A constatação é de um estudo da psicóloga Vera Paiva e revela que o suicídio nem sempre é motivado por doenças mentais e que pode estar atrelado a motivos sociais
Neste mês comemora-se o Setembro Amarelo, uma campanha de conscientização da população acerca do suicídio, criada em 2014 pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é a segunda causa de morte entre jovens entre 15 a 29 anos e 77% deles ocorre em países pobres.
O artigo Prevalência e determinantes sociais da ideação suicida entre estudantes brasileiros em escolas públicas do ensino médio busca sanar uma lacuna nas estatísticas de suicídio entre jovens brasileiros. Comumente associado a doenças mentais, o suicídio pode estar atrelado a motivos sociais, “à desigualdade econômica, um crescimento de desemprego, da flexibilidade de emprego, a falta e a destruição das políticas de proteção social”, como explica a professora do Instituto de Psicologia da USP e um dos autores do estudo, Vera Paiva. Ela também ressalta que esse problema “tem sido associado com desigualdade de gênero”.
O estudo revela que a taxa de suicídio é maior entre meninos e que está diretamente ligada a fatores socioeconômicos, de bem-estar social e pertencimento, como a renda baixa, bullying e até ao estudo no período noturno. Ainda assim, jovens que estão diretamente expostos à LGBT+ fobia e que se assumem parte da comunidade LGBTQIA+ são o grupo mais afetado.
Mesmo que o número de suicídios não tenha aumentado consideravelmente na pandemia, o que aconteceu foi uma mudança nos grupos que o idealizam. “A gente não viu um aumento expressivo, a gente viu mudanças dos grupos que estão mais ou menos afetados”, explica a professora.
O papel da escola
O projeto, financiado pela Fapesp e liderado pela professora e por Marcos Roberto Vieira Garcia, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), surgiu a partir de uma demanda das escolas e dos professores para que o assunto de saúde mental fosse abordado nas escolas.
“A escola não tem condições plenas de resolver esse assunto, mas tem sim condições de evitar a discriminação, o bullying baseado em qualquer uma desses elementos e fazer o compartilhamento das situações de sofrimento”, ressalta Vera. “As professoras não são capacitadas para lidar com um evento de saúde mental ou lidar com famílias”, observa.
A atuação das escolas na prevenção do suicídio e na diminuição do sofrimento psicossocial desses grupos mais afetados é muito importante, porém, deve ser direcionado. Abordar o assunto, promover um ambiente de segurança a esses grupos, pautar temas como a LGBT fobia e estar atento a sinais são medidas que podem ser tomadas por essas instituições. Uma das melhores formas de prevenção, segundo Vera Paiva, é o sentimento de pertencimento e poder conversar e se reunir com pessoas parecidas.
Sistema de saúde
A culpabilização dos pacientes e o encaminhamento destes não são o mais recomendado. O Sistema Único de Saúde, que oferece acompanhamento nesses casos, não dispõe de atenção individualizada, o que é imprescindível. “A maior parte do que é oferecido para eles é o atendimento em grupo, e na primeira chegada eles querem ser recebidos individualmente, querem ser escutados individualmente”, explica a pesquisadora. “É necessário mudar o modo como o serviço de saúde acolhe os jovens”, finaliza Vera.
Pesquisa liderada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) identificou um conjunto de proteínas ligadas à depressão tardia, doença que acomete idosos. Foram determinadas moléculas que podem contribuir para diagnósticos e tratamentos mais eficazes. O estudo, que foi publicado no periódico europeu Journal of Proteomics, envolve também cientistas das universidades de Connecticut (EUA) e de Toronto (Canadá), além da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Daniel Martins-de-Souza, professor da Unicamp e coordenador do trabalho, destaca que um dos objetivos é entender a similaridade com a depressão. “Ainda não temos ideia de quão similar, do ponto de vista molecular, essa depressão tem com a depressão maior, que afeta quase 10% da população. E, da mesma forma como [ocorre] para depressão maior, não temos biomarcadores que possam identificar ou predizer que alguém vai desenvolver isso no futuro”, aponta.
Uma das diferenças entre as duas manifestações da doença pode estar ligada ao aspecto ambiental. “Ou seja, as pessoas passam por experiências na vida que acabam dirigindo mudanças biológicas que levam à depressão. Isso também é verdade para a depressão maior, mas essas características podem ser mais proeminentes nas pessoas com depressão tardia”, relaciona. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), pelo menos seis a cada 100 pessoas, entre 65 e 74 anos, serão diagnosticadas com depressão.
Análises
Foram estudadas amostras sanguíneas de 50 pessoas, das quais 19 tinham diagnóstico de depressão tardia. A análise mostrou diferenças significativas na concentração de 96 proteínas. Entre elas, 75 são candidatas para a determinação de uma identidade molecular para a doença geriátrica.
“A gente conseguiu achar o que nós chamamos de uma assinatura molecular. Ou seja, nós identificamos algumas moléculas no sangue que teriam esse poder de distinguir quem tem a depressão e quem não tem”, pontuou Martins-de-Souza.
As próximas etapas do estudo envolvem a coleta de novas amostras dessa população. A ideia é “quantificar especificamente estas 75 proteínas para ver se a gente consegue replicar esses dados”, explica o coordenador.
Além disso, a doutoranda Lícia Silva-Costa, do Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp e uma das autoras do estudo, identificou seis proteínas que tem uma correlação a severidade dos sintomas. “Também pode ser uma marcação para predizer que uma pessoa vai ter uma piora muito grande de sintomas, o que poderia ser previamente tratado”, acrescenta o professor. A proposta agora é também validar essas informações com novas amostras.
Por Camila Maciel – Repórter da Agência Brasil – São Paulo
Você sabe para que serve a vitamina B6? Cresce o número de estudos que sugerem que a ausência desse composto no organismo pode impactar a saúde mental.
O complexo B é uma das vitaminas mais importantes para o corpo, entre elas, a B12, utilizada para combater a anemia e saúde dos ossos e a B9, indicada para grávidas por causa do ácido fólico, entre outras.
A nutricionista Paula Sozza Silva Gulá, doutora no Programa de Psicobiologia do Departamento de Psicologia e do Laboratório de Nutrição e Comportamento da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, explica que o ser humano não consegue sintetizar as vitaminas do complexo B, por isso é importante a complementação alimentar com a ingestão adequada.
Reações químicas
A vitamina B6 está envolvida em uma série de reações químicas importantes para o sistema nervoso central, sendo essencial para o funcionamento do nosso organismo e atuando através da corrente sanguínea. Participa ativamente não só da parte cerebral, mas também tem sua importância no metabolismo e na função hormonal.
“A vitamina B6 está disponível amplamente em alimentos como salmão, atum, cereais fortificados, grão de bico, aves, folhas verdes escuras, banana, laranja e melão. Mas também em alimentos como carnes, ovos, castanhas, nozes, entre outros grupos alimentares”, orienta Paula.
Incluída no rol dos transtornos mentais, a depressão é uma doença psiquiátrica comum, que se caracteriza por tristeza persistente e falta de interesse em realizar atividades que antes eram consideradas divertidas. A depressão pode afetar pessoas de todas as idades, desde bebês a idosos. Entre os tipos mais comuns da doença estão a depressão maior, a bipolar, a pós-parto, os transtornos depressivos induzidos por outras substâncias ou medicamentos, entre outras. A distimia, por exemplo, é um tipo de depressão crônica e incapacitante, que apresenta sintomas leves a moderados de tristeza, sensação de vazio ou infelicidade.
“Todas precisam de acompanhamento médico adequado pois, se não tratadas, essas doenças podem levar ao suicídio”, afirmou o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antonio Geraldo da Silva. A campanha Setembro Amarelo, realizada anualmente neste mês pela ABP, chama a atenção sobre a depressão e os perigos que ela pode causar.
“Praticamente, todos os casos de suicídio são relacionados aos transtornos mentais, principalmente os não diagnosticados ou tratados incorretamente. Dessa forma, a maior parte dos episódios fatais poderia ter sido evitada com as informações corretas sobre saúde mental e doenças psiquiátricas”.
O doutor Antonio Geraldo Silva esclareceu que, devido à sua alta prevalência, a depressão é a doença mais associada ao suicídio. “Não só durante a campanha Setembro Amarelo®️, como em todos os meses, a ABP cumpre sua principal missão, que é disseminar conteúdos relevantes sobre saúde mental para a sociedade, atuando na conscientização da sua importância e na prevenção das doenças mentais”.
Fatores de risco
Segundo informou o especialista, alguns fatores de risco podem levar uma pessoa à depressão. “Existem diversos fatores que podem ser considerados gatilhos e causam impacto no desenvolvimento de uma doença mental, como causas genéticas, que chamamos de genótipo, e os fatores ambientais, os fenótipos. São duas características que, quando combinadas, determinam se a pessoa desenvolverá ou não qualquer tipo de doença”. Silva explicou que o ambiente no qual o indivíduo está inserido e seu comportamento também contribuem para o desenvolvimento de doenças mentais como, por exemplo, conflitos familiares, dificuldades financeiras, problemas no relacionamento, a influência da mídia e das redes sociais. Essas situações podem ser fatores potencializadores para o surgimento de uma doença mental. “Sendo assim, isso também tem impacto no comportamento suicida”, disse o psiquiatra.
Além dos fatores ambientais e genéticos, o presidente da ABP lembrou que outros fatores podem impedir o diagnóstico precoce das doenças mentais e, consequentemente, causar impacto na prevenção do suicídio, levando ao aumento de casos, como o estigma e o tabu relacionados ao assunto. “Esses são aspectos importantes que impactam negativamente nos portadores de doenças mentais e no comportamento suicida”. “Praticamente, 100% das pessoas que tentam ou cometem suicídio têm alguma doença psiquiátrica, diagnosticada ou não. As doenças mais relacionadas ao suicídio, além da depressão, são transtorno bipolar, transtornos relacionados ao uso e abuso de álcool e drogas, transtorno de personalidade e esquizofrenia.
Antonio Geraldo da Silva afirmou que a pessoa diagnosticada com depressão precisa ter uma rede de apoio de familiares ou amigos. “A família e os amigos são fundamentais na busca por ajuda e no apoio ao tratamento. Muitas vezes, são os primeiros a perceber que há algo de diferente e apontar a necessidade de buscar auxílio psiquiátrico”. Os sintomas depressivos variam de pessoa para pessoa, mas os mais comuns são tristeza, fadiga, distúrbios de sono, alterações no peso, baixa autoestima, perda de energia, dificuldade de concentração, redução de interesse em atividades anteriormente prazerosas e no contato com pessoas, ideias suicidas.
Buscando auxílio
É sempre bom ressaltar que somente um médico ou profissional da área de saúde pode diagnosticar corretamente a depressão. O presidente da ABP ressaltou que uma vez que se nota prejuízo no comportamento do indivíduo, ou seja, quando os sintomas começam a atrapalhar a vida da pessoa, é hora de buscar um psiquiatra para avaliar o quadro. “Ansiedade e tristeza são características normais do ser humano mas, a partir do momento em que nos impedem de sair de casa, trabalhar, levar uma vida social ativa, nos relacionar com outras pessoas, devemos procurar auxílio”.
Para ajudar uma pessoa depressiva, deve-se orientá-la a buscar cuidados, um tratamento especializado para a doença. “Se a pessoa tem sintomas depressivos, ela precisa e merece procurar ajuda com um médico psiquiatra, que vai indicar e oferecer o melhor tratamento possível”.
O médico lembrou também que os quadros depressivos precisam ser tratados com cuidado e urgência. “Não podemos deixar a doença envelhecer. Se a pessoa está mostrando que tem os sintomas, devemos ajudá-la a procurar um médico para fazer o diagnóstico, entender qual tipo de ajuda ela vai precisar e iniciar o tratamento imediatamente”.
A pesquisa Vigitel Brasil, realizada em 2021 e publicada este ano pelo Ministério da Saúde, incluiu pela primeira vez a depressão. O levantamento mostrou que 11,3% dos cidadãos brasileiros receberam diagnóstico da doença, o que corresponde a cerca de 23 milhões de pessoas, quase o dobro do número divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019, que indicava a existência de 12 milhões de brasileiros com depressão. Considerando que nem toda a população tem acesso aos serviços de saúde mental, Antonio Geraldo da Silva destacou que muitas pessoas podem viver com depressão sem conhecer o diagnóstico. “E isso é muito grave. Devido à alta prevalência, a depressão é a doença mais associada ao suicídio”, reiterou. A própria OMS considera que a depressão é a terceira doença mais incapacitante e, diante do envelhecimento da população e das mudanças globais, existem perspectivas de que será a doença mais incapacitante até 2030.
Crianças e jovens
A psiquiatra Janine Veiga disse que a depressão infantil é semelhante à do adulto e que os sintomas são iguais, em maior ou menor grau. A doença pode ocorrer, por exemplo, por predisposição genética; por traumas advindos de situações de abuso; por convívio familiar conflituoso; por eventos estressantes, entre outras razões.
“Se não tratada a depressão, o jovem pode envolver-se com uso de drogas, apresentar dificuldade no relacionamento social e há o risco de agravamento da doença, que pode até chegar ao suicídio”, alertou. Janine recomendou que os pais devem ficar atentos a mudanças de comportamento dos filhos, como alteração do sono, padrão alimentar, irritabilidade, queda no rendimento escolar, choro fácil, desânimo, entre outros.
Pandemia
A psicóloga da Fundação São Francisco Xavier Gabriela Pinheiro Reis afirmou que as consequências da pandemia de covid-19 têm se revelado preocupantes para a saúde mental da população. O Relatório Mundial de Saúde Mental de 2022, divulgado pela OMS, revelou que apenas no primeiro ano da pandemia 53 milhões de pessoas desenvolveram depressão e 76 milhões tiveram ansiedade, com alta de 28% e 26% de incidência desses transtornos, respectivamente.
De acordo com a OMS, o suicídio é a segunda principal causa de morte entre indivíduos com idade entre 15 e 29 anos. “O suicídio é um tema sensível e uma triste realidade na sociedade. A campanha Setembro Amarelo tem fundamental importância na conscientização sobre o assunto e na promoção da informação correta e, principalmente, para incentivar as pessoas que estejam passando por momentos difíceis a buscarem ajuda”, comentou Gabriela.
Na avaliação da psicóloga, as doenças mentais precisam ser encaradas sem preconceito. “Não é frescura. Depressão, bipolaridade e ansiedade são doenças que devem ser diagnosticadas e tratadas o quanto antes”.
Bem me Quer
A campanha Bem Me Quer, Bem Me Quero: Cuidar da sua saúde mental é um exercício diário”, realizada pela Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata), visa a conscientizar a população sobre depressão, ansiedade e prevenção ao suicídio por meio da valorização do autocuidado e do equilíbrio na rotina.
Para a associação, algumas atitudes podem fazer a diferença e contribuir para a saúde mental, como não ficar o tempo todo conectado na internet, estabelecer horários, evitar bebidas cafeinadas em excesso e optar por uma alimentação equilibrada.
A presidente da Abrata, Marta Axthelm, chamou a atenção para o fato de que a autocobrança para dar conta de tantos papéis, principalmente no caso das mulheres, que são profissionais, mães, parceiras, amigas, no dia a dia, pode ser um gatilho para a depressão. “É essencial reduzir o tempo de acesso às redes sociais, principalmente no período da noite. No caso da depressão, a condição pode apresentar muito sono, mas tem o outro lado, que é a insônia”.
Segundo Marta, a depressão costuma a apresentar sinais que não são percebidos pelo paciente, na maioria das vezes. No caso do suicídio, quem pensa em tirar a própria vida quase sempre dá sinais, mas boa parte das pessoas que estão ao seu redor não consegue identificá-los. “Por isso, o Setembro Amarelo é tão importante para debater esses temas. Mais uma vez, reforçamos nosso papel de promover iniciativas que despertam a conscientização do autocuidado em prol da saúde mental e que também estimulam a população a olhar ao redor para identificar que alguém próximo precisa de ajuda”, concluiu a presidente da Abrata.
Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro
Presente majoritariamente em crianças, a dermatite atópica é a doença de pele mais comum na infância. Segundo Roberto Takaoka, médico da divisão de Dermatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (HC-FM) da USP e responsável pela organização da exposição, a mostra “foi um pedido dos pacientes porque sentem que não há o conhecimento amplo da doença”. A exibição interativa estará aberta entre hoje (12) e 23 de setembro, no hall de entrada do Instituto Central do HC.
A necessidade de conscientização ao público serve como educação para evitar os casos de bullying e isolamento dos pacientes. Takaoka destaca as causas da doença: “É importante salientar que não é contagioso, é de origem genética”. Além das crianças, a dermatite atópica também acomete pessoas com outras alergias, como a asma, e aqueles em transição da infância para a adolescência.
O médico sinaliza a possibilidade de prevenção do agravamento: “Contato com água quente, sabonete mais forte, bucha. Isso pode começar a causar uma reação mais forte, são fatores desencadeadores”. A parte emocional, como as situações escolares e domiciliares, também deve ser levada em consideração, na opinião dele. “Estresse e ansiedade, isso pode piorar a parte da coceira e piora a [condição da] dermatite”, informa.
Tratamento
A inflamação cutânea deve ser observada por um pediatra e, em casos mais graves, por um dermatologista, sugere Takaoka. O tratamento depende da intensidade da doença, e é “importante ressaltar que se deve evitar os fatores desencadeantes e a parte do controle emocional”, indica ele. Os casos leves, caracterizados por lesões isoladas, devem ser tratados por medicamentos locais, enquanto nos casos fortes são aplicados medicamentos sistêmicos via oral ou injetável.
O médico explica que há um incentivo para o paciente entender o que acontece na sua pele e identificar os fatores desencadeadores: “Tem muita pesquisa sobre novos medicamentos e acho que vamos conseguir um melhor controle dessa doença. Mas nunca esquecer desse apoio emocional, da educação sobre a doença”.
As nanopartículas dispersas em sistemas lipídicos (de gorduras) e carregadas com antibióticos são usadas para transportar medicamentos e podem aumentar a ação dos fármacos, deixando-os mais eficientes.
As infecções bacterianas são um grave problema de saúde global: afetam desde a expectativa de vida até a produção de alimentos, segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS). Pensando em soluções terapêuticas mais eficazes para infecções bacterianas oculares, pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP desenvolvem estudos com nanopartículas à base de lipídios (gorduras) carregadas com antibióticos (LBNs). Essas partículas minúsculas – menores que 500 nanômetros (o equivalente a 5 centímetros divididos por cem mil) – são capazes de levar um medicamento pelo organismo até o local da infecção.
Atualmente, há vários tipos de nanopartículas difundidas no mercado, usadas em medicamentos com diferentes vias de administração, como oral e oftalmológica, para tratar doenças infecciosas, bacterianas e cardiovasculares, inflamações crônicas, transtornos neurológicos e até mesmo câncer. O intuito dos cientistas da USP é melhorar a ação desses fármacos através das vantagens proporcionadas pelo uso das LBNs, como a maior velocidade de absorção do medicamento pelo organismo, com o objetivo de tratar infecções nos olhos causadas por bactérias.
A pesquisadora Mirla Bazan Henostroza, doutoranda no Programa de Fármacos e Medicamentos da FCF, explica ao Jornal da USP que existem vários tipos de nanopartículas: elas podem ser dispersas em meio aquoso orgânico (como no caso de sistemas lipídicos — LBNs — e poliméricos), inorgânicos (como em nanopartículas metálicas) ou híbridos.
Antes de iniciar sua pesquisa de doutorado, Mirla realizou um levantamento dos estudos publicados nos últimos seis anos que mostram o aprimoramento da atividade antimicrobiana desses nanocarreadores em testes in vitro e in vivo. O objetivo era compreender os últimos avanços do uso dessa tecnologia antes de iniciar sua tese.
“O levantamento mostrou que antibióticos nanoestruturados em sistemas lipídicos tiveram uma eficácia, no mínimo, duas vezes maior quando comparados ao antibiótico livre”, conta Mirla. “Nos resultados mais surpreendentes, houve uma melhora até 12 vezes maior na atividade antimicrobiana.”
Entre as vantagens das LBNs, Mirla destaca a maior velocidade de absorção pelo organismo, proteção do medicamento contra a degradação química ou enzimática, maior capacidade de carga e menor toxicidade. Segundo a pesquisadora, as nanopartículas podem ser consideradas como um suplemento dos fármacos que potencializam seus efeitos e uma alternativa promissora para o uso terapêutico de antibióticos devido às suas características superiores em relação aos tratamentos convencionais.
Além de prevenir ou reduzir a toxicidade relacionada à maioria dos antibióticos disponíveis hoje, “os nanocarreadores contribuem para o aumento da solubilidade, o que permite que uma maior quantidade do fármaco esteja disponível em concentrações terapêuticas adequadas para agir contra as bactérias”, explica a pesquisadora. Com a maior eficiência dessas partículas no transporte do medicamento, é possível reduzir até mesmo o número de doses da medicação, o que contribui para uma maior adesão dos pacientes ao tratamento.
Colírio com nanopartículas à base de lipídios
Em seu mestrado, a pesquisadora estudou uma nanoemulsão contendo rifampicina para o tratamento da tuberculose ocular. Atualmente Mirla desenvolve sua tese de doutorado na FCF, sob orientação da professora Nádia Araci Bou Chacra. Os estudos estão focados na preparação e caracterização de nanocarreadores inovadores para o tratamento de infecções oftalmológicas (nos olhos) por meio de colírios. As próximas etapas da tese, que deve ser defendida em meados de 2023, pretendem avaliar a eficácia antimicrobiana dessas nanopartículas lipídicas contendo antibiótico produzidas no laboratório em testes in vitro e in vivo.
Segundo Mirla, a expectativa é de que, no futuro, esses produtos possam ser aprovados pelas agências reguladoras e cheguem ao mercado para uso da população.
Uma estratégia contra as superbactérias
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a resistência bacteriana tem crescido no mundo todo e se tornado um problema de saúde global cada vez mais preocupante. O uso excessivo e a prescrição errônea dos fármacos contribuem para que as bactérias sofram mutações e tornem-se mais resistentes à ação desses antibióticos, o que faz com que doenças infecciosas como pneumonia, tuberculose e gonorreia sejam cada vez mais difíceis de serem tratadas.
Segundo Mirla, a utilização das nanopartículas pode auxiliar no combate à criação de superbactérias. “Os nanocarreadores representam uma das estratégias mais viáveis a curto e a médio prazo para o controle da resistência bacteriana devido ao complexo mecanismo de ação da junção antibiótico-nanopartícula, que pode gerar um aumento da eficácia dos antibióticos existentes atualmente e que, em sua forma livre, não seriam capazes de matar as bactérias resistentes”, finaliza.
Mais informações: e-mail mirlabazan@usp.br, com Mirla Bazan Henostroza
Médicos propõem mudar a classificação da obesidade e o objetivo é valorizar o impacto do emagrecimento na saúde, priorizando o bem-estar em detrimento da estética. A iniciativa é da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
O médico Márcio Corrêa Mancini, do Grupo de Obesidade e Síndrome Metabólica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, discorre sobre o assunto ao relembrar uma frase do médico e professor, já falecido, Alfredo Halpern. De acordo com este, o ideal é atingir um peso onde as complicações associadas à obesidade são anuladas ou minimizadas.
Mancini aponta que a obesidade é um problema de saúde tratado de forma diferente dos demais: “Quando falamos de tratar diabetes, não falamos de normalizar a glicemia como se fosse um indivíduo que não tem diabetes, falamos de atingir um controle da glicose no sangue para o indivíduo não ter complicações ao longo do tempo.” Além disso, a influência da sociedade na imposição de um padrão estético também atrapalha.
Obesidade controlada
De acordo com o entrevistado, o objetivo da obesidade controlada é perder aproximadamente 10% ou 15% do peso para melhorar a saúde. “Se o indivíduo com 100 quilos passar a ter 90 ou 85, ele não normaliza o peso corporal, mas melhora muito a sua saúde. Ele vai aumentar a expectativa de vida e isso é suficiente, porque ,muitas vezes, com a ideia de normalizar o peso, o paciente se frustra”, menciona.
A normalização do peso corporal está associada ao IMC (Índice de Massa Corporal), que calcula se uma pessoa está acima do peso ao considerar seu peso e altura. No entanto, Mancini comenta que muitas vezes a busca pela normalização pode frustrar o paciente, é um processo longo e os resultados não aparecem de forma rápida. Por isso, controlar a obesidade deve ser o primeiro passo.
Mancini aponta que a obesidade controlada estimula as pessoas a encararem o processo, que é demorado em razão do próprio organismo humano: “Ele tende a se defender da perda de peso. O famoso efeito sanfona não vem do nada, ele vem de forças internas, de substâncias que o organismo produz para impedir a desnutrição. O organismo aceita o ganho de peso com facilidade e não aceita a perda de peso com facilidade.”
A perda de 10% ou 15% do peso é benéfica em um período mais longo. “A vigilância a longo prazo é muito importante para que o paciente não recupere peso. Por menor que seja a perda de peso, mesmo que seja somente 5% a 10%, o paciente não vai perder de uma forma mágica”, indica Mancini, ao ressaltar a importância do acompanhamento.
De uma hora para a outra, você apresenta problemas de visão, começando a não enxergar direito sem nenhum motivo aparente. Fique muito atento e procure um auxílio médico, pois pode estar com neuromielite óptica, doença rara, autoimune e ainda sem cura. Tarso Adoni, assistente do Departamento de Neurologia e também médico do Ambulatório de Doenças Desmielinizantes do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, explica que “essa é uma doença autoimune do sistema nervoso central em que canais de água, chamados aquaporina 4, são atacados por anticorpos produzidos pelo próprio paciente. O aquaporina 4 é fundamental para o funcionamento normal do sistema nervoso central. Quando esse canal é bloqueado pela presença dos anticorpos, existe uma lesão, que acontece principalmente nas estruturas do sistema nervoso central, que são ricas em aquaporina 4, nos nervos ópticos, na medula espinhal e áreas que apresentam contato com o líquor no sistema nervoso central e nos vasos”.
Por ser uma doença autoimune, não se sabe o que a desencadeia. As mulheres são mais afetadas do que os homens pela neuromielite óptica. “De cada nove mulheres, somente um homem desenvolve a lesão, que costuma ser detectada por volta dos 38, 40 anos. Ela é mais comum em afrodescendentes e orientais, embora possa acontecer também em caucasianos”, destaca o neurologista.
Duas características
Essa doença apresenta duas características que se entrelaçam. Ela é mais comum em indivíduos que tenham outras doenças autoimunes. Assim, quem tem neuromielite óptica pode ter mais chances de um diagnóstico de miastenia gravis, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide e síndrome de Sjögren. Ao mesmo tempo, se a pessoa já tem alguma doença autoimune, está mais suscetível a apresentar a neuromielite óptica, que apresenta uma evolução de seus sintomas atingindo não só os olhos, mas outros órgãos, como destaca Adoni.
“Os principais sintomas da neuromielite óptica são: inflamação do nervo óptico, conhecida como neurite óptica, que ocasiona dor ao redor ou atrás do olho, com danos à visão que, em casos graves, pode levar à cegueira. A medula espinhal também pode ser atacada, ocasionando um caso de mielite, ou seja, uma inflamação que pode levar à perda de movimentos, de sensibilidade, uma sensação de aperto no abdome ou no tórax, com dificuldade para urinar e evacuar. Podem ocorrer também inflamações na região do tronco encefálico, ocasionando caracteristicamente soluços, vômitos incoercíveis e vertigens.”
Tratamento
Há tratamentos efetivos, bastante eficazes, que buscam atenuar a resposta imunológica do portador, reduzindo a chance de que ele produza anticorpos que ataquem o seu próprio corpo. Há medicamentos disponíveis na rede pública de saúde que podem controlar boa parte dos problemas. Somente os casos chamados de “refratários”, que não respondem aos remédios disponíveis no SUS, necessitam de um tratamento mais caro. Não há estudos definitivos sobre a patologia, mas, segundo Adoni, há uma estimativa de 4 mil a 7 mil pessoas com neuromielite óptica em todo o Brasil. Se você apresentar algum dos sintomas já discriminados, procure um neurologista, pois exames específicos irão ajudar em sua identificação, já que ela pode ser confundida com outras doenças.
Ptose palpebral é um termo médico utilizado para indicar a queda da pálpebra superior, aquela pele que fica em cima dos olhos. Trata-se de uma doença oftalmológica, conhecida também como pálpebra caída, e ocorre tanto de forma congênita como pode ser adquirida ao longo da vida. Em um primeiro momento, pode parecer apenas um problema estético, mas vai muito além disso, porque existe o risco de causar a perda da visão.
O oftalmologista Antônio Augusto Velasco Cruz, professor do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, deixa claro que não se trata de excesso de pele. A doença está relacionada ao músculo que levanta os nervos e pode ocorrer bilateralmente – nos dois olhos – ou unilateral, apenas em um deles.
O professor esclarece também o que é ptose adquirida, aquela que chega com o passar dos anos, e que pode ocorrer por vários motivos e situações.
Sensação de peso
As pálpebras caídas dão a sensação de peso sobre os olhos, cansaço visual, baixa visão por causa da sombra no campo visual. O uso de lentes, alergias ou até questões neurológicas também podem levar à queda dessa pele sobre o olho.
O tratamento da pálpebra caída é feito de forma cirúrgica. Existem várias técnicas cirúrgicas indicadas, de acordo com a causa. Velasco Cruz explica que nunca deve ser usado o botox, já que esse método não resolve o caso.
O oftalmologista explica que, muitas vezes, a cirurgia é confundida com outra doença, que também trata do excesso de pele nos olhos, e explica a diferença entre ptose e dermatocalase. Por outro lado, a recuperação da cirurgia de ptose é muito tranquila, seja ela congênita ou adquirida, requerendo apenas os cuidados pós-cirúrgicos, como qualquer outra.
O primeiro Consenso Latino-Americano sobre Dor Crônica reuniu especialistas de 14 países da América Latina, com o objetivo de redefinir e discutir os impactos da saúde da população. A médica fisiatra do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Lin Tchia Yeng, destaca que a dor é um sinal para as áreas de atenção do corpo.
A dor crônica é um problema comum e impacta de diversas formas a qualidade de vida do paciente. Desde incômodos constantes e problemas no sono, até afastamentos no trabalho, a condição é bastante prejudicial e pode indicar problemas de saúde mais graves. O Consenso Latino-Americano foi pensado de forma a aumentar a discussão sobre a dor na formação de médicos e fisioterapeutas, essencial para a identificação do problema no momento do atendimento: “Então, a gente tem que melhorar essa discussão sobre dor, que é fundamental na área da saúde”, completa a médica Lin.
Incômodos crônicos têm diferentes causas e são, geralmente, de origem “musculoesqueléticos”, como destaca Lin. Uma porcentagem de pacientes apresenta dores nas costas e de cabeça, sem mencionar dores decorrentes de incômodos operatórios. No entanto, em alguns casos, a dor pode até ser de origem oncológica, proveniente do desenvolvimento de um câncer. Algumas delas podem até ter causa em movimentos repetitivos e rotineiros, e o home office demonstrou isso com o aumento das queixas de dor.
Diagnóstico e automedicação
Com o diagnóstico adequado, é possível identificar casos e realizar um tratamento direcionado com os fármacos específicos. Porém, não são todos os remédios disponíveis para dor que são disponibilizados pela “cesta básica do governo”, como os de diabete e hipertensão. Além disso, a médica salienta que algumas dores podem demandar um tratamento por medicação escorado ao suporte emocional, por meio de psicólogos e de terapeutas: “Muitas vezes, as dores pioram com estresse, ansiedade e depressão. Por isso, muitas vezes também precisamos de um psicólogo”, adiciona Lin.
Lin Yeng chama atenção para a questão envolvendo a automedicação e o autotratamento: “Não é bacana fazer automedicação, porque você pode encobrir um sintoma, que é um importante alerta”. E enfatiza dizendo ser importante esperar por um diagnóstico direcionado de um especialista, que pode demandar um tratamento combinado, antes de tomar uma atitude em relação à dor.