número de acometidos pela depressão.

Por Fernanda Real

FONTE: Jornal da USP

Mudanças no estilo de vida diminuem risco de demência até em casos com predisposição genética

https://blog.50maissaude.com.br/wp-content/uploads/2022/08/RISCO-DE-DEMENCIA_PROF-ORESTES-VICENTE-FORLENZA_ROXANE-EDITADA.mp3?_=1

Há sete hábitos que diminuem o risco de demência em até 43%, mesmo para quem tem predisposição genética para o quadro: permanecer ativo; adotar uma alimentação saudável; evitar o sobrepeso; não fumar; manter a pressão arterial adequada; controlar o colesterol e a taxa de açúcar no sangue. As conclusões são do estudo Genetic Risk, Midlife Life’s Simple 7 and Incident Dementia in the Atherosclerosis Risk in Communities Study, realizado nos Estados Unidos, que acompanhou cerca de 11.500 pacientes por três décadas.

“O que eles mostraram nessa base de dados é que você tendo um bom score de estilo de vida, de hábitos, mesmo que você tenha um risco genético alto, você consegue atenuar em parte esse risco”, explica Orestes Vicente Forlenza, professor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. O estudo determinou cinco faixas de risco, avaliando como os hábitos influenciam em cada um.

Forlenza conta que a incidência de demência vem caindo em países desenvolvidos, o que é reflexo dos incentivos à mudança do estilo de vida. “Essa promoção de um envelhecimento mais saudável a partir da meia-idade, é muito importante para reduzir a quantidade de casos de demência lá na frente.” O número total de casos pode permanecer estável ou aumentar pelo fato de as pessoas estarem vivendo mais.

Comorbidades

Outros hábitos podem ser melhorados e contribuírem na redução do risco de demência, como evitar a perda de acuidade auditiva e visual e fazer o tratamento correto da depressão. “Todas as intervenções feitas na meia-idade na população vão resultar num benefício populacional, que é uma redução de até 30%, 35% dos casos de demência”, afirma o professor.

Fatores de risco cardiovasculares têm relação direta com o risco cérebro-vascular, que impacta na doença de Alzheimer, a doença mais frequente do grupo da demência, acelerando o início dos sintomas, segundo Orestes. “A promoção de bons hábitos, o controle adequado das comorbidades, das doenças que se associam a isso, tudo isso em conjunto vai levar a um envelhecimento cerebral mais saudável, mesmo para quem tem ou para quem não tem doença de Alzheimer.”

FONTE: Jornal da USP

Fórmula de guaraná ajuda a controlar oleosidade da pele e cabelos

Uma fórmula cosmética contendo extrato de guaraná, fruto típico da Amazônia, se mostrou eficaz na redução da oleosidade excessiva e promoção das condições normais de hidratação da pele e cabelos. O estudo Avaliação da pele e cabelos oleosos, desenvolvimento e eficácia clínica de formulações cosméticas contendo extrato de guaraná, que deu origem à formula, foi desenvolvido pela farmacêutica Marcella Gabarra Almeida Leite, com orientação da professora Patrícia Maia Campos, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP.

O estudo, conta Marcella, mostra que o uso de produtos com extrato de guaraná em suas formulações, além de reduzir a oleosidade sem causar danos à fibra capilar ou à pele, promove diminuição do tamanho dos poros e de fatores associados à formação de espinhas. “Nós percebemos uma diminuição no número de porfirinas, que são metabólitos da bactéria Cutibacterium acnes, aquela relacionada à formação de espinhas e de outros problemas envolvendo a oleosidade.”

A professora Patrícia ainda informa que a fibra capilar continuou com a maleabilidade e sem ressecamento, bem como os níveis de oleosidade normais na pele, que mantiveram o equilíbrio. Quanto às propriedades que explicam o uso do guaraná em cosméticos, as pesquisadoras afirmam tratar-se de um fruto brasileiro rico em compostos como saponinas e taninos, que conferem atividade detergente e adstringente, além de trazer compostos fenólicos, como catequinas e epicatequinas, que possuem potente atividade antioxidante.

Desta forma, enfatiza a professora Patrícia, utilizar extrato de guaraná no combate da oleosidade representa um passo importante para o desenvolvimento sustentável, principalmente por conta da utilização de produtos da biodiversidade brasileira nos cosméticos na busca de produtos mais inovadores e efetivos.

O controle da oleosidade na qualidade de vida

Os problemas com a oleosidade de pele e cabelos dos brasileiros são considerados “muito relevantes” já que são o principal motivo de procura por dermatologistas no País. Segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia, a oleosidade é predominante em 56,5% da população, fato que, segundo as pesquisadoras, justifica os estudos e a busca por soluções.

Outro fato é o de que alterações capilares, em especial as causadas pela produção excessiva de sebo, podem afetar negativamente a imagem e influenciar diretamente na qualidade de vida. Marcella informa que, além dos desconfortos usuais causados pelo aspecto gorduroso e brilhante, a oleosidade pode causar alterações cutâneas como acnes, dermatites seborreicas e comprometimentos na eudermia (estado fisiologicamente normal da pele).

Em números, a oleosidade é considerada normal até atingir 150 microgramas por centímetro quadrado. Apesar disso, a pesquisadora explica que a quantidade de sebo é considerada anormal quando gera incômodo. Marcella conta que os níveis da oleosidade presente na pele são medidos através de um equipamento chamado Sebumeter. “Esse equipamento possui uma fita opaca que fica transparente quando ela está em contato com o sebo presente na pele e aí essa transparência é contabilizada por uma fotocélula que é quantificada”, explica.

Essas medidas de oleosidade fizeram parte do experimento realizado com voluntárias mulheres de 18 a 40 anos com pele e cabelos oleosos. Após a seleção, que procurava por um padrão no nível de oleosidade, as participantes receberam uma formulação básica que foi usada por 15 dias para promover o wash out (tratamento para normalizar as condições do cabelo e pele das mulheres, evitando a influência de outros produtos). Na sequência, passaram por novas etapas de análises.

O estudo foi desenvolvido no Laboratório de Tecnologia de Cosméticos, da FCFRP, como parte do doutorado da farmacêutica Marcella. Os pesquisadores estão preparando artigos científicos sobre os achados e, por enquanto, ainda não há perspectivas para o desenvolvimento de formulações comerciais com a fórmula.

Mais informações: e-mails pmcampos@usp.br (com Patrícia) ou marcellagabarra@hotmail.com (com Marcella)

Autora: Laura Oliveira
Arte: Ana Júlia Maciel

FONTE: Jornal da USP

Estudo da USP analisa transtorno da fala pouco conhecido no Brasil

Um estudo inédito no Brasil desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) faz o mapeamento genético de 100 crianças com apraxia de fala na infância (AFI) para identificar as alterações genéticas que levam ao transtorno, que ainda passa por muito desconhecimento no Brasil. A intenção é auxiliar em novas opções de tratamento no futuro. A AFI é um transtorno que interfere na reprodução dos sons da fala. Segundo a fonoaudióloga e consultora técnica da Associação Brasileira de Apraxia de Fala na Infância (Abrapraxia), Elizabeth Giusti, a criança sabe o que quer dizer, mas o cérebro não envia os comandos adequados para movimentar os articuladores, a língua, os lábios e a mandíbula.

A pesquisa é uma iniciativa da Abrapraxia, entidade criada a partir da união de três mães que têm filhos diagnosticados com o transtorno e criaram uma rede de apoio, em 2016. Desde lá, a entidade já capacitou mais de 15 mil pessoas, entre fonoaudiólogos, terapeutas, pais e familiares, além de oferecer cursos regulares. Dados da entidade indicam que o transtorno, pouco debatido no Brasil, atinge duas a cada mil crianças.

O financiamento do estudo é da Abrapraxia, mas tem contrapartida da USP, que presta os atendimentos gratuitos. A professora titular de genética do Instituto de Biociências da USP, Maria Rita Passos Bueno, que coordena a área de genética do projeto, disse que na fase atual os resultados já são positivos.

“Os resultados estão muito promissores onde a gente está encontrando a caracterização genética em praticamente 50% da amostra. O estudo, além de confirmar alguns genes já sugestivos associados à apraxia de fala, também está possibilitando a identificação de novos genes candidatos para a apraxia de fala”, contou, informando que entre os 50% somente dois casos só tem apraxia de fala, nos outros casos há alguma outra alteração clínica como espectro autista, deficiência intelectual e convulsões.

A previsão é encerrar esta fase do estudo até o fim deste ano, mas conforme a coordenadora, a intenção é continuar a avançar com o projeto, que ainda precisa de financiamento para uma nova etapa. “A gente não vai conseguir resolver todas as perguntas com este projeto, que é inicial. No primeiro momento é caracterizar as alterações genéticas de apraxia de fala nesta casuística de crianças brasileiras. A segunda fase é resolver os casos que a gente não conseguir achar a causa genética”, afirmou.

Bruna Ribeiro é mãe de Gabriel, de 10 anos, uma das crianças que participam do estudo. Além da Apraxia, o filho foi diagnosticado com espectro autista, o que ocorre também com outras crianças com transtorno de fala. Bruna contou que Gabriel nasceu prematuro extremo com 29 semanas e até os três anos não tinha o diagnóstico de apraxia. “Como teve atraso global motor, demorou a se sentar, a andar, ele não fazia as transições, eu sempre pensava que a fala viria. Mesmo ele balbuciando pouco, meu foco era sempre no atraso motor global. Eu nem imaginava, nem sabia que existia apraxia de fala”, revelou.

O diagnóstico veio quando a fonoaudióloga que trabalhava com o menino fez um curso realizado pela Abrapraxia em Goiânia, Goiás, e identificou o transtorno da fala no Gabriel. “Até os quatro anos ele foi não verbal. Com quatro anos falou a primeira palavra. Falou Ana, que é o nome da minha sobrinha e afilhada. Hoje o Gabriel fala bem, não tem alguns sons, por exemplo, o r, o g, mas se faz entender”, comentou.

Capacitação

A doutora Elizabeth Giusti, chamou atenção para a necessidade de capacitar os profissionais da área, diante do desconhecimento sobre o transtorno no Brasil, que pode levar a um erro no diagnóstico e prejudicar o desenvolvimento da criança. Segundo a fonoaudióloga, esse é um tipo de transtorno que se precisa manejar vários tipos de componentes para que a terapia dê resultado. Para isso, é fundamental ter uma criança muito motivada, porque é necessário transformar em prazeroso algo difícil para ela.

“Se está exigindo da criança algo que é uma ferida dela, muito difícil, então, as terapias precisam ser motivadoras e criativas. Os profissionais precisam ser resilientes, porque não é um transtorno que em um mês já vai ver resultado. Não é só a técnica em si, mas tem toda uma questão de manejo da criança, do ambiente, de conseguir dar o desafio na medida certa. Se dá pouco não tira a criança do lugar, mas se dá demais frustra a criança, porque o que se está pedindo foi muito. Encontrar esse ponto de equilíbrio para dar à criança o desafio na medida certa, é algo que vai muito além de só a aplicação das técnicas. Esse olhar empático de entender o quanto aquele momento é difícil para a família e o quanto é desafiador para a criança”, pontuou.

Elizabeth Giusti recomendou ainda a estrutura de uma equipe multidisciplinar, incluindo terapeuta ocupacional e fisioterapeuta. “Com as dificuldades da fala (a criança) pode não conseguir interagir com os amigos e pode gerar comportamentos inadequados, ser, por um lado, uma criança inibida ou, por outro, querer morder os amiguinhos. É importante ter o olhar para a criança como um todo”, comentou, completando que é importante também que a equipe tenha contato com a professora porque é ela quem está lá em contato com a criança na escola todos os dias.

Apesar de a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizar tratamentos completos com fonoaudiólogos, psicólogos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, a mãe de Gabriel contou, que mesmo tendo uma liminar permitindo o tratamento, não consegue ter acesso a todos os profissionais por causa do seu tipo de plano de saúde. “Tem uma liminar pelo plano mas não consigo fazer valer esse meu atendimento por conta da rede dos profissionais e pela disponibilidade que eles têm de horário. A rede credenciada deles é pequena e não consegue atender à demanda”, disse.

Diagnóstico precoce

A fonoaudióloga alertou ainda para a importância do diagnóstico precoce para que a criança possa ter acesso ao tratamento adequado para o transtorno. De acordo com ela, diferentemente do que ocorre com uma criança com desenvolvimento típico em que o aprender a falar é algo que acontece naturalmente pelos estímulos ao ter o contato das pessoas que estão ao redor, na criança com apraxia o aprendizado da fala não é algo natural.

“Precisa ser ensinado à criança como movimentar os articuladores para que ocorra essa produção de fala. O diagnóstico precoce significa acesso a tratamento adequado e suporte adequado para a família. Eu vejo que muitas crianças quando não têm acesso a esse diagnóstico precoce, muitas vezes acabam até sendo encaminhadas para outros tipos de tratamento, que não são os mais adequados para essa condição, o que acaba gerando frustração para a criança que vai crescendo. A percepção dela da dificuldade vai ficar cada vez maior. O que começa, por exemplo, com uma dificuldade para desenvolver a fala acaba gerando outras consequências no desenvolvimento, como baixa autoestima, dificuldade para se socializar com outras crianças”, concluiu.

Rede pública

Elizabeth Giusti diz que a Abrapraxia desenvolve cursos para profissionais e famílias de crianças com o transtorno e as informações podem ser obtidas no site.

A especialista acrescentou que desde a criação, em 2016, a associação tem um trabalho para atender famílias que não têm condição financeira para pagar o tratamento. A fonoaudióloga disse ainda que a associação oferece também cursos de formação para fonoaudiólogos e parte das vagas é destinada aos profissionais que trabalham no SUS.

Por Cristina Indio do Brasil – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

FONTE: Agência Brasil