O conhecimento sobre a saúde do brasileiro

Em agosto, voluntários do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) serão convocados para novas entrevistas e bateria de exames para avaliar a saúde do brasileiro e a evolução de fatores de risco para doenças cardiovasculares, principal causa de morte no mundo.

esquisadores e voluntários se aquecem para a quarta onda do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil). O Elsa é um estudo de cunho epidemiológico que investiga na população brasileira a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (como acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto, entre outras) e algumas doenças associadas. Os participantes da pesquisa, cerca de 15 mil pessoas de várias regiões do País, com idade entre 35 e 74 anos, serão novamente convocados em agosto para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para estas doenças – que são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Desde 2008, quando começou a coleta de dados, o Elsa-Brasil vem produzindo conhecimentos relevantes sobre a saúde da população adulta brasileira, dados que servirão para adequação de políticas públicas de saúde voltadas para as necessidades brasileiras.  A cada três ou quatro anos acontece uma nova onda presencial para prosseguimento da pesquisa e, anualmente, é feito um monitoramento por telefone ou WhatsApp que é contínuo durante todo o estudo. As perguntas versam sobre fatores de risco para doença cardiovascular, condições de vida, diferenças sociais, estresse no trabalho, conflito saúde familiar, saúde mental, questões de gênero e especificidades da dieta da população brasileira.

Na modalidade presencial, são realizados exames laboratoriais (hemograma, glicemia em jejum e após sobrecarga de glicose, colesterol total e frações, creatinina, ácido úrico, proteína C ultrassensível, hormônio tiretrófico – TSH, tiroxina-livre – T4-livre e insulina), medidas antropométricas como peso, circunferência abdominal, altura, índice de massa corporal (IMC), medidas de pressão arterial, avaliação de funcionalidades como equilíbrio, marcha e força muscular, avaliação cognitiva, bioimpedância para avaliação da composição corporal e porcentual de gordura e eletrocardiograma. Ao final, os resultados dos exames são disponibilizados aos participantes.r

“A cada onda, são produzidos novos dados e guardados em um servidor de pesquisa; depois de cruzados e analisados, resultam em informações muitas delas inéditas acerca da saúde da população brasileira”, relata ao Jornal da USP a médica epidemiologista Isabela M. Benseñor, coordenadora do Elsa- Brasil, em São Paulo, e professora da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). “O estudo de coorte [acompanhamento de longo prazo] é um celeiro de produção de conhecimento. Até o momento, já foram publicados mais de 400 artigos científicos em revistas brasileiras e estrangeiras e capacitados mais de mil novos pesquisadores e pessoal técnico para trabalhar em pesquisa clínica”, diz.

Isabela M. Benseñor – Foto: Arquivo pessoal

O engajamento dos voluntários no projeto é alto, o que reflete no baixo porcentual de desistência de participação. Enquanto que estudos de coorte realizados em outros países perdem, de um ano para o outro, 20% de seus participantes, o Elsa, desde 2008, em 14 anos de existência, perdeu apenas 15%. Em geral, são casos de óbitos ou de pessoas que se aposentaram e foram morar em outras cidades, e que, no caso de mudanças, continuam sendo seguidas por telefone, informa a professora Isabela.

Inovação: inclusão de fatores de risco não clássicos para doenças cardiovasculares

O Elsa-Brasil inovou incluindo em suas investigações fatores de risco não clássicos ao estudo, que podem estar associados à incidência de doenças cardiovasculares, diz a pesquisadora. Além de manter os fatores clássicos como o tabagismo, obesidade, sedentarismo, hipertensão, diabete, estresse e dislipidemia, investigados em outros estudos de coorte, o Elsa-Brasil vem explorando fatores psicossociais: estresse no trabalho, diagnósticos psiquiátricos, conflito família-trabalho, eventos negativos de vida, capital social e características de vizinhança, além de outras doenças associadas como as tireoidianas (hipo e hipertireoidismo) e as inflamatórias autoimunes (artrite reumatoide, lúpus, síndrome de Sjögren), enxaquecas e sintomas psiquiátricos (depressão e ansiedade).

Em 2020, por conta da pandemia do coronavírus, os pesquisadores do Elsa avaliaram 2.117 participantes para saber se os níveis de sintomas psiquiátricos – ansiedade e depressão – cresceram durante a pandemia. O artigo Prevalence and risk factors of psychiatric symptoms and diagnoses before and during the covid-19 pandemic: findings from the Elsa-Brasil covid-19 mental health cohort indicou que a prevalência de transtornos mentais se manteve elevada, porém não teve aumento significativo na pandemia.

“A inclusão de fatores não clássicos trouxe a oportunidade de análise da interação entre doenças inflamatórias, cardiovasculares e sintomas psiquiátricos e se essa coexistência aumentaria o risco de desfechos cardiovasculares fatais e não fatais e de mortalidade geral e por doenças cardiovasculares”, diz a pesquisadora.

Outra originalidade da pesquisa brasileira foi o recrutamento, em 2008, de voluntários com idade mínima a partir de 35 anos, o que vem permitindo avaliar antecipadamente em que momento as doenças cardiovasculares e o processo aterosclerótico (obstrução do fluxo sanguíneo nas artérias carótidas por placas de gordura e cálcio) começam a se manifestar, relata a professora Isabela.

“As linhas de estudo que envolvem fatores de risco não clássicos para a doença cardiovascular em uma idade mais jovem têm sido nossas maiores fontes de produção científica. Nos projetos temáticos Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo] associados ao estudo, por exemplo, o papel da função tireoidiana na determinação das doenças cardiovasculares gerou 30 artigos já publicados, além de vários outros submetidos”, diz.

O artigo Gender, race and socioeconomic influence on diagnosis and treatment of thyroid disorders in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (Elsa-Brasil), cujo um dos autores é a professora Isabela, relata que gênero, raça e fatores socioeconômicos influenciam no diagnóstico e tratamento da doença.

Neste estudo, se verificou que o diagnóstico e o tratamento do hipotireoidismo clínico é menor entre os homens, entre os participantes de menor escolaridade e renda e entre os pretos, quando comparados aos pardos e brancos. “O resultado mostra que mesmo em uma amostra de pessoas que têm mais acesso aos serviços de saúde, no caso dos voluntários do Elsa, que são funcionários públicos, a desigualdade social influencia no diagnóstico e tratamento do hipotireodismo”, diz.

Este mesmo estudo também indicou que o hipotireoidismo clínico e subclínico (quando há um aumento do hormônio tireotrófico, mas a tiroxina-livre ainda está em níveis normais) são mais frequentes nos brancos e o hipertireoidismo clínico e subclínico (quando há uma diminuição do hormônio tireotrófico, mas a tiroxina-livre está em níveis normais) são mais frequentes nos pretos.

Outra informação relevante publicada em artigo científico foi que a levotiroxina, um hormônio sintético usado no tratamento de reposição hormonal quando há déficit de produção de tiroxina pela glândula tireoide, vem sendo largamente utilizada no Brasil por mulheres de classes sociais mais elevadas, possivelmente com prescrição off label. Ou seja, o medicamento vem sendo utilizado para perda de peso, tratamento da depressão e outros fins, o que, segundo a pesquisadora, não é diferente dos resultados encontrados em estudos de outros países.

Mais informações: e-mail isabensenor@gmail.com, com a professora Isabela M. Benseñor

Por: Ivanir Ferreira

FONTE: Jornal da USP

Declínio cognitivo é maior para quem consome mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados

Pães de forma, macarrão instantâneo, refrigerantes: os ultraprocessados são produtos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de sua composição final não lembrar a comida de verdade. Vários estudos mostram os prejuízos que eles causam à saúde. Uma das pesquisas mais recentes foi realizada por cientistas da USP com base no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) e mostra que o consumo de ultraprocessados é um dos fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. Os resultados mostraram que a queda cognitiva ao longo da vida foi 28% maior entre os participantes que consumiram mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados. Isso equivale, por exemplo, a comer três pães de forma todos os dias.

Os dados estão sendo apresentados durante a Conferência Internacional da Associação de Alzheimer, que acontece ao longo desta semana, entre 31 de julho e 4 de agosto, em San Diego, nos Estados Unidos.

O Elsa-Brasil é um estudo epidemiológico nacional realizado desde 2008 por várias instituições como a USP, UFES, Fiocruz, UFBA, UFMG e UFRGS, que acompanha o estado de saúde de cerca de 15 mil funcionários. A ideia é investigar a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto) e outras associadas. Os participantes, com idades entre 35 e 74 anos, são de várias regiões do País. No próximo mês de agosto, eles serão novamente convocados para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para essas doenças, consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Entre vários outros aspectos da saúde, o Elsa é o estudo com a maior amostra e o maior tempo de avaliação da performance cognitiva no Brasil. Os dados das três primeiras ondas (entre 2008 e 2010, 2012 e 2014 e de 2017 a 2018) embasaram uma série de artigos que encontraram associações de piora do desempenho cognitivo com diversos fatores, como, por exemplo, enxaquecasconsumo de álcool, inflamação e, principalmente, doenças vasculares como a hipertensão.

Fatores sociais também se mostram relevantes: um dos artigos mostrou que a adesão à dieta MIND (Mediterranean-DASH Intervention for Neurodegenerative Delay), criada para reduzir o risco de doenças que afetam a memória e a mente, só mostrou eficiência nesse objetivo em pacientes de alta renda, com melhores condições materiais de se alimentar de forma saudável. Em outro, os pesquisadores observaram que o estresse relacionado à rotina de trabalho também está associado ao declínio cognitivo.

Durante a conferência em San Diego, a equipe do Elsa apresenta dois novos estudos longitudinais, ainda não publicados, baseados no acompanhamento dos participantes durante as três primeiras ondas, que identificaram dois fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo: o consumo de ultraprocessados e o impacto do acúmulo de gordura nas artérias. 

Consumo de ultraprocessados

O estudo sobre ultraprocessados foi realizado pela pesquisadora Natália Gonçalves em colaboração com outros integrantes do Elsa, inclusive, o grupo de pesquisa do professor Carlos Augusto Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública (FSP), um dos órgãos diretamente envolvidos na elaboração do Guia Alimentar para a População Brasileira.

A pesquisa utilizou os dados de 10.775 pessoas coletados nas três primeiras ondas do Elsa para classificar a alimentação dos participantes de acordo com os quatro grupos descritos pelo Guia: não processados (vegetais, frutas, cereais etc.), ingredientes culinários (azeites, sal, óleos), alimentos processados (com modificações leves como adição de sal ou açúcar) e ultraprocessados, “alimentos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de que a sua composição final nem lembra comida de verdade” (pães de forma, macarrão instantâneo, marmitas prontas, refrigerantes, entre outros).

A partir disso, os pesquisadores dividiram as pessoas em quatro grupos, de acordo com a porcentagem de ultraprocessados na dieta, e descobriram que as pessoas que comem mais desse tipo de produto (acima de 20% da ingestão diária) têm uma queda 28% maior na performance cognitiva do que as que comem menos (abaixo de 20%).

Para tornar mais palpável o que isso significa, a pesquisadora explica que 20% de calorias diárias vindas de ultraprocessados equivalem a, por exemplo, míseras três fatias de pão de forma por dia.

“Esses resultados, além de inéditos, são muito importantes pois apontam para um comportamento que as pessoas podem modificar e, com isso, possivelmente diminuir a chance de declínio cognitivo ao longo dos anos”, diz Natália ao Jornal da USP.

Além dela, o artigo Higher consumption of ultra-processed foods is related to cognitive decline in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil) tem como coautores Naomi Vidal Ferreira, Claudia Kimie Suemoto e Renata Bertazzi Levy, da Faculdade de Medicina da USP; Neha Khandpur, Euridice Martinez Steele, Dirce M. Marchioni, da Faculdade de Saúde Pública da USP; Paulo Andrade Lotufo e Isabela Judith Martins Bensenor, do Hospital Universitário da USP; Paulo Caramelli, da UFMG, e Sheila Maria Alvim de Matos, da UFBA.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: Claudia Suemoto, em cksuemoto@usp.br, Naomi Vidal Ferreira, em naomivferreira@gmail.com, e Natália Gonçalves, em natalia.g@fm.usp.br

Texto: Sebastião Moura
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Gordura no fígado: ácido úrico e frutose altos podem desencadear esteatose hepática não alcoólica

A frutose vinda de produtos ultraprocessados aumenta o risco de associação entre o ácido úrico e a doença. A pesquisa, realizada na Faculdade de Medicina, usou dados do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto, uma coorte (acompanhamento de longo prazo) em andamento no País.

Pesquisa desenvolvida pela Faculdade de Medicina (FMUSP) mostrou que há uma associação importante entre o aumento dos níveis de ácido úrico sérico e a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). A DHGNA é causada pelo acúmulo progressivo de gordura no fígado e não pelo consumo excessivo de álcool. Nos últimos anos, evidências clínicas sugerem que o ácido úrico elevado frequentemente está associado ao desenvolvimento ou progressão da DHGNA. Altos índices de ácido úrico podem levar ao desenvolvimento de resistência à insulina (RI).

Outro dado importante trazido pelo estudo mostra que o consumo elevado de frutose – vinda de produtos ultraprocessados – pode aumentar o risco de associação entre o ácido úrico e a DHGNA, tanto para homens quanto para mulheres.

Os resultados integram a tese de doutorado da nutricionista Clara Freiberg, defendida em janeiro de 2021. A partir desses achados, a pesquisadora sugere que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina.

Do total da amostra estudada (10.597 pessoas), a pesquisa encontrou uma prevalência de DHGNA de 38,5% (44,9% em homens e 34% em mulheres). Quando comparados a outros países, como Estados Unidos (34%), Índia (29%) e Coreia do Sul (26%), esse número parece bem elevado.

“Quando falamos de frutose estamos nos referindo àquela industrializada, presente em alimentos ultraprocessados, e não ao consumo da fruta propriamente dita”, esclarece Clara Freiberg, nutricionista autora do estudo.

A ingestão de frutose tem sido associada à progressão da doença devido ao seu potencial de aumentar os níveis de ácido úrico no sangue. Ela está presente em muitos produtos ultraprocessados na forma de xarope de milho enriquecido com frutose. Estudos estimam que a frutose tem sua absorção aumentada em quase 30% quando associada a soluções com esse tipo de carboidrato.

“Quando falamos de frutose estamos nos referindo àquela industrializada, presente em alimentos ultraprocessados, e não ao consumo da fruta propriamente dita”

Elsa-Brasil

Para realizar a pesquisa, a nutricionista utilizou os dados provenientes do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), uma coorte (acompanhamento de longo prazo) de servidores públicos de todo o Brasil, iniciada em 2008, e que conta com cerca 15 mil participantes, com idade entre 36 e 74 anos.

A amostra final para a pesquisa foi composta de 10.597 participantes (4.309 homens e 6.288 mulheres) que preencheram os critérios para diagnóstico de DHGNA (exames antropométricos, clínicos, bioquímicos e ultrassonografia, para avaliar a presença da doença).

Todos os participantes foram classificados em quintis dos níveis de ácido úrico sérico para a análise de todas as variáveis, sendo o primeiro quintil (Q1) referente aos valores mais baixos e o último quintil (Q5) aos valores mais elevados. Quintil é o termo usado para um conjunto de dados que é dividido em cinco partes iguais.

As análises mostraram que não houve diferença entre os quintis quanto à idade, etnia e renda. Participantes com maior nível de ácido úrico apresentaram menor nível de escolaridade e maior prevalência de IMC (índice de massa corporal, calculado pelo peso da pessoa dividido pela altura dela ao quadrado). Também apresentaram mais hipertensão, diabete, níveis de enzimas do fígado altos, eram inativos fisicamente e tinham esteatose hepática de leve a grave. Além disso, possuíam maior média de circunferência da cintura, de HOMA-IR (marcador de que avalia se o paciente tem resistência à insulina), de enzimas hepáticas, colesterol total, LDL e triglicerídeos.

A circunferência da cintura deve ser tratada com atenção porque a deposição de tecido adiposo, que é a gordura localizada no abdômen, está associada ao aumento da mortalidade geral. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a medida da cintura não ultrapasse 102 centímetros (cm) nos homens e 88 cm nas mulheres.

Quanto ao nível de ácido úrico, 965 mulheres (15%) e 1.122 homens (26%) eram hiperuricêmicos (níveis altos de ácido úrico). Verificou-se também que 45% dos homens e 34% das mulheres apresentaram algum nível de DHGNA. A prevalência da doença hepática tendeu a aumentar à medida que se elevavam os níveis de ácido úrico sérico.

Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

 

Não houve diferenças de idade, etnia e renda entre os homens com alto consumo de frutose quando comparados aos participantes normouricêmicos (com níveis normais de ácido úrico) e hiperuricêmicos.

As mulheres hiperuricêmicas com maior consumo de frutose têm chance aumentada de apresentar DHGNA. Para os homens, a chance de hiperuricêmicos com consumo elevado de frutose apresentarem a doença foi maior do que aqueles com consumo adequado de frutose. “Com esses resultados, acho importante que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina”, sugere Clara.

Ainda de acordo com a pesquisadora, os profissionais de saúde precisam ser mais claros ao orientar os pacientes sobre o controle do sal, do açúcar e da frutose, por exemplo. “As pessoas precisam entender que altos níveis de frutose nem sempre estão associados a um consumo excessivo de frutas.”

“Com esses resultados, acho importante que a investigação prática da função hepática deva fazer parte do protocolo dos exames de rotina”, sugere Clara. 

A doença

A doença hepática gordurosa não alcoólica vem se tornando uma das principais causas de doença hepática crônica no mundo. Sobrepeso, diabete, má nutrição, perda brusca de peso e sedentarismo estão entre os fatores de risco para o aparecimento da doença.

Há evidências de que a pressão alta, resistência à insulina, níveis elevados de colesterol e triglicérides estão diretamente associados ao excesso de gordura no fígado.

A patologia geralmente é assintomática e pode atingir um estágio avançado antes de ser diagnosticada. Desconforto no quadrante superior direito, fadiga e letargia foram relatados em até 50% dos pacientes mas, muitas vezes, a DHGNA é diagnosticada após a realização de exames de rotina.

Estudos mostram que, entre os pacientes com esteatose hepática simples, 12% a 40% desenvolverão NASH (forma mais avançada da doença hepática gordurosa não alcoólica) com fibrose precoce após oito a 13 anos. Desses, aproximadamente 15% desenvolverão cirrose e/ou evidência de descompensação hepática no mesmo período. Cerca de 7% das pessoas com cirrose compensada associada à DHGNA vão evoluir para câncer no fígado dentro de dez anos, enquanto 50% exigirão um transplante ou morrerão de causa relacionada ao fígado.

“Minha população estudada foi de adultos e idosos, mas seria importante avaliar o consumo de frutose em crianças e adolescentes”, explica. “A oferta de ultraprocessados é enorme para esse público. Na cantina da escola, por exemplo, refrigerante e água têm o mesmo preço.”

Foto: Reprodução/HCV-Trials

 

Jovens e adolescentes na mira

Clara contou ao Jornal da USP que o trabalho dela abriu várias outras possibilidades de estudo. “Minha população estudada foi de adultos e idosos, mas seria importante avaliar o consumo de frutose em crianças e adolescentes”, explica. “A oferta de ultraprocessados é enorme para esse público. Na cantina da escola, por exemplo, refrigerante e água têm o mesmo preço.”

Outro exemplo seria o acompanhamento mais próximo da dieta de alguns pacientes para verificar se há a mesma resposta clínica.

O Elsa-Brasil é um estudo iniciado em 2008, que investiga, na população brasileira, a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto, entre outras) e doenças associadas. São 15 mil participantes, de várias regiões do País, com idade entre 35 e 74 anos. No próximo mês de agosto eles serão novamente convocados para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para essas doenças – que são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: e-mail clara.freiberg@gmail.com, com Clara Freiberg.

Texto: Fabiana Mariz
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Pesquisadores do Elsa-Brasil vão estudar a relação entre equilíbrio e audição

A quarta onda do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) vai continuar com as avaliações por audiometria tonal, além de avaliar também as alterações de equilíbrio que podem estar relacionadas com quedas entre os idosos.

Envelhecimento, exposição a ruídos e doenças crônicas são alguns dos fatores que podem contribuir para perdas auditivas. Tentando entender quais desses fatores realmente têm um impacto na audição e de que forma isso acontece, pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) acompanham, desde 2009, voluntários do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

O Elsa-Brasil é um estudo de cunho epidemiológico que investiga na população brasileira a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto, entre outras) e algumas doenças associadas. Os participantes da pesquisa, cerca de 15 mil pessoas de várias regiões do País, com idade entre 35 e 74 anos, serão novamente convocados em agosto para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para estas doenças – que são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

“Estudos longitudinais da audição no Brasil não são feitos. Então, este é um estudo inédito e grande e temos vários parâmetros acompanhados no estudo Elsa, o que nos ajuda a fazer as análises”, conta ao Jornal da USP a professora Alessandra Samelli, líder do estudo relacionado à audição.

As avaliações já relacionam a perda auditiva a fatores como envelhecimento, doenças crônicas e declínio cognitivo. Agora, na quarta onda do estudo Elsa, em agosto, os pesquisadores vão estudar a relação entre alterações auditivas e equilíbrio.

“Sabemos que a cóclea, que faz parte do sistema auditivo, está ao lado do aparelho vestibular, que é um dos responsáveis pelo equilíbrio”, explica Alessandra sobre essa nova avaliação.

Com o envelhecimento, diversos sistemas são afetados e, para o equilíbrio ocorrer, há dependência de parte desses sistemas, como o vestibular e o visual. A análise da relação entre a audição e o equilíbrio pode ajudar a identificar se há uma associação entre esses fatores e descobrir possíveis falhas no equilíbrio do idoso, prevenindo possíveis acidentes. “Um problema muito grande nos idosos são as quedas e entender essa relação pode ser uma forma de evitá-las”, complementa.

Metodologias, resultados e expectativas

Para analisar a audição dos voluntários, é feito o exame de audiometria tonal. Nesse exame, as pessoas ficam em cabines acústicas isoladas e escutam sons de diferentes frequências. Assim, é possível identificar qual é o limiar auditivo de cada um — nível mínimo de pressão acústica necessário para provocar uma sensação auditiva. A partir disso, identifica-se o grau da perda auditiva e o seu tipo.

Também é feita uma anamnese padrão a fim de entender históricos de saúde e ocupacionais de cada participante e analisar possíveis influências nas alterações auditivas. O trabalho de uma pessoa, por exemplo, em um ambiente com ruídos, pode afetar a audição. Para entender outras influências, ainda são utilizados os resultados de pesquisas realizadas nas outras áreas do estudo Elsa-Brasil.

Foto: Reprodução/PxHere

Ao longo desses anos, não é possível afirmar definitivamente se a relação entre doenças crônicas e perdas auditivas existe, mas já se concluiu que o envelhecimento contribui para a perda auditiva. “O que a gente consegue dizer é que o efeito da idade sobre a audição é o mais evidente; por isso precisamos fazer esse acompanhamento audiológico durante o envelhecimento e fazer a intervenção o mais rapidamente possível”, diz a professora Alessandra.

A intervenção pode evitar possíveis consequências da perda auditiva, como declínio cognitivo, isolamento social e depressão. A expectativa com a nova onda é que a triagem do equilíbrio ajude a evitar outras consequências, como as quedas entre os idosos.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Autora: Bianca Camatta
Arte: Adrielly Kilryann e Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP