Endometriose: entenda o que é e qual o tratamento

A endometriose, doença que acomete 6,5 milhões de mulheres no Brasil, ganhou repercussão nos últimos dias depois que a cantora Anitta revelou ter recebido um diagnóstico e que passará por cirurgia. O dado sobre a ocorrência entre brasileiras faz parte de um levantamento feito em 2020 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). No mundo, são 176 milhões de casos.

Ao se manifestar em uma rede social, a artista disse querer que mais pessoas falem sobre o tema e que mulheres recebam o apoio necessário. “[Que] Mulheres que precisam da saúde pública possam ter mais recursos e melhorias de vida. E também para que as mulheres que trabalham tenham direitos no sentido de não serem obrigadas a trabalhar em condições de tremenda dor simplesmente pelo fato de que a doença não é entendida”, escreveu.

O ginecologista e obstetra Mario Martinez, conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), descreve a endometriose como o fenômeno em que o tecido interno do útero, chamado endométrio, fica fora da cavidade uterina. O crescimento desse tecido pode atingir regiões como o “ligamento uterossacro, septo reto-vaginal, pode caminhar em direção ao intestino e, às vezes, também pegar a parte anterior do útero, atingindo a bexiga”.

Dores fortes em cólica no período menstrual (dismenorreia), até mesmo com dores incapacitantes, são alguns dos sintomas mais comuns. Também são comuns dores nas relações sexuais (dispareunia). “Pode levar ainda a quadros de infertilidade feminina. A mulher não consegue engravidar porque, quando ela tem endometriose profunda no compartimento posterior do útero, leva a fatores peritoneais que provocam uma falha de implantação do embrião no endométrio”, acrescenta Martinez.

O médico defende que a doença seja sempre investigada quando relatos como este chegarem aos consultórios. “Se não for, você vai tratar como cólica menstrual, mas se ela relata cólica, na minha opinião, já merece uma investigação. Se você não pensar em endometriose, você não faz diagnóstico, uma vez que o ultrassom comum não pega”, explica. Segundo Martinez, isso ocorre porque a endometriose é uma lesão plana. Os exames para o diagnóstico são ultrassom transvaginal com preparo intestinal ou ressonância magnética.

Uma parte do tratamento envolve o bloqueio hormonal dos ovários, fazendo com que a mulher pare de menstruar. “Quando você tira o fator de produção de hormônio da mulher, que seria estrogênio, com medicações antiestrogênicas, você acaba fazendo com que a endometriose diminua e, às vezes, até suma, em algumas situações”, aponta.

Se a doença estiver muito avançada, o tratamento é inicialmente cirúrgico e depois hormonal. “Você faz a cirurgia de retirada dos tecidos endometrióticos e depois promove um bloqueio para que não retorne. A doença pode se tornar crônica, então se você não bloqueia ela pode voltar.”

“Pesquisem, galera. A endometriose é muito comum entre as mulheres. Tem vários efeitos colaterais, em cada corpo de um jeito. Podem se estender até a bexiga e causar dores terríveis ao urinar. Existem vários tratamentos. O meu terá que ser cirurgia”, aconselhou Anitta no Twitter.

Fonte: Agência Brasil

Prevenção é arma contra insuficiência cardíaca

A insuficiência cardíaca é uma síndrome clínica que se caracteriza pelo enfraquecimento do coração ou por uma dificuldade do coração se encher. “Isso gera aumento das pressões no sangue, na circulação do pulmão ou, eventualmente, do lado direito do coração, na veia”, disse à Agência Brasil o cardiologista Edimar Bocchi.

O médico é chefe da Unidade de Insuficiência Cardíaca do Instituto do Coração (Incor), em São Paulo, e membro da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), onde foi fundador do Departamento de Insuficiência Cardíaca.

O especialista afirmou que o coração fica fraco ou se torna mais rígido, necessitando de um aumento de pressão. Nas duas circunstâncias, isso leva a uma série de sintomas. Como há um aumento de pressão no pulmão, na circulação pulmonar, a pessoa tem falta de ar, cansaço. E como isso pode levar também a pressões do lado direito do coração, o paciente pode ter inchaço nas pernas, na barriga, ficar com o organismo todo inchado. O inchaço geral é provocado por uma retenção de água e de líquidos pelo rim..

Como o coração fica mais fraco ou mais duro, ele perde a capacidade de jogar sangue para a frente, com os nutrientes dos quais as células do corpo dependem. Então, o coração provoca uma falta de nutrientes no organismo todo e, às vezes, a pressão pode cair, por causa disso. “Tem uma série de consequências devido ao enfraquecimento do coração ou à dificuldade de o coração se encher”.

Hoje (9), se comemora o Dia Nacional de Alerta contra a Insuficiência Cardíaca.

Frequência

A doença ou síndrome é silenciosa e perigosa e relativamente frequente na população. Ela acomete 2% da população mundial, cerca de 26 milhões de pessoas, e vai aumentando conforme a idade. A tendência é que esse número cresça aproximadamente 25%, até 2030.

No Brasil, a estimativa é que a doença acomete um percentual maior de pessoas, devido à Doença de Chagas e à falta de acesso ao tratamento médico adequado. Por isso, Bocchi advertiu que, no Brasil, há maior comprometimento.

No país, a insuficiência cardíaca apresenta outro fator importante. Ela está relacionada a hospitalizações frequentes, em razão da falta de ar. “Hoje, a insuficiência cardíaca é a principal causa de hospitalização por doença cardiocirculatória. É muito mais frequente a hospitalização por insuficiência cardíaca do que por infarto, por pressão alta”.

Além disso, a insuficiência cardíaca apresenta elevado risco de óbito, “uma alta mortalidade”. Cerca de 50% dos pacientes morrem em torno de cinco anos. “É o estágio final de todas as doenças do coração. A pessoa teve um infarto, compromete o coração, o coração vai enfraquecendo progressivamente, ele pode ter outros infartos que vão piorando ainda mais. A pessoa pode ter Doença de Chagas, que enfraquece o coração também de forma progressiva e o paciente vai evoluindo para hospitalização e óbito.”

Hipertensão

Edimar Bocchi informou também que a hipertensão, como fator de risco, pode levar a comprometimento do coração pelo próprio desenvolvimento de cardiopatia, uma sobrecarga do coração crônica, e ocasionar o infarto. Destacou ainda que o diabetes é importante porque pode levar a um risco maior de infarto e, em menor incidência, à miocardiopatia.

Normalmente, na medida em que a idade vai evoluindo, aumenta a incidência de insuficiência cardíaca. “Quando mais velho, a incidência é maior”. Cerca de 15% dos pacientes idosos chegam a ter insuficiência cardíaca. Após os 70 ou 75 anos, a incidência é muito alta. “À medida que vai passando a idade, vai aumentando a incidência e a prevalência. No Brasil, como o acesso à saúde e aos cuidados médicos é mais limitado, é esperado ter insuficiência cardíaca em pacientes mais jovens, em idade mais precoce, com 55 anos”.

Campanha

A Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro (Socerj) está engajada na campanha de alerta contra a insuficiência cardíaca, promovida pela SBC. “Porque, quando a doença é reconhecida mais precocemente, ela pode ser tratada mais rapidamente. Hoje, com tratamento, 30% dos pacientes podem reverter (a doença) ou melhorar a insuficiência cardíaca. Quanto mais precoce o tratamento, melhor. Este é um aspecto importante”, destacou Edimar Bocchi.

A campanha tem dois objetivos principais. O primeiro é a prevenção, para evitar que a pessoa desenvolva os fatores de risco. “Tem que tratar a hipertensão, o diabetes, não fumar, tratar o colesterol alto, para evitar que tenha o infarto”. O outro objetivo é fazer um diagnóstico precoce.

O médico afirmou que, com um diagnóstico precoce, se consegue efetuar um tratamento em fase mais inicial, evitando que a pessoa evolua na insuficiência cardíaca, cuja mortalidade é muito alta. Bocchi informou que a mortalidade por insuficiência cardíaca é maior do que muitos cânceres não tratados. “É um problema de saúde. As pessoas desconhecem isso. Só tem um tipo de câncer que mata mais do que insuficiência cardíaca. É o câncer de pulmão. Por isso, é importante esse alerta”, afirmou.

Prevenção

À Agência Brasil, a chefe do Departamento de Insuficiência Cardíaca da Socerj, Jacqueline Sampaio, reiterou que essa é uma doença grave, com mortalidade muito alta e uma incapacidade funcional importante. “Está no rol das cardiopatias graves. Então, prevenir é muito importante. Quando a gente fala de prevenção, está se referindo, basicamente, à saúde cardiovascular e ao controle de coisas que podem, futuramente, causar a síndrome da insuficiência cardíaca”. Neste sentido, a médica chamou a atenção sobre a necessidade de a população controlar bem a pressão, não fumar, ter hábitos de vida saudáveis, acompanhar o colesterol. “Isso tudo é uma maneira de você ser preventivo à insuficiência cardíaca”.

Segundo Jacqueline Sampaio, a insuficiência cardíaca é mais comum em homens do que em mulheres. “Estatisticamente, o gênero masculino tem mais predisposição que o feminino”. Ela estimou que a proporção deve ser da ordem de 60% para 40%. “É mais prevalente no sexo masculino, mas também está presente na mulher”.

A médica informou que, atualmente, há inúmeras medicações para a doença. Se elas forem adotadas na fase inicial retardam sua evolução. “Porque a insuficiência cardíaca nada mais é do que o coração perder sua capacidade de bombear (sangue)”. Nos casos de diagnóstico de insuficiência leve, o problema está quando a pessoa negligencia o uso dos remédios prescritos pelo especialista justamente para que ela não evolua para uma insuficiência grave.

“É preciso ter o entendimento de que, apesar de não estar sentindo nada, a pessoa não deve deixar de tomar as medicações, nem negligenciar o tratamento. Isso é muito importante também”. Jacqueline insistiu que mesmo que não esteja sentindo nada, a pessoa não deve deixar de tomar a medicação prescrita porque os remédios são preventivos para o não agravamento da doença. “O agravamento vai muito de uma negligência e da má orientação, de um diagnóstico que não foi feito a tempo.”

Data

O 9 de julho foi instituído pela SBC como Dia Nacional de Alerta contra a Insuficiência Cardíaca, em homenagem ao aniversário do pesquisador Carlos Chagas, cientista cardiovascular pioneiro e responsável pela descoberta da Doença de Chagas, fator de risco importante para a insuficiência cardíaca. Na Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro (Socerj), durante todo o mês de julho, estão sendo realizados encontros com cardiologistas, dedicados à educação continuada da classe médica sobre a insuficiência cardíaca.

Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

FONTE: Agência Brasil

Pesquisa e uso da cannabis avançaram no Brasil nos últimos anos

Nos últimos 10 anos, as pesquisas e o uso legal de cannabis medicinal aumentaram muito no Brasil. Segundo o neurocientista Sidarta Ribeiro, que é professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o avanço acompanha a tendência mundial de regulamentação de medicamentos feitos à base da planta, popularmente conhecida como maconha.

“Isso acontece muito pela ação de familiares de pacientes, de pacientes organizados em associações, isso está crescendo muito. São dezenas de milhares de pessoas que fazem tratamento medicinal com cannabis, isso não existia há 10 anos atrás. Tem um monte de gente que tem autorização para importar, que consegue comprar na farmácia, embora seja caríssimo.”

Ele participou do seminário internacional Cannabis amanhã: um olhar para o futuro, que ocorreu ontem (9) e hoje (10) no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM), promovido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pela Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal (Apepi).

Tradição e proibição

Para o professor, a proibição da cannabis no Brasil não cumpriu o que prometeu – diminuir o uso recreativo da substância e a violência envolvida no mercado ilegal da planta – e isso está sendo percebido pela população.

“As pessoas estão se conscientizando de que foram enganadas, de que muita injustiça foi cometida em nome dessa guerra contra a maconha e que, na verdade, se elas precisam, ou se algum familiar, algum amigo precisa dessa substância para lidar com situações de vida ou morte, elas são capazes de romper as amarras desse difamação que a maconha sofreu por muitas décadas.”

Também palestrante no evento, o líder indigenista e ambientalista Ailton Krenak lembra que a cannabis foi introduzida no Brasil pelos povos africanos e, depois incorporada aos rituais de alguns povos indígenas há 300 anos.

“A gente não pode naturalizar a ideia de que a cannabis integra o repertório de conhecimento dos povos originários daqui da América do Sul. Ela não é nativa daqui, ela veio para cá com os povos que vieram da África, né? Tem gente que acha que ela entrou pelo Caribe, pela América Central, tem outros historiadores que dizem que os povos que vieram do Benim, da África, levaram ela para o Maranhão e daí ela entrou na Amazônia.”

Krenak destaca a importância das plantas medicinais no saber tradicional dos povos originários, muitas cantadas em rituais tradicionais e outras integrantes de mitos fundadores desses povos.

“O uso medicinal e o uso ritualístico, ele foi integrado a outras práticas, assim como a jurema. A jurema é daqui, é nativa, os povos indígenas do Nordeste têm os rituais da jurema e assimilaram essa planta que veio da África como uma planta que é parente da jurema”.

Associação

A advogada Margarete Brito, fundadora e diretora da Apepi, explica que a associação foi criada em 2014 para ajudar familiares e pacientes que viram na cannabis medicinal uma grande melhora na qualidade de vida de pessoas com doenças rara e neurológicas, como epilepsia. A família dela foi a primeira a conseguir autorização judicial para plantar a maconha e extrair o óleo medicinal em casa e, depois disso, criou a Apepi para ajudar outros pacientes. Atualmente, a associação fornece o óleo para quase 4 mil pacientes.

Este é o terceiro evento que a associação promove em parceria com a Fiocruz, sendo o primeiro em 2018. De acordo com Brito, os palestrantes apresentaram muitos avanços nas pesquisas, esclarecimento médico e no uso da cannabis medicinal no país.

“Até por relato de participantes, médicos, pesquisadores que estão nessa edição, dizendo o quanto o debate avançou. As associações já estão conseguindo plantar e abrir espaço para pesquisa. Hoje, a Apepi tem parceria com a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e com a Unicamp, que faz a dosagem de todos os óleos. No último seminário, em 2019, isso nem existia.”

Ela destaca a importância de se amadurecer o debate em torno da maconha medicinal, até para baratear o acesso aos medicamentos, ainda muito caros. Para a advogada, o preço pode baixar com a aprovação do Projeto de Lei (PL) 399/15, que regulamenta o plantio de Cannabis sativa para fins medicinais e a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta. O PL foi aprovado na comissão especial da Câmara dos Deputados no mês passado, mas que teve o trâmite novamente interrompido.

“Ainda é muito caro. Além de melhorar o acesso, você gera riqueza para o país, né? Porque hoje existem inúmeras pessoas que ainda usam o produto que vem lá de fora, pagando em dólar. Como o Sidarta diz, é igual você importar mandioca para fazer farinha.”

Pesquisa

O médico sanitarista e assessor de relações institucionais da Fiocruz, Valcler Rangel, explica que a Fiocruz pretende implantar ações para induzir a pesquisa na área, com o objetivo de possibilitar o uso da cannabis medicinal como um recurso para a saúde pública.

“A gente está formulando uma proposta de indução de pesquisas e estudos amplos nessa área, estudos interdisciplinares, pegando no campo biológico, dos estudos clínicos e também das ciências sociais. A ideia é induzir estudos voltados para essa questão do uso medicinal da cannabis, com a constituição de plataformas de análise e a criação de um grupo de trabalho permanente com o pessoal das universidades e da sociedade civil, que trabalhe uma agenda combinada das instituições para esse enfrentamento das dificuldades do uso da cannabis”.

Um estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostrou que canabinoides são eficazes no tratamento de doenças neurológicas.

Estudos indicam parkinson, glaucoma, depressão, autismo e epilepsia. Além disso, há evidências da eficácia dos canabinoides contra dores crônicas, em efeitos antitumorais e também contra enjoos causados pela quimioterapia, além da aplicação no tratamento da espasticidade causada pela esclerose múltipla.

Os canabinoides também demonstraram evidências de que são efetivos para o tratamento da fibromialgia, distúrbios do sono, aumento do apetite e diminuição da perda de peso em pacientes com HIV; melhora nos sintomas de síndrome de Tourette, ansiedade e para a melhora nos sintomas de transtornos pós-traumáticos.

Por Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro

FONTE: Agência Brasil

Câncer de cabeça e pescoço: 90% poderiam ser curados se diagnosticados precocemente

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Segundo o Instituto Nacional do Câncer, a estimativa é que o Brasil registre mais de 222 mil casos de câncer de cabeça e pescoço este ano, sendo que 90% deles poderiam ser curados, se diagnosticados precocemente. A criação da campanha Julho Verde foi pensada nisso e o mês foi dedicado à conscientização e prevenção da doença. Sobre o assunto, o professor doutor Flavio Hojaij, da Faculdade de Medicina (FM) da USP, conversou com o Jornal da USP 1ª Edição.

Respondendo perguntas fundamentais na composição da campanha Julho Verde, o professor inicia dizendo que esse tipo de câncer pode ser evitado, quando as pessoas tomam consciência de que alguns  hábitos, como a prática do fumo e do consumo de álcool, são prejudiciais. Para ele, o “cuidado com a saúde da cavidade oral é uma das coisas fundamentais nos nossos cuidados”, para evitar a formação de “carcinomas de células escamosas”.

Médicos e dentistas fazem a detecção dos tumores, que podem ser resolvidos em 90% dos casos, se diagnosticados precocemente. No entanto, para os casos mais avançados, esse tipo de câncer “é um dos mais devastadores para um indivíduo”, complementa Hojaij. Por isso, é preciso estar atento a dores de garganta que perduram por mais de 15 dias, aftas e manchas brancas e vermelhas na cavidade oral por mais de duas semanas, nódulos na região do pescoço e rouquidão. O professor também destaca que o contato com o HPV, papilomavírus humano, pode induzir à formação de um carcinoma orofaríngeo, região da boca e da garganta.

Atenção aos sintomas

Após a detecção do problema, a medida a ser tomada, em um primeiro momento, é o contato com um otorrinolaringologista ou um cirurgião de pescoço e cabeça. Ainda que a evolução da doença costume ser mais demorada, já que se diferencia de casos no pâncreas ou intestino grosso, que se espalham com mais facilidade, por ter sua evolução nos gânglios do pescoço, o doutor Flávio destaca a importância da atenção aos sintomas persistentes, uma vez que o tratamento para os casos mais avançados costuma ser “mais agressivo”.

A reincidência do câncer de cabeça e pescoço costuma ocorrer em indivíduos com hábitos de fumo, pouca higiene bucal e consumo de bebidas alcoólicas. Nesses casos, o professor diz que “eles têm uma chance de 20% de ter o tumor novamente”, sendo proporcional ao tempo persistindo nessas atitudes. Um segundo caso é decorrente do tamanho do tumor, que pode ocasionar o “estadiamento”: “Quanto maior o grau do tumor, maior a chance, mesmo com bons tratamentos, de um tumor recidivar”, complementa ele.

O professor finaliza enfatizando que a educação e a conscientização, como a criação de uma cartilha para crianças, são dois dos principais caminhos para o combate à doença. “Nós acreditamos que a educação seja a maior prevenção em saúde. Quanto mais a população for orientada, mais rica será nossa população em saúde.”

FONTE: Jornal da USP

A busca excessiva pela juventude eterna é prejudicial para toda a sociedade

Esny Soares indica que a passagem do tempo e o envelhecimento devem ser mais valorizados e que a valorização da juventude é típica da cultura ocidental

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Uma das características da sociedade contemporânea é a busca intensa pela juventude. O passar da idade se tornou um tabu, de modo que as pessoas desejam parecer cada vez mais jovens para se adequar ao padrão de aparência imposto. O envelhecimento é rejeitado e as mudanças de características físicas são desvalorizadas e omitidas. A alta dos procedimentos e da comercialização de produtos estéticos é um exemplo disso.

Esny Soares, pesquisador do Instituto de Psicologia da USP, analisa os motivos que levam à busca excessiva pela jovialidade: “Historicamente, a ideia de envelhecer sempre foi rechaçada, ficar velho é sinônimo de ficar ultrapassado. A sociedade, de um modo geral, mas especialmente a brasileira, associa o envelhecimento a uma perda, um prejuízo, e nisso está embutido um descrédito do potencial do idoso”.

Em uma sociedade que atrela a beleza à juventude, o envelhecimento é tratado como um enfeiamento ou ruptura com os padrões de beleza impostos. “Todos nós percebemos o preconceito. Para tentar fugir desses estereótipos de que a pessoa idosa é incapaz, ultrapassada, feia e desvalorizada, as pessoas procuram mudar a aparência, como se a aparência tivesse o poder de revelar o valor das pessoas”, aponta o pesquisador.

Envelhecimento

De acordo com Soares, o envelhecimento é visto com maus olhos mais em algumas culturas do que em outras: “No Ocidente, o preconceito contra o idoso é mais descarado. Em uma sociedade de consumo, que privilegia os meios de produção, o idoso é alguém que não tem nada a contribuir, é assim que as pessoas pensam. Todo o seu legado e sua contribuição na sociedade por tantos anos, tudo isso é renegado e o idoso passa a ser considerado como um estorvo para a sociedade”.

A fixação pela juventude também contribui para a prática do ageísmo — também chamado de idadismo, etarismo ou preconceito etário —, que consiste na discriminação por conta da idade. Relatório realizado pela Organização Mundial da Saúde indica que o preconceito relacionado ao envelhecimento atrapalha o processo de aceitação da velhice. Além disso, essa mentalidade pode se refletir em atitudes, políticas, leis e instituições, sendo prejudicial para toda a sociedade.

Existem culturas como as dos países do Oriente, que valorizam o idoso como um patrimônio da família e da sociedade. “Infelizmente, com a globalização, os países do Oriente estão experimentando o que se tem convencionado chamar de ocidentalização de valores. A competitividade, a individualidade e os valores de mercado, tão comuns no Ocidente, já passam a fazer parte das novas gerações orientais e isso pode indicar que a mesma desvalorização do idoso, ocorrida no Ocidente, em algum tempo também possa ser experimentada nas culturas orientais”, comenta o pesquisador.

Padrão imposto

A padronização presente nas redes sociais e meios midiáticos também tem influência nessa lógica. Soares diz que “a mídia supervaloriza a juventude e, mesmo diante do fenômeno do envelhecimento acelerado que nós estamos experimentando no Brasil, valores comerciais ditam os nossos comportamentos. Como consequência, os idosos vão sendo colocados para escanteio e a impressão que se tem é que o idoso é improdutivo, alguém que não contribui em uma sociedade tão dinâmica como a nossa”.

O pesquisador indica que um livro escrito por Oscar Wilde, no final do século 19, é uma obra-prima para falar da compulsão pela juventude: “Em O retrato de Dorian Gray, o personagem principal faz um pacto para não envelhecer e passa a vida toda com a mesma aparência de jovem. Claramente, esse fenômeno descrito por Oscar Wilde se repete nos dias de hoje e apresenta contornos patológicos que contaminaram toda a nossa sociedade”.

Soares sugere que a sociedade não sabe valorizar as fases da vida. “A ideia da fonte da juventude e a negação do envelhecimento traduzem uma sociedade que não aprendeu que cada uma das fases da vida traz consigo uma experiência de descobertas, desafios e realizações. Isso está sendo perdido por uma geração que investe o seu tempo em idolatrar a juventude e deixa passar sob os seus olhos a beleza do envelhecimento com qualidade. Envelhecer não é prejuízo, quem envelhece tem valor e essa fase da vida também pode ser apreciada pelo idoso e pela sociedade”, destaca.

Por João Dall’ara

FONTE: Jornal da USP

O sono é tão essencial para a vida quanto a alimentação

Álan Eckeli diz que a redução da qualidade, extensão ou regularidade do sono pode provocar diversos problemas à saúde e até mesmo risco de morte.

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Dormir é um hábito comum, mas de extrema importância para a vida humana. O sono saudável é essencial para a regulação do corpo, portanto, alterações em sua regularidade são determinantes e podem se refletir em diversos aspectos físicos e mentais de uma pessoa.

O professor de Neurologia e Medicina do Sono, Álan Eckeli, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, analisa o papel do sono para o funcionamento do corpo humano: “O sono é essencial para a vida, ele é tão essencial para a vida quanto a alimentação. Se nós dormirmos mal, vamos adoecer e, se nós pararmos de dormir e interrompermos esse fenômeno natural, vamos falecer. Isso demonstra a importância vital do sono para a manutenção da vida”.

Eckeli diz que a redução da qualidade, extensão ou regularidade do sono pode provocar diversos problemas: “Repercute em todo o nosso metabolismo e no nosso funcionamento mental, pode trazer prejuízos quanto à nossa memória, nossa cognição, prejuízos quanto ao nosso humor, deixando-nos mais deprimidos e predispostos a ter fadiga. Também pode alterar nosso ciclo de fome e saciedade, ou seja, aumentando a fome e reduzindo a saciedade”.

O sono é imprescindível para a atividade cerebral, em especial por conta do líquido cefalorraquidiano, líquido que banha o cérebro. “Quando a gente adormece, ele penetra dentro do parênquima cerebral, ou seja, ele entra dentro do cérebro e tira as impurezas do metabolismo cerebral. Esse fenômeno de limpeza do nosso cérebro acontece quase que exclusivamente durante o sono”, aponta o professor.

Durante o sono, as substâncias que atrapalham o funcionamento do cérebro são descartadas. Eckeli cita, como exemplo, a substância neurotóxica beta-amiloide, que está associada ao Alzheimer: “Quando o líquido cefalorraquidiano penetra dentro do cérebro e faz essa limpeza, ele retira a beta-amiloide. Então, uma das funções do sono é promover essa limpeza cerebral, que está relacionada ao melhor metabolismo, à melhor homeostase dos neurônios, das células e de toda a estrutura do nosso sistema nervoso central”.

Dormir de forma irregular é prejudicial em diversos aspectos para a saúde humana. “A curto prazo, dormir pouco, uma, duas, três horas por noite vai trazer sintomas relacionados à sonolência, cansaço, fadiga, mau humor e redução da nossa capacidade de empatia. Essa redução aguda de sono também pode aumentar o apetite, porque altera alguns hormônios relacionados à fome e à saciedade”, indica o professor.

O sono é imprescindível para a atividade cerebral – Foto: Reprodução/Freepik

Outro problema é o aumento das chances de causar acidentes, dormir pouco compromete os estímulos e respostas psicomotoras, assim como pode afetar a memória, por vários motivos, como conta Eckeli: “Quando dormimos mal, ficamos desatentos e, se não prestamos atenção, não aprendemos. O sono é essencial para a consolidação da memória, porque se você estiver se expondo pouco ao sono o processo de consolidação da memória não vai ser tão efetivo”.

Regularidade do sono

O professor destaca o período considerado ideal para o sono. Dormir pouco ou dormir em excesso são situações nocivas para a saúde humana. “Os dois extremos estão associados à mortalidade, fortalecendo para a gente a ideia que existe uma faixa de tempo total do sono ideal ou próxima do ideal, algo entre seis e nove horas, pendendo mais para sete horas. É claro que isso é muito individual, mas do ponto de vista populacional, dormir pouco ou dormir demais pode estar associado à mortalidade”, descreve.

Eckeli comenta sobre os perigos da apneia do sono, doença recorrente no Brasil: “Essa doença pode causar infarto, AVC, arritmias cardíacas e pode ocasionar acidentes. As breves reduções na regularidade do sono vão produzir sintomas, mas não necessariamente doenças, que podem ser parcialmente recuperados se você dormir bem nas noites seguintes. Entretanto, se você ficar exposto a reduções prolongadas do tempo total e da qualidade do sono, você tem um aumento de risco de morte e de outras condições clínicas.”

Outro risco é a possibilidade do desenvolvimento de cânceres. ”A piora da qualidade do sono pode alterar a expressão de alguns oncogenes, que promovem mutações que podem gerar um câncer. Essas alterações no sono também podem inibir outros oncogenes, que seriam protetores para evitar os nossos cânceres, causando um desequilíbrio favorável à incidência de câncer”, salienta o professor.

Eckeli reitera a necessidade de um sono saudável: “Qualquer função cerebral importante o sono modula, ele é essencial para a cognição, ele é essencial para a memória. Não existe um bom funcionamento cognitivo se a pessoa não dorme bem, a gente precisa ter um bom sono, seja de qualidade, seja de quantidade ou regularidade. Isso volta à importância do sono como um agente homeostático que mantém o equilíbrio do organismo e o sono como uma função vital para a manutenção da vida”.

Texto: João Dall’ara
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Chocolate com alto teor de cacau contribui no estado nutricional e conforto de idosos com câncer

Ao apontar associação entre o consumo do alimento e a melhora do estado nutricional, estudo destaca o papel da assistência nutricional – respeitando as preferências pessoais – para pacientes com câncer em cuidados paliativos.

Considerado um dos doces mais queridos em todo o mundo, o chocolate também pode oferecer benefícios para a saúde, especialmente para idosos com câncer em cuidados paliativos, ou seja, sem possibilidade de cura. É o que aponta um estudo de pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP que sugere que o consumo de chocolate com maior teor de cacau pode contribuir para a melhora do estado nutricional, da funcionalidade e a diminuição de sintomas nesses pacientes.

“Nós queríamos fazer um trabalho de pesquisa que fosse útil para o público-alvo, promovendo melhora nos problemas nutricionais, conforto e prazer. Foi assim que pensamos em estudar o chocolate, que tem uma história antiga na sociedade e que é alvo de estudos na área cardiovascular”, comenta Nereida Kilza da Costa Lima, médica geriatra, professora da FMRP e orientadora do estudo Effect of chocolate on older patients with cancer in palliative care: a randomised controlled study.

A pesquisa foi realizada com 46 pacientes idosos com câncer em cuidados paliativos em tratamento no Serviço de Oncologia e Cuidados Paliativos do Hospital das Clínicas da FMRP (HCFMRP). Todos os voluntários receberam tratamento padrão e foram divididos em três grupos, um com pessoas que não receberam chocolate, outro de pessoas que consumiram 25 gramas diárias de chocolate com 55% cacau e, por último, aquelas que ingeriram a mesma quantidade de chocolate branco.

“Nós coletamos os dados sociodemográficos e informações do estado de saúde, com exames laboratoriais e da avaliação nutricional dos participantes antes e após quatro semanas da intervenção, usando ferramentas específicas e validadas na comunidade científica”, explica Josiane Cheli Vettori, que é nutricionista, doutora pela FMRP e primeira autora do estudo.

Os voluntários tinham média de 67 anos de idade e 43,5% estavam em risco de desnutrição ou estavam desnutridos antes do início do trabalho. “No final do estudo, observamos que os índices das avaliações nutricionais foram aumentados significativamente. A elevação teve significância clínica e não houve indivíduo classificado como desnutrido após a intervenção, evidenciando que, possivelmente, a intervenção nutricional pode ser capaz de reduzir a perda de peso em pacientes com câncer em estágio avançado melhorando o estado nutricional”, conta.

Alimentação como conforto em cuidados paliativos

O câncer é a segunda principal causa de mortes no mundo, com 9,6 milhões de vítimas em 2018, de acordo com dados da Organização Pan-Americana da Saúde. “Diante desse cenário, cresce a preocupação com o impacto da nutrição em pacientes com câncer em cuidados paliativos. Assim, a alimentação como preservação do estado nutricional, prevenção da desnutrição e promoção de conforto são importantes”, conta a nutricionista Josiane.

Além de nutrir o corpo, a alimentação está associada às memórias, conexão com amigos, autonomia e prazer. “O suporte nutricional deve ser adaptado para atender às necessidades e desejos de cada paciente, pois eles são únicos quanto aos valores, história, desejos, lembranças e necessidades nutricionais e emocionais”, ressalta.

Ela ainda conta que a assistência nutricional é importante para o controle dos sintomas durante o tratamento oncológico e deve ser realizada pela equipe de saúde junto com o paciente, familiares e cuidadores. Para isso, é preciso que os profissionais de saúde tenham criatividade e sensibilidade para respeitar as preferências, verificar o acesso a determinado alimento e outras necessidades envolvidas no ato de se alimentar, como dentição e controle motor para segurar talheres.

“Antes de recomendar o chocolate, é importante observar as preferências alimentares, que são altamente pessoais, e pensar em conjunto com a equipe multiprofissional, familiares e paciente para entender se faz sentido no tratamento, se é algo que ele gosta e se tem acesso”, reforça a nutricionista.

Chocolate branco pode não ser um vilão

Há quem diga que o chocolate branco não é chocolate por ele ser produzido com a manteiga do cacau e não com a massa usada na fabricação do chocolate ao leite e daqueles com mais teor de cacau. Apesar do rótulo de vilão, cientistas buscam entender quais são os efeitos do alimento e quais propriedades podem ser benéficas.

“Nos surpreendeu que o chocolate branco, que é sempre visto como sem efeito, contribuiu para a melhora dos voluntários do nosso estudo. Ele demonstrou ter efeito benéfico no estresse oxidativo, que causa danos celulares; melhora na inflamação e nas reservas corporais. Agora a comunidade científica precisa continuar pesquisando quais são e os impactos de possíveis componentes positivos desse tipo de chocolate”, diz a professora Nereida.

O estudo Effect of chocolate on older patients with cancer in palliative care: a randomised controlled study foi publicado em janeiro na BMC Palliative Care. Além de Nereida e Josiane, o trabalho conta com autoria de Luanda G. da Silva, Karina Pfrimer, Alceu A. Jordão, Paulo Louzada Junior, Júlio C. Moriguti e Eduardo Ferriolli.

Texto: Giovanna Grepi
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Bactéria encontrada no mangue produz matéria-prima para plástico biodegradável

Identificada nas águas do mangue de Cubatão, na Baixada Santista, a bactéria Methylopila oligotropha produz grãos de um material biodegradável, chamado de PHAs, para armazenar energia, com propriedades similares a alguns tipos de plásticos, como a maleabilidade, o que viabilizaria seu uso em grande escala como matéria-prima para substituir plásticos derivados do petróleo, reduzindo a poluição ambiental – Fotos: Cedidas pela pesquisadora

Com propriedades similares a alguns tipos de plásticos, material tem potencial para substituir derivados do petróleo e reduzir poluição ambiental.

Nas águas do mangue da Baixada Santista existe uma bactéria chamada Methylopila oligotropha que, para acumular energia, produz grãos microscópicos de reserva na forma de poli-hidroxialcanoatos, ou simplesmente PHAs, um material biodegradável com propriedades similares a alguns tipos de plásticos. Em pesquisa do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Biotecnologia da USP, a bactéria foi isolada e cultivada para avaliar o potencial da produção de PHAs em grande escala, a fim de ser usados como matéria-prima nas indústrias, com o objetivo de substituir os plásticos produzidos a partir do petróleo, de forma a reduzir a poluição ambiental. O estudo teve apoio do Research Center for Greenhouse Gas Innovation (RCGI), centro de pesquisa em engenharia sediado na Escola Politécnica (Poli) da USP que reúne pesquisadores de diversas instituições nacionais e estrangeiras.

“Os PHAs são atraentes comercialmente pela possibilidade de serem substitutos para os derivados do petróleo, pois possuem propriedades similares a vários termoplásticos e elastômeros”, aponta ao Jornal da USP a professora Elen Aquino Perpétuo, do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), campus Baixada Santista, que coordenou a pesquisa. Os elastômeros e termoplásticos são dois tipos de plásticos que podem ser moldados e transformados por meio de processos de injeção, extrusão e sopro, de acordo com a temperatura em que são aquecidos. “A variabilidade da composição dos PHAs determina suas propriedades mecânicas e permite seu uso em diversas aplicações, como na produção de biopolímeros, usados nas áreas de farmácia e medicina para confecção de suturas, implantes e fixações ósseas, sendo absorvidos pelo organismo na mesma escala de tempo em que ocorre a regeneração do tecido.”

O projeto foi objeto da dissertação de mestrado de Esther Cecília Nunes da Silva, no Programa de Pós-Graduação Interunidades em Biotecnologia da USP. Na pesquisa, que procurava identificar linhagens bacterianas produtoras de materiais de origem natural como os PHAs, a bactéria Methylopila oligotropha foi isolada do mangue da Baixada Santista, na cidade de Cubatão, através da coleta de amostras no próprio local. “Posteriormente, as amostras passaram por um processo de enriquecimento seletivo, onde somente o metanol foi adicionado como fonte de carbono”, explica a professora. “Assim, foi possível transferir uma parte desse cultivo para uma placa de Petri, a fim de isolar colônias bacterianas, para posterior identificação molecular.”

De acordo com Elen, já existiam alguns relatos sobre a possibilidade da Methylopila oligotropha acumular PHB, um tipo de PHA. “No entanto, a grande novidade desta pesquisa foi verificar e quantificar a capacidade desta bactéria em produzir, além de PHB, também o copolímero PHB-HV”, relata Elen, “que apresenta melhores propriedades mecânicas, pois é menos cristalino e mais flexível, facilitando o seu processamento industrial”.

Produção

Os pesquisadores analisaram o conteúdo interno da bactéria, na forma de grânulos, que indicavam a produção de PHB. “A produção de PHAs por bactérias, de modo geral, ocorre em cultivos com excesso de carbono e deficiência de algum nutriente, como, por exemplo, nitrogênio, fósforo e potássio”, afirma a professora. “Especificamente, a indução do PHB-HV foi feita a partir do cultivo bacteriano em excesso de fonte de carbono, no caso, metanol, e limitação do nitrogênio, além da adição de um co-substrato, o ácido valérico.”

Segundo Elen, para chegar à produção industrial de PHAs, é necessário que haja estudo de escalonamento. “Há somente uma empresa no Brasil que produzia PHB microbiano, mas hoje trabalha somente sob demanda e ainda assim toda a produção é exportada”, ressalta. “Tudo isso porque o PHB ainda tem um custo elevado para o mercado interno.”

“No entanto, para além do escalonamento, é também necessário que haja incentivo fiscal e políticas públicas voltadas para a diminuição do uso de plásticos derivados de petróleo, principalmente aqueles de ‘uso único’”, destaca a professora. “A Alemanha já fez isso em 2021, quando proibiu a venda de plásticos descartáveis, entre eles pratos, copos, canudos, talheres, aplicando uma diretiva europeia destinada a proteger os oceanos da poluição.”

O projeto foi desenvolvido no Bio4Tec Lab do Centro de Capacitação e Pesquisa em Meio Ambiente (Cepema) da Escola Politécnica (Poli) da USP, em Cubatão, e teve apoio do Research Center for Greenhouse Gas Innovation (RCGI), um centro de pesquisa em engenharia (CPE) que é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), com patrocínio da Shell, através de recursos da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Coordenado pelo professor Júlio Meneghini e sediado na Escola Politécnica (Poli) da USP, o RCGI conta com atuação de pesquisadores de várias universidades nacionais e internacionais.

Mais informações: e-mail elen.aquino@unifesp.br, com a professora Elen Aquino Perpétuo

Texto: Júlio Bernardes
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Pesquisa da USP traz dados inéditos sobre malária na gestação

Pesquisa teve o objetivo de preencher uma lacuna envolvendo a falta de dados sobre a repercussão da doença nas gestantes. Com informações de mais de 60 mil mulheres, foi possível identificar os principais pontos de atenção para malária gestacional, chamados de hotspots, e assim definir quais regiões e Estados requerem mais esforços sanitários para o seu controle – Foto: Reprodução/Pixnio e Flickr

Cientistas do Instituto de Ciências Biomédicas analisaram dados de 2004 a 2018 e fizeram mapeamento das regiões mais afetadas pela doença no País. Estudo oferece subsídios ao Ministério da Saúde para a tomada de decisões.

Um estudo feito por pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP revelou dados importantes para o combate da malária gestacional no Brasil. A pesquisa, publicada na Lancet Regional Health – Americas, analisou a série histórica da doença na região da Floresta Amazônica durante um período de 15 anos, descobrindo as áreas mais afetadas, os grupos de maior risco e informações sobre os tratamentos receitados aos pacientes.

Coordenado pelo professor Claudio Romero Farias Marinho e realizado pela pesquisadora Jamille Gregório Dombrowski, ambos do Laboratório de Imunoparasitologia Experimental, o trabalho teve o objetivo de cobrir uma lacuna da falta de um conhecimento amplo sobre o problema para viabilizar o planejamento de políticas públicas. “Até então, os estudos que forneciam dados sobre a doença eram pontuais e não apresentavam um panorama do número de casos de uma forma mais ampla; agora podemos transformar esses dados em informações que possam subsidiar o Ministério da Saúde na tomada de decisões”, afirma Marinho.

A malária é uma doença infecciosa causada pelo protozoário Plasmodium e transmitida pelo mosquito Anopheles, com duas espécies prevalentes: a Plasmodium vivax, a mais incidente na região, e a Plasmodium falciparum. Junto das crianças menores de cinco anos, as gestantes são consideradas o principal grupo de risco para a doença, devido às mudanças fisiológicas e à presença do parasita na placenta. Além dos sintomas característicos (febre alta, calafrios, tremores, sudorese e dor de cabeça) serem mais intensos nelas, a doença aumenta os riscos de anemia materna, partos prematuros, baixo peso da criança no nascimento, abortos espontâneos e até microcefalia.

Levantamento amplo – Na pesquisa, foram utilizados modelos estatísticos para mapear a incidência de casos na região no período entre 1º de janeiro de 2004 e 31 de dezembro de 2018. Depois, foi rastreado o número de grávidas entre 10 e 49 anos e feito o mapeamento da população dos locais analisados com base em dados do Serviço de Informação de Vigilância Epidemiológica de Malária do DataSUS.

Com informações de mais de 60 mil mulheres, foi possível identificar os principais pontos de atenção para malária gestacional, chamados de hotspots, e assim definir quais regiões e Estados requerem mais esforços sanitários para o seu controle.

Áreas e grupos de risco – Ao longo dos anos, os números apontaram uma incidência significativa de malária gestacional em municípios dos Estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Pará. Destacam-se neste contexto as cidades de Mâncio Lima (Acre), situado na microrregião do Juruá, que fica entre o Acre e o Amazonas; Anajás, Bagre, Breves, Curralinho, Limoeiro do Ajuru, Muaná, Oeiras do Pará, São Sebastião da Boa Vista e Cachoeira do Piriá, no Pará; e São Gabriel da Cachoeira, Japurá, Santa Isabel do Rio Negro, Barcelos, Fonte Boa e Maraã, no Amazonas.

O estudo também mostra que a maior prevalência da doença se dá entre gestantes de 15 a 24 anos de idade. “Isso ocorre porque é nessa faixa etária que se observa o maior número de primigestas [mulheres que engravidaram pela primeira vez], pois é o grupo que, na maioria dos casos, ainda não foi infectado, fator que as deixa mais suscetíveis à infecção. É também um grupo que sofre muito com os efeitos mais graves da doença”, explica a pesquisadora.

O grupo de maior risco é o das grávidas mais jovens e a pesquisa aponta que a situação é preocupante. “Quando se considera a falta de imunidade, as alterações fisiológicas associadas à gestação e a infecção por Plasmodium, o resultado é muito preocupante. Infelizmente, não é raro encontrar meninas de 10 a 14 anos grávidas nessas regiões. Durante o período analisado, tivemos 2.674 casos, um número que totaliza mais de 4% do total de notificações”, afirma Dombrowski.

Medicação equivocada –
 Por ser de notificação compulsória, os pesquisadores obtiveram dados sobre o esquema de tratamento utilizado e descobriram que, em alguns, houve o registro de distribuição da primaquina para as gestantes, um medicamento utilizado no tratamento de malária, mas contraindicado para grávidas porque pode acarretar abortos espontâneos. “Como nosso trabalho foi desenvolvido com informações secundárias, provenientes de um banco de dados, não é possível afirmar que essa medicação foi realmente prescrita. Pode ter havido erro no preenchimento da ficha de notificação ou o profissional escolheu a medicação que mais se aproximava da que foi de fato prescrita, por exemplo”, aponta ela.

Apesar dos problemas encontrados, os pesquisadores observaram uma melhora na notificação correta do tratamento. “Para avançarmos ainda mais é fundamental que tenhamos mais treinamentos e capacitações dos profissionais para o correto preenchimento da ficha de notificação, pois é um documento importante para os programas de controle e eliminação da doença”, afirma a pesquisadora.

A capacitação de profissionais de saúde na região é fundamental para a correta atuação no acompanhamento de gestantes que contraíram a doença – Foto: Reprodução/Freepik

Redução de casos

O estudo mostrou que houve uma redução de cerca de metade dos casos de malária gestacional ao longo do período analisado. Este fato deve-se à ampliação da rede de diagnóstico e tratamento em toda a região. Além disso, a partir de 2006, foram inseridos no tratamento os combinados de artemisinina, um fármaco com ação potente contra a doença. Porém, a tendência de queda sofre o empecilho da descentralização das ações públicas para o combate à malária. Os municípios possuem autonomia para lidar com os casos e podem sofrer perdas com a alternância de equipes vinculadas aos órgãos de saúde a cada nova eleição.

Apesar da redução do número de casos, a doença permanece sendo um grande problema de saúde pública. “Os índices de malária caíram devido a uma série de medidas adotadas para o controle da doença, mas continuam oscilando, ainda que apresentem uma tendência de queda”, pondera Dombrowski.

Diagnóstico precoce

Em anos anteriores, o laboratório voltou seus esforços para desenvolver novas terapias contra a doença por meio do sequenciamento de genomas e do bloqueio de receptores envolvidos no processo inflamatório decorrente da infecção. Agora, com o aspecto epidemiológico já completo, o foco das pesquisas será em ações de diagnóstico precoce. Atualmente, por mais que as gestantes não apresentem sintomas, elas podem estar com o parasita na placenta (malária placentária). Na maioria dos casos, a constatação da doença só é feita após o nascimento do bebê, sem a possibilidade de intervenção ou tratamento. “Estamos trabalhando com a identificação de biomarcadores para a detecção da malária placentária no sangue periférico da mãe”, conta a pesquisadora.

A malária placentária é uma das consequências graves da malária gestacional que acontece em cerca de 20% a 50% dos casos. Como as gestantes geralmente não apresentam sintomas, trata-se de um dos principais desafios para os programas de triagem e tratamento da doença. “A identificação de biomarcadores é fundamental para o diagnóstico precoce dessa complicação, melhorando o cuidado com a gestante e o bebê. A molécula ou as moléculas candidatas devem ser de rápida mensuração, bem como ter um custo razoável para ser acessível e introduzido à rotina de pré-natal”, afirma Dombrowski.

Da Assessoria de Comunicação do ICB

Texto: Redação
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP

Estudo descreve os mecanismos moleculares da disfunção erétil por consumo de álcool

Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP descreve os mecanismos moleculares responsáveis pela disfunção erétil desencadeada pelo consumo excessivo de álcool. O estudo realizado pelo professor Carlos Renato Tirapelli, da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, mostrou que o álcool afeta a circulação sanguínea do corpo cavernoso, músculo do pênis que se dilata ou contrai conforme o órgão recebe estímulos. Para ficar ereto, os vasos sanguíneos no corpo cavernoso precisam estar dilatados, permitindo maior circulação de sangue. Porém, com o álcool presente no organismo, os vasos se contraem mais, o que reduz o fluxo sanguíneo e impede a ereção do pênis. Os resultados da pesquisa estão em artigo da European Journal of Pharmacology.

A relação entre o etanol e a disfunção erétil não é novidade, uma vez que já vem sendo descrita na literatura científica há bastante tempo. Pesquisadores da Universidade de Hong Kong descreveram os efeitos prejudiciais do álcool na ereção em 2007.

Entretanto, diz o professor, “essa é a primeira vez que um estudo foca nos mecanismos moleculares responsáveis pela disfunção erétil desencadeada pelo consumo excessivo de álcool”.

A disfunção erétil é um problema muito comum entre os homens. Dentre os brasileiros, cerca de 16 milhões sofrem da condição, principalmente homens acima de 40 anos. Mas, independentemente da idade, fatores como estresse, depressão e baixa autoestima podem desencadear o problema de impotência sexual. E, ainda, a impotência sexual pode ser um indicador de doenças cardíacas no futuro. Já se sabe também que o consumo excessivo de álcool pode contribuir significativamente para a disfunção erétil. A pesquisa da USP ajuda a mostrar como isso ocorre.

Prejudica a vasodilatação

No estudo, o corpo cavernoso foi analisado in vitro (em células no laboratório) e em ratos. O professor Tirapelli conta que um grupo de cobaias recebeu, diariamente, uma solução com 20% de teor alcoólico, durante seis semanas. “Ao final desse período percebeu-se que o músculo do pênis se contraía mais que o normal, indicando que o consumo frequente de álcool prejudica a vasodilatação do órgão.”

O exagero nas bebidas alcoólicas prejudica a dilatação dos vasos sanguíneos do órgão que, por sua vez, pode resultar em disfunção erétil – Foto: Wikipédia

 

Segundo o professor Tirapelli, os resultados mostraram que o consumo regular de álcool desencadeia o estresse oxidativo no corpo cavernoso, provocando menor produção de óxido nítrico (NO), molécula presente no organismo que contribui para a vasodilatação. Assim, o pesquisador administrou um antioxidante em outro grupo de ratos tratados com a solução contendo álcool. “Esse grupo não sofreu os efeitos do estresse oxidativo e, com isso, não houve prejuízos na vasodilatação do pênis. Assim, é possível afirmar que o etanol pode ser considerado um fator que prejudica a vasodilatação do corpo cavernoso e predispõe o indivíduo a desenvolver disfunção erétil.”

Degradação dos neurônios

Fazendo analogia com os seres humanos, diz o professor, “dependendo da quantidade de álcool consumida numa festa, por exemplo, independentemente da bebida ser destilada ou não, o corpo cavernoso fica contraído até que o álcool seja eliminado da corrente sanguínea”. O professor ainda lembra que, devido ao consumo crônico de álcool, o indivíduo pode desenvolver a neuropatia, uma doença que causa a lesão e degradação dos neurônios. “Durante o estudo, o grupo de animais tratado apenas com a solução de álcool apresentou uma resposta menor aos estímulos neurais. Esse resultado aponta o prejuízo aos neurônios causado pelo consumo da solução de álcool.”

“O mais recomendável seria evitar as bebidas alcoólicas. O problema é que o álcool é uma droga lícita acessível a grande parte da população. E não é só isso, a população em geral acredita que os efeitos do álcool se limitam a algumas horas após seu consumo, o que não é verídico.”

Mais informações: e-mail crtirapelli@eerp.usp.br, com o professor Carlos Renato Tirapelli

FONTE: Jornal da USP