Células de tumor agressivo são eliminadas por composto à base de metal raro

Testado em laboratório por cientistas brasileiros, substância não afeta células saudáveis, podendo abrir caminho para tratamentos mais seguros e eficazes do melanoma

Pesquisadores brasileiros estão mais próximos de oferecer uma nova esperança para o tratamento do melanoma, o tipo mais perigoso de câncer de pele. Em um estudo publicado na revista Pharmaceuticals, os cientistas mostraram que uma substância criada em laboratório, que combina o metal rutênio e uma molécula derivada de um composto orgânico, a antraquinona, foi capaz de interromper o crescimento de células de melanoma e ainda induzir sua morte.

O melanoma é considerado um dos cânceres de pele mais agressivos por sua alta capacidade de se espalhar para outras partes do corpo. Apesar dos avanços recentes em tratamentos como a imunoterapia e medicamentos-alvo, muitos pacientes ainda enfrentam limitações, seja pela baixa resposta clínica ou pelos efeitos colaterais severos. Por isso, o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas segue sendo uma das grandes prioridades da ciência médica.

O composto desenvolvido pelos pesquisadores atua como uma espécie de bloqueio para as células tumorais. Em condições normais, as células do corpo passam por diversas etapas para crescer, se dividir e se multiplicar. O novo composto interrompe esse ciclo logo no início, impedindo que as células do melanoma avancem em sua multiplicação.

Um dos grandes diferenciais desse novo composto é sua seletividade. Enquanto os tratamentos convencionais contra o câncer, como a quimioterapia, costumam afetar tanto células doentes quanto saudáveis, provocando efeitos colaterais como queda de cabelo, náuseas e fadiga, os testes laboratoriais com a nova substância indicaram uma ação preferencial sobre as células de melanoma, com mínima interferência nas células normais.

Composto impede que as células doentes cresçam e se multipliquem, sem afetar as células saudáveis, com interferência mínima nas células normais – Imagem: Extraída do artigo

Menos toxicidade

O rutênio é um metal de transição ainda pouco conhecido pelo grande público, mas que apresenta propriedades químicas interessantes. Diferentemente de outros metais utilizados em terapias anticâncer, como a platina, compostos de rutênio podem ser menos tóxicos e mais eficazes na identificação e destruição seletiva de células tumorais.

O estudo reforça o papel da química medicinal e da química bioinorgânica na criação de moléculas inteligentes, que interagem de maneira mais precisa com alvos celulares, ampliando as possibilidades de tratamentos mais seguros e eficazes. Até o momento, o composto foi testado apenas em células cultivadas em laboratório. Segundo o professor Javier Ellena, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC), que participou da pesquisa, ainda será necessário avançar para testes em modelos animais e, posteriormente, em humanos – um processo que pode levar vários anos.

Ainda assim, os cientistas estão otimistas, pois os resultados iniciais apontam para uma estratégia promissora na luta contra o melanoma. Se os próximos testes confirmarem o potencial da substância, ela poderá, no futuro, tornar-se uma alternativa mais eficaz e menos agressiva no combate ao câncer de pele mais perigoso.

Estrutura da molécula do composto criado para atuar contra células tumorais de câncer de pele, que contém rutênio, um metal raro, e um derivado de antraquinona, composto orgânico – Imagem: Extraída do artigo

O estudo contou com a colaboração de pesquisadores de diversas instituições de ensino e pesquisa do País, incluindo o Instituto de Química da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), em Minas Gerais, o Departamento de Ciências Biomédicas da Unifal, o Departamento de Química da Universidade Estadual do Ceará (Uece), o Instituto de Química (IQ) da USP, o IFSC e o Departamento de Química da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), também em Minas. Para acessar o artigo científico completo, publicado na Pharmaceuticals, clique no link.

Mais informações: javiere@ifsc.usp.br, com o professor Javier Ellena

* Por Rui Sintra, da Assessoria de Comunicação do IFSC, adaptado por Júlio Bernardes

**Estagiário sob orientação de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Células-tronco mostram potencial para tratar lesões ósseas em pessoas com osteoporose

Pesquisa realizada em células e animais revela como a terapia celular pode regenerar tecido ósseo, abrindo caminho para desenvolver tratamentos mais eficazes para a osteoporose

Uma pesquisa demonstrou que um tipo de célula-tronco encontrada em vários tecidos do corpo humano é capaz de reparar defeitos ósseos em animais com osteoporose. No estudo, foram analisadas as interações entre as células saudáveis e as células osteoporóticas tanto em experimentos in vitro (realizados em um ambiente controlado fora de um organismo vivo) quanto em animais com defeitos ósseos e osteoporose. Os resultados do trabalho da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp) da USP estão publicados em artigo na Life Sciences.

A capacidade das células-tronco multipotentes – que podem se diferenciar em vários tipos de tecidos – de induzir regeneração tecidual já é conhecida devido às suas propriedades de autorrenovação e diferenciação. Neste processo, células menos especializadas adquirem funções específicas, neste caso se especializam e se transformam em osteoblastos, que são responsáveis pela formação de tecido ósseo.

O uso de células-tronco mesenquimais no tratamento de lesões ósseas também já é conhecido e promissor, mas a utilização desse tratamento em condições de osteoporose ainda é desafiador. É que o tecido ósseo em condições saudáveis tem uma capacidade regenerativa adequada para restabelecer sua função normal após uma lesão, porém, em presença de osteoporose, o reparo ósseo é prejudicado.

A explicação, segundo especialistas, se deve ao fato de que a osteoporose enfraquece o tecido ósseo, tornando-o menos denso e mais poroso, aumentando o risco de fratura e dificultando o tratamento de lesões. Além disso, a literatura científica indica que a osteoporose afeta negativamente a função das células-tronco mesenquimais, prejudicando sua proliferação e sua capacidade de induzir formação de tecido ósseo.

Relevância da relação células saudáveis com osteoporóticas

Nos experimentos in vitro, as células foram mantidas em coculturas, o que significa que dois tipos de células foram cultivadas juntas em um mesmo ambiente. Neste caso, foi avaliada a interação entre células saudáveis e células osteoporóticas.

O professor da Forp e líder do grupo de pesquisa, Adalberto Luiz Rosa, afirma que avaliar as relações entre esses dois tipos de células é importante pois, no caso da terapia celular, “uma das interações relevantes para o sucesso do tratamento é a das células saudáveis, que são utilizadas como tratamento, sendo recepcionadas pelas células presentes em ambiente acometido pela doença”.

Entre as conclusões obtidas, a partir dos experimentos in vitro, o pesquisador informa que as células-tronco originadas de ratos com osteoporose têm sua capacidade de regeneração reduzida, que é parcialmente recuperada pela interação com células saudáveis. Da mesma maneira, o contrário também é verdade, já que células saudáveis têm seu potencial regenerativo reduzido quando em contato com células osteoporóticas.

Efeito de células-tronco mesenquimais de doadores saudáveis ​​(HE-MSCs) injetadas localmente na formação óssea em defeitos calvários de ratos submetidos à orquiectomia – Foto: Reprodução ScienceDirect

Terapia é mais desafiadora para diabéticos e hipertensos

Nos experimentos in vivo, ratos com osteoporose, nos quais foram criados defeitos ósseos, receberam aplicações de células-tronco mesenquimais, obtidas da medula óssea de ratos jovens saudáveis, diretamente na lesão óssea. O professor destaca que o diferencial da pesquisa foi criar os defeitos ósseos nos animais e aguardar duas semanas para realizar a terapia celular, “o que simula melhor o tratamento de defeitos preexistentes e aproxima nossa abordagem da realidade clínica”.

Como resultado, constataram que as células-tronco induziram a formação de tecido ósseo e, além disso, continuavam detectáveis até cinco dias após a injeção, em contraste com a permanência celular em locais saudáveis, onde permaneceram por até 14 dias. Outros estudos demonstram que o mesmo ocorre em ratos diabéticos e hipertensos, o que “nós atribuímos à presença das doenças, embora não tenhamos nos debruçado sobre os mecanismos envolvidos”, afirma o pesquisador.

Segundo o professor, esse fato indica o quanto o tratamento de defeitos ósseos em portadores de doenças sistêmicas é complexo: “Esses resultados ressaltam que o tratamento de defeitos ósseos pela terapia celular é ainda mais desafiador em pacientes acometidos por essas doenças (diabéticos e hipertensos), mas é viável, uma vez que bons resultados foram obtidos com a terapia celular em animais com osteoporose”.

Potencial para prevenir lesões ósseas

O professor ressalta que os resultados são interessantes, mas ainda devem ser aperfeiçoados: “Nosso estudo focou no tratamento de defeitos ósseos e constatamos que a terapia celular induz formação óssea, mas não regenerou por completo os defeitos”.

Rosa ainda explica que esse tratamento tem potencial para ser um método de prevenção de lesões, apesar de não ser o ideal para o tratamento da osteoporose sistêmica. “Há pesquisas sugerindo que ela poderia ser utilizada naqueles ossos que apresentam maior fragilidade e risco de fraturas”, adianta.

Esses resultados criam expectativas interessantes para um futuro tratamento de lesões ósseas em pessoas com osteoporose, “nossa perspectiva é que nossos resultados contribuam para que no futuro o tratamento de defeitos ósseos com células-tronco e seus derivados seja uma realidade clínica eficaz e acessível aos pacientes que dele necessitem”, finaliza Rosa.

*Estagiário sob orientação de Rita Stella

FONTE: Jornal da USP

São Paulo lança programa de terapia celular para tratamento de câncer

O governo do estado de São Paulo lançou dia 14 um programa de tratamento avançado contra o câncer com a utilização de terapia celular. Dois novos centros de saúde, um na capital paulista e um em Ribeirão Preto, produzirão compostos para a terapia celular CAR-T, que utiliza células T para combater o câncer de sangue.

A capacidade inicial de tratamento é de até 300 pacientes por ano. O programa faz parte de um acordo de cooperação entre o Instituto Butantan, a Universidade de São Paulo (USP) e o Hemocentro de Ribeirão Preto.

De acordo com o governo do estado, esse tipo de terapia celular já se mostrou altamente eficaz no tratamento de alguns tipos de câncer de sangue, como linfoma e leucemia linfóide aguda. As novas unidades de São Paulo e de Ribeirão Preto serão equipadas com estruturas que permitirão a realização dos principais processos da nova tecnologia, como produção, desenvolvimento, armazenamento e aplicação da terapia celular.

As instalações incluem laboratórios de controle de qualidade, salas de criopreservação, salas de produção de vírus, salas limpas de produção de células CAR-T, salas de preparo de meios e soluções, e áreas destinadas ao armazenamento do produto final e dos insumos em tanques criogênicos.

“Curar uma pessoa que estava em situação quase terminal é uma emoção indescritível. Estes dois centros são fruto de anos de dedicação de uma grande equipe. Somos mais de 50 pesquisadores trabalhando há décadas em um único objetivo”, destacou o presidente do Instituto Butantan e coordenador do estudo, Dimas Covas.

A tecnologia celular CAR-T é um tipo de imunoterapia que utiliza linfócitos T, células do sistema imune responsáveis por combater agentes patogênicos e matar células infectadas. O tratamento consiste em retirar e isolar os linfócitos T do paciente, ativá-los, programá-los para conseguirem identificar e combater o câncer e, depois, inseri-los de volta no organismo do indivíduo. Todo o processo pode durar cerca de dois meses.

Por Bruno Bocchini – Repórter da Agência Brasil – São Paulo

FONTE: Agência Brasil