Reouvir, programa do HC, para pessoas com perda auditiva

O Programa Reouvir fornece aparelhos de surdez para pacientes encaminhados pelo sistema Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (Cross). O encaminhamento acontece logo após o médico do posto constatar em exames a causa da surdez, as situações que podem agravar a perda e o diagnóstico audiológicos. A coordenadora do programa, Mara Gândara, vinculada à Divisão de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP), descreve seu funcionamento em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição.

Com mais de 25 mil pacientes beneficiados durante dois anos, o programa de reabilitação auditiva com aparelho de amplificação sonora atende aos pacientes das unidades da rede pública. “Às vezes, os pacientes demoram para reconhecer a própria surdez, geralmente os amigos e a família que percebem, porém, é preciso identificar o mais rápido possível. Quanto maior o tempo de surdez, pior a recuperação”, ressalta Mara.

“No Hospital das Clínicas (HC), atendemos desde criança com 6 meses até idosos com 107 anos, com vários tipos de perda auditiva”, comenta a especialista. São vários os motivos para o indivíduo se tornar surdo, pode ocorrer durante a gestação, no parto, conforme a idade ou os ruídos muito altos ao longo da vida.

O funcionamento do Programa Reouvir

Mara E. Rocha Gândara – Foto: Reprodução home Mara Gândara

 

A professora explica que a Secretaria da Saúde faz mapeamentos e agenda esses pacientes pelo sistema Cross. Eles são encaminhados para o serviço mais próximo de sua residência. Depois, é feito o agendamento pela própria unidade de saúde e a equipe do Reouvir recebe o paciente e inicia o processo seletivo. O indivíduo que não tem tratamento clínico ou cirúrgico deverá receber o aparelho de amplificação do som individual de acordo com as especificidades de sua surdez. “Precisamos receber do médico o diagnóstico etiológico (o que causou a surdez) e audiológico (o nível de audição dele). No HC, o paciente passa pela consulta médica, depois faz uma audiometria, também há a verificação da documentação dele e a orientação sobre o que é um aparelho auditivo e como funciona.”

Após esse procedimento, a pessoa vai testar e se adaptar ao aparelho. É muito importante que tenha um apoio familiar nessa fase, pois o indivíduo não está acostumado com sons altos e fica incomodado. Esse período de adaptação é chamado de “aclimatização” e um treinamento com fonoaudiólogo auxilia nessa etapa, mas às vezes o indivíduo não tem dinheiro, o SUS banca somente o aparelho, segundo afirma Mara.

A equipe do Reouvir faz a consulta depois de dois meses após a entrega do aparelho para regulá-lo e um ano depois é realizada uma audiometria para saber o quanto o paciente está adaptado e satisfeito. Ele também volta para o médico de origem a cada quatro meses para limpeza, pois a cera obstrui e não deixa o som passar livremente. O programa também revê a regulagem para o acompanhamento e fica responsável pela troca do molde, pois há um tamanho diferente para cada idade.

FONTE: Jornal da USP

Jogos de passatempo potencializam a saúde cerebral

No início de 2022, a internet foi dominada por postagens misteriosas de jogos que exibiam sequências de blocos verdes, amarelos e pretos. Tais publicações permitiam que os usuários de redes sociais compartilhassem sua pontuação no Wordle, jogo viral de adivinhação de palavras, sem dar um spoiler para aqueles que ainda não haviam completado o desafio diário.

Criado por Josh Wardle, o Wordle – cujo título é um trocadilho que combina o sobrenome do autor e o termo em inglês word, que significa palavra – é um quebra-cabeça on-line que propõe ao jogador descobrir uma palavra secreta de cinco letras por dia, em até seis tentativas. O sucesso do passatempo foi tanto que logo surgiram versões em português, como os jogos Term.ooo e Letreco, que funcionam da mesma maneira.

Estímulo ao cérebro

Sonia Maria Dozzi Brucki – Foto: Fapesp/Reprodução

Segundo Sonia Maria Dozzi Brucki, neurologista no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, além de oferecer uma divertida distração, jogos como o Wordle podem auxiliar na formação de novos neurônios, as células responsáveis pela transmissão dos impulsos nervosos cerebrais. “Qualquer tipo de atividade intelectual fará com que você crie novas sinapses”, diz a médica.

A cada partida, o jogador precisa desenvolver uma nova linha de raciocínio, o que estimula a neurogênese em áreas cerebrais diversas. Dessa forma, mesmo jogos baseados na repetição, como o próprio Wordle, que apresenta aos jogadores um mesmo desafio diariamente – a única mudança é a palavra que deve ser encontrada –, são benéficos para a amplificação das sinapses.

Outros fatores cotidianos também podem potencializar o funcionamento cerebral: Sonia indica aliar as atividades intelectuais à atividade física, social e também a uma alimentação adequada e saudável. “Uma boa alimentação é aquela que tem pouca carne vermelha e derivados lácteos, mas muitos peixes, nozes, verduras, legumes e azeites”, explica. O controle de doenças, como a diabete, hipertensão e alterações no colesterol também é um aspecto importante para a boa manutenção dos neurônios. “Além disso, é fundamental tratar a depressão, se a pessoa tiver; corrigir alterações sensoriais como  distúrbios auditivos e visuais e também não fumar, porque o cigarro é deletério para a  circulação sanguínea”, continua a neurologista.

Jogos aliados à saúde

Não há passatempos mais ou menos recomendados para a conservação da saúde do cérebro: a atividade deve ser escolhida com base em preferências individuais. Jogos, leitura, escuta de música, jardinagem, estudo de outras línguas e até mesmo faxinas são exercícios que podem contribuir para a vitalidade encefálica. “Uma atividade interessante, também, e que estimula o convívio social, são os jogos de cartas e de tabuleiro. Há uma infinidade enorme [de jogos do tipo]. Mas o importante é que a pessoa faça tudo com alegria, com bom humor, com felicidade, não adianta querer que alguém realize uma atividade sem ter vontade alguma”, finaliza Sonia.

FONTE: Jornal da USP

Transtornos de personalidade e dependentes de álcool

Pessoas diagnosticadas com transtornos de personalidade possuem maior propensão a serem dependentes de álcool, especialmente em sua forma mais grave. A análise é de um estudo feito por pesquisadores do Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina (FMUSP) com mais de cinco mil moradores da região metropolitana de São Paulo.

 

Carolina Hanna de Aquino Chaim, médica psiquiátrica do IPq e uma das pesquisadoras envolvidas nas análises dos dados – Foto: Arquivo pessoal da pesquisadora

“Pessoas que sofrem com transtornos de personalidade adquirem ao longo da vida alguns padrões de comportamentos disfuncionais (pensamentos, percepções, reações) que acabam interferindo em suas relações com a vida e com o outro, trazendo-lhes muito sofrimento”, explica ao Jornal da USP Carolina Hanna de Aquino Chaim, médica psiquiátrica do IPq e uma das pesquisadoras envolvidas nas análises dos dados.

O transtorno envolve a presença de variados sintomas comportamentais patológicos, como instabilidade emocional, tendência a relacionamentos interpessoais complicados, excentricidade, necessidade de chamar atenção, dificuldade em ter empatia e seguir condutas sociais, relata o estudo.

“A compreensão de fatores comportamentais associados ao consumo e à dependência do álcool contribui para direcionar abordagens terapêuticas e traçar estratégias mais específicas de prevenção e intervenção direcionadas para essa população”

Os dados estão no artigo Alcohol use patterns and disorders among individuals with personality disorders in the Sao Paulo Metropolitan Area, publicado em março na revista científica PLOS ONE, a partir da pesquisa de amostragem sobre saúde mental na região metropolitana de São Paulo, feita entre 2005 e 2007, por um grupo de instituições nacionais e estrangeiras, em uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, o levantamento foi coordenado pela professora Laura Helena Silveira Guerra de Andrade, orientadora de Carolina Hanna e uma das autoras do artigo.

A médica psiquiátrica diz que “a compreensão de fatores comportamentais associados ao consumo e à dependência do álcool contribui para direcionar abordagens terapêuticas e traçar estratégias mais específicas de prevenção e intervenção direcionadas para essa população”. Ela diz que “a existência de uma ou mais doenças adicionais pode complicar os sintomas e atrasar o diagnóstico, além de interferir no prognóstico e tratamento dos pacientes”.

Segundo Carolina, é importante ressaltar que, apesar da dependência do álcool ser mais comumente presente em pessoas com algum transtorno mental prévio, todo indivíduo pode desenvolver a dependência se o consumo começar a ser prioritário e gerar problemas de saúde mental ou física, ou de relacionamentos.

Muitos estudos mostram que não existe um nível seguro de consumo de álcool e este deve ter evitado especialmente em populações de risco, como crianças e adolescentes, grávidas, ou pessoas com outras doenças clínicas e/ou psiquiátricas que possam ter a evolução agravada pelo álcool.

Afetividade negativa

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID) e o Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais, 5ª edição (DSM-5), os sintomas dessa patologia estão subdivididos em três grupos, “clusters A, B e C” (veja quadro abaixo). As pessoas cujos sintomas fazem parte do cluster B foram as que mais pontuaram (70%) na pesquisa para dependência ou abuso de álcool, relata o artigo.

Segundo Carolina, “a afetividade negativa é um solo fértil para dependências de drogas e jogos”, exemplifica. “Quem sofre com esse problema tem uma tendência em beber na busca de um prazer imediato e para fugir/compensar o vazio. Passado o efeito da substância, o desconforto persiste e a pessoa recai no afeto negativo, o que a leva a buscar novamente a intoxicação”, diz.

Classificação de Transtornos de Personalidades de acordo com DSM-5 – Clusters A, B e C

CLUSTER A CLUSTER B CLUSTER C
 Transtorno de personalidade paranoica Transtorno de personalidade antissocial Transtorno de personalidade esquiva
 Transtorno de personalidade esquizoide Transtorno de personalidade limítrofe Transtorno de personalidade dependente
 Transtorno de personalidade esquizotípica Transtorno de personalidade histriônica Transtorno de personalidade obsessivo-compulsiva
Transtorno de personalidade narcisista

Resultados

Analisando os dados, a maior prevalência encontrada para ambos os transtornos (de personalidade e de abuso de álcool) foi para o cluster B (36,3%), quando comparado com os clusters A (32,7%) e C (23,6%). Quando se avaliou “padrões e transtornos do uso de álcool entre indivíduos com transtornos de personalidade”, os resultados apresentados para os que relataram uso de álcool em anos anteriores foram: 72,4% dos entrevistados eram do cluster B; 64,9%, do cluster A; e 48%, do cluster C.

Quando questionados sobre regularidade do consumo de bebida alcóolica, 89,2% era do cluster B, sendo que, destes, 36,3% apresentaram “padrão de beber pesado e com frequência”. Já os do cluster A pontuaram em 80,4% para regularidade e 32,7% para beber pesado e com frequência; e os do cluster C, 79,3%, para regularidade e 23,6% para o beber pesado frequentemente.

Resultado semelhante aconteceu quando foi perguntado aos entrevistados sobre o “padrão de consumo de bebida alcoólica”, considerando como categorias o “uso frequente” e “beber pesado”. Neste quesito, as pessoas do cluster B também tiveram pontuação mais elevada para o “beber pesado” (37,1%), o que corresponde a mais de cinco doses por ocasião; o cluster A ficou com 19,5%, e o C, com 22,4%.

Métricas para diagnóstico de abusos de álcool

Carolina explica que a métrica usada para diagnóstico de transtornos por uso de álcool é baseada na quantidade de problemas relacionados (ao todo são 11), considerando ainda as categorias “leve”, “moderado” e “grave”, conforme o número de problemas apresentados nos últimos 12 meses. “Leve”, quando há a presença de dois a três problemas relacionados; “moderado”, de quatro a cinco; e “grave”, com seis ou mais.Entre os 11 critérios ou problemas relacionados estão: se o álcool é frequentemente consumido em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido; se há fissura e/ou desejo intenso de consumir álcool; se o uso da bebida continua, apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico que pode ser exacerbado pelo seu uso; se muito tempo é gasto em atividades necessárias para obtenção do álcool, dentre outros.

Já a métrica para o “beber pesado” considera a ingestão de quatro a cinco doses de álcool numa mesma ocasião, sendo que cada dose teria que ter o volume de etanol contido em uma cerveja (330 mililitros – ml) ou de uma taça de vinho, de 100 a 120 ml, ou de 40 a 50 ml de bebidas destiladas.

Mais informações: e-mail carolina.hanna@usp.br, com Carolina Hanna de Aquino Chaim

FONTE: Jornal da USP

Trabalho em excesso eleva risco de derrame e doenças cardíacas

Cerca de 745 mil mortes por ano são atribuídas a jornadas de trabalho iguais ou superiores a 55 horas semanais, que afetam 8,9% da população mundial

De 2000 a 2016, estimativa conjunta entre Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) avaliou pela primeira vez a relação entre doenças sistêmicas do coração com a duração de jornadas de trabalho em todo o globo. Os dados mostram que jornadas de trabalho iguais ou superiores a 55 horas semanais, quando comparadas a jornadas de 35 a 40 horas semanais, aumentam em 35% o risco de Acidente Vascular Cerebral (AVC), conhecido popularmente como derrame, e em 17% o risco de desenvolvimento de doença isquêmica do coração, doenças que levam à perda da vida e da capacidade no trabalho.

Em 2016, 745.194 mortes/ano foram atribuídas a essa condição de trabalho excessiva, que abrange 8,9% da população mundial (488 milhões de pessoas), um aumento de 29% em relação há 16 anos. Segundo a professora Frida Marina Fischer, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, que foi membro do grupo técnico consultivo do estudo, com a atual pandemia há uma tendência ao aumento da duração da jornada de trabalho e à precarização das condições de trabalho, cenário ainda mais preocupante nos próximos anos.

O estudo avaliou a exposição a longas horas de trabalho em 194 países e as taxas de doenças cardíacas e neurovasculares em 183, relacionada a dados de 2.324 pesquisas transversais e 1.742 conjuntos de dados por revisões sistemáticas e metanálises. Os dados foram organizados em idade, sexo, região e em grupos de duração de jornada (até 48 horas; de 49 a 54 horas; e igual ou superior a 55 horas), entre os anos de 2000, 2010 e 2016. Em 2016, 398 mil pessoas tiveram mortes relacionadas ao AVC e 347 mil a doenças cardíacas, aumento de 19% e 42%, respectivamente. O fator de risco compartilhado por essas pessoas era a exposição a jornadas de trabalho iguais ou superiores a 55 horas por semana, 11 horas por dia, sem contar os finais de semana. Esses e outros resultados foram publicados em 17 de maio deste ano, na revista científica Environment International.

Qual o futuro do trabalho?

Excesso de trabalho – Foto: GraphicMama,Joseph Mucira Pixabay/Fotomontagem Jornal da USP

 

O artigo nos leva a questionar o futuro do trabalho. Para a pesquisadora, o presente se mostra triste e preocupante e o futuro, incerto. De acordo com ela, países que estavam seguindo as recomendações da OMS de diminuição das jornadas de trabalho voltaram a apresentar seu aumento. As populações mais atingidas pela carga de trabalho elevada são as situadas principalmente no Pacífico Ocidental e Sudeste Asiático, onde 11,7% das pessoas trabalham mais de 55 horas de trabalho por semana. A região com menor número foi a Europa, com 3,5%. “Em geral, quanto menos regulamentado o trabalho, maior o risco oferecido à população”, completa.

Para os cientistas, outra preocupação, além das mortes e desenvolvimento de doenças incapacitantes, está nos chamados “agentes mediadores”, que são ligados a pesquisas anteriores que sugerem o estresse psicossocial associado à maior mortalidade dessas doenças. Eles estão associados às respostas biológicas, tais como a liberação excessiva de hormônios ligados ao estresse e a disfunção do sistema cardiovascular e comportamentos em função do estresse (por exemplo, o excesso na ingestão de álcool, o consumo de tabaco, sedentarismo, nutrição inadequada, a perturbação de sono, entre outros). “Esses mediadores vão agravar uma situação degradada de saúde potencialmente iniciada pelas longas jornadas de trabalho”, completa.

Segundo a pesquisadora, esse aumento acompanha o crescimento do trabalho informal e orientado pelas plataformas digitais, dinâmica chamada de uberização do trabalho. No Brasil, o futuro do trabalho na pandemia covid-19 reflete o cenário de desemprego de 14,7%, onde o mercado de trabalho é mais exigente, competitivo e mal remunera os empregados. Está inserido nos serviços mediados por aplicativos e abalado pela pandemia do covid-19, o que configura, para a pesquisadora, uma condição prejudicial ao País e à população. Porém, ela destaca que até mesmo condições de trabalho consideradas melhores, com maior garantia de direitos e autonomia, estão sujeitas à exposição do trabalhador a riscos de saúde. “Exemplos que podemos citar são os profissionais da saúde e professores, inclusive os universitários, que trabalham excessivo número de horas por semana.”

Os homens, entre 30-49 anos representam a população mais exposta às longas jornadas; e entre 60 a 74 anos, os que têm maior número e taxas de mortes por 100.000 habitantes por doença isquêmica do coração e acidente vascular cerebral. Entretanto, Frida Fischer destaca a dupla jornada de trabalho vivida por muitas mulheres que, além das atividades profissionais, são responsáveis pelos cuidados domiciliares, como cozinhar, limpar a casa e cuidar de crianças. Com a ampliação do teletrabalho, ou home office, devido à pandemia, tanto para homens quanto para mulheres, teme-se que as horas de trabalho aumentam em decorrência da dificuldade de conciliar tarefas domésticas e profissionais “Eu vejo nesse artigo um importante alerta, que chama atenção e diz: trabalhar muitas horas por semana faz mal à saúde”, afirma a pesquisadora.

Das cerca de 745 mil mortes atribuídas ao trabalho em excesso, em 2016, 3,7% eram por doença isquêmica do coração e 6,9% por Acidente Vascular Cerebral. Quando se fala em anos de vida perdidos por incapacidade física e mental no trabalho, 5,3%  são decorrentes de doença isquêmica do coração e 9,3% de derrame, aproximadamente 23,3 milhões em anos perdidos. Esses dados foram obtidos por análises de 37 estudos sobre doenças cardíacas isquêmicas, com 768 mil participantes, 22 sobre AVC (839 mil participantes). “Qual o custo disso em vidas? Qual o custo para um país em termos de recursos humanos e Previdência social?”, questiona Frida.

Mais informações: e-mails fmfische@usp.br, com Frida Marina Fischer, e pegaf@who.int, com Frank Pega

Por Guilherme Gama

FONTE: Jornal da USP

Enfermagem conta com novas metodologias para tratamento de transtornos mentais

O conceito de saúde, além de abranger o bem-estar físico e social do indivíduo, não prescinde da saúde mental. O tratamento para quem sofre de transtornos mentais, sejam quais forem, requer mais do que a prescrição de medicamentos, pois é imprescindível oferecer um cuidado especializado, proporcionando ao paciente acolhimento, atenção, valorizando-o como um ser merecedor de boa qualidade de vida. Nesse cuidado, quem acompanha mais de perto a pessoa internada em hospital é o profissional de enfermagem. A profundidade emocional do cuidado de enfermagem vai além do corpo, “o cuidado deve oferecer uma perspectiva holística e ir além da visão reducionista à doença”.

Um artigo da SMAD – Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas traz uma análise “sobre a realização de um treinamento em saúde mental com a utilização de metodologias ativas”, baseada no trabalho de cinco enfermeiras em um hospital geral de grande porte em leitos psiquiátricos.

A pesquisa com o pessoal de enfermagem contou com a realização de treinamento a partir de metodologias ativas, “com foco na aprendizagem baseada em problemas e problematização” e na avaliação desse treinamento. As autoras do artigo apontam a necessidade da formação de profissionais que inclua o cuidado humanizado ao paciente, com foco nas necessidades emocionais ou subjetivas e no estabelecimento de um vínculo de confiança entre enfermeiras(os) e doentes.

Metodologias ativas envolvem métodos de desenvolvimento e de estímulo de ações provenientes do pensamento crítico e reflexivo que podem auxiliar os profissionais de enfermagem a proporcionar melhoras significativas aos portadores de transtornos mentais. Essas novas metodologias se fundamentam em duas perspectivas: a aprendizagem baseada em problemas, procurando despertar “uma atitude ativa do aluno em busca do conhecimento”, e a problematização, em que os problemas são identificados pelo aluno(a)/enfermeiro(a) na prática da “ação – reflexão – ação”, ambas dedicadas a questões da realidade. Em relação à avaliação da reação ou da satisfação das metodologias, a pesquisa mostrou o resultado favorável do treinamento, comprovado o progresso “na assistência de enfermagem em saúde mental”.

A adoção de metodologias ativas revelou-se como processos vitais para a conquista de conhecimento em saúde mental, já que possibilitou a criação de recursos de comunicação e desenvolvimento do raciocínio crítico, “minimizando, assim, as dificuldades e tornando o profissional mais preparado para lidar com certas circunstâncias”. Observa-se também que o treinamento gerou transformações expressivas de comportamento dos profissionais, propiciando novos rumos em relação ao processo do cuidado, “tornando-se mais humanizado e integralizado”. Essa realização do processo educativo ligado à Educação Permanente em Saúde (EPS) difere muito do método tradicional. Neste último, os pacientes psiquiátricos são apáticos, e a EPS, ao contrário, viabiliza a participação ativa daqueles na tomada de decisões, junto das enfermeiras(os).

As autoras declaram a importância do olhar do profissional de enfermagem para com os doentes, ouvindo suas dores, aflições e conflitos, sem julgamentos ou preconceitos, destacando a relação necessária entre as enfermeiras(os) e os familiares de quem está hospitalizado, pois a equipe de enfermagem precisa “incentivar e integrar a participação da família no tratamento e reabilitação de pacientes com transtornos mentais”.

Finalizando, ressalta-se que o estudo favoreceu a elaboração de conhecimento no campo da saúde mental com o novo treinamento das metodologias ativas para pessoas com distúrbios mentais, ancorado tanto nas habilidades e novas atitudes adquiridas pelos profissionais de enfermagem quanto na “capacidade crítica no exercício cotidiano do trabalho nos hospitais psiquiátricos”.

Artigo

MACHADO, M. G. de O.; SAMPAIO, C. L. Treinamento em transtornos mentais comuns na enfermaria: uso de metodologias ativas na construção do cuidado. SMAD – Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas (Edição em português), São Paulo, v. 17, n. 1, p. 75-83, 2021. ISSN: 1806-6976. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.1806-6976.smad.2021.168134. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/smad/article/view/168134. Acesso em: 09 jun. 2021.

Contatos

Marília Girão de Oliveira Machado – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza (CE). E-mail mariliagirao05@hotmail.com

Cynthia Lima Sampaio – Hospital Universitário Walter Cantídio, Fortaleza (CE).

FONTE: Jornal da USP

Incontinência urinária, hábitos saudáveis previnem, diz especialista

Hábitos saudáveis, exercícios físicos e controle do peso podem prevenir a incontinência urinária – sintoma caracterizado pela perda involuntária da urina, problema que acomete cerca de 20 milhões de brasileiros, segundo a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU).

De acordo com o doutor em urologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e diretor da SBU, Carlos Sacomani, a incontinência, quando moderada ou grave, pode afetar a vida sexual, profissional e o convívio pessoal do paciente. “Em termos de comprometimento da qualidade de vida, pode ser bastante importante se a intensidade for de moderada a grave”, destaca.

Segundo o médico, quando ocorre em mulheres, as causas principais estão ligadas ao esforço, em pacientes que sofreram um enfraquecimento da musculatura do assoalho pélvico. “Quando elas tossem, espirram ou fazem esforço físico, alguma atividade física, escapa urina”, explica. De acordo com ele, a musculatura do assoalho pélvico pode ser sobrecarregada em caso de mulheres com muitos partos, gravidez de gêmeos ou de crianças muito pesadas.

As pacientes também podem ter incontinência devido a um quadro de bexiga hiperativa, explica o médico, quadro que pode ser acentuado pelo consumo de café e chá preto. “São mulheres que têm alteração na bexiga, elas têm vontade de urinar e se elas não forem rapidamente ao banheiro, perdem urina”.

Nos homens, o quadro de bexiga hiperativa ocorre também, mas é mais comum nos pacientes  idosos. A incontinência urinária ainda ocorre em homens como sintoma secundário à cirurgia de próstata. “Há pacientes que fizeram cirurgia de próstata, principalmente por câncer, e que evoluem com perda urinária depois da cirurgia. A causa é a própria cirurgia”, ressalta Sacomani.

O tratamento da incontinência pode começar pela mudança do estilo de vida e fisioterapia do assoalho pélvico. Nos casos de bexiga hiperativa, há a possibilidade da utilização de medicamentos e até o implante de um marca-passo da bexiga. Nos pacientes com perda de urina associada ao esforço, pode-se também fazer o tratamento cirúrgico.

A prevenção passa por hábitos saudáveis, segundo o médico. “São aqueles hábitos de sempre, entre eles praticar atividade física adequada e evitar obesidade, que está diretamente relacionada à incontinência urinária – quanto maior o sobrepeso, maior a chance de incontinência urinária”.

FONTE: Agência Brasil

Testes em laboratório mostram que o canabidiol pode auxiliar no tratamento de dor crônica

Pesquisa desenvolvida por cientistas do campus de Ribeirão Preto da USP em animais de laboratório mostra a ação positiva do canabidiol (CBD) – substância extraída da planta Cannabis sativa – na redução da dor crônica e comorbidades associadas, como ansiedade. A pesquisadora Gleice K. Silva-Cardoso, do Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, acredita que o CBD seja uma estratégia promissora no tratamento da dor crônica neuropática já que o sistema canabinoide tem participação essencial no circuito de sensibilidade à dor. O sistema endocanabinoide (encontrado no cérebro e em diversos outros locais do organismo humano e animal) foi descoberto no final da década de 1980 e, desde então, vários estudos nacionais e internacionais envolvendo os efeitos terapêuticos do CDB ganharam força. Um artigo de Gleice K. Silva-Cardoso foi publicado na revista Neuropharmacology.

 

Christie Panissi – Foto: Reprodução/Fapesp

 

Os resultados são da fase pré-clínica (testes realizados em animais de laboratório), mas mostraram o potencial terapêutico do CBD em reduzir a percepção à alodinia (dor a estímulos leves, como um simples toque) e à hiperalgesia térmica (quadro doloroso provocado pelo aumento do calor) em animais com dor neuropática. De acordo com a professora Christie Ramos Andrade Leite Panissi, do Departamento de Psicologia da FFCLRP e orientadora da pesquisa, além da diminuição da dor, os cientistas observaram “ativação de regiões do sistema nervoso central relacionadas com a modulação de respostas emocionais”.

Quanto ao fator emocional, Gleice afirma que a dor crônica nunca vem sozinha e, muitas vezes, está associada a alguma comorbidade, “principalmente, ansiedade e depressão”. Assim, ela acredita que o transtorno deve ser trabalhado em aspecto multifatorial e não somente físico. As avaliações da pesquisadora têm também como base resultados anteriores de um outro estudo que ela realizou na Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, quando avaliou atividades neuronais (comunicação entre neurônios e seus receptores) de uma área localizada no tronco cerebral: o núcleo parabraquial, envolvido na modulação da percepção da dor crônica e que também foi testada para receptores canabinoides.

Terapia para dor e respostas emocionais

Cannabis é composta de flavonoides, mais de 200 terpenos e mais de 100 fitocanabinoides, dentre os quais os mais conhecidos são o canabidiol (CBD, que não possui efeito psicoativo) e o tetra-hidrocanabinol (THC, que possui efeito psicoativo). Como um dos mais estudados, o CBD é capaz de ativar receptores canabinoides presentes no organismo e que fazem parte do sistema endocanabinoide. Esses receptores podem ser ativados por substâncias endocanabinoides (produzidas pelo próprio organismo) e por derivados da Cannabis, como o CBD, ou outro agente sintético.

 

Gleice Silva-Cardoso – Foto: Reprodução/Fapesp

 

A professora Christie destaca que a busca por agentes terapêuticos, “em especial para casos de dores crônicas resistentes aos tratamentos tradicionais”, confirma a relevância do estudo, não apenas para a descoberta de novos medicamentos, mas para investigar “novos usos de compostos já conhecidos e as possibilidades de sua atuação conjunta, minimizando possíveis efeitos colaterais indesejáveis”.

Gleice considera que os achados de seu estudo podem indicar o CBD como um auxiliar no tratamento da dor crônica que também pode reverter comportamentos do tipo ansioso. Se este componente da Cannabis ajuda a modular a aversão à dor, como observado, ele o faz acessando “não somente a parte de alívio mecânico do animal, mas também a questão dessa modulação da percepção”.

Apesar de comemorar os resultados, a professora Christie lembra que o estudo ainda é pré-clínico e que mais pesquisas devem ser realizadas sobre o uso do canabidiol e demais derivados da Cannabis “até serem indicados para uso clínico no tratamento da dor crônica”.

Tratamentos com canabidiol

Gleice informa que, atualmente, há “um leque de opções de estudos com o uso do canabidiol em diversas doenças”, principalmente com foco sobre suas propriedades “em comorbidades e doenças neuropsiquiátricas”. A substância tem revelado benefícios farmacológicos analgésicos e imunossupressores, com ação terapêutica para os distúrbios de ansiedade, do sono e do movimento, “o que o torna uma substância com grande potencial terapêutico”, observa Christie.

Produtos com o CBD já são comercializados em outros países e “indicados para o tratamento da epilepsia, Parkinson ou Alzheimer, assim como analgésicos em doentes oncológicos terminais”, diz a professora. Mas, no Brasil, os medicamentos à base de canabidiol que são autorizados pela Anvisa “têm como principal indicação o tratamento de espasmos musculares relacionados com a esclerose múltipla”, conta.

Ouça no player abaixo a entrevista da pesquisadora Gleice Silva-Cardoso e da professora  Christie Ramos Andrade Leite Panissi ao Jornal da USP no Ar, Edição Regional. 

Por Brenda Marchiori

FONTE: Jornal da USP

Ombro Congelado? Equipamento desenvolvido na USP pode ajudar a tratar

Estudo preliminar com um equipamento desenvolvido no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP pode ajudar no tratamento da capsulite adesiva, uma lesão no ombro também conhecida como “ombro congelado”. A inflamação provocada pela capsulite impede o movimento do ombro. Os testes mostraram que a nova técnica tem potencial para tratar a doença e levar recuperação e qualidade de vida em apenas seis semanas, contra os três anos da terapia convencional.

Ana Carolina Negraes Canelada – Foto: Reprodução/LinkedIn

De acordo com a fisioterapeuta Ana Carolina Negraes Canelada, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e participante do Projeto Fotodinâmica do IFSC, a nova terapia é capaz de fazer o paciente voltar rapidamente à vida normal.

O novo equipamento é portátil e “constituído por duas esferas que, conjugadas com a aplicação de laser, ao deslizarem e comprimirem o músculo afetado, provocam a mobilização da fáscia muscular [pele que envolve o músculo], promovendo uma recuperação da amplitude do membro”.

Os resultados da pesquisa que testou o equipamento e a técnica foram publicados recentemente pelo Journal of Novel Physiotherapies e mostram o caso de um paciente de 57 anos com capsulite adesiva que apresentava os dois ombros comprometidos e sentia muitas dores que impediam movimentos, como a flexão dos ombros, abdução e rotação interna.

Com os tratamentos convencionais, relata a fisioterapeuta, o paciente levaria de dois a três anos para se curar, mas que, em apenas seis semanas de aplicação do novo tratamento, a inflamação desapareceu e os movimentos dos ombros voltaram. Ana Carolina relata que o paciente foi submetido a sessões de 15 minutos de aplicações, duas vezes por semana. Ao término da sexta semana, “o paciente teve uma recuperação total de todos os movimentos, sem qualquer vestígio de inflamação e com ausência completa de dores, colocando-o, assim, apto para o trabalho normal”, comemora a pesquisadora.

Foto: Alessandra Cuba/Comunicação da Santa Casa de Misericórdia de São Carlos

Novos testes

Antonio Eduardo de Aquino Junior – Foto: Reprodução/LinkedIn

O novo tratamento está disponível na Unidade de Terapia Fotodinâmica (UFT), sediada na Santa Casa da Misericórdia de São Carlos (SCMSC), numa parceria com o IFSC.

No dia 20 de setembro, o estudo entrou em uma nova fase, com o teste em 120 voluntários já diagnosticados com capsulite adesiva para “certificar que a nossa metodologia é realmente funcional e que esse método de tratamento reduzido vai se manter nos demais pacientes”, diz o professor do IFSC e orientador do estudo, Antonio Eduardo de Aquino Junior.

De acordo com o professor, se for realmente viável, o tratamento poderá ser implementado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), “diante de toda a documentação e certificação dos órgãos necessários”.

Causas da capsulite adesiva

As causas da capsulite adesiva não estão bem determinadas. Mas, dentre as possibilidades, encontram-se alguns fatores como traumatismo (com ou sem fratura associada), cirurgias ou causas sistêmicas, como diabete ou doenças da tireoide. Rigidez muscular e dor são os principais sintomas que limitam os movimentos ativos e passivos do ombro.

Estima-se que a doença acometa entre 2% e 5% da população geral, mas chegue a 20% nos diabéticos, sendo as mulheres de 40 a 60 anos a população mais afetada. Os atuais tratamentos aplicados são a termoterapia, crioterapia, eletroterapia, cinesioterapia e massagem direta, em um período de recuperação que varia entre dois e três anos.

Por: Brenda Marchiori e Ferraz Junior
Colaboração: Rui Cintra, IFSC

FONTE: Jornal da USP

Sensor vestível em material natural analisa substâncias presentes no suor

Desenvolvido na USP em São Carlos, adesivo aplicado sobre a pele poderá ser usado para monitorar o funcionamento do organismo, através do suor, e administrar medicamentos

Um sensor vestível, impresso em nanocelulose microbiana, um polímero natural, foi criado por pesquisadores da  USP, no campus de São Carlos, em colaboração com a Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, Universidade de Araraquara, Universidade de Campinas (Unicamp) e Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), em Campinas. O dispositivo poderá substituir, com vantagens, os sensores convencionais, impressos em superfícies plásticas. Aplicado sobre a pele, permite detectar várias substâncias presentes no suor, funcionando como um sensor não invasivo de amostras.

Robson Rosa da Silva, pós-doutor do Grupo de Polímeros Prof. Bernhard Gross do Instituto de Física de São Carlos da USP – Foto: Reprodução/Lattes

 

A pesquisa, coordenada pelo professor Osvaldo Novais de Oliveira Junior, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC), recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) por meio dos projetos “Biossensor impresso e implantável fabricado com biopolímeros para monitoramento de longa duração”; “Design e fabricação de dispositivos flexíveis nanoestruturados para detecção de biomarcadores”; “Desenvolvimento de instrumentos analíticos baseados em línguas eletrônicas para detecção simultânea de ameaças bacterianas” e um apoio da Equipamento Multiusuários.

“A nanocelulose microbiana é um polímero 100% natural, produzido por bactérias a partir do açúcar. Sua principal vantagem em relação ao plástico é que propicia uma interface muito maior com a pele e já é encontrada no mercado há alguns anos na forma de curativos. No entanto, ainda não havia sido estudada como matriz para a fabricação de sensores eletroquímicos”, diz Robson Rosa da Silva, também do IFSC e um dos dois autores principais do artigo.

Nos sensores de matriz plástica, a transpiração forma uma espécie de barreira entre a pele e o dispositivo, dificultando a detecção e constituindo também um fator alergênico. “Já o sensor em nanocelulose é totalmente respirável: o suor consegue chegar até a camada ativa do eletrodo através da matriz de nanocelulose”, explica.

O sensor tem a forma de um pequeno adesivo retangular, com 1,5 centímetro de comprimento e 0,5 centímetro de largura e a espessura de uma folha de papel de seda. E consegue detectar vários biomarcadores, como sódio, potássio, ácido úrico, ácido láctico, glicose, etc. “Esses elementos ou substâncias, que circulam na corrente sanguínea, são detectáveis também no suor. Assim, uma aplicação possível do sensor de nanocelulose é o monitoramento da diabete. Outra é o controle hormonal em mulheres, por meio da detecção do hormônio estradiol”, informa Silva.

Paulo Augusto Raymundo Pereira, atualmente pós-doc do Instituto de Física de São Carlos da USP – Foto: Reprodução /Lattes

 

O dispositivo poderia ser usado para detectar também a presença de poluentes atmosféricos no organismo. “Como prova de conceito, expusemos o sensor a baixas de concentrações de metais tóxicos, como chumbo e cádmio. E o resultado foi positivo”, acrescenta o pesquisador.

As unidades de detecção são impressas sobre a matriz de nanocelulose microbiana por meio de uma técnica de serigrafia semiautomatizada, com o uso de pasta com grande concentração de partículas de carbono, devido à alta condutividade elétrica desse material. “Reações químicas de oxidação ou redução produzem o sinal elétrico que indica a concentração do metabólito de interesse”, explica Paulo Augusto Raymundo Pereira, o outro autor principal do artigo, que realiza pós-doutorado no IFSC.

“Para isso, o sensor é conectado a um potenciostato, que faz as medidas eletroquímicas por meio da variação da corrente elétrica. E as informações obtidas são, finalmente, transmitidas a um computador e traduzidas por meio da curva-padrão”, detalha Pereira. Segundo ele, a conexão wireless do sensor com o aparato de medição e leitura é uma possibilidade tecnológica de fácil resolução.

Os pesquisadores estudam, agora, o uso do dispositivo para a administração de medicamentos, bem como sua viabilização comercial. A primeira fase do projeto “Fabricação de eletrodos impressos por serigrafia em substratos biodegradáveis (nanocelulose e filmes de cebola Allium cepa l) para aplicações das indústrias médica, alimentícia e agroindustrial”, desenvolvido pela Biosmart Nanotechnology, teve o apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da Fapesp.

O artigo Microbial nanocellulose adherent to human skin used in electrochemical sensors to detect metal ions and biomarkers in sweat, publicado no periódico Talanta, pode ser acessado no link.

Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

Por José Tadeu Arantes/Agência Fapesp

FONTE: Jornal da USP

Método traça perfil mais detalhado dos tipos de gordura presentes no sangue

Análise mostra que mulheres jovens não obesas apresentaram grande acúmulo de gordura no sangue após as refeições

Pessoas saudáveis, mas com um metabolismo mais lento, acumulam mais gordura no sangue após as refeições, o que pode servir como marcador de problemas metabólicos e cardiovasculares. A conclusão é de uma pesquisa realizada na USP em mulheres com menos de 40 anos de idade, não obesas, submetidas a uma dieta rica em gorduras. A análise feita no estudo, que identificou um perfil mais preciso dos tipos de gordura existentes no sangue em relação aos testes clínicos tradicionais, tem potencial para ajudar a prever, detectar e monitorar doenças. As conclusões do trabalho são descritas em artigo do The Journal of Nutritional Biochemistry.

Os pesquisadores estudaram a lipemia pós-prandial, que é o acúmulo de gordura no sangue decorrente de uma refeição. “Ela aumenta o número de lipídeos plasmáticos, especialmente lipoproteínas ricas em triglicerídeos (TG). Entre os fatores de risco para doenças cardiovasculares está a tríade de lipídeos, ou seja, altos níveis de TG, de LDL e concentrações reduzidas de HDL-C”, relata o pesquisador Marcos Yoshinaga, do Instituto de Química (IQ) da USP, que participou do estudo. “Portanto, a lipemia pós-prandial prolongada pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares por um aumento exacerbado de TG plasmático combinado ao catabolismo acentuado de HDL, que implica menores concentrações de HDL-C.”

De acordo com o professor Marcelo Rogero, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, que também integra o grupo de pesquisadores, o objetivo geral do trabalho foi estudar os efeitos de uma refeição enriquecida em gorduras saturadas sobre os lipídeos plasmáticos, em um grupo selecionado de pacientes saudáveis. “O alvo da pesquisa eram mulheres com menos de 40 anos de idade e não obesas”, aponta. “O objetivo específico do trabalho era examinar como o lipidoma plasmático ou as diferentes espécies moleculares de lipídeos plasmáticos se comportam no período pós-prandial em mulheres jovens e saudáveis.”

Os pesquisadores realizaram uma análise lipidômica para descrever e quantificar as espécies moleculares de lipídeos no plasma humano. “Abordando cerca de 300 moléculas, as análises lipidômicas aumentam o potencial de se encontrar biomarcadores, se comparadas ao perfil lipídico clínico de rotina, como triglicérides, colesterol total, LDL, HDL”, descreve Yoshinaga. “Por exemplo, o perfil lipídico clínico fornece informação sobre os TG totais, enquanto a análise lipidômica permite quantificar centenas de espécies moleculares de TG, com informações precisas sobre a natureza e a composição de ácidos graxos, sejam eles saturados, monoinsaturados ou poli-insaturados.”

Os lanches de fast food, embora muito populares, são refeições altamente gordurosas
Foto: Unsplash

 

Metabolismo

O estudo também analisou parâmetros clínicos das pacientes, como perfil lipídico, insulina, glicose, marcadores inflamatórios e medidas antropométricas. Ao todo, 274 lipídeos plasmáticos distribuídos em 18 classes lipídicas foram comparados com parâmetros clínicos do sangue. “Identificamos, como esperado, um enriquecimento em inúmeras espécies moleculares de TG entre uma e três horas após a refeição”, aponta o pesquisador. “Depois de cinco horas, porém, pudemos classificar dois grupos distintos entre as pacientes, um com metabolismo rápido, que voltou aos níveis em jejum, e outro com metabolismo lento, que mantinha níveis elevados de TG.”

A comparação entre os dois grupos revelou que as diferenças no metabolismo de TG estavam relacionadas ao incremento de insulina pós-prandial, bem como às classes lipídicas TG e fosfatidilinositol (PI). “As análises lipidômicas realizadas em fração rica em TG (LDL e VLDL) e em fração enriquecida em HDL revelaram que a fração HDL de pacientes de metabolismo lento continha maiores concentrações de PI e TG”, destaca Yoshinaga. “Verificamos assim uma assinatura da lipemia pós-prandial prolongada relacionada não somente ao enriquecimento de TG plasmático, mas particularmente um aumento das concentrações de TG e PI em HDL.”

O pesquisador aponta que, no aspecto nutricional, após serem confirmadas em estudos de larga escala, as ferramentas analíticas utilizadas no estudo têm potencial para identificar como indivíduos jovens e saudáveis lidam com dietas ricas em gordura, principalmente com relação ao risco de acúmulo de lipídeos específicos. “A análise lipidômica identificou distintas respostas pós-prandiais em indivíduos saudáveis com maior precisão se comparadas ao perfil lipídico clínico de rotina, e pode potencialmente ajudar na detecção, monitoramento e predição de doenças metabólicas.”

 

Frituras possuem altas concentrações de VLDL
Foto: Unsplash

“No aspecto clínico, o acúmulo de PI e TG em HDL durante a lipemia pós-prandial prolongada traz perspectivas futuras para avançarmos no entendimento do lipidoma de HDL durante o metabolismo intravascular em relação à insulina”, observa Yoshinaga. “Em especial, será possível compreender o papel do lipidoma de HDL influenciando suas funções antiaterogênica e anti-inflamatória, bem como as concentrações de HDL-C, que são um fator de risco independente para doenças cardiovasculares.”

O estudo foi realizado por pesquisadores do IQ e da Faculdade de Saúde Pública (FSP), que integram os projetos Centro de Pesquisa de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma) e Food Research Center (FoRC), dois Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Além de Yoshinaga, que realiza pesquisa de pós-doutoramento com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o trabalho teve a participação de Adriano Britto Chaves-Filho, cujo pós doutorado é financiado pela Fapesp; Bruna Jardim Quintanilha, doutoranda da FSP; além dos professores Marcelo Rogero, da FSP e do FoRC, e Sayuri Miyamoto, do IQ e do Redoxoma.

Mais informações: e-mail marcosyukio@gmail.com, com Marcos Yoshinaga

Por Júlio Bernardes

FONTE: Jornal da USP