Insulina semanal pode trazer conforto a pacientes diabéticos num futuro próximo

Cem anos após o primeiro uso de insulina no tratamento do diabete, novidade substituiria dose diária, na visão de Maria Elisabeth Rossi da Silva.

O metabolismo humano controla variadas funções, inclusive a regulação da taxa de glicose (glicemia) no sangue. No corpo humano, o hormônio com essa função é a insulina. A escassez ou deficiência na atuação da insulina resulta em diabetes mellitus, uma doença que atinge 16,8 milhões de brasileiros, segundo o Atlas do Diabetes da Federação Internacional de Diabetes (IDF).

Como tratamento, os pacientes são indicados a aplicar uma dose diária de insulina e, em alguns casos, uma dose extra. Contudo, o futuro do tratamento da doença é promissor, uma vez que está sendo desenvolvida uma insulina basal. “Temos hoje insulinas que a gente chama de  insulina basal, que mantém um nível constante de insulina durante todo o dia, mas essa insulina dura 24 horas. Então, o paciente tem que aplicá-la todos os dias, e a semanal vai trazer esse conforto”, esclarece Maria Elisabeth Rossi da Silva, chefe da Unidade de Diabetes do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

Para o paciente do tipo 1 da diabetes mellitus, caracterizada pela origem autoimune – as células de defesa do corpo atacam o pâncreas, responsável pela produção da insulina –, “a insulina basal vai dar tranquilidade para o paciente, mas ele vai ter que continuar utilizando a [insulina] rápida nas refeições”, explica. No caso do tipo 2, presente em 90% dos diabéticos, a síndrome está relacionada ao envelhecimento das células do pâncreas, que podem diminuir a produção da insulina. “O paciente com diabete tipo 2 realmente vai se beneficiar e vai poder fazer o uso apenas dessa aplicação injetável uma vez por semana”, diz ela.

A novidade ainda está na fase três de pesquisa: “É uma confirmação da padronização da insulina [basal] e uma confirmação de que ela traz benefícios”, elabora Maria. Os resultados apresentados pela tecnologia têm atuação semelhante ou até mesmo superior à insulina diária, conta ela. A previsão de chegada ao mercado é até 2024.

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Como se prevenir?

Assim como uma vasta gama de doenças, o diabete também tem três principais causas a serem pontuadas. A primeira delas é o aspecto genético: “Alguns genes favorecem o aparecimento do diabete, mas talvez o mais importante não seja isso”, avalia Maria Elizabeth. Ela se refere aos outros dois fatores que favorecem o surgimento da doença, a obesidade e o sedentarismo.

Em comparação com 2006, a atual população obesa no Brasil dobrou em frequência, afirma ela: “Nós tínhamos 11% da população com obesidade [em 2006] e hoje nós temos 22%”. A relação direta deste dado com a porcentagem de diabéticos também é uma questão de preocupação. Quinze anos atrás, “tínhamos 5,3% da população com diabete e hoje nós temos quase 10%”.

Por sua vez, a prática de atividades físicas reduz a glicemia. Em altos níveis, a taxa de glicose no sangue pode levar a complicações na saúde, adverte. “O paciente com diabete tem o risco maior de hipertensão, doença cardíaca, angina, infarto, acidente vascular cerebral ou de doença renal e alguns pacientes podem até progredir para diálise”, exemplifica.

Para uma boa qualidade de vida, Maria sugere atividades físicas, o controle da taxa de glicose e cuidado com os níveis de lipídios, como colesterol e triglicérides. “E essa insulina nova que vai ajudar no controle. Mas, para a prevenção, o que nós temos de mais forte ainda é aquilo da atividade física e exercício”, conclui.

FONTE: Jornal da USP

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Dia Nacional do Diabetes: pacientes buscam qualidade de vida

O Dia Nacional do Diabetes, celebrado domingo (26/06), reforça a importância de hábitos saudáveis para evitar a doença, que acomete mais de 537 milhões de adultos com idade entre 20 e 79 anos, representando 10,5% da população mundial nessa faixa etária. Os dados são do Atlas do Diabetes 2021, divulgado pela Federação Internacional de Diabetes (IDF).

O Brasil é o sexto país em incidência de diabetes no mundo e o primeiro na América Latina — são 15,7 milhões de pessoas adultas com esta condição, e a estimativa é que, até 2045, a doença alcance 23,2 milhões de adultos brasileiros.

A aposentada Walquiria Lopes, de 64 anos, teve o primeiro sinal de que poderia estar com a doença em um teste de rotina no escritório em que trabalhava. Após um mês de acompanhamento médico e aferição diária da glicemia capilar, ela recebeu o diagnóstico: diabetes tipo 2.

“Fiquei muito assustada pois já queriam até me aplicar insulina, porque já [o índice] estava muito alto. Aí comecei o tratamento com um endocrinologista. A descoberta é muito importante, porque eu não tinha sintomas, o diabetes é uma doença silenciosa. Eu não tinha sede, pois eu já tomava água por causa de cálculos renais. Já não comia muito doce, mas comia muito carboidrato, e não sabia que este também podia causar a doença”, lembra Walquiria. A aposentada destaca a importância dos exames e diz que foi com a picadinha no dedo que teve o alerta. A confirmação da doença veio depois, com exames de sangue.

Walquiria aprendeu a conviver com o diabetes, controlando a doença de forma adequada. “Continuo não tendo sintoma nenhum, mas convivo com a doença fazendo exames periódicos, tomo a medicação e vou ao médico regularmente.” Ela reforça que o exame é importante porque, se o diabetes for descoberto precocemente, a pessoa já pode iniciar o tratamento. Com o tratamento adequado, a vida é perfeitamente normal, afirma.

Tipos

Existem quatro tipos de diabetes, explica o endocrinologista e presidente da Associação de Diabetes do ABC, Marcio Krakauer. “O do tipo 1 acontece por uma doença autoimune, em que o corpo para de produzir insulina naquele momento (ou poucas horas e dias antes), e os sintomas são excessivos, como fome, sede intensa, perda de peso, visão embaçada, infecções urinárias e genitais, dores no corpo”.

Nesse tipo, quando se repõe a insulina, o indivíduo fica bom rapidamente. O diabetes do tipo 2 é uma doença que mistura o hereditário com o ganho de peso e vai surgindo de forma muito lenta na vida. Em geral, quando se faz um diagnóstico por causa de tais sintomas, estes já existem há cerca de cinco anos ou mais, acrescenta o médico. Segundo Krakauer, o diabetes do tipo 2 é completamente assintomático ou pouco sintomático.

Já o pré-diabetes é uma condição bem inicial. “Nós damos esse nome, mas, na verdade, a glicose já não está normal. O diagnóstico é feito por números de glicose na ponta do dedo, ou do exame hemoglobina glicada ou do exame de curva glicêmica. É o início da história do diabetes”, e aí as pessoas precisam ser tratadas para evitar que fiquem com diabetes, ressalta o médico.

O diabetes gestacional é aquele que aparece por causa da gravidez. “Em geral, são mulheres obesas, que têm história de pais com diabetes tipo 2 e que, quando estão entre a 26ª e 28ª semanas de gestação, por conta dos hormônios da gravidez, podem apresentar a glicose elevada, o diabetes. Essas mulheres devem tratar-se porque pode haver muitas complicações para mãe e para o bebê”, observa Krakauer.

Conviver com a doença

Os riscos do diabetes são vários, mas há formas adequadas de controlar a doença. “Todos [os tipos de diabetes] precisam de mudança de estilo de vida: primeiro plano, alimentar-se de forma saudável, nutricionalmente adequada. Aqueles que estão acima do peso devem perder peso, os que estão abaixo do peso, ganhar ou manter o peso”, destaca o médico.

Ele acrescenta que é importante reduzir os carboidratos simples e dar preferência aos carboidratos integrais, ingerindo-os em pequena quantidade, e ter a alimentação fracionada ao longo do dia. O prato precisa ser composto de forma saudável: metade de legumes, verduras, saladas, um quarto de carboidratos integrais e um quarto de proteína, que pode ser vegetal ou animal.

Quem tem diabetes tipo 1 precisa fazer a reposição de insulina, já que não produz o hormônio, e manter hábitos de vida saudáveis. A insulina, hormônio produzido pelo pâncreas, é responsável por levar a glicose que está no sangue para o interior das células.
Já o diabetes gestacional, dependendo da situação, pode ser tratado só com alimentação saudável. “Se necessário, o diabetes gestacional pode ser tratado com insulina. Por enquanto, não se utiliza medicamento oral. Apesar de alguns estudos liberarem a metformina, por enquanto só se libera a insulina durante a gestação. E atividade física também. Aliás, a atividade física é importante para todos os tipos de diabetes e para todas as pessoas.”

De acordo com o médico, para conviver com a doença, é preciso monitoramento e educação. “É preciso fazer teste na ponta do dedo ou usar a medição da glicose continuamente para tomada de decisão, tanto para enxergar o efeito da alimentação, o efeito da parte emocional, da glicose no sangue, o efeito do exercício, dos remédios, da insulina. A monitorização é muito importante.”

Krakauer explica que, quando o diabetes está bem compensado, com parâmetros perto da normalidade, a chance de complicações crônicas é mínima. “Mas aqueles que estão [com o diabetes] mal controlado e por muito tempo, podem ter complicações nos olhos — a doença é a maior causa de cegueira no mundo –, no coração e doenças arteriais periféricas.”

Podem advir ainda problemas neurológicos, alerta o médico. “Chamamos de neuropatia do diabetes, que aumenta muito a chance de perder a sensibilidade nos pés. Esses indivíduos podem ter infecções e sofrer amputações, além de doença renal do diabetes que leva à hemodiálise ou ao transplante de rim. E várias outras questões, como gordura no fígado, doenças pulmonares, pior resposta às infecções, como, por exemplo, a covid-19.”

O médico explica que quem tem diabetes responde mal à doença porque a glicose alta diminui a imunidade às infecções. “Quando a doença está controlada e bem compensada por muito tempo, isso não ocorre”.

Prevenção

Fórmula para evitar e controlar o diabetes combina exercícios físicos e alimentação saudável – Arquivo/Agência Brasil

A fórmula alimentação saudável e exercícios físicos é o meio mais efetivo de prevenir a doença, orienta o especialista. “A mistura é: alimentação saudável, perda de peso para quem está acima do peso, muito exercício físico, tomar muita água, dormir direito e reduzir o estresse,  quando possível.”

Krakauer enfatiza que alimentos ultraprocessados também aceleram a incidência da doença. “Ultraprocessados são alimentos com alto teor de farinha branca, açúcares e gorduras, que fazem mal ao organismo. O indivíduo que tem tendência ao diabetes tipo 2, pode, com o excesso de ultraprocessados, ganhar peso muito rapidamente na região da barriga e apresentar excesso de gordura no fígado e no pâncreas [esteatose hepática ou pancreática], o que é um fator de risco gigantesco para o aparecimento da doença.”

Ficar longe do cigarro e das bebidas alcoólicas é outra maneira de diminuir o risco de ter a doença, diz o médico. “Não fumar em hipótese alguma, reduzir as bebidas alcoólicas, para quem as toma em excesso, levar a vida de forma saudável, o máximo que conseguir. Algumas vezes, podem ser indicadas medicações capazes de reduzir o risco do diabetes em torno de 30%.”

Portal

Iniciativas que forneçam informações de qualidade contribuem para o gerenciamento adequado da condição é uma forma de ajudar quem busca conhecimento. Uma delas é o portal Tipo Você, que reúne conteúdos informativos e educacionais para que pacientes e familiares aprendam e aperfeiçoem o gerenciamento do diabetes.

Lançado na última semana pela Roche Diabetes Care, o portal visa auxiliar as pessoas com diabetes a entender as medidas adequadas e a cuidar cada vez mais da saúde.

Para o médico, informação é essencial para a mudança no estilo de vida de quem quer evitar o diabetes e de quem precisa conviver com doença. “É mudança de estilo de vida. E é preciso ter conhecimento, informação, educação para atingir a transformação.”

Por Ludmilla Souza – Repórter da Agência Brasil – São Paulo

FONTE: Agência Brasil

Gordura no fígado: ácido úrico e frutose altos podem desencadear esteatose hepática não alcoólica

A frutose vinda de produtos ultraprocessados aumenta o risco de associação entre o ácido úrico e a doença. A pesquisa, realizada na Faculdade de Medicina, usou dados do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto, uma coorte (acompanhamento de longo prazo) em andamento no País.

Pesquisa desenvolvida pela Faculdade de Medicina (FMUSP) mostrou que há uma associação importante entre o aumento dos níveis de ácido úrico sérico e a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). A DHGNA é causada pelo acúmulo progressivo de gordura no fígado e não pelo consumo excessivo de álcool. Nos últimos anos, evidências clínicas sugerem que o ácido úrico elevado frequentemente está associado ao desenvolvimento ou progressão da DHGNA. Altos índices de ácido úrico podem levar ao desenvolvimento de resistência à insulina (RI).

Outro dado importante trazido pelo estudo mostra que o consumo elevado de frutose – vinda de produtos ultraprocessados – pode aumentar o risco de associação entre o ácido úrico e a DHGNA, tanto para homens quanto para mulheres.

Os resultados integram a tese de doutorado da nutricionista Clara Freiberg, defendida em janeiro de 2021. A partir desses achados, a pesquisadora sugere que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina.

Do total da amostra estudada (10.597 pessoas), a pesquisa encontrou uma prevalência de DHGNA de 38,5% (44,9% em homens e 34% em mulheres). Quando comparados a outros países, como Estados Unidos (34%), Índia (29%) e Coreia do Sul (26%), esse número parece bem elevado.

“Quando falamos de frutose estamos nos referindo àquela industrializada, presente em alimentos ultraprocessados, e não ao consumo da fruta propriamente dita”, esclarece Clara Freiberg, nutricionista autora do estudo.

A ingestão de frutose tem sido associada à progressão da doença devido ao seu potencial de aumentar os níveis de ácido úrico no sangue. Ela está presente em muitos produtos ultraprocessados na forma de xarope de milho enriquecido com frutose. Estudos estimam que a frutose tem sua absorção aumentada em quase 30% quando associada a soluções com esse tipo de carboidrato.

“Quando falamos de frutose estamos nos referindo àquela industrializada, presente em alimentos ultraprocessados, e não ao consumo da fruta propriamente dita”

Elsa-Brasil

Para realizar a pesquisa, a nutricionista utilizou os dados provenientes do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), uma coorte (acompanhamento de longo prazo) de servidores públicos de todo o Brasil, iniciada em 2008, e que conta com cerca 15 mil participantes, com idade entre 36 e 74 anos.

A amostra final para a pesquisa foi composta de 10.597 participantes (4.309 homens e 6.288 mulheres) que preencheram os critérios para diagnóstico de DHGNA (exames antropométricos, clínicos, bioquímicos e ultrassonografia, para avaliar a presença da doença).

Todos os participantes foram classificados em quintis dos níveis de ácido úrico sérico para a análise de todas as variáveis, sendo o primeiro quintil (Q1) referente aos valores mais baixos e o último quintil (Q5) aos valores mais elevados. Quintil é o termo usado para um conjunto de dados que é dividido em cinco partes iguais.

As análises mostraram que não houve diferença entre os quintis quanto à idade, etnia e renda. Participantes com maior nível de ácido úrico apresentaram menor nível de escolaridade e maior prevalência de IMC (índice de massa corporal, calculado pelo peso da pessoa dividido pela altura dela ao quadrado). Também apresentaram mais hipertensão, diabete, níveis de enzimas do fígado altos, eram inativos fisicamente e tinham esteatose hepática de leve a grave. Além disso, possuíam maior média de circunferência da cintura, de HOMA-IR (marcador de que avalia se o paciente tem resistência à insulina), de enzimas hepáticas, colesterol total, LDL e triglicerídeos.

A circunferência da cintura deve ser tratada com atenção porque a deposição de tecido adiposo, que é a gordura localizada no abdômen, está associada ao aumento da mortalidade geral. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a medida da cintura não ultrapasse 102 centímetros (cm) nos homens e 88 cm nas mulheres.

Quanto ao nível de ácido úrico, 965 mulheres (15%) e 1.122 homens (26%) eram hiperuricêmicos (níveis altos de ácido úrico). Verificou-se também que 45% dos homens e 34% das mulheres apresentaram algum nível de DHGNA. A prevalência da doença hepática tendeu a aumentar à medida que se elevavam os níveis de ácido úrico sérico.

Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

 

Não houve diferenças de idade, etnia e renda entre os homens com alto consumo de frutose quando comparados aos participantes normouricêmicos (com níveis normais de ácido úrico) e hiperuricêmicos.

As mulheres hiperuricêmicas com maior consumo de frutose têm chance aumentada de apresentar DHGNA. Para os homens, a chance de hiperuricêmicos com consumo elevado de frutose apresentarem a doença foi maior do que aqueles com consumo adequado de frutose. “Com esses resultados, acho importante que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina”, sugere Clara.

Ainda de acordo com a pesquisadora, os profissionais de saúde precisam ser mais claros ao orientar os pacientes sobre o controle do sal, do açúcar e da frutose, por exemplo. “As pessoas precisam entender que altos níveis de frutose nem sempre estão associados a um consumo excessivo de frutas.”

“Com esses resultados, acho importante que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina”, sugere Clara. 

A doença

A doença hepática gordurosa não alcoólica vem se tornando uma das principais causas de doença hepática crônica no mundo. Sobrepeso, diabete, má nutrição, perda brusca de peso e sedentarismo estão entre os fatores de risco para o aparecimento da doença.

Há evidências de que a pressão alta, resistência à insulina, níveis elevados de colesterol e triglicérides estão diretamente associados ao excesso de gordura no fígado.

A patologia geralmente é assintomática e pode atingir um estágio avançado antes de ser diagnosticada. Desconforto no quadrante superior direito, fadiga e letargia foram relatados em até 50% dos pacientes mas, muitas vezes, a DHGNA é diagnosticada após a realização de exames de rotina.

Estudos mostram que, entre os pacientes com esteatose hepática simples, 12% a 40% desenvolverão NASH (forma mais avançada da doença hepática gordurosa não alcoólica) com fibrose precoce após oito a 13 anos. Desses, aproximadamente 15% desenvolverão cirrose e/ou evidência de descompensação hepática no mesmo período. Cerca de 7% das pessoas com cirrose compensada associada à DHGNA vão evoluir para câncer no fígado dentro de dez anos, enquanto 50% exigirão um transplante ou morrerão de causa relacionada ao fígado.

“Minha população estudada foi de adultos e idosos, mas seria importante avaliar o consumo de frutose em crianças e adolescentes”, explica. “A oferta de ultraprocessados é enorme para esse público. Na cantina da escola, por exemplo, refrigerante e água têm o mesmo preço.”

Foto: Reprodução/HCV-Trials

 

Jovens e adolescentes na mira

Clara contou ao Jornal da USP que o trabalho dela abriu várias outras possibilidades de estudo. “Minha população estudada foi de adultos e idosos, mas seria importante avaliar o consumo de frutose em crianças e adolescentes”, explica. “A oferta de ultraprocessados é enorme para esse público. Na cantina da escola, por exemplo, refrigerante e água têm o mesmo preço.”

Outro exemplo seria o acompanhamento mais próximo da dieta de alguns pacientes para verificar se há a mesma resposta clínica.

O Elsa-Brasil é um estudo iniciado em 2008, que investiga, na população brasileira, a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto, entre outras) e doenças associadas. São 15 mil participantes, de várias regiões do País, com idade entre 35 e 74 anos. No próximo mês de agosto eles serão novamente convocados para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para essas doenças – que são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: e-mail clara.freiberg@gmail.com, com Clara Freiberg.

Texto: Fabiana Mariz
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Pequena proteína reduz níveis de açúcar, gera patente e pode ser aliada no combate à diabete

Sintetizado a partir de substância produzida no sangue, o peptídeo Ric4 reduz níveis de açúcar no organismo, e, futuramente, poderá ser usado em medicamentos para controle da diabete

Uma pequena proteína cuja origem são as células do corpo humano pode ter um grande papel no controle da diabete. Em pesquisa com participação do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, cientistas descobriram que o peptídeo Ric4, sintetizado a partir de uma proteína produzida pelas células sanguíneas, aumentou a sensibilidade à insulina e reduziu a glicemia, ou seja, o nível de açúcar no sangue. Os estudos sobre a estrutura e as propriedades do Ric4, realizados em animais, geraram uma patente que, no futuro, poderá dar origem a medicamentos para tratar a diabete, e que sirvam de alternativa à terapia com insulina.

Os resultados do trabalho são mostrados em artigo publicado no site da revista científica Pharmaceuticals, no último dia 16 de dezembro. A diabete tipo 2 acontece quando o corpo desenvolve resistência à insulina, responsável por processar o açúcar no organismo e levá-lo às células, o que aumenta a concentração de açúcar na corrente sanguínea.

“Há alguns anos, nosso laboratório desenvolveu um teste em modelo animal que encontrou alterações em um grupo de peptídeos intracelulares (InPeps), que são pequenas proteínas produzidas no interior das células, normalmente a partir de proteínas maiores”, explica ao Jornal da USP o professor Emer Ferro, do ICB, coordenador do estudo. “Os animais testados apresentaram maior sensibilidade à insulina e, consequentemente, maior captação de glicose e glicemia reduzida. Nossa hipótese era de que isso aconteceu devido às alterações nos níveis de InPeps.”

Emer Suavinho Ferro – Foto: Cecília Bastos/USP Imagem

Em seguida, os pesquisadores sintetizaram quimicamente em laboratório quatro peptídeos, que foram denominados Ric1, Ric2 e Ric3 e Ric4. “O Ric 1 e o Ric2 foram identificados no músculo gastrocnêmio (batata da perna) e são derivados da proteína troponina I; o Ric3 foi encontrado no tecido adiposo epididimal (na região do púbis), produzido a partir da proteína de ligação acil-CoA, e o Ric4 é derivado da subunidade alfa da hemoglobina, proteína existente no sangue”, descreve o professor. “Nosso objetivo foi identificar se algum desses peptídeos poderia reproduzir farmacologicamente a maior sensibilidade à insulina e à glicemia reduzida observada nos animais.”

Captação de Glicose

“Caso isso acontecesse, poderíamos identificar um novo peptídeo que poderia ser usado no tratamento de pacientes diagnosticados com pré-diabete ou diabete tipo 2, que possuem elevados níveis de glicose e não respondem à insulina”, relata Ferro. “Foram realizados testes de viabilidade celular em cultura de células, de avaliação do efeito dos peptídeos nos níveis de expressão de proteínas específicas (Western Blotting), de estabilidade enzimática, de expressão gênica (PCR), de captação de glicose em tecidos animais e culturas de células de camundongos, e de tolerância e transporte de glicose, em células e modelos animais.”

Pesquisas sobre a estrutura e as propriedades do peptídeo Ric4 e seus derivados geraram uma patente que pode ser aproveitada futuramente na pesquisa e criação de  novos medicamentos para tratar a diabete tipo 2, e que sirvam de alternativa à terapia com insulina; na imagem, profissional da saúde medindo glicose de paciente – Foto: Marcos Santos/ USP Imagens

A pesquisa verificou que dois derivados do peptídeo Ric4 (Ric4-2 e Ric4-15) possuem ação hipoglicemiante, isto é, induzem a captação de glicose e reduzem a glicemia em animais após administração oral. “As análises sugerem que o peptídeo se liga ao receptor de insulina para induzir a captação de glicose, de forma independente da insulina, esta última também um peptídeo, aumentando sua sensibilidade”, aponta o professor do ICB. “Modificações estruturais do Ric4 natural, que geraram o Ric4-2 e o Ric4-15, reduziram sua degradação por enzimas digestivas, sem prejudicar a ação farmacológica. Em resumo, peptídeos como o Ric4 podem exercer ação similar à insulina e podem ser úteis no tratamento de pacientes com diabete tipo 2.”

De acordo com Ferro, apesar da significância biológica e farmacológica, as possíveis aplicações clínicas do Ric4 ainda merecem mais investigações. “O estudo indica que pacientes com pré-diabete ou diabete tipo 2, que têm hiperglicemia resistente à insulina, poderiam ser tratados com Ric4 ou com seus análogos, Ric4-2 e Ric4-15. Porém, ensaios adicionais precisam ser realizados para avaliar a potência do peptídeo em reduzir a glicemia de portadores de diabete tipo 2”, destaca Ferro. “Nosso trabalho reforça a perspectiva que os peptídeos podem manter sua atividade farmacológica após administração oral, ‘quebrando’ o dogma que dentro do corpo eles são imediatamente degradados por enzimas digestivas.”

Além da publicação do artigo, um pedido de patente do peptídeo Ric4 foi depositado junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) pela Agência USP de Inovação (Auspin) e pela INOVA, Agência de Inovação da Unicamp. “Embora o pedido tenha sido depositado em maio de 2018, nenhuma empresa até o momento se interessou em licenciar a patente do Ric4 para desenvolvimento de um fármaco alternativo à insulina para o tratamento da diabete tipo 2”, conclui o professor.

O trabalho teve a participação dos pesquisadores Renée Silva, Ricardo Llanos, Rosangela Eichler e do professor Emer Ferro, do Departamento de Farmacologia do ICB,  do pesquisador Thiago Oliveira e do professor William Festuccia, do Departamento de Fisiologia do ICB, e do professor Fabio Gozzo, do Instituto de Química da Unicamp.

Mais informações: e-mail eferro@usp.br, com o professor Emer Ferro

Por: Júlio Bernardes

Arte: Ana Júlia

FONTE: Jornal da USP