Pesquisa identifica moléculas associadas à depressão em idosos

Pesquisa liderada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) identificou um conjunto de proteínas ligadas à depressão tardia, doença que acomete idosos. Foram determinadas moléculas que podem contribuir para diagnósticos e tratamentos mais eficazes. O estudo, que foi publicado no periódico europeu Journal of Proteomics, envolve também cientistas das universidades de Connecticut (EUA) e de Toronto (Canadá), além da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Daniel Martins-de-Souza, professor da Unicamp e coordenador do trabalho, destaca que um dos objetivos é entender a similaridade com a depressão. “Ainda não temos ideia de quão similar, do ponto de vista molecular, essa depressão tem com a depressão maior, que afeta quase 10% da população. E, da mesma forma como [ocorre] para depressão maior, não temos biomarcadores que possam identificar ou predizer que alguém vai desenvolver isso no futuro”, aponta.

Uma das diferenças entre as duas manifestações da doença pode estar ligada ao aspecto ambiental. “Ou seja, as pessoas passam por experiências na vida que acabam dirigindo mudanças biológicas que levam à depressão. Isso também é verdade para a depressão maior, mas essas características podem ser mais proeminentes nas pessoas com depressão tardia”, relaciona. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), pelo menos seis a cada 100 pessoas, entre 65 e 74 anos, serão diagnosticadas com depressão.

Análises

Foram estudadas amostras sanguíneas de 50 pessoas, das quais 19 tinham diagnóstico de depressão tardia. A análise mostrou diferenças significativas na concentração de 96 proteínas. Entre elas, 75 são candidatas para a determinação de uma identidade molecular para a doença geriátrica.

“A gente conseguiu achar o que nós chamamos de uma assinatura molecular. Ou seja, nós identificamos algumas moléculas no sangue que teriam esse poder de distinguir quem tem a depressão e quem não tem”, pontuou Martins-de-Souza.

As próximas etapas do estudo envolvem  a coleta de novas amostras dessa população. A ideia é “quantificar especificamente estas 75 proteínas para ver se a gente consegue replicar esses dados”, explica o coordenador.

Além disso, a doutoranda Lícia Silva-Costa, do Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp e uma das autoras do estudo, identificou seis proteínas que tem uma correlação a severidade dos sintomas. “Também pode ser uma marcação para predizer que uma pessoa vai ter uma piora muito grande de sintomas, o que poderia ser previamente tratado”, acrescenta o professor. A proposta agora é também validar essas informações com novas amostras.

Por Camila Maciel – Repórter da Agência Brasil – São Paulo

FONTE: Agência Brasil

Síndrome metabólica: restrição de proteínas ajuda a controlar diabete e reduzir obesidade

Durante 27 dias, pesquisadores da USP, da Unicamp, do Instituto Nacional do Câncer e da Universidade de Copenhague acompanharam 21 pessoas com síndrome metabólica que receberam dietas com restrição proteica e com restrição calórica.

Estabelecer uma dieta adequada faz parte do tratamento de pessoas com síndrome metabólica: um conjunto de fatores de risco, como hipertensão, nível elevado de açúcar no sangue, excesso de gordura corporal em torno da cintura e colesterol alto, que podem levar ao desenvolvimento de diabete e de doenças cardíacas. Em busca de novas estratégias alimentares para esse grupo, pesquisadores brasileiros e dinamarqueses compararam os efeitos entre a dieta de restrição proteica e a dieta de restrição calórica. “Os resultados do estudo mostram que a dieta de restrição de proteína é eficaz para controlar a diabete e reduzir a obesidade. Além disso, diminuiu os níveis de colesterol, controlou a pressão arterial e auxiliou na redução do peso corporal com perda de gordura e manutenção de músculos”, explica o biomédico Rafael Ferraz Bannitz, doutor pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

Bannitz é o primeiro autor do artigo Dietary Protein Restriction Improves Metabolic Dysfunction in Patients with Metabolic Syndrome in a Randomized, Controlled Trial publicado na revista Nutrients.

O estudo contou com 21 participantes que foram divididos em dois grupos. O primeiro foi submetido a uma dieta com restrição de 25% das calorias ideais para cada pessoa. No outro grupo também foi mantida a quantidade calórica ideal, porém, a quantidade de proteínas foi reduzida para o mínimo recomendado. “No grupo com restrição calórica, tivemos uma concentração de 20% de proteínas, 50% de carboidrato e 30% de gordura. Já o grupo com restrição de proteínas teve 10% de proteínas, 60% de carboidrato e 30% de gordura”, explica Ferraz Bannitz.

Os voluntários eram homens e mulheres, com idade entre 25 e 60 anos, com Índice de Massa Corporal (IMC) que indicava obesidade moderada a grave. O IMC é determinado pela divisão do peso da pessoa pela sua altura ao quadrado. Todos tinham Diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial e níveis elevados de gordura no sangue. Eles foram acompanhados por 27 dias por uma equipe do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (HCRP) da USP com avaliação da pressão arterial, peso, composição corporal, distribuição de gordura, gasto energético basal e outras análises bioquímicas e moleculares, como microbioma intestinal (conjunto de microrganismos que habitam o intestino) e modificação da expressão de genes do tecido adiposo.

“A característica isocalórica da dieta de restrição proteica torna essa abordagem nutricional mais atraente e menos drástica para ser aplicada em ambientes ambulatoriais e na casa dos pacientes. Além disso, tem potencial para ser usada como terapia auxiliar em pessoas com síndrome metabólica com diabete e obesidade”, aponta o cientista biomédico.

O estudo foi coordenado pela professora Maria Cristina Foss de Freitas, orientadora do Programa de Pós-Graduação em Clínica Médica da FMRP, e teve apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Entre os autores estão pesquisadores da FMRP, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e da Universidade de Copenhague, da Dinamarca.

Mais informações: e-mail Rafael.FerrazBannitz@joslin.harvard.edu

Texto: Giovanna Grepi
Arte: Simone Gomes

FONTE: Jornal da USP

Pesquisa e uso da cannabis avançaram no Brasil nos últimos anos

Nos últimos 10 anos, as pesquisas e o uso legal de cannabis medicinal aumentaram muito no Brasil. Segundo o neurocientista Sidarta Ribeiro, que é professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o avanço acompanha a tendência mundial de regulamentação de medicamentos feitos à base da planta, popularmente conhecida como maconha.

“Isso acontece muito pela ação de familiares de pacientes, de pacientes organizados em associações, isso está crescendo muito. São dezenas de milhares de pessoas que fazem tratamento medicinal com cannabis, isso não existia há 10 anos atrás. Tem um monte de gente que tem autorização para importar, que consegue comprar na farmácia, embora seja caríssimo.”

Ele participou do seminário internacional Cannabis amanhã: um olhar para o futuro, que ocorreu ontem (9) e hoje (10) no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM), promovido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pela Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal (Apepi).

Tradição e proibição

Para o professor, a proibição da cannabis no Brasil não cumpriu o que prometeu – diminuir o uso recreativo da substância e a violência envolvida no mercado ilegal da planta – e isso está sendo percebido pela população.

“As pessoas estão se conscientizando de que foram enganadas, de que muita injustiça foi cometida em nome dessa guerra contra a maconha e que, na verdade, se elas precisam, ou se algum familiar, algum amigo precisa dessa substância para lidar com situações de vida ou morte, elas são capazes de romper as amarras desse difamação que a maconha sofreu por muitas décadas.”

Também palestrante no evento, o líder indigenista e ambientalista Ailton Krenak lembra que a cannabis foi introduzida no Brasil pelos povos africanos e, depois incorporada aos rituais de alguns povos indígenas há 300 anos.

“A gente não pode naturalizar a ideia de que a cannabis integra o repertório de conhecimento dos povos originários daqui da América do Sul. Ela não é nativa daqui, ela veio para cá com os povos que vieram da África, né? Tem gente que acha que ela entrou pelo Caribe, pela América Central, tem outros historiadores que dizem que os povos que vieram do Benim, da África, levaram ela para o Maranhão e daí ela entrou na Amazônia.”

Krenak destaca a importância das plantas medicinais no saber tradicional dos povos originários, muitas cantadas em rituais tradicionais e outras integrantes de mitos fundadores desses povos.

“O uso medicinal e o uso ritualístico, ele foi integrado a outras práticas, assim como a jurema. A jurema é daqui, é nativa, os povos indígenas do Nordeste têm os rituais da jurema e assimilaram essa planta que veio da África como uma planta que é parente da jurema”.

Associação

A advogada Margarete Brito, fundadora e diretora da Apepi, explica que a associação foi criada em 2014 para ajudar familiares e pacientes que viram na cannabis medicinal uma grande melhora na qualidade de vida de pessoas com doenças rara e neurológicas, como epilepsia. A família dela foi a primeira a conseguir autorização judicial para plantar a maconha e extrair o óleo medicinal em casa e, depois disso, criou a Apepi para ajudar outros pacientes. Atualmente, a associação fornece o óleo para quase 4 mil pacientes.

Este é o terceiro evento que a associação promove em parceria com a Fiocruz, sendo o primeiro em 2018. De acordo com Brito, os palestrantes apresentaram muitos avanços nas pesquisas, esclarecimento médico e no uso da cannabis medicinal no país.

“Até por relato de participantes, médicos, pesquisadores que estão nessa edição, dizendo o quanto o debate avançou. As associações já estão conseguindo plantar e abrir espaço para pesquisa. Hoje, a Apepi tem parceria com a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e com a Unicamp, que faz a dosagem de todos os óleos. No último seminário, em 2019, isso nem existia.”

Ela destaca a importância de se amadurecer o debate em torno da maconha medicinal, até para baratear o acesso aos medicamentos, ainda muito caros. Para a advogada, o preço pode baixar com a aprovação do Projeto de Lei (PL) 399/15, que regulamenta o plantio de Cannabis sativa para fins medicinais e a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta. O PL foi aprovado na comissão especial da Câmara dos Deputados no mês passado, mas que teve o trâmite novamente interrompido.

“Ainda é muito caro. Além de melhorar o acesso, você gera riqueza para o país, né? Porque hoje existem inúmeras pessoas que ainda usam o produto que vem lá de fora, pagando em dólar. Como o Sidarta diz, é igual você importar mandioca para fazer farinha.”

Pesquisa

O médico sanitarista e assessor de relações institucionais da Fiocruz, Valcler Rangel, explica que a Fiocruz pretende implantar ações para induzir a pesquisa na área, com o objetivo de possibilitar o uso da cannabis medicinal como um recurso para a saúde pública.

“A gente está formulando uma proposta de indução de pesquisas e estudos amplos nessa área, estudos interdisciplinares, pegando no campo biológico, dos estudos clínicos e também das ciências sociais. A ideia é induzir estudos voltados para essa questão do uso medicinal da cannabis, com a constituição de plataformas de análise e a criação de um grupo de trabalho permanente com o pessoal das universidades e da sociedade civil, que trabalhe uma agenda combinada das instituições para esse enfrentamento das dificuldades do uso da cannabis”.

Um estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostrou que canabinoides são eficazes no tratamento de doenças neurológicas.

Estudos indicam parkinson, glaucoma, depressão, autismo e epilepsia. Além disso, há evidências da eficácia dos canabinoides contra dores crônicas, em efeitos antitumorais e também contra enjoos causados pela quimioterapia, além da aplicação no tratamento da espasticidade causada pela esclerose múltipla.

Os canabinoides também demonstraram evidências de que são efetivos para o tratamento da fibromialgia, distúrbios do sono, aumento do apetite e diminuição da perda de peso em pacientes com HIV; melhora nos sintomas de síndrome de Tourette, ansiedade e para a melhora nos sintomas de transtornos pós-traumáticos.

Por Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

FONTE: Agência Brasil

Canabinóides podem auxiliar no tratamento de doenças neurológicas

Estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostrou que os canabinóides, substâncias que podem ser encontradas em plantas do gênero cannabis, podem auxiliar no tratamento de doenças neurológicas e psiquiátricas. A descoberta foi feita por pesquisadores do Laboratório de Neuroproteômica, do Instituto de Biologia (IB), e publicada hoje (27) na revista European Archives of Psychiatry and Clinical Neurosciences.

“A gente sabe muito sobre o efeito dos canabinóides, endocanabinoides ou sintéticos sobre os neurônios. Estamos aprendendo agora que essas substâncias também atuam sobre as células da glia”, diz Daniel Martins-de-Souza, um dos pesquisadores. Ele explica que o nome glia significa cola em grego, porque, no passado, os pesquisadores achavam que essas células ligavam os neurônios uns nos outros, funcionando apenas como células de suporte.

Nas últimas duas décadas, no entanto, estudos mostraram que elas praticam funções importantes no cérebro. A pesquisa analisou a interação de uma dessas células da glia, chamada oligodendrócito, com os canabinóides. O oligodendrócito é responsável por produzir a bainha de mielina, que faz o “encapamento” dos axônios, que são o meio de comunicação entre os neurônios. “Para o neurônio conseguir conversar com outro por meio de impulsos elétricos, ele precisa de um encapamento no fio, vamos assim dizer”, explica o estudioso, comparando com os fios de um poste de energia elétrica.

Falhas nas células da glia podem causar doenças. “A bainha de mielina é destruída, por exemplo, na esclerose múltipla, eventualmente até na doença de Alzheimer. Então, a bainha de mielina é bastante importante para que o neurônio funcione. A gente sempre teve uma visão muito neurocêntrica, ou seja, muito da importância do neurônio no cérebro, mas ele não vai funcionar bem se as células acessórias dele também não funcionarem, como é o caso do oligodendrócito”, acrescenta Martins-de-Souza.

Com a análise in vitro, os pesquisadores viram que os canabinóides promovem a proliferação dos oligodendrócitos. “Todas as eventuais doenças que têm perda de oligodendrócitos poderiam se beneficiar”, afirma o especialista. Ele destaca que estudos com animais e humanos devem confirmar esses dados. A pesquisa também mostrou que, com os canabinóides, os oligodendrócitos amadurecem melhor. “Isso abre novas avenidas pra gente investigar potenciais tratamentos de doenças.”

Depressão e esquizofrenia são outras doenças que podem se beneficiar dessa descoberta.

O que são canabinóides

Além do canabinóide extraído de plantas do gênero cannabis, o canabidiol, o próprio organismo humano produz a substância, chamada endocanabinóide. “Foi descoberto que os compostos da cannabis se ligam a receptores no cérebro, que passaram a ser conhecidos como receptores canabinóides. O que a gente descobriu a posteriori é que o nosso organismo produz substâncias que interagem com esses mesmos receptores. Tudo isso é chamado de canabinóide”, explica o pesquisador.

O estudo, portanto, utilizou tanto compostos extraídos de plantas do gênero cannabis, como o canabidiol, o endocanabinóide, quanto sintéticos.

FONTE: Agência Brasil

Pitt-Hopkins, estudo analisa tratamento gênico para a síndrome

Um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade da Califórnia San Diego, nos Estados Unidos, estudam atualmente uma mutação no gene TCF4, que causa a Síndrome Pitt-Hopkins.

A Síndrome Pitt-Hopkins é uma desordem de neurodesenvolvimento que tem características de Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ela tem causa genética e é rara, provocando em seu paciente déficit cognitivo, atraso neuropsicomotor, ausência de fala, crises convulsivas e distúrbios respiratórios. A estimativa é que a síndrome afete uma em cada 30 mil pessoas.

“Todos os pacientes com essa síndrome tem mutação nesse gene. Esse gene também está associado com outras doenças como o transtorno bipolar e a esquizofrenia. É importante lembrar que uma doença genética não é a mesma coisa que dizer que a doença é hereditária. Uma doença hereditária é quando ela é herdada do pai e da mãe. Nesse caso, não é. Os pais não tem mutação do gene, não carregam esse problema genético”, explicou Fabio Papes, professor do Instituto de Biologia da Unicamp e um dos coordenadores do estudo.

Conhecendo o mecanismo que causa essa condição, os pesquisadores passaram a estudar esse gene TCF4 em laboratório. Para esse estudo eles não utilizaram animais, mas células humanas. “O cérebro de um animal de laboratório não se desenvolve da mesma forma que o cérebro de uma criança portadora dessa síndrome. Isso nos levou então a estudar as células dos próprios pacientes. Essas células foram coletadas, cultivadas em laboratório e transformadas em células-tronco para que então a gente pudesse obter os chamados organóides cerebrais. Organóides são uma mini-versão do cérebro, mas no tubo de ensaio, dentro do laboratório”, explicou.

Fabio Papes, professor do Instituto de Biologia da Unicamp – Fulvia DIPillo/Direitos reservados

Durante essa fase de estudo, Papes e os demais pesquisadores buscaram criar e testar uma terapia gênica que pudesse reverter os efeitos provocados pela mutação no gene TCF4. E, no laboratório, os testes foram promissores.

“A terapia gênica pode ser feita de várias formas. Você pode simplesmente substituir o gene problemático tirando aquele gene por um que funciona de forma apropriada. No caso dessa doença, isso não é possível porque o gene é muito grande. No nosso trabalho, abordamos a terapia gênica de outras duas formas. Em uma delas, introduzimos um terceiro gene dentro das células do indivíduo doente. Todas as nossas células possuem duas cópias de cada gene, inclusive desse gene TF4: uma cópia que herdamos do pai e outra que herdamos da mãe. Nos pacientes com essa síndrome, uma das cópias não funciona direito. Para compensar essa cópia que não funciona muito bem nós, pesquisadores, introduzimos nas células uma terceira cópia, normal, funcional, para compensar pelo gene que dentro das células não funciona muito bem”, observou.

Papes disse que os cientistas também testaram uma outra estratégia em laboratório para tentar reverter os efeitos da mutação: eles utilizaram a técnica chamada CRISPR-Cas9, cujas criadoras ganharam o Prêmio Nobel de Química em 2020. “Nós, pesquisadores, fizemos com que a cópia boa que está presente nas células, a que funciona normalmente, tenha mais atividade”, disse.

Para explicar o que aconteceu nessa estratégia, ele comparou os dois genes com duas velas. “É como se uma pessoa tivesse, em uma célula qualquer, duas velas acesas lá dentro. No paciente com a síndrome, existe só uma velinha acesa. O que fizemos foi fazer com que essa vela, que estava acesa, queimasse duas vezes mais rápido. A atividade do gene passa a ser maior do que o gene normal. Então ele compensaria a falta de atividade do gene que é defeituoso dentro da célula do paciente”, exemplificou.

Ao final dos experimentos, as duas técnicas utilizadas pelos cientistas (a de introdução de um terceiro gene e a do CRISPR) deram resultados semelhantes. “Tudo igualzinho, com o mesmo tipo de resultado. E agora os testes clínicos é que vão determinar qual das duas abordagens será efetiva para ser empregada em pessoas”.

Testes clínicos

Apesar dos resultados promissores em laboratório, a pesquisa ainda precisa passar por novos testes, os chamados testes clínicos, quando passará a ser aplicada em voluntários humanos. Essa etapa, segundo Papes, pode demorar ainda entre cinco ou dez anos para começar a dar resultados. Uma empresa dos Estados Unidos, a Ultragenics, já licenciou o projeto e ficará responsável por essa etapa de estudos, que ainda não tem data para serem iniciados. A previsão é que a fase clínica seja aplicada em diversos países, entre eles, o Brasil.

Em entrevista à Agência Brasil e à Rádio Nacional, o pesquisador disse que os resultados devem ajudar também no tratamento de outros transtornos tais como a esquizofrenia, o estresse pós-traumático e o transtorno bipolar. “Pacientes dessas outras enfermidades possuem mutações no mesmo gene e, eventualmente, poderão ser beneficiados da mesma terapia”, falou.

Terapia gênica no Brasil

terapia gênica começou a ser aplicada no Brasil em fevereiro deste ano, contra a leucemia, quando foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essa terapia pode custar até 475 mil dólares. No câmbio atual, isso equivaleria a mais de R$ 2 milhões. Mas, segundo Papes, até que o estudo esteja concluído, o preço das terapias gênicas devem custar bem menos. Ele espera também que esse tipo de tratamento possa ser utilizado no Sistema Único de Saúde (SUS).

O estudo foi publicado na revista Nature Communications e é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

FONTE: Agência Brasil

Sensor vestível em material natural analisa substâncias presentes no suor

Desenvolvido na USP em São Carlos, adesivo aplicado sobre a pele poderá ser usado para monitorar o funcionamento do organismo, através do suor, e administrar medicamentos

Um sensor vestível, impresso em nanocelulose microbiana, um polímero natural, foi criado por pesquisadores da  USP, no campus de São Carlos, em colaboração com a Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, Universidade de Araraquara, Universidade de Campinas (Unicamp) e Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), em Campinas. O dispositivo poderá substituir, com vantagens, os sensores convencionais, impressos em superfícies plásticas. Aplicado sobre a pele, permite detectar várias substâncias presentes no suor, funcionando como um sensor não invasivo de amostras.

Robson Rosa da Silva, pós-doutor do Grupo de Polímeros Prof. Bernhard Gross do Instituto de Física de São Carlos da USP – Foto: Reprodução/Lattes

 

A pesquisa, coordenada pelo professor Osvaldo Novais de Oliveira Junior, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC), recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) por meio dos projetos “Biossensor impresso e implantável fabricado com biopolímeros para monitoramento de longa duração”; “Design e fabricação de dispositivos flexíveis nanoestruturados para detecção de biomarcadores”; “Desenvolvimento de instrumentos analíticos baseados em línguas eletrônicas para detecção simultânea de ameaças bacterianas” e um apoio da Equipamento Multiusuários.

“A nanocelulose microbiana é um polímero 100% natural, produzido por bactérias a partir do açúcar. Sua principal vantagem em relação ao plástico é que propicia uma interface muito maior com a pele e já é encontrada no mercado há alguns anos na forma de curativos. No entanto, ainda não havia sido estudada como matriz para a fabricação de sensores eletroquímicos”, diz Robson Rosa da Silva, também do IFSC e um dos dois autores principais do artigo.

Nos sensores de matriz plástica, a transpiração forma uma espécie de barreira entre a pele e o dispositivo, dificultando a detecção e constituindo também um fator alergênico. “Já o sensor em nanocelulose é totalmente respirável: o suor consegue chegar até a camada ativa do eletrodo através da matriz de nanocelulose”, explica.

O sensor tem a forma de um pequeno adesivo retangular, com 1,5 centímetro de comprimento e 0,5 centímetro de largura e a espessura de uma folha de papel de seda. E consegue detectar vários biomarcadores, como sódio, potássio, ácido úrico, ácido láctico, glicose, etc. “Esses elementos ou substâncias, que circulam na corrente sanguínea, são detectáveis também no suor. Assim, uma aplicação possível do sensor de nanocelulose é o monitoramento da diabete. Outra é o controle hormonal em mulheres, por meio da detecção do hormônio estradiol”, informa Silva.

Paulo Augusto Raymundo Pereira, atualmente pós-doc do Instituto de Física de São Carlos da USP – Foto: Reprodução /Lattes

 

O dispositivo poderia ser usado para detectar também a presença de poluentes atmosféricos no organismo. “Como prova de conceito, expusemos o sensor a baixas de concentrações de metais tóxicos, como chumbo e cádmio. E o resultado foi positivo”, acrescenta o pesquisador.

As unidades de detecção são impressas sobre a matriz de nanocelulose microbiana por meio de uma técnica de serigrafia semiautomatizada, com o uso de pasta com grande concentração de partículas de carbono, devido à alta condutividade elétrica desse material. “Reações químicas de oxidação ou redução produzem o sinal elétrico que indica a concentração do metabólito de interesse”, explica Paulo Augusto Raymundo Pereira, o outro autor principal do artigo, que realiza pós-doutorado no IFSC.

“Para isso, o sensor é conectado a um potenciostato, que faz as medidas eletroquímicas por meio da variação da corrente elétrica. E as informações obtidas são, finalmente, transmitidas a um computador e traduzidas por meio da curva-padrão”, detalha Pereira. Segundo ele, a conexão wireless do sensor com o aparato de medição e leitura é uma possibilidade tecnológica de fácil resolução.

Os pesquisadores estudam, agora, o uso do dispositivo para a administração de medicamentos, bem como sua viabilização comercial. A primeira fase do projeto “Fabricação de eletrodos impressos por serigrafia em substratos biodegradáveis (nanocelulose e filmes de cebola Allium cepa l) para aplicações das indústrias médica, alimentícia e agroindustrial”, desenvolvido pela Biosmart Nanotechnology, teve o apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da Fapesp.

O artigo Microbial nanocellulose adherent to human skin used in electrochemical sensors to detect metal ions and biomarkers in sweat, publicado no periódico Talanta, pode ser acessado no link.

Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

Por José Tadeu Arantes/Agência Fapesp

FONTE: Jornal da USP