Novo teste de Alzheimer pode funcionar como auxiliar no diagnóstico da doença

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Segundo Vicente Forlenza, o teste seria usado em casos específicos para identificar, já através de um diagnóstico anterior, que pode haver Alzheimer ou que ela está em seu início

O Alzheimer é uma doença cerebral degenerativa que causa perda de memória e pode levar à morte. Nesse sentido, avanços em seu diagnóstico são necessários para tentar retardá-la com tratamentos, já que se trata de uma doença sem cura. Um novo teste de sangue foi criado e funciona de modo a reconhecer biomarcadores ligados à doença.

O professor Vicente Forlenza, do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina (FM) e do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas, ambos da USP, explicou ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição que esse novo teste “representa a possibilidade de, através de um exame de sangue, detectar algum elemento próprio da doença de Alzheimer, ou seja, indicando que o processo que causa a doença está presente”.

Porém, é necessário que a informação obtida, a partir de seu resultado, seja somada a um conjunto de outros dados laboratoriais para inferir se existe ou não a possibilidade de Alzheimer. Logo, não é recomendado fazer esse exame em pessoas assintomáticas e “para um rastreio sem outras informações”, o que é “uma conduta indevida”, ressalta Forlenza.

Micróglia humana (células em marrom), células de apoio ao sistema nervoso – Foto: Reprodução/Nature Neuroscience

Como pode ser usado o teste

O teste seria usado em casos específicos para identificar, já através de um diagnóstico anterior, que pode haver a doença ou que ela está no início. O especialista explica que a informação obtida a partir dos biomarcadores está no começo de ser incorporada ao diagnóstico avançado, pois ainda não se sabe seu comportamento nas diferentes populações. “Tudo isso ainda é desconhecido. Eu diria que é prematuro achar que é um teste que resolveu os nossos problemas. É importante, mas ele não pode trabalhar sozinho.”

O professor ressalta também que o único diagnóstico que detecta a presença do Alzheimer precisamente é feito após a morte, com a comprovação de lesões no cérebro — o chamado diagnóstico padrão ouro. “Em vida, clinicamente a gente consegue no máximo fazer uma formulação probabilística.”

FONTE: Jornal da USP

Rejuvenescimento de células se apresenta como alternativa para doenças do envelhecimento

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Para Rodrigo Calado, trata-se de aprender como cuidar melhor de alguns tecidos para retardar um pouco o processo de envelhecimento celular, lembrando que existem fatores ambientais e do próprio organismo que regulam o envelhecimento

Eestudo publicado no último mês de abril na revista científica eLife, cientistas de Cambridge, no Reino Unido, rejuvenesceram células de pele humana em 30 anos. A pesquisa ainda está em fase inicial de desenvolvimento, mas é vista como um caminho para o futuro científico. O professor Rodrigo Calado, especialista em Hematologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e membro do Centro de Terapia Celular da USP, examina o funcionamento da tecnologia.

De acordo com Calado, o princípio já existe desde a clonagem da ovelha Dolly, quando pesquisadores da Escócia conseguiram colocar um núcleo de uma célula madura da glândula mamária de uma ovelha dentro do citoplasma: “Eles retiraram o núcleo de um ovo recém-fecundado e naquela célula sem o núcleo introduziram o núcleo da célula bem madura. Com isso, eles conseguiram mostrar que o DNA desse núcleo da célula madura podia ‘voltar no tempo’, assumir as características de uma célula embrionária e dar origem de novo a um organismo inteiro”.

Cerca de uma década depois, o cientista japonês Shinya Yamanaka identificou que esse processo é o resultado da ação de, principalmente, quatro proteínas que atuam no controle do DNA, chamadas de fatores de transcrição. “Quando você introduz essas quatro proteínas no núcleo de qualquer célula virtualmente e expressa essas proteínas em grande quantidade, elas são capazes de reprogramar o DNA de uma célula, ou seja, do sangue, de uma célula da pele, de uma célula do coração, da glândula mamária, qualquer tipo de célula em um estado que nós chamamos de pluripotência — um estado embrionário em que essa célula é capaz de dar origem a qualquer tipo de célula”, conta o professor.

Esse processo é acompanhado de uma série de alterações nas células para que elas percam as cicatrizes acumuladas ao longo do tempo, essas cicatrizes são obrigatórias para que elas assumam características de determinada linhagem. Calado indica que “é mais ou menos como se passasse uma borracha nessas cicatrizes que ficam acumuladas no DNA. O que esse grupo fez foi entender melhor quais são esses marcadores que estão relacionados ao envelhecimento de alguma forma, que foram ‘apagados’ ou modificados por esse processo de reprogramação das células”.

Envelhecimento

Um dos objetivos finais da pesquisa é tratar e amenizar os efeitos de doenças relacionadas ao envelhecimento. Mas, de acordo com o professor, ainda é cedo para pensar em grandes impactos. “São duas coisas bastante distintas, a forma como a gente rejuvenesce uma célula da forma como a gente rejuvenesce um organismo como um todo. Uma coisa é você pegar uma célula, reprogramá-la e essa célula vai ficar em pluripotência, eu não consigo fazer isso com o seu organismo de uma forma geral.”

O envelhecimento está associado a processos celulares, mas não há como desconsiderar outros fatores, como o desenvolvimento hormonal e o acúmulo de cicatrizes e infecções. “Essas alterações inflamatórias não vão se reverter necessariamente com a inibição de alguns fatores de envelhecimento dentro da célula especificamente. […] “O que a gente pode aprender é como a gente pode cuidar melhor de alguns tecidos para retardar um pouco esse processo de envelhecimento celular, mas lembrando que existem outros fatores ambientais e outros fatores do próprio organismo que regulam o envelhecimento para além da célula”, aponta Calado.

Tecnologia em desenvolvimento

Apesar de estar em um estágio inicial, a tecnologia já possui funcionalidade na ciência. O professor comenta: “Tem sido muito útil já atualmente. Dentro do Centro de Terapia Celular, que é o Cepid-Fapesp, nós utilizamos essas células pluripotentes e induzidas para entender uma série de doenças, porque você pode produzir células em grandes quantidades e entender nas células o que está sendo alterado”.

Calado projeta os próximos passos da pesquisa, mesmo que a longo prazo. “De forma mais complexa, é a produção de órgãos. Se um paciente tem um defeito genético, você pode corrigir aquele defeito da célula no laboratório, depois produzir o órgão que está acometido e fazer um transplante de volta para colocar o órgão que teve a correção realizada. Isso é mais distante, obviamente, mas existem perspectivas, pelo menos em teoria. Isso já é feito em algumas instâncias, inclusive em modelos animais, como camundongos, mas, para humanos, ainda tem um tempo para acontecer”.

Texto: João Dall’ara
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

“Grazing”: o que o hábito de beliscar comida pode revelar sobre a nossa saúde mental?

O “grazing” é caracterizado por comer, ao longo do dia, quantidades pequenas, de modo repetitivo, não planejado, sem fome, com algum nível de sensação de perda de controle. Identificar esse comportamento pode ajudar a prevenir transtornos associados a problemas psicológicos e alimentares

A prática de beliscar comida de modo contínuo, ao longo do dia, mesmo sem fome, é conhecido como grazing. Identificar esse comportamento pode ajudar a prevenir transtornos associados a problemas psicológicos e alimentares. Essa é a conclusão do estudo de doutorado Comportamentos alimentares nos contextos comunitário e de sobrepeso e obesidade: compreensão e avaliação do Grazing, defendido na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, no mês de março, pela psicóloga Marília Consolini Teodoro, sob orientação da professora Carmem Beatriz Neufeld. A pesquisa mostra a importância do trabalho preventivo de regulação emocional para prevenir a manifestação desse tipo de comportamento, que está associado a problemas psicológicos e alimentares.

Marília explica que o grazing, tema pouco estudado no Brasil, é o nome dado a comer quantidades pequenas ou modestas de alimentos de maneira repetitiva e não planejada, sem ser em resposta à sensação de fome ou saciedade, com algum nível de sensação de perda de controle. Segundo a professora Carmem, “em um primeiro momento, não é necessariamente um comportamento problemático ou associado a uma psicopatologia”. Mas explica que pode gerar desdobramentos associados a “uma maior probabilidade de desenvolvimento de uma psicopatologia, de uma patologia do comportamento alimentar”.

Por isso, a identificação desse comportamento, aponta a pesquisadora, poderá proporcionar “novas investigações para intervenções mais direcionadas, principalmente na área dos problemas alimentares”. Assim como abordagens multifatoriais para tratar essas condições, que, “muitas vezes, não são consideradas um transtorno mental, mas estão extremamente relacionadas com condições psicológicas”, para que os pacientes sejam cuidados de forma integrativa e os resultados sejam mais efetivos.

O estudo colocou como hipótese o entendimento de que o grazing funciona como um mecanismo de regulação emocional para o alívio de ansiedade, por exemplo. Outros estudos já associaram o comportamento, principalmente, com a obesidade, a dificuldade de perder peso e outros tipos de transtornos alimentares e sintomas depressivos e ansiosos. “O peso está extremamente relacionado com condições psicológicas, assim como condições comportamentais, como é o caso desse comportamento em específico”, afirma Marília.

A pesquisadora investigou e avaliou a manifestação desse comportamento na população brasileira, com uma amostra comunitária de 542 pessoas, em que a maioria estava em nível de peso considerado normal, e uma amostra clínica de 281 pessoas, com participantes que apresentavam algum nível de obesidade. Marília conta que as amostras foram comparadas para “entender também se havia alguma diferença na manifestação desse comportamento”. Na amostra clínica, o grazing foi mais prejudicial, mas também se manifestou de forma significativa na amostra comunitária, o que indica “a relevância desse comportamento no Brasil”.

As pesquisadoras dividiram a manifestação desse comportamento em dois grupos: o grazing repetitivo, que ocorre de forma contínua, porém mais leve, menos prejudicial e menos associado à perda de controle; e o grazing compulsivo, mais associado à perda de controle e a sintomas psicológicos.

Outro resultado que chamou a atenção das pesquisadoras foi que o estresse apresentou uma variação do grazing compulsivo, mais associado à perda de controle. “Então a gente entende que o estresse parece ser uma variável que colabora, que está relacionada com a manifestação desse comportamento.”

Adaptação e validação de questionário

Para a pesquisa foi utilizado o Repeat Questionary (Rep(eat)-Q), ferramenta que investiga a relação do grazing com o Índice de Massa Corporal (IMC) e a psicopatologia. O IMC é um índice usado mundialmente para saber se uma pessoa está em seu peso ideal, dividindo o peso pela sua altura ao quadrado. O questionário foi adaptado e validado pelas pesquisadoras para a população brasileira, mediante etapas de avaliação e estudo piloto, até chegar à versão final adaptada como Questionário de Belisco Contínuo. Foi aplicado também um questionário sociodemográfico e um questionário de avaliação de sintomas ansiosos, depressivos e de estresse.

Ao todo, a pesquisa contou com quatro etapas. Na primeira, as pesquisadoras traçaram um panorama sobre a avaliação psicológica de transtornos alimentares e problemas alimentares associados, apresentando o conceito de grazing e os instrumentos disponíveis para a avaliação. A segunda foi uma revisão da literatura sobre o tema e as definições usadas, população estudada, prevalência e associações já encontradas sobre o comportamento, além das lacunas que ainda existem sobre a questão. Já a terceira foi a adaptação e validação do questionário para a população brasileira e, para finalizar,  a aplicação nas amostras comunitária e clínica, além de análises de comparação entre elas.

Ouça no player abaixo entrevista das pesquisadoras ao Jornal da USP no Ar, Edição Regional.

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Por Brenda Marchiori

FONTE: Jornal da USP

Estrôncio e osteoporose: qual o papel desse elemento químico na mineralização dos ossos?

Testes em modelos biomiméticos (que imitam o tecido real) mostraram que altas doses de estrôncio, elemento presente em fármaco descontinuado para tratamento da osteoporose, podem resultar em enfraquecimento dos ossos. Estudo foi ganhador do Prêmio Capes de Teses.

Pesquisa do Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP analisou a influência do elemento químico estrôncio, em sua forma iônica (Sr2+), na formação óssea utilizando modelos biomiméticos, ou seja, que imitam a estrutura e composição do tecido in vivo. O estudo, realizado pela pesquisadora Camila Tovani, mostrou que altas concentrações de estrôncio podem promover a desestabilização dos principais componentes ligados à formação dos ossos, o que explica o desenvolvimento de patologias associadas ao acúmulo deste elemento no tecido.

Os resultados parciais do estudo podem ser encontrados no texto Formation of stable strontium-rich amorphous calcium phosphate: Possible effects on bone mineral e em sua pesquisa de doutorado, que foi uma das ganhadoras do Prêmio Capes de Teses 2021.

De acordo com a pesquisadora, o ranelato de estrôncio era um fármaco amplamente prescrito para pacientes com osteoporose, doença caracterizada pela perda progressiva da massa óssea, e que inspirou o uso do elemento químico em diversos tratamentos da doença. O fármaco foi descontinuado devido a efeitos colaterais, como doenças cardiovasculares, relacionados à necessidade de administração em alta dosagem. Porém, o efeito dessa prescrição na estrutura da hidroxiapatita, mineral presente nos ossos, não havia sido investigado.

Ensaios in vitro levantavam suspeitas sobre uma possível influência negativa de altas concentrações de Sr2+ sobre a saúde dos ossos, o que levou a cientista a desenvolver um estudo, durante seu doutorado, sob orientação da professora Ana Paula Ramos, do Departamento de Química da FFCLRP, que investigasse qual o impacto real deste íon no tecido ósseo.

Questionada sobre os impactos da descoberta, Tovani espera que novos fármacos contendo estrôncio, que resultem em efeitos positivos sobre o tecido ósseo em baixa dosagem, possam ser desenvolvidos. Este íon pode auxiliar na regulagem de células importantes para manutenção da estrutura óssea e não deve ser descartado como possibilidade de terapia.

“Nosso principal objetivo era investigar os diferentes impactos do estrôncio utilizando modelos sintetizados em laboratório que imitassem a fase orgânica (colágeno) e inorgânica (apatita) do tecido ósseo, em termos de estrutura e composição. A fase orgânica, formada principalmente por fibras de colágeno, e a fase mineral, composta de nanopartículas de fosfato de cálcio, que têm propriedades específicas e difíceis de serem reproduzidas artificialmente”, diz a pesquisadora. O uso desses modelos é útil na previsão de possíveis efeitos in vivo, minimizando o uso de animais nas pesquisas.

“O modelo biomimético desenvolvido por nós, em Ribeirão Preto, e em parceria com a pesquisadora Nadine Nassif, da Universidade Sorbonne, na França, pode ser usado para investigar o efeito de outros elementos químicos, auxiliando no estudo de diversas doenças que atingem o tecido ósseo”, comenta a especialista.

Atualmente, ela realiza pós-doutorado na Universidade Sorbonne, onde desenvolve pesquisas avançadas sobre a mineralização óssea. “A osteoporose é uma das doenças que mais afetam a população idosa, e trazer a discussão sobre a dose dos remédios administrados e as condições de cada paciente é importante para melhorar a qualidade de vida dessas pessoas”, conclui.

Mais informações: e-mail anapr@ffclrp.usp.br, com Ana Paula Ramos, e e-mail bussola.camila@gmail.com, com Camila Tovani

Texto: Gabriel Gama Teixeira
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Pesquisadores do Elsa-Brasil vão estudar a relação entre equilíbrio e audição

A quarta onda do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) vai continuar com as avaliações por audiometria tonal, além de avaliar também as alterações de equilíbrio que podem estar relacionadas com quedas entre os idosos.

Envelhecimento, exposição a ruídos e doenças crônicas são alguns dos fatores que podem contribuir para perdas auditivas. Tentando entender quais desses fatores realmente têm um impacto na audição e de que forma isso acontece, pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) acompanham, desde 2009, voluntários do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

O Elsa-Brasil é um estudo de cunho epidemiológico que investiga na população brasileira a incidência e fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto, entre outras) e algumas doenças associadas. Os participantes da pesquisa, cerca de 15 mil pessoas de várias regiões do País, com idade entre 35 e 74 anos, serão novamente convocados em agosto para entrevistas e exames que identifiquem uma possível evolução dos fatores de risco para estas doenças – que são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

“Estudos longitudinais da audição no Brasil não são feitos. Então, este é um estudo inédito e grande e temos vários parâmetros acompanhados no estudo Elsa, o que nos ajuda a fazer as análises”, conta ao Jornal da USP a professora Alessandra Samelli, líder do estudo relacionado à audição.

As avaliações já relacionam a perda auditiva a fatores como envelhecimento, doenças crônicas e declínio cognitivo. Agora, na quarta onda do estudo Elsa, em agosto, os pesquisadores vão estudar a relação entre alterações auditivas e equilíbrio.

“Sabemos que a cóclea, que faz parte do sistema auditivo, está ao lado do aparelho vestibular, que é um dos responsáveis pelo equilíbrio”, explica Alessandra sobre essa nova avaliação.

Com o envelhecimento, diversos sistemas são afetados e, para o equilíbrio ocorrer, há dependência de parte desses sistemas, como o vestibular e o visual. A análise da relação entre a audição e o equilíbrio pode ajudar a identificar se há uma associação entre esses fatores e descobrir possíveis falhas no equilíbrio do idoso, prevenindo possíveis acidentes. “Um problema muito grande nos idosos são as quedas e entender essa relação pode ser uma forma de evitá-las”, complementa.

Metodologias, resultados e expectativas

Para analisar a audição dos voluntários, é feito o exame de audiometria tonal. Nesse exame, as pessoas ficam em cabines acústicas isoladas e escutam sons de diferentes frequências. Assim, é possível identificar qual é o limiar auditivo de cada um — nível mínimo de pressão acústica necessário para provocar uma sensação auditiva. A partir disso, identifica-se o grau da perda auditiva e o seu tipo.

Também é feita uma anamnese padrão a fim de entender históricos de saúde e ocupacionais de cada participante e analisar possíveis influências nas alterações auditivas. O trabalho de uma pessoa, por exemplo, em um ambiente com ruídos, pode afetar a audição. Para entender outras influências, ainda são utilizados os resultados de pesquisas realizadas nas outras áreas do estudo Elsa-Brasil.

Foto: Reprodução/PxHere

Ao longo desses anos, não é possível afirmar definitivamente se a relação entre doenças crônicas e perdas auditivas existe, mas já se concluiu que o envelhecimento contribui para a perda auditiva. “O que a gente consegue dizer é que o efeito da idade sobre a audição é o mais evidente; por isso precisamos fazer esse acompanhamento audiológico durante o envelhecimento e fazer a intervenção o mais rapidamente possível”, diz a professora Alessandra.

A intervenção pode evitar possíveis consequências da perda auditiva, como declínio cognitivo, isolamento social e depressão. A expectativa com a nova onda é que a triagem do equilíbrio ajude a evitar outras consequências, como as quedas entre os idosos.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Autora: Bianca Camatta
Arte: Adrielly Kilryann e Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Novo medicamento combinado com quimioterapia pode melhorar a sobrevida de pessoas com leucemia mieloide aguda

Pesquisadores avaliaram o benefício do ivosidenibe combinado à quimioterapia. O estudo internacional contou com pesquisadores de várias regiões do mundo e os resultados foram publicados no The New England Journal of Medicine.

As possibilidades de tratamento para pacientes mais velhos, com mais de 60 anos, com leucemia mieloide aguda (LMA) são restritas. Em busca de aumentar e melhorar a qualidade de vida das pessoas que convivem com esse câncer, pesquisadores de várias regiões do mundo, incluindo o Brasil, avaliaram o benefício de um novo medicamento, ivosidenibe, e os resultados promissores na sobrevida foram publicados no artigo Ivosidenib and Azacitidine in IDH1-Mutated Acute Myeloid Leukemia no The New England Journal of Medicine, em abril.

A LMA pode ser explicada por diversas mutações genéticas nas células-tronco que provocam queda nas células saudáveis, causando anemia, sangramentos e infecções. “A doença é um câncer do sangue e da medula óssea potencialmente grave e uma parcela de cerca de 10% dos casos tem mutação no gene IDH1, que serve como alvo para o ivosidenibe, afetando diretamente as células da leucemia. Foi o que usamos na pesquisa”, explica Rodrigo Calado, médico hematologista, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e um dos autores do estudo.

Os cientistas recrutaram 146 pacientes com diagnóstico de LMA com mutação no gene IDH1 e que eram inelegíveis para a quimioterapia convencional, que é a primeira fase do tratamento e busca eliminar no sangue e reduzir na medula óssea as células da leucemia. Os voluntários foram divididos aleatoriamente em dois grupos sendo um deles controle, que recebeu placebo e quimioterapia, e o outro que recebeu o ivosidenibe e a quimioterapia.

“A terapia combinada com ivosidenibe e quimioterapia foi associada a eventos adversos semelhantes aos atribuídos ao tratamento padrão e foi eficaz em prolongar a sobrevida livre de complicações, aumentando a probabilidade de remissão completa e prolongando a sobrevida global entre pacientes do estudo”, explica o professor.

Ainda, de acordo com Calado, o estudo mostra que o uso do medicamento pode ser expandido para outros casos com mutações em genes específicos. “A pesquisa também sugere que outros tipos de câncer com mutação no IDH1 também possam se beneficiar desse tratamento”, conclui.

O estudo foi coordenado pelo hematologista Pau Montesinos e contou com pesquisadores da Espanha, França, Polônia, China, Itália, Brasil, Canadá e Estados Unidos.

Mais informações: rtcalado@fmrp.usp.br

Autor: Giovanna Grepi
Arte: Ana Júlia Maciel

FONTE: Jornal da USP

Encontrada em alimentos, a zeaxantina é antioxidante que fortalece o sistema imune

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A zeaxantina é um antioxidante que defende o corpo contra os radicais livres. É um carotenoide muito parecido com a luteína, e pode ser encontrada em vegetais verde-escuros, legumes vermelhos e amarelos.

Fator de proteção

Ela é essencial ao organismo, mas como este não é capaz de sintetizá-la, pode ser obtida através da ingestão de alimentos como milho, espinafre, couve, alface, brócolis, ervilhas e ovo, por exemplo.

A médica da Faculdade de Saúde Pública da USP  e nutricionista clínica Karin Klack, responsável pela Divisão de Nutrição e Dietética do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, explica que essa substância apresenta inúmeros benefícios  à saúde, como a prevenção do envelhecimento precoce e a proteção da visão, pois é capaz de proteger os olhos contra os raios UV emitidos pelo sol, funcionando como se fosse “óculos escuros”.

Além do sol, protege contra a luz azul de computadores, telas de celulares, tablets e TVs. A zeaxantina pode evitar também várias doenças na retina como catarata, retinopatia diabética e degeneração macular.

Karin Klack deixa um alerta para quem consome o anticoagulante varfarina sódica, pois nesse caso a ingestão precisa ser feita de forma moderada. Além disso, a substância é mais bem absorvida na gordura, por isso, adicionar um pouco de azeite ou óleo pode aumentar a absorção pelo corpo.

Por Sandra Capomaccio

FONTE: Jornal da USP

Parkinson: tratamento do congelamento da marcha vai além do uso de medicamentos

Pesquisa realizada na Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP indica que o uso apenas de medicamentos não é suficiente para reduzir um dos sintomas mais incapacitantes da doença de Parkinson: o congelamento da marcha. O estudo, de autoria da pesquisadora Julia Ávila de Oliveira, verificou que o levodopa, medicamento utilizado para tratamento da doença e sintomas associados, não atenuou diferenças motoras entre pessoas com e sem congelamento. O estudo foi orientado pelo professor Luís Augusto Teixeira, do Laboratório de Sistemas Motores Humanos da EEFE.

O Parkinson é uma doença neurológica que afeta funções motoras. Um dos sintomas é o congelamento da marcha, caracterizado pela incapacidade momentânea de andar, como se a pessoa estivesse com os pés presos ao chão, não conseguindo propulsionar o seu corpo na direção para a qual deseja se movimentar. A levodopa age no aumento da quantidade de dopamina no corpo, um tipo de neurotransmissor responsável pela comunicação entre os neurônios, e controle dos movimentos do corpo e coordenação motora.

O objetivo da pesquisa foi verificar o quanto a medicação levodopa poderia afetar nos diferentes parâmetros do andar de pessoas com a doença de Parkinson. Foram selecionados 22 pacientes, divididos em dois grupos: um apresentava o congelamento e o outro não, sendo que todos os pacientes faziam uso do remédio de forma contínua. A pesquisadora explica que a levodopa induz a um efeito agudo de melhora motora. Esse efeito é dependente da concentração da substância no organismo e dura algumas horas. Por isso, os pacientes precisam tomar mais de uma dose da medicação por dia.O professor Teixeira explica que outros estudos realizados na própria EEFE já vinham demonstrando que protocolos de exercícios contendo outras atividades motoras, como caminhada com ultrapassagem de obstáculos, giros, mudanças de direção, passagem por locais com limitações de espaço (batente de porta, por exemplo), podem ser mais eficazes no tratamento de pacientes que apresentam congelamento da marcha.

A marcha dos pacientes foi avaliada por meio de um equipamento denominado Zebris, uma esteira capaz de medir a pressão exercida sobre ela. O Sistema Zebris calcula automaticamente os parâmetros da marcha a partir da pressão exercida pelos pés durante uma breve caminhada. Dessa forma, são obtidas informações como velocidade da marcha, cadência (quantidade de passos por minuto), comprimento médio, largura e tempo de duração do passo, e comprimento e tempo de duração da passada.

Os voluntários realizaram esse teste em duas situações: sob efeito da medicação, cerca de uma hora após a ingestão, e sem o efeito da medicação, cerca de 12 horas após a última dose. Em cada teste, eles realizaram dez tentativas em uma velocidade confortável determinada pelos próprios pacientes. Foram também aplicados questionários para a avaliação do estágio da doença, da severidade dos sintomas motores, do equilíbrio e das funções cognitivas, além do levantamento de informações sobre dosagem utilizada da medicação e há quanto tempo receberam o diagnóstico da doença.

Em ambos os estados, medicado e não medicado, o grupo com o congelamento da marcha apresentou menor comprimento do passo, da passada e menor velocidade da marcha, comparado ao grupo sem o sintoma. Isso indicou um maior comprometimento no primeiro grupo, independentemente se tomou ou não a medicação. Essa diferença entre os dois grupos não foi atenuada com o uso do medicamento, pois no estado medicado ambos apresentaram uma melhora equivalente sobre os sintomas.

A fim de saber mais sobre essas possibilidades, ideias de continuação da pesquisa já foram colocadas para discussão, o que implica desde novos modelos de análise estatística, comparação entre tarefas motoras diferentes e treinamentos físicos que podem servir como intervenção para a melhora da marcha.Segundo Júlia Ávila, é possível concluir, a partir dos resultados do estudo, “que apenas a medicação não é capaz de atenuar as diferenças motoras do padrão da marcha de pessoas com e sem congelamento, sendo necessárias outras intervenções não-farmacológicas para esse fim”. Além disso, “as diferenças clínicas entre os pacientes com e sem congelamento da marcha não interferem na análise do efeito da medicação”. Com isso, a pesquisa amplia as possibilidades de intervenções para que ocorra a melhora da condição.

O trabalho, realizado em parceria com a Universidade Federal do ABC, integrou a dissertação de mestrado Efeito da medicação antiparkinsoniana nos parâmetros espaço-temporais da marcha de indivíduos com doença de Parkinson: comparação entre indivíduos com e sem congelamento da marcha, apresentada em fevereiro de 2022.

Texto: serviço de comunicação da EEFE

Mais informações: e-mail comunicaeefe@usp.br, na EEFE

FONTE: Jornal da USP

Membrana amniótica pode ser utilizada para recuperação de tecidos e acelerar cicatrização

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Tecnologia envolvendo a membrana amniótica, uma camada da placenta, foi liberada no Brasil no final de 2021 e é eficiente no tratamento de queimaduras e feridas. Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª edição,  André Paggiaro, diretor do Banco de Tecidos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, examina a aplicação da técnica e os seus resultados.

Ele indica que “a membrana amniótica já é utilizada internacionalmente há bastante tempo, ela foi liberada para uso no Brasil pelo Conselho Federal de Medicina no final do ano passado. No banco de tecidos do HC (Hospital das Clínicas da USP), a gente já vinha usando e até hoje vem utilizando como um projeto de pesquisa. Apesar de estar liberada pelo Conselho Federal de Medicina, ela ainda não é completamente regulamentada pelo Sistema Nacional de Transplante”.

A membrana amniótica é a camada mais interna da placenta. “É uma camada bem fininha, que produz o líquido amniótico, esse líquido tem muitos fatores de crescimento que estimulam a cicatrização, melhoram a cicatrização e fazem com que as cicatrizes praticamente desapareçam. Essa membrana é muito rica nesses fatores, por isso se descobriu que, quando ela for utilizada para tratamento de feridas ou de queimaduras, pode estimular com que essa cicatrização aconteça mais rapidamente”, comenta Paggiaro.

Para que a membrana amniótica seja utilizada em pesquisas e tratamentos, é necessária a autorização. Antes do parto, a doadora é selecionada e passa por uma bateria de exames que buscam identificar a presença de doenças infectocontagiosas. O médico aponta: “Depois de assegurado que a paciente não tem essas doenças e que não vai trazer risco para o receptor, uma enfermeira realiza toda essa triagem, conversa com a mãe e solicita autorização para ver se ela concorda ou não em doar a sua membrana amniótica.”

O processo de retirada da placenta é chamado de dequitação e acontece logo após o parto. Ela é removida e, a partir de um processo manual, a membrana amniótica é extraída pelos médicos. Após o procedimento, a membrana é levada para o banco de tecidos para ser preparada.

Aplicação da tecnologia

De acordo com Paggiaro, a membrana amniótica é especialmente interessante para queimaduras de segundo grau que tenham a destruição de toda a epiderme e de parte da derme: “Essa membrana vai estimular a cicatrização dessa ferida e estimular que as próprias células do indivíduo se multipliquem, se reproduzam e tenham a formação de uma nova pele. Ela também pode ser utilizada para aqueles pacientes que têm feridas crônicas, uma ferida crônica provocada pelo diabete, provocada por úlceras venosas ou de outras causas.”

Muitas vezes as feridas ficam estagnadas e não cicatrizam. “A membrana amniótica vai funcionar como um choque quando você aplica no leito. Ela vai liberar uma série de fatores inflamatórios e esses fatores inflamatórios vão agir na ferida, reduzir a inflamação local e os fatores de crescimento vão chamar novas células que vão estimular o processo de cicatrização. Ela vai servir principalmente para queimaduras de segundo grau e feridas crônicas”, ressalta Paggiaro.

Os resultados da técnica mostraram-se surpreendentes. Paggiaro relata: “A gente aplicou, por exemplo, em uma paciente na semana passada, com uma queimadura de segundo grau em face, e em cinco, seis dias, ela já tinha a ferida completamente restaurada, coisa que demoraria dez dias para ter. Então, estamos bem animados com essa nova tecnologia e esperamos que em breve consigamos disponibilizá-la de forma mais abrangente para todo o País.”

FONTE: Jornal da USP

Pessoas que não sentem dor podem ser a chave para novos analgésicos

Análise de mutações genéticas em pessoas insensíveis à dor leva à descoberta de novo alvo para analgésicos. Estudo conduzido por pesquisadores do Instituto de Química e do Instituto de Ciências Biomédicas da USP foi capa da revista Science Signaling. Com base nessa ideia, pesquisadores liderados pela professora Deborah Schechtman, do departamento de Bioquímica do Instituto de Química (IQ) da USP, analisaram mutações genéticas em pacientes com insensibilidade congênita à dor com anidrose (CIPA) e identificaram proteínas modificadas que impedem a transmissão do impulso doloroso. A partir dos dados obtidos, eles desenvolveram um peptídeo, o TAT-pQYP, que apresentou efeito analgésico em um modelo animal de dor inflamatória. Os resultados foram publicados como matéria de capa da revista Science Signaling.

“Pessoas que têm mutações no receptor do fator de crescimento neural (NGF) não sentem dor. Fizemos um estudo detalhado das mutações descritas na literatura para essa doença e modelamos os efeitos das diferentes mutações encontradas em pacientes. Ao entender o que acontece com pessoas que não sentem dor, podemos mimetizar essa situação para tratar quem sente dor e também tentar uma inibição mais específica para algum processo, evitando efeitos colaterais,” afirma a professora Débora Schechtman.

Especialista em dor e coautora do estudo, a professora Camila Squarzoni Dale, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, explica que “os analgésicos usados hoje para dor crônica são moduladores da neurotransmissão, no caso dos antidepressivos e dos anticonvulsivantes, ou moduladores da resposta inflamatória, no caso dos anti-inflamatórios. Nosso peptídeo é diferente, ele modula diretamente uma via de dor. Nossa intenção é modificar como o cérebro interpreta a dor, modificando como os impulsos dolorosos vão entrar no sistema nervoso”.

Cerca de 10% da população adulta mundial é portadora de dor crônica. Nos Estados Unidos, para cerca de 7% das pessoas a dor crônica é incapacitante. “O que é impactante é que esses números superam o total de diabéticos ou de pessoas com doenças cardíacas ou mesmo de pessoas com câncer”, afirma a pesquisadora. A dor crônica já é um problema de saúde pública, tornando a busca por novos analgésicos cada vez mais urgente. Em pacientes com dores crônicas, a modificação e deterioração das vias nociceptivas, que transmitem os estímulos dolorosos, faz com que os remédios muitas vezes não funcionem adequadamente, ou ainda percam efeito com o tempo. Além disso, alguns países têm enfrentado a chamada epidemia de opioides, que já levou a mais de 500 mil mortes por overdose nos últimos 20 anos só nos Estados Unidos. Embora analgésicos opioides sejam indicados principalmente para alivio de dor aguda, como a dor pós-operatória, eles podem causar vício e têm efeitos colaterais.

Caminhos da dor

A insensibilidade congênita à dor com anidrose (CIPA) é uma doença autossômica recessiva rara que tem como principais sintomas a falta de percepção da dor sensorial e a incapacidade de suar. Como a dor física tem função protetora, sendo fundamental para nossa sobrevivência, é comum que pessoas com essa doença morram na infância, por lesões ou doenças não percebidas.

Como explica Déborah, pacientes com CIPA têm mutações no gene NTRK1, que codifica o receptor de tropomiosina quinase (TrkA), afetando a expressão e/ou atividade desse receptor. Um dos principais fatores que levam à doença é a perda de função do TrkA, que é ativado pelo fator de crescimento neural (NGF). A dor inflamatória se inicia com a liberação do NGF, que ativa o TrkA nos neurônios sensoriais periféricos, seguida da despolarização neuronal, atingindo o Sistema Nervoso Central (SNC).

Níveis de NGF elevados são encontrados em diversas condições de dor, como artrite reumatóide, endometriose e dores de cabeça crônicas. Anticorpos bloqueadores de NGF têm sido usados para tratar a dor da osteoartrite em humanos, mas eles apresentam efeitos colaterais como osteonecrose, que é a morte de um segmento de osso. Segundo os pesquisadores, isso pode acontecer devido à inibição da remodelação óssea, uma vez que a sinalização de NGF é necessária para o ‘brotamento’ (sprouting) e sobrevivência de fibras nervosas simpáticas durante a formação óssea. Igualmente, foram desenvolvidos inibidores do domínio quinase do receptor TrkA, mas, por não serem seletivos, também apresentam efeitos colaterais. “Se você inibe completamente a atividade de quinase, você também vai impedir o crescimento dos neuritos e o remodelamento dos neurônios”, explica Deborah.

As mutações ligadas à CIPA estão espalhadas pelo gene, resultando em sintomas variados da doença. A maior parte delas, no entanto, está concentrada no domínio de quinase. Para obter informações sobre o impacto na função da proteína e na sinalização, os pesquisadores mapearam as alterações moleculares causadas pelas mutações numa estrutura em 3D do TrkA. Com esse estudo de modelagem molecular, realizado em parceria com o grupo do professor Paulo de Oliveira, do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), e análise bioquímica, realizada pelo grupo de Deborah, eles identificaram mutações que diminuem a interação entre o receptor TrkA e um de seus substratos, a fosfolipase C gama (PLC). Esta fosfolipase está envolvida na ativação de canais iônicos, que são como condutores elétricos na membrana celular, possibilitando a comunicação no sistema neural.

A partir dos dados obtidos, eles desenharam um peptídeo permeável à célula, baseado na região de ancoragem da fosfolipase C no receptor TrkA. O peptídeo foi testado em células, nas quais inibiu a ligação entre TrkA e PLC e reduziu a ativação de PLC mediada pelo fator de crescimento neural (NGF). O passo seguinte foi testar em um modelo animal de dor inflamatória para confirmar o papel da PLC na sinalização celular da dor e a eficácia do peptídeo. “Vimos que o peptídio reverte a dor nos animais provocada por estímulos mecânicos e térmicos, por um período prolongado. Temos um peptídeo que modula uma das vias mediada pelo NGF e pode funcionar para dor tanto aguda quanto crônica”, disse Dale.

O peptídeo potencialmente terá menos efeitos colaterais. “Mostramos que o peptídeo inibe a fosforilação da fosfolipase C, mas não inibe toda a sinalização mediada pelo NGF. Dessa maneira, ele inibe pontualmente uma via da dor”, afirmou Deborah, acrescentando que “o peptídeo pode ser um lead para um fármaco. Um bom alvo de droga pode modular a atividade enzimática ou uma interação proteína-proteína, como é o nosso caso”. Os pesquisadores agora estão trabalhando para resolver a estrutura do complexo TrkA/PLC.

Outro objetivo é encontrar a melhor formulação terapêutica do peptídeo. “Nossa intenção é dividir esse trabalho com a indústria farmacêutica, para podermos desenvolver um produto. Como ele é uma molécula pequena, acreditamos que possa ser usado em formulações como pomadas, em apresentações tópicas, para ser absorvido pela pele. Achamos que ele vai ter uma eficácia diferenciada em termos de efeito para a dor”, conclui Dale.

O estudo contou com colaboradores das áreas de modelagem molecular, biologia celular e experts em dor e foi realizado no âmbito de um Projeto Temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O artigo Structural analysis of TrkA mutations in patients with congenital insensitivity to pain reveals PLCγ as an analgesic drug target pode ser lido aqui.

Texto: da assessoria de comunicação do ICB

FONTE: Jornal da USP