Hidrogel ajuda a tratar erosão e sensibilidade dos dentes

Uma nova tecnologia, para uso profissional, pode ajudar no tratamento da erosão e da sensibilidade dos dentes. Trata-se de um hidrogel à base de quitosana, substância extraída de crustáceos como camarões, e de aditivos naturais, sem a adição de flúor, que atua nos dentes para a reposição do mineral perdido no processo corrosivo e no vedamento da superfície dos dentes, diminuindo a sensibilidade. O novo produto com o pedido de patente em andamento, através da Agência USP de Inovação (AUSPIN), foi desenvolvido pela dentista Shelyn Akari Yamakami durante seu doutorado na Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp) da USP sob orientação da professora Regina Guenka Palma Dibb.

Shelyn conta que a erosão dental é uma doença crônica que ataca os dentes através de um processo químico sem ação de bactérias. É causada por ácidos de origem do próprio organismo ou contidos nos alimentos e as consequências desse desgaste podem ser a perda da estrutura dental, dentes mais curtos e mais amarelados, além da dor proveniente da hipersensibilidade dentinária. A nova tecnologia, afirma a pesquisadora, é capaz de vedar os túbulos dentinários, que são canais microscópicos que irradiam por baixo da superfície do esmalte até o interior do dente e são responsáveis pela sensibilidade dentária. A principal ideia, segundo Shelyn, é diminuir o processo erosivo que aumenta o problema.

Refluxo é o principal vilão, mas não o único

Um dos principais fatores da erosão dental e, consequentemente, da sensibilidade dentinária, diz a pesquisadora, é o refluxo gastroesofágico, doença causada pelo retorno do conteúdo ácido do estômago para o esôfago, garganta e boca. “No Brasil, cerca de 11% da população apresenta sintomas que são compatíveis com o refluxo”, afirma.

Outros fatores que podem acarretar no refluxo são o consumo excessivo de alimentos e bebidas ácidas, pessoas com transtornos alimentares, profissionais que sejam expostos a ácidos em seu ambiente de trabalho e até mesmo nadadores que estão constantemente em contato com o cloro na água.

Hidrogel é eficiente, mas causa da erosão deve ser investigada

O hidrogel foi desenvolvido à base de quitosana em concentração específica e aditivos naturais não tóxicos ao organismo para agir nos dentes com a dupla ação de inibir o processo erosivo e a hipersensibilidade dentinária. Segundo as autoras, não existe nada similar no mercado.

Diferentemente dos produtos atualmente comercializados, a nova tecnologia não possui adição de flúor, sendo uma alternativa para pacientes com restrição ao elemento químico. Apesar disso, Shelyn enfatiza que “o flúor ainda é utilizado para prevenção da cárie com sua eficácia amplamente comprovada na proteção dos dentes e na melhora da saúde bucal”.

A pesquisadora informa que quando os ácidos entram em contato com a superfície dos dentes o conteúdo mineral passa a ser dissolvido, tornando-os mais vulneráveis à ação das enzimas presentes na boca, o que favorece o processo erosivo ao longo do tempo. “Se a dissolução de minerais se torna cíclica, parte da estrutura dentária pode ser perdida pela ação do ácido; por conta disso adicionamos ao hidrogel agentes que atuam tanto na reposição da parte mineral, como também no vedamento da superfície do dente. Essas ações diminuem a sensibilidade na área, a progressão da erosão e consequentemente a perda irreversível da estrutura dentária”, comenta Shelyn.

A professora Regina, no entanto, alerta que a tecnologia não atua sozinha, sendo necessário o correto diagnóstico da causa do processo erosivo. Com isso, é possível agir na origem do problema, que pode ser o refluxo, problemas alimentares ou o consumo exagerado de alimentos ácidos, evitando que o processo erosivo retorne e o tratamento com o hidrogel seja possível e eficiente.

Mesmo com o pedido de patente em andamento, a professora Regina acredita que ele deve chegar o mais rápido possível ao mercado prevendo um valor acessível para comercialização. “Ao desenvolver essa tecnologia nós nos preocupamos com o custo dessa solução. Em laboratório, esse custo não é maior do que os existentes no mercado. Portanto, temos a esperança que esse produto venha com um valor muito mais acessível do que os atuais tratamentos para a sensibilidade e erosão”, conclui.

Shelyn apresentou seu trabalho de trabalho de doutorado Efeito de diferentes tratamentos na interceptação da erosão dentinária, com orientação da professora Regina Guenka Palma Dibb, à Forp, em maio de 2020.

Além delas, participaram do desenvolvimento do produto: Lais Lopes Machado de Matos, Debora Fernandes Costa Guedes, Juliana Jendiroba Faraoni, e Alessandro Dibb.

Agência USP de Inovação

Agência USP de Inovação (AUSPIN), criada em fevereiro de 2005, é o Núcleo de Inovação Tecnológica da USP responsável por gerir a política de inovação para promover a utilização do conhecimento científico, tecnológico e cultural na Universidade a favor do desenvolvimento socioeconômico do Estado de São Paulo e do País.

Atua diretamente na proteção do patrimônio industrial e intelectual produzido na USP, orientando docentes, alunos e funcionários na elaboração de projetos e efetuando os procedimentos necessários para o registro de patentes, marcas, direitos autorais de livros, softwares, músicas, entre outras criações.

A Agência USP de Inovação está presente em todos os campi da USP: São Paulo, Bauru, Lorena, Piracicaba, Pirassununga, Ribeirão Preto e São Carlos.

Mais informações: e-mails shelyn.yamakami@gmail.com e rgpalma@usp.br

Por Eduardo Nazaré

FONTE: Jornal da USP

Proteína klotho combate neuroinflamações e o envelhecimento

Uma pesquisa do Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP demonstrou, pela primeira vez, o efeito anti-inflamatório e neuroprotetor da proteína klotho em neurônios de camundongos recém-nascidos. Essa molécula age tanto no conjunto de células que protegem os neurônios, reduzindo a toxicidade do meio, quanto inibindo a atuação das substâncias inflamatórias liberadas.

É difícil avaliar como todos esses agentes atuam em um animal vivo, mas são correlações que sugerem um possível vínculo de causalidade. O modelo revela uma ação pontual, mas existe uma conexão muito grande entre a klotho e a prevenção de doenças neurodegenerativas. Para serem produzidos medicamentos baseados nesses estudos, entretanto, é necessário avaliar também a atuação da proteína no longo prazo e seus possíveis efeitos colaterais.

A klotho é uma molécula que pode ser encontrada tanto em volta das membranas celulares quanto em forma solúvel, como no sangue. Ela é comumente associada ao rim: os ossos liberam um hormônio cujos receptores das células do rim se juntam à proteína. Essa interação libera a vitamina D.

Estudos mais recentes indicam também que a molécula tem um papel importante no sistema nervoso central, sendo que a falta dela está relacionada ao envelhecimento dos neurônios. A descoberta desse mecanismo foi documentada em 1997. Desde então, a função da proteína no cérebro ainda não foi totalmente compreendida, mas sabe-se que a injeção dela em animais já apresentou bons resultados. Por isso, ela é tida como uma espécie de “elixir da juventude”, na medida em que alimenta e protege os neurônios das adversidades do tempo. Caso estudos futuros confirmem o seu papel na produção de novos neurônios, ela poderá ser usada como um suporte para evitar doenças neurodegenerativas e psiquiátricas.

“A klotho se constitui numa proteína com uma perspectiva muito promissora de ter um efeito interessante em processos degenerativos ou em doenças neurológicas e neuropsiquiátricas cujo componente inflamatório é um fator que tem um papel muito importante. Hoje a gente sabe que [a falta dela] está envolvida na depressão, na psicose e em uma série de transtornos”, aponta ao Jornal da USP o professor do ICB Cristoforo Scavone, coordenador do estudo.

Autores do artigo Neuroprotective action of α‑klotho against lipopolissacarídeo‑activated glia conditioned medium in primary neuronal culture, Vinicius Nakao e Caio Henrique Mazucanti, ex-alunos da pós-graduação do ICB, inicialmente procuraram entender se a proteína realmente tinha a capacidade de proteger as células do cérebro de doenças neurodegenerativas. Para isso, as células que protegem e interagem com os neurônios, cultivadas em frascos, foram provocadas com lipopolissacarídeos na presença e na ausência da klotho. Os lipopolissacarídeos são componentes das paredes das células de bactérias gram-negativas que provocam uma rápida resposta do sistema imunológico, causando inflamação das células.

Feito isso, as substâncias liberadas foram recolhidas e adicionadas aos frascos que continham somente neurônios. Neste experimento, os cientistas constataram que foram liberadas mais moléculas inflamatórias que provocam a morte de neurônios quando as demais células do sistema nervoso não eram tratadas com a klotho. Isso é importante porque a presença de uma inflamação crônica é justamente a resposta imunológica exagerada responsável pela degeneração dos neurônios. Sem a inflamação, há menor chance de desenvolver doenças como Alzheimer e Parkinson, que ocorrem em geral em idosos.

Na segunda etapa, tentou-se verificar se esse resultado ocorria por conta da interação da proteína com as células que revestem os neurônios ou se a molécula estudada também interagia diretamente com o meio produzido. Para isso, foram coletadas as substâncias inflamatórias na ausência da klotho e adicionadas aos neurônios. A molécula, dessa vez, foi adicionada somente nessa fase, ao mesmo tempo em que deixava de ser adicionada em um outro recipiente idêntico para que fossem comparados. Com isso, concluiu-se que a klotho também protegia os neurônios da toxicidade produzida pelo meio.

Sabe-se que os exercícios físicos e a boa alimentação estimulam a produção de neurônios, fortalecendo a saúde de uma maneira geral. Ocorre que, no envelhecimento, há uma inflamação sistêmica crônica e é esse fator que está associado aos déficits cognitivos e às doenças neurológicas. Por isso, quando produzida em quantidades suficientes, a klotho tem um efeito protetor contra essas doenças e alguns tipos de lesões cerebrais.

Envelhecimento

Durante sua carreira, o professor Cristoforo Scavone, do ICB, se interessou por estudar as bases moleculares associadas às doenças neurodegenerativas, procurando entender por que essas doenças ocorrem no envelhecimento e por que algumas pessoas conseguem envelhecer de forma mais saudável.

Junto à professora Regina Markus, ele estudou o envelhecimento através de marcadores observados em laboratório. Nesse percurso, notou-se que os pacientes de diálise tinham um déficit cognitivo e que havia alguns sinais característicos nas amostras de sangue dessas pessoas, como o estresse oxidativo. A partir dessa pista, ele passou a fazer testes em animais.

Scavone procurou modelos que pudessem estar associados ao envelhecimento, passando a estudar a proteína klotho. Na época, fez um estudo relacionando a doença renal crônica com o desenvolvimento de déficit cognitivo associado à neuroinflamação e constatou que essa proteína estava em menor concentração nesses casos. Isso tinha correlação com o aparecimento desses déficits, como perda de memória e demência.

Ao longo dos anos, constatou-se que o ácido glutâmico e a modulação da insulina provocam liberação de klotho do neurônio, que, por sua vez, estimula a formação de lactato astrocitário. O lactato, por sua vez, pode ser usado pelas células neuronais como substrato metabólico.

Alguns processos fisiológicos e patológicos dificultam a produção da klotho, como doenças do envelhecimento e danos renais. Ratos com hipertensão espontânea, cujo rim foi removido ou com diabete tipo 1, por exemplo, tiveram a produção da proteína diminuída, o que leva a aumentar a toxicidade no organismo.

Antienvelhecimento

A klotho é uma proteína antienvelhecimento que protege as células renais, inibindo a produção de citocinas inflamatórias, uma resposta imunológica nociva, e a formação de necrose tumoral.

Evidências sugerem que a molécula está associada às membranas das células dos rins. As formas solúveis da proteína, porém, podem ser encontradas em fluidos como o sangue, a urina e o líquido presente no cérebro.

Existem estudos que mostram a ação protetora da klotho em células renais. O trabalho publicado teve como objetivo avaliar os efeitos da molécula em células cerebrais de camundongos isoladas. O meio condicionado foi usado para induzir à morte dos neurônios e avaliar se a molécula estudada poderia reverter o efeito.

As células utilizadas foram colhidas de animais recém-nascidos, menos resistentes que células tumorais produzidas artificialmente, que são utilizadas em outros estudos. Por meio delas, é possível observar uma situação fisiológica normal, não alterada. Quando células tumorais são usadas, há mudanças genéticas e alterações nas respostas.

O procedimento foi realizado seguindo as diretrizes Animal Research: Reporting of In Vivo Experiments (Arrive), que se assemelham ao Princípio Ético em Pesquisa Animal adotado pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (Concea) e foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa Animal (CEEA) do ICB.

Os neurônios foram mantidos por duas semanas em um suplemento de meio neurobasal. Passados quinze dias, as células foram tratadas com proteínas klotho sintetizadas.

Mais informações: e-mail criscavone@usp.br, com Cristoforo Scavone

Texto: Ivan Conterno
Arte: Guilherme Castro

FONTE: Jornal da USP

Você sabe o que é encefalopatia traumática crônica?

A encefalopatia traumática crônica, também conhecida como demência do pugilista, é uma doença neurodegenerativa que é provocada ou desencadeada por repetidos traumatismos na cabeça ou no crânio. Alguns boxeadores famosos, como os brasileiros Maguila e Éder Jofre e o estadunidense Muhammad Ali, desenvolveram a doença ao longo de suas carreiras. Porém, não são apenas os lutadores que podem desenvolver esse tipo de encefalopatia e seus sintomas podem ser confundidos com outros tipos de doenças cerebrais.

O médico, professor e pesquisador Vitor Tumas, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, especialista na área de Neurologia, especialmente nas áreas de Transtornos do Movimento e Neurologia Comportamental, explica que a encefalopatia traumática crônica foi inicialmente descoberta em lutadores de boxe no início do século 20, mas atletas de outros esportes que possuem repetitivos traumas na cabeça, como o rugby, o futebol americano e até mesmo o futebol, podem ser alvos da doença. Segundo Tumas, ela também foi descrita em veteranos militares que participaram de treinamentos em áreas de conflito ou propriamente em conflitos bélicos.

Tumas e outros especialistas no assunto acreditam que a encefalopatia traumática crônica seja causada pela exposição repetitiva ao traumatismo de crânio, como uma pancada, um golpe, uma sacudida violenta na cabeça, que faz com que o cérebro se mova bruscamente dentro da caixa craniana. “Esse tipo de movimento súbito de aceleração e desaceleração pode provocar estiramento das fibras nervosas, romper pequenos vasos e causar pequenas lesões no tecido cerebral. Esses traumatismos são mais evidentes na chamada concussão cerebral, quando, logo após o trauma, o paciente fica meio confuso, desorientado ou perde os sentidos por alguns segundos”, afirma o pesquisador.

Os repetitivos traumas, segundo Tumas, vão provocando um acúmulo de alterações que desencadeiam um processo inflamatório. A partir de um certo ponto, isso começa a provocar a deposição de diversas proteínas anormais no cérebro, sendo a principal a TAU fosforilada. Esse processo, a longo prazo, se torna irreversível e progressivo.

Sintomas, relações com outras doenças cerebrais e diagnóstico

Os sintomas gerais provocados pela demência do pugilista são tonturas e dores de cabeça crônicas. O paciente também pode desenvolver sintomas mentais como perda de memória e dificuldade de raciocínio, além de problemas motores como lentidão, rigidez dos músculos, alterações na fala e desequilíbrio. Segundo Tumas, as características principais são alterações comportamentais de depressão, ansiedade, agressividade, impulsividade e até paranoia.

“Os sintomas da doença podem imitar muito as doenças psiquiátricas, como o Alzheimer, em várias fases do acometimento, e os pacientes têm uma tendência muito forte ao suicídio. Esses sintomas começam leves e vão evoluindo progressivamente e o paciente vai ficando cada vez mais comprometido e dependente. Por causa dessa complexa combinação de sintomas e o histórico de traumatismos cranianos repetitivos, pode ser a chave para se pensar no diagnóstico”, explica Tumas.

O diagnóstico da doença ainda é complicado. Conforme explica o professor, ainda não existem exames que confirmem um diagnóstico clínico durante a vida do paciente, ele é totalmente baseado na suspeita clínica e no histórico de traumatismo de crânio repetitivo. “Geralmente, a doença costuma afetar adultos e idosos, com início dos sintomas ainda na fase adulta. Existem alguns casos também de jovens que desenvolveram a doença. A frequência ainda não é bem estabelecida, e depende do diagnóstico por autópsia”, explica o professor.

Prevenção e diminuição de sintomas

O principal fator, alerta Tumas, é a prevenção do problema, uma vez que a doença não tem cura. Quem pratica esportes de risco como lutas, rugby, futebol americano e o futebol deve ter atenção a esse problema e ser orientado a tentar reduzir o impacto desses traumas.

Um fato importante, por exemplo, é que há mais risco para desenvolver a encefalopatia traumática crônica se o intervalo entre um traumatismo e outro for muito curto, por exemplo, quando um jogador de futebol bate a cabeça, continua jogando e tem outro traumatismo no mesmo jogo. “Por isso hoje há uma recomendação para que sempre que algum jogador tenha um trauma na cabeça, mesmo que seja aparentemente discreto, ele precisa de atendimento imediato. Caso haja uma concussão nítida, ele deve sair do jogo para evitar um novo trauma em curto espaço de tempo”, explica o professor.

O médico e pesquisador alerta que é sempre importante que familiares, ou o próprio paciente que desenvolve sintomas característicos desse tipo de encefalopatia, procurem um médico e citem que foi exposto aos traumatismos de crânio durante um período da vida. A doença ainda não tem um tratamento específico ou maneiras de bloquear sua progressão, a intervenção é na tentativa de amenizar os sintomas.

Durante a fase inicial, segundo o professor, é mais fácil controlar a doença com o uso de medicamentos. Já nas fases avançadas, é um quadro de demência muito mais difícil de ser contido. “Veja que o mais importante é prevenir o problema, até porque não sabemos qual é o ponto de conversão, de virada, de quando aquele número de traumatismos  se transforma num quadro definitivo”, afirma Tumas.

Fatos curiosos sobre a doença

O professor Tumas conta uma história interessante, relacionada ao jogador de futebol Bellini, capitão da Seleção Brasileira durante a Copa do Mundo da Fifa de 1958, na Suécia. Bellini tinha sintomas da doença de Alzheimer, mas, por conta do histórico de ele ser futebolista, os médicos suspeitaram da hipótese da demência do pugilista. Quando Bellini faleceu, em 2014, sua família concedeu autorização para realização da autópsia, que confirmou o diagnóstico da encefalopatia traumática crônica. Segundo Tumas, ela pode acontecer simultaneamente a doenças degenerativas como o Alzheimer. No caso do jogador, houve dificuldade no diagnóstico.

Outro fato ainda em pesquisa, conta Tumas, é a questão das subconcussões. O estudo é para saber se, por exemplo, cabecear a bola no futebol, mesmo que não haja nenhum sintoma imediato, possa levar a microtraumatismos que, se repetitivos, eventualmente possam evoluir para um quadro de encefalopatia traumática crônica. “Não temos uma certeza sobre isso, porém sabe-se que jogadores de futebol têm uma chance de desenvolver essa doença. Mas, se cabecear a bola sem sentir nada é um fator de risco, supõe-se que sim. Por conta disso, nos Estados Unidos, existe uma recomendação para que crianças só iniciem treinamentos de cabeceio no futebol acima de dez anos de idade para evitar as subconcussões desde a juventude”, conclui Tumas.

Por Eduardo Nazaré

FONTE: Jornal da USP

Estudo revela novo mecanismo para instalação da dor neuropática

A famosa dor do nervo ciático, como é popularmente conhecida, é um entre muitos exemplos da dor neuropática, problema crônico que prejudica a qualidade de vida e para o qual ainda não existe medicação específica. Ao investigar a questão, um grupo de cientistas da USP e de instituições dos Estados Unidos descobriu um novo mecanismo, envolvendo células do sistema imunológico e as membranas do sistema nervoso central (meninges), ligado ao desencadear da dor neuropática. Os achados, publicados em artigo da revista The Journal of Clinical Investigation, abrem espaço para a pesquisa e desenvolvimento de terapias específicas contra o problema.

A principal descoberta do estudo, segundo Thiago Mattar Cunha, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e um dos autores do estudo, é que as meninges, que são membranas que recobrem o sistema nervoso central (encéfalo e medula espinal, o SNC), têm células que participam do processo de cronificação da dor neuropática. Chamou a atenção dos pesquisadores o fato de que essas células, chamadas de dendríticas, integram o sistema imunológico.

Cunha conta que buscaram com o estudo trazer novos conhecimentos para ajudar a desenvolver terapias “não apenas para tratar os sintomas, mas atacar a dor na origem, impedindo que ela se cronifique”.

Meninges e células dendríticas

Para realizar o estudo,  foi utilizado modelo animal (camundongos) com lesão em um nervo periférico, o ciático, reproduzindo o mesmo tipo de lesão traumática que a de um ser humano, para investigar e entender os mecanismos envolvidos.

Cunha explica que, após a lesão, as células dendríticas presentes nas camadas exteriores do SNC “aumentam a produção de um determinado tipo de enzima, a indoleamina 2, 3-dioxigenase (IDO1), que produz vários metabólitos, substâncias biológicas com atividade pró-dolorosa, ou seja, que aumentam a dor”.

Com esses resultados, avalia o professor, foi possível demonstrar um papel ainda desconhecido para as meninges e também para as células dendríticas, o que abre portas para o desenvolvimento de fármacos que possam bloquear a produção desta enzima e impedir que ela produza metabólitos que estimulam a dor.

Novas moléculas

A identificação do novo mecanismo encoraja os pesquisadores a desenvolver novas moléculas, a partir das já existentes no mercado, e também a pesquisa com aquelas advindas de produtos naturais. A busca é por uma molécula que seja capaz de bloquear, seletivamente e com boa potência, a produção dos metabólitos que aumentam a dor neuronal. A tarefa que se inicia conta com a participação de pesquisadores da FMRP e do Laboratório Nacional de Biociências localizado no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas.

Estima-se que a dor neuropática afete em torno de 10% da população mundial. Cunha conta que o problema é causado por uma lesão em algum nervo, em especial os sensitivos, que leva a informação dolorosa para o sistema nervoso central (SNC).

Entre os diferentes estímulos que desencadeiam a dor neuropática, o professor cita traumas mecânicos, compressão ou lesão por um corte do nervo (cirurgias, por exemplo) e o uso de fármacos, como quimioterápicos. Ele cita ainda as doenças metabólicas, como diabete, e doenças autoimunes, como esclerose múltipla, entre aquelas que podem despertar a dor neuropática.

O professor Cunha avalia que a equipe ainda tem uma longa jornada pela frente, mas acredita que essa nova descoberta traz boas perspectivas para um futuro tratamento da dor neuropática, que atinge milhares de pessoas pelas mais diversas razões, e que ainda não tem tratamento.

Mais informações: e-mail thicunha@usp.br, com Thiago Mattar Cunha

Texto: Ana Beatriz Fogaça
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Vitamina D pode estar ligado a tumor da glândula adrenal

Resultados ainda são de testes em laboratório, mas podem explicar relação do controle genético da vitamina D no desenvolvimento e comportamento maligno do tumor da glândula adrenal em crianças.

Experimentos realizados na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP avançam no entendimento dos mecanismos de formação e crescimento de tumores adrenocorticais (da glândula suprarrenal ou adrenal) em crianças. A adrenal é responsável pela produção de diversos hormônios e o tumor que ataca essa glândula possui, no Brasil, a mais alta incidência do mundo em crianças.

Os estudos recém-publicados pela equipe da FMRP mostram relação do tumor com mudanças no padrão de metilação (processo bioquímico que ocorre no DNA e regula a expressão dos genes), de expressão do gene VDR, que codifica o receptor da vitamina D, e também no perfil de metilação global das células tumorais, que é uma informação sobre o status de metilação — positiva/aumentada ou negativa/reduzida — de múltiplas regiões do genoma das células tumorais, indicando um comportamento mais maligno.

Entre os principais mecanismos observados pelos pesquisadores está a menor quantidade do gene VDR quando comparado com pacientes normais. “Detectamos a redução de sua expressão, mas também buscamos entender o que causa essa expressão reduzida. Uma das possibilidades é a alta metilação do gene que decodifica o VDR, que é um processo biológico que silencia ou expressa genes do nosso DNA. Mas ainda não sabemos por que isso ocorre e, por isso, são necessários estudos complementares para ampliar a compreensão”, afirma Sonir Antonini, professor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP e coordenador dos estudos.

Os achados sobre a quantidade desses genes, informa Antonini, foram obtidos de amostras de 108 pacientes pediátricos acompanhados em hospitais terciários no Estado de São Paulo, como o Hospital das Clínicas da FMRP (HCFMRP) e Centro Infantil Boldrini em Campinas, e estão descritos no artigo Vitamin D receptor hypermethylation as a biomarker for pediatric adrenocortical tumors publicado em abril deste ano no European Journal of Endocrinology.

Já os resultados dos ensaios pré-clínicos in vitro (laboratoriais) e in vivo (modelo animal) foram relatados no artigo Vitamin D receptor activation is a feasible therapeutic target to impair adrenocortical tumorigenesis, publicado na Molecular and Cellular Endocrinology, e mostram o impacto da expressão do VDR sobre o crescimento das células tumorais. Neste estudo, avaliaram o padrão da metilação (processo de modificação química do DNA que impede a expressão do gene) do VDR em células de tumor adrenocortical.

Antonini afirma que o grupo observou ainda haver “íntima relação entre o VDR e o sistema da via Wnt/Beta-catenina”, outra via importante na formação destes tumores e foco de estudo do grupo. “Fomos capazes de, nos testes in vitro, modular a expressão do VDR e verificar sua associação com o crescimento de células tumorais”, continua o professor, afirmando que estes achados abriram caminhos para estudar modelo animal de xenoenxerto tumoral, que é a implantação de células e desenvolvimento do tumor humano em camundongos. E, nestes modelos animais, verificou-se que o estímulo do gene que regula a vitamina D (VDR) – com administração subcutânea de injeções de vitamina D ou análogos nos animais – foi capaz de reduzir significativamente o crescimento tumoral.

Estes estudos foram realizados por Ana Carolina Bueno de Queiroz Arruda, que é nutricionista, pós-doutoranda da FMRP e primeira autora dos artigos. “Estes achados pavimentam o caminho para, numa fase posterior, comprovar esses efeitos em humanos”, informa Ana Carolina.

Análise da metilação global do genoma tumoral

Outro estudo publicado pelo grupo de pesquisadores analisou o padrão de metilação de todos os genes do genoma humano e observou que é possível, a partir de ferramentas computacionais, identificar grupos de pacientes com tumor adrenocortical agressivo e também aqueles menos agressivos. A diferenciação, aponta Antonini, está na metilação, que é importante para expressão ou silenciamento de genes.

“Nossos dados obtidos nos pacientes brasileiros são muito robustos e mostram que o padrão de metilação é um preditor independente do comportamento tumoral. Para confirmar isto, replicamos nossos achados em um grupo de pacientes internacionais, principalmente dos Estados Unidos, e os resultados foram os mesmos. Além disso, identificamos possíveis novos genes que podem ser usados como prognóstico por estarem envolvidos na formação e crescimento desses tumores e que iremos continuar investigando em estudos futuros”, conta o professor.

O artigo DNA methylation is a comprehensive marker for pediatric adrenocortical tumors foi publicado na Endocrine-Related Cancer e sua primeira autora, Ana Carolina Bueno de Queiroz Arruda, recebeu uma das principais premiações nacionais da área de endocrinologia no Congresso Brasileiro de Metabologia (CBEM) realizado pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) em setembro de 2022. O grupo recebeu a premiação de Melhor Estudo na Área Translacional e Básica apresentado no evento científico. Este trabalho também recebeu, em outubro, o Prêmio Slep de trabalho oral apresentado no congresso da Sociedade Latino-Americana de Endocrinologia Pediátrica (Slep).

Os três estudos integram o projeto temático Mecanismos fisiopatológicos e moleculares de tumorigênese: abordagem baseada em plataformas de sequenciamento em escala genômica. Com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o projeto é coordenado pela professora Margaret de Castro e tem como pesquisadores principais os professores Antonini e Léa Zanini Maciel, todos da FMRP. Além da colaboração com diversos pesquisadores da FMRP e do Centro Infantil Boldrini da Unicamp, estes estudos contam com análises de bioinformática realizadas em parceria com o professor Ricardo Vêncio, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.

Entenda o que são os tumores adrenocorticais

Os tumores adrenocorticais são neoplasias (tumores que surgem após um aumento anormal na quantidade de células) no córtex da glândula adrenal, que fica acima do rim. Ou seja, são tumores localizados em um componente do nosso sistema endócrino responsável pela produção de diversos hormônios, como cortisol, aldosterona, androgênios (hormônios masculinos) e as catecolaminas (adrenalina, noradrenalina e dopamina).

A doença, explica a nutricionista Ana Carolina Arruda, tem causas genéticas ligadas ao gene TP53 e é rara, sendo responsável por cerca de 0,2% de todos os cânceres pediátricos. No Brasil, no entanto, “a incidência dos tumores adrenocorticais é até 18 vezes maior e, por isso, é importante continuarmos estudando, já que, até o momento, não há marcadores moleculares prognósticos robustos para a condição”.

A maioria das crianças com esta doença apresenta sinais de excesso hormonal, como puberdade precoce e ganho de peso com parada no crescimento. “A remoção cirúrgica do tumor é o único tratamento potencialmente curativo para pacientes com a doença localizada e o tratamento com quimioterápicos e droga adrenolítica têm efeito limitado na maioria dos pacientes com a doença avançada”, conclui o professor Antonini.

Mais informações: e-mail antonini@fmrp.usp.br ou acarolinabueno@usp.br

Texto: Giovanna Grepi e Rita Stella
Arte: Rebeca Fonseca

FONTE: Jornal da USP

Infecções bacterianas ainda estão entre as doenças que mais matam no mundo

Pesquisa publicada na revista científica The Lancet, em novembro, demonstrou que mortes por infecções bacterianas ainda despontam como a segunda principal causa de morte no mundo. Em 2019, estima-se que ocorreram 13,7 milhões de mortes relacionadas com infecções. Mas o maior problema não mora aí: dessas, mais da metade foram causadas por apenas 33 patógenos.

Isso significa que 13,6% de todas as mortes em 2019 foram causadas por essas bactérias e, dentre essas, apenas cinco delas causaram quase metade de todas as mortes por bactérias investigadas. Elas também são responsáveis por 56,2% de todas as mortes relacionadas à sepse.

“As doenças infecciosas eram a principal causa de morte no mundo todo no início do século passado e isso foi se transformando em virtude das melhorias sanitárias, como o tratamento de água e esgoto, o controle da qualidade da produção dos alimentos e também o advento das vacinas e o desenvolvimento dos antibióticos, que passaram a ser produzidos em grande escala na década de 40”, diz Valéria Cassettari, médica infectologista e coordenadora do Controle de Infecções Hospitalares do Hospital Universitário.

Por que ainda tantos morrem?

O infectologista e professor da Faculdade de Medicina da USP, Marcos Boulos, explica que o número elevado de mortes tem a ver com as características replicativas das bactérias. “Algumas bactérias, de modo geral, e alguns protozoários replicam muito rapidamente. Mais rápido e mais fatal, na maior parte das vezes”, diz.

Mesmo com esse avanço, as fatalidades poderiam ser bem menores. Dentre as causas para o ainda alto número de mortes por infecções bacterianas, destaca-se o atendimento tardio, diagnóstico não específico, maus hábitos alimentares e fragilidades de saúde, que implica na piora do quadro caso haja uma bactéria.

Valéria lembra também que, entre os patógenos que mais matam, dois deles, Staphylococcus aureus e Escherichia coli, estão entre os microrganismos que naturalmente habitam o corpo humano. “São bactérias que estão presentes no nosso organismo como colonizantes na pele e no trato gastrointestinal. Em algum momento ocorre uma fragilidade das nossas defesas e elas acabam causando doenças”, diz.

 

Staphylococcus aureus e  Escherichia coli – Fotos: Scientific Animations; NIAID/Wikimedia Commons

Não é difícil adquirir uma dessas bactérias, mas é complicado tratá-las. Por isso, apresentam-se como um problema mundial de saúde pública. Nilton Erbet Lincopan Huenuman, professor livre-docente do Departamento de Microbiologia no Instituto de Ciências Biomédicas da USP, ressalta que muitas vezes as infecções são tratadas “empiricamente”, ou seja, um só protocolo é aplicado independentemente de exames certeiros ou bactérias diferentes. Isso pode levar à morte o paciente que não recebeu o tratamento adequado.

Problemas no sistema de saúde

Outro aspecto revelado pelo estudo é que países com uma maior renda per capita registraram as menores taxas de morte por infecções bacterianas, enquanto regiões com menores rendas foram as mais afetadas. Um exemplo é a região da África Subsaariana. Isso mostra a importância de um tratamento eficaz e de qualidade dentro de facilidades médicas públicas e privadas.

“Os maiores desafios do sistema de saúde para o atendimento adequado às doenças bacterianas são, em primeiro lugar, disponibilidade de equipe capacitada em número suficiente de profissionais para atendimento nos serviços de urgência, para que o diagnóstico seja feito rapidamente e com precisão”, pontua Valéria.

Exames de cultura de sangue e de urina, por exemplo, também estão entre os desafios: muitas vezes não há como fazer. Além disso, depois de coletados, devem ir a bons laboratórios para que um diagnóstico certeiro possa ser feito bem como a identificação correta das resistências a antibióticos. Por fim, a infectologista lembra que muitos pacientes com infecções necessitam de cirurgias de urgência, medicamentos vasoativos e monitoramento 24 horas por dia: “Nós temos esse problema que é uma carência permanente de leitos de UTI”.

 

É de extrema importância procurar por atendimento médico assim que sintomas de infecção aparecerem  Foto: stefamerpik/Freepik

Cuidados

Por isso, é de extrema importância procurar por atendimento médico assim que sintomas de infecção aparecerem. Eles são: tosse, espirro, febre, inflamação, catarro, fadiga, entre outros. Boulos ainda lembra que hábitos saudáveis de alimentação são fundamentais para que as bactérias, principalmente as oportunistas, não encontrem terreno fértil para sua replicação.

Divulgação

Um curso para capacitar professores de ensino médio sobre resistência bacteriana aos antibióticos está sendo organizado por Valéria e Lincopan, uma parceria entre o Hospital Universitário e o Instituto de Biomédicas II. O curso será presencial, com seis aulas teóricas e duas aulas práticas em laboratório, e acontece do dia 3 a 25 de março de 2023: às sextas, as aulas vão das 19h às 21h e, aos sábados, das 9h às 11h. A parte teórica será no Hospital Universitário da USP e a prática será no Instituto de Ciências Biomédicas da USP.

As inscrições estão abertas até o dia 17 de fevereiro. Basta preencher o formulário de inscrição e enviar o comprovante de professor de ensino médio com especificação da disciplina ministrada para o e-mail cecex@hu.usp.br.

Por Julia Estanislau

FONTE: Jornal da USP

Corpo humano possui mecanismos para se adaptar aos efeitos do calor

A tontura, a perda de apetite e o aumento da produção de suor são meios que o corpo humano possui para regular a temperatura corporal durante os dias mais quentes do ano.

Principalmente no final do ano, no término da primavera e início do verão, as temperaturas aumentam e a sensação de sempre estar com calor aparece. “A maior parte dos problemas por temperaturas ambientes muito elevadas é observada na primavera ou no início do verão, e não no pico dessas estações. Isso se dá porque a gente ainda não tem, no início, esses mecanismos de adaptação ao calor totalmente estabelecidos“, comenta o professor Luiz Guilherme Branco, do Departamento de Fisiologia, Morfologia e Parasitologia Básica da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da USP.

O calor não provoca somente sensações, mas também sintomas como falta de apetite, aumento da sudação e tontura em algumas pessoas. Mas como e por que isso acontece?

Funcionamento

A temperatura corporal tende a se manter em equilíbrio sempre, por volta de 36,5ºC, no frio ou no calor. Para controlar esse valor, o corpo humano possui ferramentas responsáveis por aferir qual o tamanho da regulação, como explica Branco: “A termorregulação se baseia na existência de termorreceptores que detectam variação da temperatura ambiente na pele. Essas informações são levadas até o sistema nervoso central e são processadas no hipotálamo, assim, ajustes termorregulatórios são finalmente feitos”.

O fato de pessoas de regiões mais quentes se adaptarem “melhor” quando comparadas às de outras pode ser explicado pela adaptação: “O sistema termorregulatório de indivíduos adaptados ao calor se torna um pouco mais eficiente tanto na geração de suor quanto no fluxo sanguíneo cutâneo, que se torna um pouco maior também. Essa adaptação leva o indivíduo a ter um estresse térmico relativamente menor frente à mesma temperatura ambiente em relação ao indivíduo não adaptado”, diz o professor.

Os sintomas semelhantes até mesmo aos de uma virose são os efeitos da manutenção da temperatura corporal em equilíbrio. Como esse controle é inevitável, existem apenas formas de auxiliá-lo, fazendo com que o organismo não precise de tanto esforço para regular a temperatura.

Efeitos

A tontura, a perda de apetite e o aumento da produção de suor são mecanismos para a regulação da temperatura corporal durante o calor. Branco analisa a ocorrência desses eventos: “A tontura, via de regra, é comum. Ela é relacionada à queda da pressão arterial causada tanto pelo aumento do aporte sanguíneo cutâneo, ou seja, o sangue vai para perto da pele a fim de aumentar a perda de calor, como pela desidratação que esses indivíduos apresentam”.

A questão do apetite, coloca Branco, é fruto de uma demanda metabólica menor, já que não há a necessidade de gastar energia para produzir calor nos dias quentes, logo, tem-se uma tendência de comer menos. Já o aumento do suor está relacionado com a perfusão cutânea: “Por meio da ativação de glândulas sudoríparas, que acontece com o aumento da perfusão cutânea (fornecimento de sangue à região próxima à pele), aumenta-se a capacidade de transferência de calor para o meio”, pontua o professor.

Para diminuir esses efeitos, Branco dá algumas dicas: “Ajustes comportamentais protegem a nossa saúde. Por exemplo, quando a gente está adaptado ao calor, passamos a aumentar a ingestão de água, a evitar alimentos muito pesados, a preferir alimentos ricos em água como frutas frescas, a usar roupas mais leves, a usar chapéus, a buscar sombra, a usar aparelho de ar condicionado, ventiladores, etc. São um conjunto de alterações comportamentais que acabam beneficiando a nossa saúde“.

FONTE: Jornal da USP

Ancestralidade africana pode amenizar risco genético do Alzheimer

A doença de Alzheimer é o tipo mais comum de demência, síndrome caracterizada pela deterioração progressiva das funções cognitivas, que acarreta problemas na memória, atividades funcionais, pensamento e comportamento, tornando-se mais comum com o avanço da idade. Embora o conjunto completo de causas ainda seja desconhecido, é sabido que certos genes podem aumentar o risco de desenvolvimento do Alzheimer, e um novo estudo indica que um deles, o gene APOE, pode ter seu impacto relacionado à ancestralidade dos indivíduos.

Trata-se de uma pesquisa realizada em parceria entre o Laboratório de Fisiopatologia do Envelhecimento (Gerolab) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) com o Departamento de Genética da USP. Nela, foi investigada a complexa interação entre genética, lesões no tecido do sistema nervoso e cognição funcional em uma amostra de 400 indivíduos afetados pela patologia do Alzheimer com diferentes níveis de gravidade.

“Os resultados dessa pesquisa nos ajudam a entender como o principal fator genético para a doença de Alzheimer, que é a apolipoproteína E, se associa a essa condição de forma diferente entre pessoas que têm ancestralidade africana e aquelas que não têm uma grande quantidade dessa ancestralidade”, diz Claudia Kimie Suemoto, professora da Disciplina de Geriatria da FMUSP e pesquisadora do Biobanco para Estudos em Envelhecimento da faculdade.

A apolipoproteína E é codificada pelo gene APOE, que desempenha papel-chave no metabolismo de lipídeos, e cuja variação APOE4 é um dos principais fatores genéticos reconhecidos para a predisposição ao desenvolvimento da demência.

“Já se sabia há anos que a APOE4 é uma das variantes comuns com maior efeito sobre Alzheimer”, diz Michel Naslavsky, professor do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP e primeiro autor do estudo. “O que tem se evidenciado recentemente, graças a estudos mais inclusivos com populações não europeias, é que o APOE4 pode ter um efeito atenuado a depender da ancestralidade.” Assim, embora esse gene aparente ter efeito danoso em todos os grupos populacionais, indivíduos com mais ancestralidade africana seriam menos suscetíveis ao seu impacto.

Ambiente e genética

Segundo a literatura médica, pessoas com ancestralidade africana costumam ter menor acúmulo de lesões no tecido do sistema nervoso associadas ao Alzheimer. No entanto, quando essas lesões estão em grande quantidade, essa ancestralidade se associa a uma pior habilidade cognitiva. Nos EUA, por exemplo, a incidência de demências é cerca de duas vezes maior em afro-americanos do que em brancos e outras minorias.

“Grande parte das diferenças se dá por conta de exposições ambientais variadas”, comenta o professor Naslavsky. “Ainda assim, sabemos que há distinções genéticas em indivíduos que se autodeclaram brancos e negros devido a múltiplas ancestralidades.” O pesquisador ressalta que a complexidade aumenta quando se analisa países mais miscigenados, a exemplo do Brasil, onde muitos possuem APOEs de diversas origens.

A aposta dos cientistas é que, ao se identificar o papel relativo do APOE em cada população, será possível entender melhor as alterações funcionais no corpo que ocorrem em decorrência da doença de Alzheimer.

O próximo passo da pesquisa, segundo a professora Claudia Suemoto, será “continuar coletando mais casos de Alzheimer para aumentar a amostra e fazer outros estudos genéticos, não só com a apolipoproteína E, mas com outros genes candidatos de risco para essa doença”.

O estudo foi publicado em 7 de setembro de 2022 no periódico Molecular Psychiatry e pode ser conferido em: https://www.nature.com/articles/s41380-022-01729-x

Da Assessoria de Comunicação da FMUSP

FONTE: Jornal da USP

Proteínas são essenciais para o bom funcionamento do organismo humano

Você  sabe exatamente por que as proteínas são importante para a alimentação? O que elas fazem no corpo? Quais seus benefícios? O que a deficiência delas causa?  As proteínas são formadas por aminoácidos que contribuem justamente para o crescimento dos tecidos.

A nutricionista Patrícia Campos Ferraz,  da Faculdade de Saúde Pública da USP e mestre em Ciência dos Alimentos pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, explica o quanto a proteína é importante na formação do nosso corpo.

Apesar de todos os seus benefícios, ela sozinha não completa uma alimentação saudável, por isso é importante o balanceamento com outros alimentos. Atletas que desejam ganhar massa magra e aumentar a definição muscular apostam em uma dieta rica em proteína.

Consumo diferenciado

A especialista explica como deve ser feito o consumo de  proteínas, principalmente por quem pratica esportes. Essa fórmula muda quando o assunto são idosos e crianças. Nesse caso, a alimentação é diferenciada. A deficiência de proteínas no organismo pode causar problemas sérios.

As pessoas que têm intolerância à proteína animal podem procurar um nutricionista para fazer um acompanhamento justamente para não ter problemas no futuro. A proteína também repõe a energia que foi perdida, auxilia a defesa do organismo, faz o transporte de substâncias pelo corpo e atua no sistema nervoso. Nosso cérebro precisa de uma quantidade de proteínas para que funcione bem, ativando as funções cognitivas.

FONTE: Jornal da USP

Insulina semanal pode trazer conforto a pacientes diabéticos num futuro próximo

Cem anos após o primeiro uso de insulina no tratamento do diabete, novidade substituiria dose diária, na visão de Maria Elisabeth Rossi da Silva.

O metabolismo humano controla variadas funções, inclusive a regulação da taxa de glicose (glicemia) no sangue. No corpo humano, o hormônio com essa função é a insulina. A escassez ou deficiência na atuação da insulina resulta em diabetes mellitus, uma doença que atinge 16,8 milhões de brasileiros, segundo o Atlas do Diabetes da Federação Internacional de Diabetes (IDF).

Como tratamento, os pacientes são indicados a aplicar uma dose diária de insulina e, em alguns casos, uma dose extra. Contudo, o futuro do tratamento da doença é promissor, uma vez que está sendo desenvolvida uma insulina basal. “Temos hoje insulinas que a gente chama de  insulina basal, que mantém um nível constante de insulina durante todo o dia, mas essa insulina dura 24 horas. Então, o paciente tem que aplicá-la todos os dias, e a semanal vai trazer esse conforto”, esclarece Maria Elisabeth Rossi da Silva, chefe da Unidade de Diabetes do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

Para o paciente do tipo 1 da diabetes mellitus, caracterizada pela origem autoimune – as células de defesa do corpo atacam o pâncreas, responsável pela produção da insulina –, “a insulina basal vai dar tranquilidade para o paciente, mas ele vai ter que continuar utilizando a [insulina] rápida nas refeições”, explica. No caso do tipo 2, presente em 90% dos diabéticos, a síndrome está relacionada ao envelhecimento das células do pâncreas, que podem diminuir a produção da insulina. “O paciente com diabete tipo 2 realmente vai se beneficiar e vai poder fazer o uso apenas dessa aplicação injetável uma vez por semana”, diz ela.

A novidade ainda está na fase três de pesquisa: “É uma confirmação da padronização da insulina [basal] e uma confirmação de que ela traz benefícios”, elabora Maria. Os resultados apresentados pela tecnologia têm atuação semelhante ou até mesmo superior à insulina diária, conta ela. A previsão de chegada ao mercado é até 2024.

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Como se prevenir?

Assim como uma vasta gama de doenças, o diabete também tem três principais causas a serem pontuadas. A primeira delas é o aspecto genético: “Alguns genes favorecem o aparecimento do diabete, mas talvez o mais importante não seja isso”, avalia Maria Elizabeth. Ela se refere aos outros dois fatores que favorecem o surgimento da doença, a obesidade e o sedentarismo.

Em comparação com 2006, a atual população obesa no Brasil dobrou em frequência, afirma ela: “Nós tínhamos 11% da população com obesidade [em 2006] e hoje nós temos 22%”. A relação direta deste dado com a porcentagem de diabéticos também é uma questão de preocupação. Quinze anos atrás, “tínhamos 5,3% da população com diabete e hoje nós temos quase 10%”.

Por sua vez, a prática de atividades físicas reduz a glicemia. Em altos níveis, a taxa de glicose no sangue pode levar a complicações na saúde, adverte. “O paciente com diabete tem o risco maior de hipertensão, doença cardíaca, angina, infarto, acidente vascular cerebral ou de doença renal e alguns pacientes podem até progredir para diálise”, exemplifica.

Para uma boa qualidade de vida, Maria sugere atividades físicas, o controle da taxa de glicose e cuidado com os níveis de lipídios, como colesterol e triglicérides. “E essa insulina nova que vai ajudar no controle. Mas, para a prevenção, o que nós temos de mais forte ainda é aquilo da atividade física e exercício”, conclui.

FONTE: Jornal da USP

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