Alternativa para tratar transtorno obsessivo-compulsivo

Para entender o futuro dos tratamentos de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) analisaram estudos sobre o uso de técnica de estimulação cerebral elétrica em pacientes com TOC. A revisão dos estudos aponta para um quadro mais ameno de sintomas do transtorno com poucos efeitos colaterais, mas também destaca a importância de mais pesquisas no campo.

A Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC) é uma técnica não invasiva que utiliza eletrodos aplicados na cabeça do paciente para descarregar corrente elétrica de baixa intensidade (de 1 a 4 miliamperes). O objetivo dessa técnica é modular a função cerebral agindo na rede de neurônios ao aumentar a estabilidade em determinadas regiões do cérebro e diminuir em outras. A ETCC já é usada para o tratamento de depressão, no entanto, ainda é uma técnica nova.

Publicada na revista MDPI, a metanálise (revisão de estudos cruzando resultados) avaliou os efeitos globais de pesquisas sobre o uso de ETCC para pacientes com TOC como uma alternativa para outros tratamentos já utilizados, como terapia cognitivo comportamental e medicamentos da classe dos inibidores de recaptação de serotonina, como a fluoxetina. “Há pacientes que não toleram efeitos colaterais de medicações ou pacientes que não têm viabilidade financeira para fazer terapia comportamental. Até mesmo o tempo pode ser custoso, considerando que são meses de tratamento. Por isso, é necessário pensar na viabilização de novos tratamentos para pacientes de TOC”, explica Laís Boralli Razza, doutora em Ciências pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da FMUSP.

A análise de resultados comparou a diferença das manifestações clínicas da fase inicial e da fase final do tratamento com ETCC de acordo com a escala Y-BOCS, instrumento para avaliar os sintomas do transtorno. Nos grupos de pacientes em que foi aplicada a técnica, houve melhora considerável dos sintomas do TOC. Porém, ao comparar o resultado com os grupos placebos dos estudos, a diferença não foi tão grande. Laís Razza explica que, por se tratar de um transtorno psiquiátrico ansioso, as expectativas das pessoas podem interferir nos resultados finais – daí a necessidade de estudos maiores, com mais pacientes, diluindo a distorção causada por este fator.

O transtorno e o tratamento

Segundo a pesquisadora, o TOC é um transtorno de ansiedade que causa obsessões relacionadas aos pensamentos do indivíduo e compulsões de comportamentos físicos, adotados com objetivo de aliviar os pensamentos causadores de ansiedade – ligados à segurança ou à saúde, por exemplo. Os graus de obsessão e compulsão variam de acordo com os pacientes.

Ela ressalta que o transtorno pode apresentar efeitos de hiperativação nas regiões sensório-motora, córtex lateral e sistema límbico do cérebro. No entanto, há uma heterogeneidade nos estudos sobre as áreas de posicionamento dos eletrodos para ETCC, o que também afeta o efeito global.

Em relação aos efeitos colaterais, os resultados do tratamento com ETCC são promissores. Segundo a Associação Médica Brasileira, os efeitos das medicações farmacológicas para TOC podem incluir náusea, sonolência, insônia, dor de cabeça, dor abdominal, entre outros. Já os do ETCC se limitam a formigamento na área onde os eletrodos foram aplicados, coceira e avermelhamento da pele; também, a técnica não apresenta critérios de exclusão de pacientes específicos, como gestantes, uma vez que não é invasiva e apenas diminui a atividade cerebral em áreas hiperativas.

As sessões de estimulação cerebral costumam durar cerca de 20 a 30 minutos, e são realizadas uma vez por semana em centros de pesquisa. Mas, segundo Laís Razza, há uma possibilidade de tornar a ETCC um tratamento remoto. “É um aparelho pequeno, que pode ser portátil. Há protocolos para monitorar o uso dos pacientes em casa, de forma a aumentar a aderência ao tratamento.”

De uma forma geral, os autores do artigo mostram benefícios alcançados com o tratamento de ETCC para o transtorno, mas destacam a necessidade da realização de estudos mais amplos para testar os resultados relacionados aos grupos placebos e grupos ativos. “Os estudos possuem amostras pequenas de pacientes, ou seja, são insuficientes para mostrar o poder da ETCC no tratamento de TOC. Ainda é uma limitação para que no futuro, de fato, possamos ver os efeitos do tratamento”, reconhece Laís Razza.

Mais informações: e-mail lais.razza@ugent.be, com Lais Boralli Razza

FONTE: Jornal da USP

Atraso no diagnóstico do TOC traz prejuízos para seu portador e para a família

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Conforme pesquisa do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC) da USP, pessoas com TOC, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, podem levar pelo menos quatro anos para receber tratamento. Mais de 500 pacientes foram avaliados em oito centros de pesquisa de diferentes regiões do Brasil, especializados no transtorno, e o estudo aponta que as pessoas demoram muito tempo para buscar ajuda.

O que é o TOC?

Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, Daniel Costa, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do HC (IPq), atesta que o TOC acomete ao menos 2% da população e se caracteriza pela presença de dois principais sintomas: as obsessões e as compulsões. As primeiras são preocupações, pensamentos e imagens desagradáveis que invadem a consciência do paciente e se repetem. Já as compulsões são comportamentos repetitivos realizados com o objetivo de aliviar o desconforto provocado pelas obsessões.

“[O TOC] está associado a algum tipo de prejuízo, de impacto. As pessoas acabam se atrasando frequentemente para compromissos e progridem com muita dificuldade nos estudos e na carreira profissional”, informa Costa. Ele também diz que há impactos nos relacionamentos com outros indivíduos.

Ele diz que os aspectos genéticos hereditários são bem definidos no TOC e a doença se agrega à família. Além disso, há um fenômeno chamado acomodação familiar, que é quando a família, que convive intimamente com o portador da doença, desenvolve mudanças de comportamento ou do ambiente de modo a evitar com que ele entre em contato com situações desagradáveis. “Quando a gente fala que é uma doença incapacitante e grave, a gente sabe que isso impacta não só a vida do portador, mas também a dos seus familiares e de pessoas próximas”, declara.

Um prejuízo associado ao TOC não tratado é o desenvolvimento de outros transtornos psiquiátricos, como a depressão e o Transtorno de Ansiedade Generalizada. Segundo Alice de Mathis, psicóloga e coordenadora do projeto de pesquisa no IPq sobre eficácia da Terapia Cognitivo Comportamental pela internet para tratamento do TOC, existem duas linhas de tratamento, a medicação e a terapia cognitiva comportamental, e é importante fazer uma avaliação para decidir o tipo de tratamento mais adequado para o paciente: “Se for um caso leve, só a terapia comportamental tem um bom resultado. Se o caso for de moderado a grave, aí seria interessante a associação tanto do remédio quanto da terapia”.

A doutora também fala sobre os gatilhos que as pessoas com a doença podem identificar: “Ela [pessoa com o transtorno] sabe que se vai em um lugar cheio de pessoas, ela vai ter mais preocupação, mais sintomas”. Alice cita o sintoma de evitação, o qual se dá quando o paciente evita ir a determinados locais pois sabe que, se ele for, alguns pensamentos podem ser desencadeados. Isso contribui para que ele fique recluso em casa e outras doenças psiquiátricas sejam desenvolvidas.

Diagnósticos e tratamentos

Alice afirma que, dependendo da gravidade dos sintomas da doença, ela passa despercebida pela família. Isso colabora para a demora na busca pela ajuda. Ela ainda diz que o transtorno começa na infância e na adolescência e, observados os sintomas pelos pais, o tratamento deve ser iniciado cedo.

Costa acrescenta a vergonha dos sintomas como um fator determinante para o atraso no diagnóstico: “A grande maioria dos pacientes reconhece os pensamentos como exagerados, absurdos, sem sentido”. “Eles falam ‘Eu sei que a possibilidade, por exemplo, de eu pegar uma doença se eu encostar nessa maçaneta é mínima, mas ainda assim eu não consigo evitar esse pensamento e não consigo evitar ter uma reação emocional desconfortável’”, completa.

Para finalizar, ele  chama a atenção aos projetos de pesquisa que estão sendo desenvolvidos no IPq e para os quais portadores de TOC e seus irmãos estão sendo recrutados para participar. O e-mail do projeto é protoc.projeto@gmail.com, para os interessados em colaborar com os estudos. Alice também comunica sobre o projeto online de Terapia Cognitivo Comportamental, o qual recebe diagnósticos da doença pelo e-mail protoctcc@gmail.com.

Autor: Redação
Arte: Guilherme Castro

FONTE: Jornal da USP