Doenças do coração matam mais mulheres que o câncer de mama

De acordo com Walkiria Ávila, as doenças do coração afetam mais mulheres que homens e possuem fatores agravantes como hipertensão, tabagismo e obesidade

As doenças cardiovasculares, como infarto, AVC e síndrome do coração partido, são um grande desafio para a saúde feminina e mais da metade das mortes de mulheres são causadas por problemas no sistema cardiovascular. A cardiologista e coordenadora do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Cardiopatia, Gravidez e Aconselhamento Reprodutivo do Hospital das Clínicas da USP, Walkiria Ávila, fala sobre as causas desse problema e como evitá-lo em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição.

Walkiria constata que, mesmo havendo uma diminuição dessas doenças nas mulheres, elas continuam sendo a principal causa de morte e afetam menos os homens. “A mulher, de forma geral, acha que infarto é coisa de homem. Em 850 mulheres que nós perguntamos ‘Do que você acha que vai morrer?’, 60% achavam que iriam morrer de câncer de mama e somente 18% achavam que seria por doença do coração. E é exatamente o contrário”, revela. Segundo a cardiologista, somente 14% das mortes de mulheres têm como causa o câncer de mama. Isso se deve aos programas para prevenção à doença, os quais são mais escassos no que diz respeito às doenças cardiovasculares.

Sintomas diferentes

A cardiologista também alerta para as diferenças nos sintomas sentidos por homens e mulheres, fator que pode retardar a procura por profissionais da saúde e prognósticos: “Na mulher, os sintomas de infarto são minimizados. No homem, [pode haver] uma dor no peito, na mulher pode não [haver]. A mulher pode ter uma dor na mandíbula, dor nos braços e até uma dor nas costas. E isso passa como se fosse uma dor na lombar”.

Walkiria também alerta para a falta de conhecimento das mulheres sobre sua saúde. Ela informa que hipertensão, tabagismo, obesidade e depressão contribuem para acelerar essas condições e que dietas e atividades físicas são os pilares preventivos das doenças do coração e até cânceres. A cardiologista ainda fala sobre gravidez e questões hormonais: “Isso já começa na puberdade. O uso dos anticoncepcionais, quando não são formulados ou receitados de formas adequadas. A gravidez é um teste à saúde da mulher e nós temos a pré-eclâmpsia, que é a hipertensão da gestação e é a principal causa de morte obstétrica”. “A menopausa, que perde o estrógeno, o protetor cardiovascular, e as doenças começam a se somar”, completa.

A médica incentiva a realização de exames precocemente para o tratamento adequado das doenças cardiovasculares. “Isso aqui é um programa de saúde pública, inclusive trazendo o alerta a essas mulheres à prevenção, e a gente tem uma visão e uma esperança de que futuramente essas doenças tendam a diminuir no sexo feminino também”, afirma.

FONTE: Jornal da USP

Consumir vegetais é saudável ao coração. Mas de quem?

É comum que se associe o consumo de alimentos como frutas e vegetais à manutenção de uma vida saudável. De fato, pesquisas diversas apontam como este hábito associa-se à redução do risco de diversas doenças, como câncer, diabete e doenças cardiovasculares. Entretanto, se estas constatações podem ser ditas com segurança em relação à população adulta, o mesmo vale para adolescentes?

Esta é a questão geral que guiou os autores do artigo O papel das frutas e vegetais na saúde cardiovascular de adolescentes: uma revisão sistemática, que ganhou destaque na edição de maio deste ano da Nutrition Reviews, uma das publicações mais importantes do mundo no campo da nutrição. Embora o estudo tenha notado que o consumo de frutas, legumes e verduras por adolescentes está muito abaixo da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de cinco porções ao dia, não é possível afirmar que este baixo consumo esteja relacionado a riscos cardiovasculares em pessoas nesta faixa etária. E a própria medição deste consumo é também um problema. Os adolescentes são um grupo etário pouco estudado, por conta da sua alta complexidade e constantes alterações biológicas, psíquicas e sociais.”

Vegetais?

De modo geral, pesquisas na área “costumam associar a ingestão de alimentos ricos em gorduras saturadas, sódio e açúcar com o desenvolvimento de indicadores de risco cardiovascular em adolescentes”, afirma Tatiana Collese, primeira autora do artigo e doutoranda em medicina preventiva pela Faculdade de Medicina (FM) da USP. Entretanto, “os adolescentes são um grupo etário pouco estudado, por conta da sua alta complexidade e constantes alterações biológicas, psíquicas e sociais”, adiciona a pesquisadora, o que leva a uma falta de definição clara sobre o que de fato seja risco cardiovascular nestas pessoas. Além disso, como o consumo de frutas e vegetais neste grupo é muito baixo, não é possível afirmar quais efeitos este hábito pode ter em sua saúde.

Ausência de critérios

O resultado inconclusivo deriva da falta de critérios comuns dentre a própria comunidade científica neste tipo de pesquisa.

Poucos estudos sobre adolescentes levam em conta a recomendação da OMS quanto ao consumo adequado de frutas e vegetais – Cesta de Frutas, de Giuseppe Arcimboldo via  Wikimedia Commons

Mais de 5.600 artigos a respeito da relação de riscos de doenças cardiovasculares em adolescentes e consumo de frutas e vegetais foram considerados no estudo. Como conta Tatiana, em muitos destes a classificação do que é ser adolescente diferia daquela adotada pela OMS: pessoas maiores de 10 e menores de 19 anos.

Notou-se também uma grande variedade de métodos para classificar o consumo de frutas e vegetais neste grupo. “Não há consenso quanto ao melhor método para se avaliar o consumo alimentar em adolescentes”, diz Tatiana. Além disso, constatou-se inclusive a falta de padronização nos critérios sobre o que é risco cardiovascular em adolescentes.

“Antigamente, as doenças cardiovasculares surgiam apenas nos nossos avós. Não se cogitava medir indicadores, como a glicemia ou a pressão arterial, nos adolescentes, já que era muito improvável desenvolver tais riscos em idades precoces sem ser congênito. Portanto, estudar risco cardiovascular em adolescentes é assunto inconclusivo”, destaca a pesquisadora.

De todo modo, revisões como esta permitem justamente identificar caminhos que futuras pesquisas podem percorrer, a fim de mostrar se aquilo que se observa em adultos pode ser dito de adolescentes. Como diz Tatiana, o trabalho do grupo ressalta “a necessidade de padronização destes critérios, a fim de se obter uma classificação unificada, capaz de estimar a prevalência global de risco cardiovascular em adolescentes e possibilitar comparações válidas entre as nações”.

Por Raphael Concli

FONTE: Jornal da USP