Sarcobesidade desafia a saúde global com envelhecimento da população

A sarcobesidade ou obesidade sarcopênica é a combinação de acúmulo de gordura e sarcopenia (perda de massa muscular) e acomete principalmente idosos. A condição está associada ao risco de desenvolvimento outras doenças, como as cardiovasculares, respiratórias, osteomusculares, psiquiátricas e câncer, e representa um desafio para a ciência e para a saúde: relatório da OMS prevê que o número de pessoas acima de 65 anos deve dobrar até 2050, chegando a 1,6 bilhão.

O enfrentamento da sarcobesidade, no entanto, mesmo com o envelhecimento, pode não depender de procedimentos avançados e produção em massa de medicamentos. Resultados de um estudo recém-publicado indicam que mudanças no estilo de vida e acesso a uma rotina saudável podem prevenir e até tratar a doença. Trata-se de uma revisão bibliográfica com os principais achados científicos sobre a doença das últimas décadas. Os estudos evidenciam ainda falta de critérios diagnósticos e de definição da própria sarcobesidade, além da complexidade do tratamento.

Coordenadora da pesquisa, a professora Ellen Cristini de Freitas, da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP, ressalta o distúrbio metabólico da sarcobesidade, agravada pelo envelhecimento, para afirmar que novas abordagens terapêuticas são necessárias na redução da patologia, razão pela qual seu time procurou pelas abordagens com potencial para o controle da doença e identificou três estratégias não farmacológicas: a suplementação com taurina (aminoácido importante no bom funcionamento do organismo), o manejo da microbiota intestinal e a prática de atividade física.

Prevalência em idosos

“O declínio acentuado e progressivo da massa e força muscular, caracterizado como sarcopenia, é uma condição prevalente em pessoas com 65 anos ou mais”, informa Ellen. A doença aumenta os riscos de incapacidades físicas, quedas, fraturas e hospitalização, limitando a qualidade de vida dos idosos. Quando associada ao aumento da gordura corporal, acrescenta a professora, há uma piora do prognóstico e se transforma na sarcobesidade.

Ellen informa ainda que, apesar de ser mais comum em idosos, os jovens não estão isentos da sarcobesidade. A população mais jovem com obesidade e sedentária ou que enfrenta alterações hormonais e metabólicas, câncer e quadro pós-cirurgia bariátrica sem cuidados nutricionais adequados também podem desenvolver a patologia.

Mas são os idosos o principal grupo de risco, pois perdem progressivamente massa muscular e ficam mais propensos à sarcobesidade. Mesmo com a dificuldade diagnóstica, informa a pesquisadora, estudos utilizando o método chamado DXA (Absorciometria de Raios X de Dupla Energia – técnica que avalia massa óssea, muscular e gordura) mostraram prevalência de 15% da sarcobesidade entre pessoas de 60 a 69 anos, e 40% entre os com 80 anos ou mais. Como a tendência é de envelhecimento, a preocupação com a sarcobesidade deve aumentar.

Suplemento de taurina na regulação metabólica

 

Infográfico mostra como o comportamento sedentário contribui para a sarcobesidade – a combinação entre obesidade e perda de massa muscular – e destaca os benefícios dos exercícios aeróbicos e de força na prevenção e controle da condição – Foto: Reprodução do artigo

 

As alterações fisiológicas próprias do envelhecimento associadas a hábitos de vida, como o sedentarismo e as mudanças alimentares, resultam “na redistribuição de gordura corporal do depósito subcutâneo para o visceral e pela redução da força e massa muscular”, informa a professora. Esta redistribuição de gordura contribui para a diminuição da massa e força muscular, a redução do gasto energético basal e a dificuldade de realizar atividade física, favorecendo o acúmulo de gordura. Por sua vez, o excesso de gordura corporal promove inflamação sistêmica e o acúmulo de gordura intramuscular com efeitos ruins na força e massa muscular. Segundo Ellen, esse é o quadro que explica o risco da obesidade e da sarcopenia coexistirem no mesmo indivíduo.

Ao falar em inflamação, a professor lembra que a sarcobesidade também representa risco para outras complicações crônicas baseadas em inflamação, como a resistência anabólica, a resistência à insulina, as doenças cardiovasculares e a diabetes. É aí que entram alternativas como a suplementação com taurina (um aminoácido produzido pelo corpo humano e presente em alimentos de origem animal) que, afirma a professora, tem mostrado respostas importantes para controlar a sarcobesidade.

Alguns estudos vêm confirmando as principais propriedades da taurina contra problemas de saúde relacionados ao envelhecimento. “Efeitos anti-inflamatórios, antioxidantes e capacidade de regular o metabolismo são algumas dessas boas respostas da taurina.” Ellen cita uma pesquisa realizada em seu laboratório que avaliou a suplementação com 3g de taurina/dia em mulheres com obesidade obtendo aumento da produção de adiponectina – proteína que desempenha um papel importante na regulação do metabolismo e na sensibilidade à insulina. Os resultados reforçam o papel da taurina no controle da inflamação.

Mesmo com os efeitos potenciais, a pesquisadora lembra que os benefícios da taurina devem ser mais explorados, já que “a maior parte das evidências vem de estudos com modelos animais e os efeitos da taurina em humanos, particularmente em indivíduos com sarcobesidade, ainda não estão completamente esclarecidos”.

Alimentação, envelhecimento e microbiota intestinal

Outro destaque da pesquisa para o controle da sarcobesidade é a microbiota intestinal. Trata-se do conjunto de microrganismos que compõem o sistema digestivo, em especial o intestino, numa comunidade de bilhões de bactérias que desempenham funções cruciais no organismo, principalmente na digestão, absorção dos nutrientes e eliminação de resíduos.

“Vários estudos já demonstraram que tanto a obesidade quanto o envelhecimento alteram a composição da microbiota intestinal, acarretando mudanças no tipo de bactérias que colonizam o nosso intestino”, destaca a professora, lembrando que esses fatores estabelecem uma maior proporção de bactérias potencialmente inflamatórias (bactérias patobiontes) em detrimento das potencialmente benéficas (bactérias simbiontes).

Assim, Ellen afirma que vale a pena prestar mais atenção à alimentação. “Padrões alimentares ocidentalizados, pautados no consumo de ultraprocessados (ricos em açúcares e gordura saturada e pobres nutricionalmente), são um dos protagonistas de mudanças na microbiota intestinal, cenário que fica ainda mais grave quando se concentra na realidade de uma população idosa.”

Atividade física, ganho de massa muscular e perda de gordura

A prática de exercícios físicos é tratada como uma estratégia importante para a prevenção e o tratamento da obesidade sarcopênica, principalmente em pessoas acima de 65 anos. A recomendação do American College of Sports Medicine para esse grupo é a da prática de atividades físicas diversas que desenvolvam múltiplas capacidades corporais como o equilíbrio, a flexibilidade e a força.

Segundo os especialistas, a atividade física é um grande fator no combate da sarcobesidade devido à sua capacidade de recompor massa muscular e perder gordura, combatendo as duas condições clínicas que caracterizam a sarcobesidade. Na mesma linha, adiantam que os exercícios físicos também são fundamentais para um envelhecimento saudável não apenas na ótica da obesidade sarcopênica, pois trazem benefícios quanto à mobilidade, reduzindo o número de quedas e melhorando a capacidade neural.

Investimento em qualidade de vida

Para Ellen, além do avanço nas formas de prevenção e tratamento é preciso um suporte adequado das autoridades de saúde na divulgação de informações de qualidade e no combate à má alimentação e ao sedentarismo. Desta forma, afirma que o investimento no combate a essa doença não depende necessariamente de grandes infraestruturas ou da produção em massa de medicamentos, mas do acesso a uma rotina envolvendo comportamentos alimentares saudáveis e atividades físicas de qualidade.

“É preciso desenvolver projetos capazes de abranger o diagnóstico correto e precoce da sarcopenia, o tratamento amplificado da obesidade no contexto de saúde pública e aumentar o acesso a alimentos in natura e saudáveis”, finaliza.

Mais informações: ellenfreitas@usp.br com a professora Ellen Cristini de Freitas

*Estagiário com orientação de Rita Stella

FONTE: Jornal da USP

Obesidade feminina pode estar associada a baixas concentrações de cobalto no sangue

Níveis menores de cobalto no sangue de mulheres com obesidade sugerem que o mineral pode influenciar a regulação genética e o metabolismo, impactando o ganho de peso e doenças associadas

O cobalto é um componente da vitamina B12 (cobalamina) que pode ser encontrado em alguns alimentos como vegetais, chocolate e carnes. Este mineral também é um metal essencial para as tecnologias atuais, sendo amplamente utilizado em baterias de lítio. O que até então não se sabia, e está sendo revelado por pesquisas recentes, é sua possível relação com a obesidade em mulheres.

O estudo multicêntrico Concentração sérica de cobalto e assinaturas de metilação de DNA em mulheres com obesidade, publicado pela revista científica Obesities, observou diferenças significativas nos níveis sanguíneos de cobalto na comparação entre mulheres com e sem obesidade. Identificou também alterações genéticas associadas ao metal, sugerindo que o cobalto pode influenciar processos biológicos relacionados ao metabolismo e ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2. Os resultados destacam ainda a importância de considerar fatores ambientais e nutricionais na prevenção e tratamento da obesidade.

As investigações foram conduzidas por pesquisadores da USP, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em Portugal, que analisaram dados de 33 mulheres brasileiras: 16 com obesidade e 17 na faixa normal de IMC (Índice de Massa Corporal). Como principal achado, os cientistas verificaram que os níveis de cobalto no sangue das participantes com obesidade eram muito menores. A deficiência, segundo os pesquisadores, pode estar relacionada à dieta pobre em nutrientes e às alterações metabólicas associadas à obesidade.

O grupo também observou a relação do cobalto com a metilação do DNA, o fator epigenético mais caracterizado que controla a expressão dos genes. A epigenética envolve as alterações genéticas em resposta a estímulos ambientais ou estilo de vida, sem contudo modificar a sequência do DNA, mas que pode influenciar a regulação de um gene (ativando ou desativando a sua atividade) e afetando as funções metabólicas. As diferenças nos padrões de metilação do DNA entre os grupos estudados, adiantam os cientistas, indicam que o cobalto pode desempenhar um papel na regulação epigenética relacionada à progressão da obesidade.

No início da vida, a regulação epigenética é responsável pela diferenciação de células, possibilitando a formação de vários tecidos. Na vida adulta a epigenética tem muita relação com o estilo de vida, como nutrição, atividade física e qualidade do sono, que é capaz de modificar os padrões de metilação – um tipo de modificação química do DNA – seja pelo aumento ou pela diminuição. Esses mecanismos podem estar relacionados à manutenção da saúde e ao desenvolvimento de doenças como, por exemplo, o câncer, explica a professora Carla Barbosa Nonino, do Departamento de Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, responsável pela pesquisa.

Impacto do cobalto no organismo

Segundo Natália Yumi Noronha, doutoranda no Departamento de Clínica Médica da FMRP e orientanda da professora Carla, o cobalto é um mineral essencial para a produção de células do sangue e o funcionamento do sistema nervoso. “O cobalto pode influenciar processos metabólicos, uma vez que uma alimentação pobre em alimentos de origem animal, como carne, leite e ovos, pode acarretar redução do metal no organismo, afetando o metabolismo e possivelmente contribuindo para o ganho de peso e outros problemas de saúde”, afirma.

Ainda segundo Natália, a obesidade está associada a deficiências nutricionais já que, mesmo com um consumo calórico alto, a qualidade da alimentação pode ser inadequada, com baixa ingestão de vitaminas e minerais essenciais. “Os achados do estudo reforçam a importância de investigar não apenas a quantidade de alimentos consumidos pelos pacientes com obesidade, mas também a qualidade, para entender melhor os impactos da dieta na obesidade e na saúde em geral”, diz.

Padrões alimentares e metilação do DNA

Para a professora Carla, o cobalto pode ser considerado essencial ao organismo quando em quantidades adequadas. O excesso, por outro lado, se torna um contaminante. Assim, as causas da deficiência de cobalto na obesidade feminina precisam ser mais bem investigadas com acompanhamento nutricional e clínico. Quanto à epigenética, que explica como o ambiente e o estilo de vida podem alterar o funcionamento de nossos genes, Carla acredita que possa ser mais uma ferramenta para entender as vias metabólicas associadas à obesidade. Segundo a professora, essa ferramenta deve permitir a identificação de padrões alimentares interessantes na ativação e inativação de genes específicos, usando padrões de metilação modificáveis.

Esses resultados devem servir de base para os novos estudos da equipe, agora interessada nos aspectos da obesidade da miscigenada população brasileira. “São escassas as pesquisas sobre metilação do DNA em populações miscigenadas. Além disso, as novas pesquisas também incluirão mais indivíduos e com diferentes condições de saúde, não só a obesidade”, adianta a professora. Seu grupo atualmente trabalha em análises de bioinformática para identificação da ancestralidade. O objetivo é descobrir as origens geográficas e características específicas, “demonstrando como o ambiente pode impactar no desenvolvimento do indivíduo e, potencialmente, o de gerações futuras”, afirma.

O estudo sobre obesidade contou com a colaboração da equipe liderada pelo professor Fernando Barbosa Jr., da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, e foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp), através do projeto de pesquisa Do biomonitoramento ao reconhecimento de assinaturas do exposoma humano visando antecipar riscos para uma saúde contínua. Participaram ainda os pesquisadores: Luísa Maria Diani (bolsista da Fapesp que compartilha a primeira autoria do projeto), Guilherme da Silva Rodrigues, Isabela Harumi Yonehara, Vanessa Aparecida Batista Pereira, Marcela Augusta de Souza Pinhel, Lígia Moriguchi Watanabe e Déborah Araújo Morais.

Mais informações: carla@fmrp.usp.br, com a professora Carla Barbosa Nonino

* Estagiário sob orientação de Rita Stella

FONTE: Jornal da USP

Exercício aeróbico combate crescimento tumoral e melhora função muscular

O treinamento físico aeróbico, que envolve atividades como caminhada, corrida e ciclismo, é uma forma de exercício que melhora a capacidade cardiovascular e a resistência física. Esse tipo de treinamento tem sido considerado uma terapia complementar ao tratamento do câncer, demonstrando benefícios significativos não apenas na prevenção da doença, mas também no aumento da sobrevida de pacientes já diagnosticados.

Um estudo da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP verificou como o treinamento físico aeróbico pode contribuir para a redução do crescimento tumoral e para a melhora no quadro de perda de massa e função muscular – aspecto importante que pode levar o paciente à caquexia. O estudo, desenvolvido em modelo animal, constatou que o exercício aeróbico foi capaz de desacelerar significativamente a progressão do tumor e melhorar a sobrevida dos animais com câncer, além de prevenir a perda de capacidade funcional.

Estrutura experimental

Um dos efeitos clássicos do exercício aeróbico é a capacidade de reduzir a hiperatividade do sistema simpático (sistema que regula alguns processos do corpo de forma automática, como pressão arterial e a frequência respiratória) e promover a restauração da função autonômica em diferentes doenças crônicas. No câncer, a atividade excessiva do sistema simpático pode acelerar o crescimento tumoral e impactar a dinâmica de manutenção da massa muscular, podendo levar à caquexia, síndrome multifatorial que piora o prognóstico e aumenta a mortalidade.

Pensando nisso, o trabalho realizado por Gabriela Silva Borges, sob orientação da professora Patrícia Chakur Brum, partiu da hipótese de que o treinamento físico aeróbico poderia atuar nos efeitos do câncer por meio da modulação da atividade simpática. O estudo foi realizado em camundongos, parte dos quais recebeu as células de carcinoma de cólon via injeção subcutânea.

A pesquisadora Gabriela Borges buscou relacionar os efeitos do câncer e a modulação da atividade simpática. Foto: Guilherme Viana

O trabalho foi dividido em dois subprojetos. O primeiro buscava investigar se a atividade do sistema nervoso simpático influencia o crescimento do tumor e a saúde dos músculos. Para isso, os camundongos foram divididos em três grupos:
  1. Animais saudáveis que receberam as células de câncer;

  2. Animais que receberam células de câncer e foram tratados com um bloqueador dos receptores  β2-adrenérgicos, que reduz a sinalização da epinefrina e norepinefrina – hormônio e neurotransmissores do sistema nervoso simpático nos tecidos;

  3. Animais saudáveis que não receberam células de câncer, mas sim solução salina apirogênica 0,9% (controle);

A ideia era comparar como a atividade simpática afeta o tumor e a função muscular nesses diferentes grupos. Após 12 dias, foram coletadas amostras do tumor e de alguns músculos para medir a massa e analisar a expressão de proteínas envolvidas na sinalização adrenérgica.

O Subprojeto 2 teve como objetivo investigar como o treinamento físico aeróbico afeta o crescimento do tumor, a massa corporal e a função muscular, além de analisar a sinalização adrenérgica (ativação de receptores pelo sistema epinefrina/norepinefrina) no tumor e nos músculos. Nessa etapa, os camundongos foram divididos em quatro grupos:

  1. Animais saudáveis treinados, que receberam solução salina (controle treinado);

  2. Animais treinados injetados com as células tumorais;

  3. Animais saudáveis não treinados (controle não treinado);

  4. Animais não treinados injetados com as células tumorais.

No Grupo 2, as células tumorais foram injetadas após 8 semanas de treinamento físico e 2 dias de descanso. Durante 20 dias, foram realizadas medidas do volume do tumor e da massa corporal. No início e ao final do protocolo, foram avaliadas a capacidade de corrida e a função muscular. Também foram coletadas amostras do tumor e dos músculos para verificar a massa e estudar a sinalização adrenérgica, além de órgãos como as glândulas adrenais, linfonodos e baço.

O potencial do treinamento físico aeróbico

Com base nos dados obtidos nos experimentos, observou-se uma redução significativa no crescimento tumoral nos camundongos submetidos ao treinamento físico aeróbico, em comparação com o grupo não treinado. O volume tumoral, analisado ao longo do tempo, apresentou uma diferença marcante entre os grupos. Além disso, a análise de sobrevida revelou que os animais que realizavam o treinamento apresentaram uma sobrevida aumentada com relação ao outro grupo.

Outro resultado importante foi a conclusão de que, embora o treinamento físico não tenha alterado a massa muscular, ele promoveu melhorias na função muscular, como o comprimento da passada com relação ao grupo controle. Isso sugere que o exercício contribui para um ambiente interno mais favorável, ajudando a combater os efeitos negativos do câncer.

O estudo reforça que o exercício aeróbico pode ser um grande aliado ao tratamento do câncer – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

A pesquisa concluiu que o treinamento físico aeróbico ajudou a manter a função muscular e a capacidade de corrida em um modelo experimental de câncer, além de reduzir o crescimento tumoral e aumentar a sobrevida dos animais. Os achados corroboram com estudos anteriores da área sobre os benefícios do treinamento físico aeróbico na redução do crescimento tumoral, na melhora da sobrevida e na performance motora em modelos experimentais de câncer. Com a pesquisa, no entanto, não foi possível identificar uma relação clara entre a sinalização adrenérgica no tumor e nos músculos.

Os resultados podem impactar positivamente na reprodutibilidade e confiabilidade de estudos futuros, destacando o treinamento físico aeróbico como uma estratégia complementar promissora no tratamento do câncer.

O estudo intitulado “Efeito do treinamento físico aeróbico na atividade nervosa simpática dos tecidos tumoral e muscular esquelético em modelo experimental de câncer” está disponível no banco de teses da USP e pode ser acessado na íntegra clicando aqui. 

Todos os procedimentos experimentais executados nesta pesquisa estão de acordo com o Guia Brasileiro de Produção, Manutenção ou Utilização de Animais em Atividades de Ensino ou Pesquisa Científica do CONCEA para o manejo de animais de laboratório e foram avaliados e aprovados pela CEUA da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE/USP).

*Estagiário sob supervisão de Paula Bassi, da Assessoria de Comunicação da EEFE 

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Treinamento resistido traz benefícios a pessoas com dor lombar desde a primeira sessão

Pesquisador da USP destaca o treinamento resistido como uma alternativa promissora para o manejo da dor lombar crônica

A dor lombar crônica é, atualmente, uma das principais causas de incapacidade no mundo. Caracterizada pela dor e desconforto na região inferior das costas, a condição afeta não somente a qualidade de vida, mas também a capacidade funcional de milhões de pessoas. Além de limitações nas tarefas diárias, a dor lombar crônica pode levar ao afastamento do trabalho e gerar consequências socioeconômicas relevantes.

O treinamento resistido – prática de exercícios para melhorar a resistência do corpo – é apontado por vários pesquisadores como uma das estratégias promissoras para mitigar os problemas causados pela condição. Em sua tese de doutorado, Eduardo Borges, sob orientação do professor Júlio Cerca Serrão, verificou o nível de influência desse tipo de treinamento na melhora da dor, da incapacidade funcional e na ativação neuromuscular dos pacientes.

Participaram do estudo 31 voluntários de ambos os sexos, com idade entre 20 e 59 anos. Essas pessoas foram divididas em dois grupos, sendo que o primeiro participou de uma sessão única de treinamento. O restante realizou um programa contínuo de oito semanas, com duas sessões semanais.

Os resultados apontaram para benefícios desde a primeira sessão de exercícios. Após as oito semanas de treinamento resistido de leve intensidade, os voluntários apresentaram melhoras na mobilidade do tronco e alterações importantes, como a redução da incapacidade funcional e da dor.

Treinamento resistido: um protocolo promissor

De forma geral, o treinamento resistido é focado em criar resistência ao corpo. O objetivo é treinar para que o corpo não fique tão cansado ou dolorido após exercícios básicos, mesmo da vida cotidiana, como caminhar e subir escadas. Tem como ideia principal a resistência progressiva, e normalmente é realizado com a utilização de pesos ou elásticos. Por ser de baixo impacto, o treinamento resistido pode ser indicado e adaptado para a maioria das pessoas.

Para verificar sua eficácia no tratamento da dor lombar crônica, Borges propôs investigar se esse tipo de treinamento seria capaz de reduzir a incapacidade funcional de moderada para leve.

Exercícios realizados na sessão aguda – Foto: Reprodução / Trabalho original, cedido pela pesquisador da EEFE

Na sessão aguda (sessão de exercícios praticados de forma isolada), foram realizados os exercícios terra com barra hexagonal, extensão lombar no banco romano e abdominal.

Exercícios realizados no protocolo de oito semanas – Foto: Reprodução / Trabalho original, cedido pela pesquisador da EEFE

Já no protocolo contínuo de oito semanas, somados aos exercícios da sessão aguda, também foram realizados os exercícios supino e remada em máquina. Os voluntários realizavam 3×10 repetições nos exercícios multiarticulares e 2×10 nos uniarticulares.

Benefícios desde a primeira sessão

Os resultados do estudo revelaram que o treinamento resistido de baixa intensidade reduziu a dor, a incapacidade funcional e aumentou a força máxima desde a primeira sessão. Após oito semanas, o grupo experimental apresentou alterações significativas quando comparado com o grupo de controle. Além de uma redução ainda maior dos índices mencionados, o grupo também mostrou redução de dor afetiva, aumento da resistência muscular e amplitude de movimento do tronco.

Mulheres tendem a sofrer mais com a dor lombar crônica do que homens – Foto: Freepik

O pesquisador concluiu que o protocolo de treinamento resistido proposto é eficaz para o tratamento de pessoas com dor lombar crônica inespecífica. “No entanto, os parâmetros eletromiográficos analisados por nós não respondem o porquê dos efeitos positivos encontrados” enfatiza.

O estudo intitulado Influência de um programa de treinamento resistido para pessoas com dor lombar em parâmetros associados à incapacidade funcional, dor e ativação neuromuscular está disponível no banco de teses da USP e pode ser acessado na íntegra clicando aqui.

*Da Seção de Relações Institucionais e Comunicação da EEFE, sob supervisão de Paula Bassi. Adaptado para o Jornal da USP

Mais informações: e-mail comunicaeefe@usp.br

FONTE: Jornal da USP

Sarcopenia e fragilidade exigem atenção nos idosos

Condições que afetam principalmente idosos já foram confundidas no passado, e precisam de tratamento multidisciplinar

Um estudo feito na Escola de Educação Física e Esportes (EEFE) da USP buscou reunir os principais trabalhos da área da saúde que envolvem a sarcopenia – declínio da massa e função dos músculos ligados aos ossos – e a fragilidade muscular para discutir estratégias de tratamento para os dois quadros, especialmente em pacientes com doenças cardiovasculares. O artigo liderado por Guilherme Fonseca traz os insights mais recentes sobre os mecanismos biológicos que são a base do problema e conclui que ainda é preciso investir na formulação de um plano de enfrentamento mais eficaz dessas condições – que podem estar relacionadas com diversas doenças crônicas, mas são reversíveis com a intervenção precoce.

A chamada sarcopenia primária é a que se desenvolve durante o envelhecimento sem nenhuma outra causa específica identificada. Mas o problema também pode estar associado a alguma enfermidade, como câncer, diabetes e doenças cardiovasculares. A fragilidade, por sua vez, muitas vezes era confundida com ela quando feita uma análise superficial, que não compreende todos os aspectos que devem ser avaliados. Atualmente, entende-se que a sarcopenia é a parte diretamente física da fragilidade, que é definida como um conceito maior. “Nós discutimos a fragilidade de uma forma mais ampla, porque engloba as partes física, cognitiva, psicológica e emocional. [O conceito] foi ganhando componentes que estabeleceram que ela não afeta apenas o físico do indivíduo, mas também a capacidade de reagir a adaptações internas e estresse externo, e a incapacidade do organismo de enfrentá-los o determina como frágil”, explica Guilherme Fonseca.

O gráfico descreve os mecanismos biológicos do desenvolvimento da fragilidade e sarcopenia, suas doenças associadas e potencial tratamento por intervenção terapêutica – Fonte: Reprodução do artigo (traduzido)

“A sarcopenia e a fragilidade podem ser entendidas como uma via de mão dupla para as outras doenças”, aponta. Ou seja, por serem condições comuns na velhice, o paciente pode desenvolver problemas cardiovasculares antes delas, mas o contrário também é possível. Isso pode acontecer com o diabete mellitus: caso primeiro venha o diabete, a dificuldade em captar glicose pela célula pode levar a uma diminuição de nutrientes que reduz a massa muscular e pode levar à sarcopenia. Mas se houver a condição muscular prévia, como o tecido atingido é o que consome mais glicose, sua degradação acarreta em diminuição do consumo da molécula, o que aumenta os níveis da glicemia e leva a um quadro de pré-diabete, podendo evoluir para diabete.

Tratamento multidisciplinar

Como prevenção das duas condições, o mais indicado é a prática de exercício físico. Para a sarcopenia, o mais apontado é o treinamento de força. Para a fragilidade, ele também se aplica, mas adicionando exercícios aeróbicos, nos quais é possível manter uma intensidade mais baixa durante um período prolongado. O treino deve ser feito de duas a três vezes por semana, envolvendo os grandes grupos musculares, como membros superiores, inferiores e músculos do tronco, abdominais e torácicos.

Cada sessão deve ter de oito a dez exercícios, exigindo em torno de 60 a 80% de contração voluntária máxima. Já para os aeróbicos, como caminhadas, corridas e natação, a frequência pode ser aumentada para cinco vezes na semana, com duração de 30 a 60 minutos, com intensidade também moderada”, orienta Guilherme Fonseca.

A ingestão calórica deve ser aumentada para que corresponda tanto ao gasto necessário do corpo diariamente, como consumo de energia extra que as práticas de exercícios irão gerar. Sobre os nutrientes, a dieta deve ser rica em proteínas para o maior fortalecimento muscular, “a recomendação atual para a população geral é de 0,8 g de proteína por quilo de peso. Mas os pacientes com sarcopenia precisam de mais, chegando a 1,5 g por quilo de peso. E para a ingestão calórica, 30 kcal por quilo de peso”, recomenda o pesquisador.

O tratamento multidisciplinar se faz necessário tendo em vista a possibilidade dessas condições serem acompanhadas por doenças crônicas. O profissional de educação física cuidando dos treinos, o nutricionista sendo responsável pelo cuidado com a ingestão calórica e de nutrientes, psicólogos para a parte emocional e cognitiva, terapeuta ocupacional para as atividades diárias e, dependendo do grau da fragilidade, o acompanhamento do fisioterapeuta também é necessário. Esse tratamento não deve incluir a parte farmacológica, já que até agora não existe comprovação científica para a aplicação de medicamentos efetivos contra a sarcopenia. A prescrição de hormônios anabólicos, como a testosterona, tampouco é recomendada.

O médico entra na parte clínica, tratando as doenças bases que vêm acompanhando a sarcopenia, como diabetes e pressão alta. “Deve deixar o indivíduo no estado compensado, para ele não descompensar, a pressão dele não ficar subindo e descendo, assim como glicemia também”, detalha o autor.

Apesar das recomendações, ainda é deficitária a bibliografia sobre a sarcopenia, e há a necessidade de pesquisas que apontem quais são os mecanismos que levarão ao desenvolvimento da condição, que poderá causar fragilidade em pacientes com doenças cardiovasculares. “Mais estudos precisam demonstrar qual é a melhor forma de tratamento, estabelecendo diretrizes para profissionais da educação física no preparo físico, de nutricionistas na reparação nutricional e principalmente na parte farmacológica, que ainda é pouco desenvolvida e precisa de um aporte científico e legal para ser utilizada”, alerta Guilherme Fonseca.

O artigo foi publicado na revista científica Cardiovascular Research, e está disponível neste link.

Mais informações: e-mail guilhermefonseca@usp.br, com Guilherme Fonseca

Andar ao menos 7.500 passos por dia ajuda a reduzir sintomas de asma

Caminhar pelo menos 7.500 passos diários pode contribuir para o controle da asma moderada ou severa em adultos. É o que indica um estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), publicado recentemente no The Journal of Allergy and Clinical Immunology: In Practice.

O trabalho, selecionado pelos editores da revista científica como artigo que modifica a prática clínica, sugere que as recomendações médicas e as políticas públicas concentrem esforços no incentivo ao aumento da prática de atividade física, em vez de focar na redução de períodos de sedentarismo. Apesar de popularmente serem considerados hábitos excludentes, a prática de atividade física e o comportamento sedentário podem ocorrer de forma concomitante. Isso porque a pessoa pode ser sedentária (ficar mais que 8 horas trabalhando sentada) e ser fisicamente ativa (realizar atividades moderadas durante, pelo menos, 150 minutos semanais).

 “Na maioria das vezes, as pessoas mesclam as duas situações: realizam atividade física três vezes por semana, por uma hora, mas trabalham o dia inteiro sentadas em um escritório”, explica Celso Ricardo Fernandes de Carvalho, professor de Fisioterapia Respiratória e Fisiologia do Exercício do curso de Fisioterapia da FMUSP e orientador do estudo. “Isso significa que elas são ativas, mas também sedentárias, ou seja, exibem os dois comportamentos ao mesmo tempo.”

A literatura científica já indicava que tanto a atividade física quanto o sedentarismo podem modular os sintomas da asma – entre eles dificuldade para respirar, respiração rápida e curta e tosse seca – mas ainda faltavam estudos aprofundados sobre seu impacto real, de modo que o tratamento da doença, que afeta cerca de 6,4 milhões de brasileiros, se mantém majoritariamente medicamentoso.

O objetivo deste trabalho, que teve apoio da Fapesp, foi investigar mais a fundo essa relação, considerando a variedade de comportamentos relacionados.

Durante o estudo, os pesquisadores analisaram dados de 426 pessoas das cidades de São Paulo e Londrina com asma moderada a grave. Foram incluídas avaliações de atividade física e tempo de sedentarismo (actigrafia), de controle clínico da asma (Asthma Control Questionnaire – ACQ) e de qualidade de vida (Asthma Quality of Life Questionnaire). Também foram investigados sintomas de ansiedade e depressão (Hospital Anxiety and Depression Scale) e dados antropométricos e de função pulmonar. Os participantes foram divididos em quatro grupos: ativo/sedentário, ativo/não sedentário, inativo/sedentário e inativo/não sedentário.

“Observamos que, quanto mais atividade física a pessoa com asma realiza, melhor é o controle de sua doença”, conta Fabiano Francisco de Lima, pesquisador da FMUSP e primeiro autor do trabalho. Mais especificamente, quem caminhava pelo menos 7.500 passos durante o dia apresentou melhores pontuações na avaliação de controle clínico da doença, independentemente de também apresentar comportamento sedentário – aliás, tempo sedentário e obesidade não apresentaram correlação com a redução de sintomas. Verificou-se também que isso independia de medicação e função pulmonar. A porcentagem de pacientes com asma controlada foi maior nos grupos ativo/sedentário (43,9%) e ativo/não sedentário (43,8%) do que nos grupos inativo/sedentário (25,4%) e inativo/não sedentário (23,9%).

Os resultados sugerem ainda que fatores emocionais, como ansiedade e depressão, também dificultam o controle da doença.

Novas perspectivas

Embora a prática de atividade física por pessoas com asma já seja recomendada por profissionais de saúde, o tema ainda é visto com receio por parte da população. Isso porque as pessoas com asma sofrem a contração dos músculos das vias aéreas durante as crises.

“O costume de evitar que crianças e adultos pratiquem exercícios por conta da doença precisa começar a ser quebrado”, diz Lima. “Esse estudo contribui para isso ao sugerir a caminhada, atividade simples e sem custo agregado, e vai além, ao oferecer uma espécie de ‘nota de corte’, uma indicação da quantidade real de atividade física que o paciente deveria fazer – 7.500 passos por dia.”

De acordo com o pesquisador, outra recomendação importante seria que profissionais de saúde passassem a adotar um olhar mais direcionado para sintomas de ansiedade como estratégia de controlar a asma.

Também participaram do estudo pesquisadores do Laboratório de Pesquisa em Fisioterapia Pulmonar da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

O artigo Physical Activity and Sedentary Behavior as Treatable Traits for Clinical Control in Moderate-to-Severe Asthma pode ser lido em: https://www.jaci-inpractice.org/article/S2213-2198(24)00274-5/abstract#%20.

*Da Agência Fapesp

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Aumento no volume de treino de força reverte perda muscular em idosos

Pesquisa com idosos saudáveis de ambos os sexos mostrou que aumentar séries de exercícios de resistência pode ser uma estratégia simples para elevar a massa muscular e a força entre os que não respondem ao treino de baixo volume

Treinos de força, como a musculação, são considerados altamente eficazes para promover ganhos de massa muscular (hipertrofia) em idosos e recuperar sua capacidade funcional, porém, nem todos respondem bem a essa atividade. Enquanto alguns apresentam aumentos expressivos de massa magra (considerados como “responsivos”) outros relatam ganhos insignificantes (“não-responsivos”).

Pesquisadores da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP demonstraram que o aumento no volume de treinamento pode mitigar a falta de resposta entre idosos. Do total de voluntários não responsivos, 80% deles responderam melhor aos treinos após a intervenção, e entre os responsivos, 47% aumentaram ainda mais a massa muscular em função dos exercícios realizados.

Os resultados desse trabalho foram publicados no artigo Resistance training volume and non responsiveness in older individual no Journal of Applied Pysiology, em fevereiro de 2024, e também fez parte de uma tese defendida na EEFE pelo educador físico Manoel Lixandrão, sob a orientação do professor Hamilton Roschel, da EEFE.

Segundo o estudo, após os 30 anos, o declínio de massa muscular acontece em torno de 3 a 8% e, depois dos 60 anos, o aumento é ainda mais drástico. “Essa condição torna as pessoas mais vulneráveis e propensas a quedas, fraturas e a outros traumas”.

Embora se saiba que a aplicação de estímulos de exercícios padronizados não resulta em respostas de ganhos de força e de massa muscular uniformes entre sujeitos distintos, os reais motivos destas diferenças ainda não são totalmente compreendidos, diz Roschel. Segundo o pesquisador, há fatores extrínsecos (a alimentação, o sono e níveis de estresse), mas existem também fatores intrínsecos (a genética e o perfil hormonal, por exemplo) que desempenham papel igualmente importante na performance do ganho de massa muscular.

Perfil dos participantes

Para a pesquisa, Lixandrão selecionou 85 voluntários maiores de 60 anos, de ambos os sexos e clinicamente saudáveis, sem histórico de diabetes tipo I ou doenças isquêmicas do miocárdio, com a pressão arterial controlada, sem lesões ou doenças músculos esqueléticas, e com índice médio de massa corporal de 26,4 (cálculo feito dividindo o peso em kg pela altura ao quadrado). Destes, 60% (51, sendo 27 homens e 24 mulheres), com média de idade de 69 anos, não respondiam adequadamente ao ganho de massa muscular, e 40% (34, sendo 14 homens e 20 mulheres), com idade média de 68 anos, respondiam melhor ao ganho de massa muscular.

Os treinos propostos foram realizados em cadeiras extensoras unilaterais, por um período de dez semanas, com duas sessões semanais. Cada uma das pernas foi aleatoriamente alocada para um dos dois modelos de treinos: um composto de uma única série com 8 a 15 repetições máximas e, o outro, por quatro séries de 8 a 15 repetições máximas. Ao longo dos treinos, os pesquisadores foram ajustando a carga executada pelos voluntários.

Antes e após as intervenções, os participantes foram submetidos a um exame de ressonância magnética do músculo quadríceps femoral (músculo da parte anterior da coxa) para quantificar as mudanças no tamanho, bem como um teste de força máximo, para avaliar os ganhos de força muscular dos membros inferiores.

Resultados

Os resultados demonstram que, embora houvesse alta variabilidade de resposta de ganho de massa muscular em idosos submetidos a treinamentos de força, essa resposta foi alterada pela manipulação do volume de treino. Após as dez semanas de exercícios, a perna que foi submetida ao segundo treino (quatro séries de 8 a 15 repetições) teve melhor resposta hipertrófica (houve maior ganho de músculos) do que a perna que executou o primeiro treino (uma série de 8 a 15 repetições).

Entre todos os indivíduos classificados como não-responsivos, aumentos no volume de treinamento promoveram ganhos adicionais tanto de massa magra (1% para quem fez o primeiro treino e 5% para quem fez o segundo) quanto de força muscular (6% para o primeiro treino e 13% para o segundo).

Segundo Lixandrão, apesar da falta de diferenças estatisticamente significantes, uma resposta semelhante foi observada também entre aqueles responsivos à intervenção. Eles tiveram ganhos adicionais de massa (5% para quem fez menos repetições e 7% para quem fez mais repetições) e de força muscular (8% para quem fez menos repetições e 12% para quem fez mais).

Quando os pesquisadores avaliaram as respostas de maneira individualizada, dos 51 idosos classificados como não-responsivos (os que apresentaram dificuldade em obter ganho de massa muscular), 80% passaram a responder melhor aos exercícios quando o volume de treinamento foi aumentado. “Esse efeito também foi observado entre os idosos que já eram responsivos. Cerca de 47% aumentaram a massa muscular em função de maior volume de treinamento.

Como recomendação, Lixandrão diz que apesar de terem identificado que volumes maiores de exercícios minimizam a baixa responsividade em idosos, o aumento da quantidade de exercício não deve ser realizado de maneira indiscriminada, pois também pode implicar em prejuízos para as pessoas. “Todo treino deve ser individualizado e acompanhado por um profissional de educação física”, avalia.

Mais informações: e-mail lixandrao@usp.br, com Manoel E. Lixandrão; e-mail hars@usp.br, com Hamilton Roschel.

*Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado

FONTE: Jornal da USP

Exercícios de baixo impacto melhoram sono e reduzem os sintomas de pessoas com asma

Pensando em melhorar a qualidade do sono de pacientes com asma, uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) estudou os efeitos de exercícios físicos de baixo impacto para pessoas nesta condição. Os resultados apontam para uma melhora na qualidade e eficiência do sono e na redução dos sintomas de asma nos participantes.

O medo de se exercitar e ficar com falta de ar, o sobrepeso, a respiração oral, alergias e sintomas noturnos explicam por que pessoas asmáticas possuem tendência para problemas do sono. Entre as maiores dificuldades nessa população estão o tempo prolongado para adormecer e o baixo aproveitamento do sono, com despertares durante a noite e sonolência durante o dia.

Levando em conta esses fatores, “a pergunta que a pesquisa fez foi: será que algum aspecto da rotina, mais leve e mais factível, como aumentar a atividade física, poderia melhorar a qualidade do sono?”, diz Celso Carvalho, professor do Laboratório de Fisioterapia e Fisiologia do Exercício da FMUSP. Segundo o pesquisador, pessoas asmáticas evitam fazer exercícios físicos pois, feitos de forma inadequada, desencadeiam o fechamento da via aérea e falta de ar. No entanto a pesquisa, publicada na European Respiratory Journal, mostrou os benefícios de uma rotina de atividade física feita de forma adequada em pessoas asmáticas, sem obstruir as vias aéreas.

O estudo acompanhou por oito semanas dois grupos de pacientes asmáticos, com graus moderado e grave. Os pesquisadores deram uma aula sobre a patologia, a importância de exercícios físicos e controle de limpeza ambiental para todos os participantes e em seguida os separaram em grupo controle — aqueles que não fariam atividade física — e grupo intervenção.

As tarefas propostas para o grupo que passou por intervenção eram exercícios físicos simples, como caminhar mais, descer do ônibus um ponto antes, usar a escada ao invés do elevador. Os números de passos diários foram monitorados com um relógio distribuído aos pacientes, o que possibilitou a análise da evolução individual. Os voluntários também descreveram, semanalmente, os sintomas de asma que tiveram durante a pesquisa.

“Observamos que a qualidade de vida deles melhorou em relação, por exemplo, aos sintomas de ansiedade, houve a diminuição do tempo de latência desses pacientes, então eles conseguiram dormir mais rápido, e melhorou a qualidade do sono deles”, diz Natália Febrini, uma das autoras do estudo.

“Todos eles melhoraram de alguma maneira. Quem dormia muito mal passou a ter alguns pequenos problemas, e quem tinha alguns pequenos problemas deixou de ter problemas para dormir.” Celso Carvalho

Também houve diminuição de todos os sintomas de asma dos pacientes. “Quando a pessoa asmática faz exercício físico, melhora a inflamação das vias aéreas e diminui a hiper-reatividade [resposta exagerada a estímulos], o que possibilita o melhor controle clínico da asma”, explica Carvalho. Mas os pesquisadores ressaltam que os resultados não significam que a atividade física cure a doença ou que substitua a medicação — o próprio estudo não cortou os remédios usados pelos pacientes —, e sim, funciona como um adicional para o tratamento e melhoria da qualidade de vida.

Além do aumento da aptidão física, o exercício gasta energia e o organismo tende a compensar isso durante a noite; também o aquecimento do corpo produzido pela atividade embala um sono mais bem aproveitado. Até mesmo para pessoas não asmáticas, implementar exercícios físicos de baixo impacto já produz resultados positivos na saúde dos indivíduos. “Após exercício físico, o organismo sempre ativa o sistema nervoso parassimpático, envolvido na diminuição da frequência cardíaca, e isso provoca a tendência de dormir mais rápido.”

A parte educacional do estudo também fez diferença no dia a dia dos dois grupos. Segundo os pesquisadores, alguns dos participantes da pesquisa não entendiam direito o que era asma ou sobre as reações alérgicas a cheiros comuns, como cigarro ou produtos de limpeza, que eram derivados da patologia. Ao entender melhor sobre a doença e a importância de exercícios físicos, os pacientes podem melhorar a qualidade de vida.

“É uma doença sem cura, mas é possível ter uma vida completamente normal. É necessário entender que a doença é algo que vai te acompanhar, mas que não deve te limitar a viver.” Natália Febrini

Mais informações: e-mail natalia.passos@fm.usp.br, com Natália Febrini.

FONTE: Jornal da USP

Saiba como funciona a memória muscular

“Quando a gente fala de memória muscular, nós estamos nos referindo a alterações que acontecem diretamente nas fibras musculares mediante o treinamento que é realizado. Se você pratica algum tipo de atividade física, as suas fibras musculares vão ser transformadas devido ao treinamento. Se você parar de realizar esse treinamento, a tendência é que suas fibras musculares se transformem novamente e voltem a ser parecidas com aquilo que elas eram antes. Entretanto, se você volta para um período de treinamento, elas, por já terem tido uma experiência prévia, têm uma facilidade de ganhar novamente aquela transformação inicial porque elas guardam essa memória de alguma vez já terem sido transformadas”, explica a fisioterapeuta Andrea Peterson Zomignani, doutora em Neurociências e Comportamento pelo Instituto de Psicologia da USP.

Essa explicação é tida, no senso comum, como a ideia do que é a memória muscular: a modificação nos músculos que faz lembrar de como realizar aquele movimento. Entretanto, Andrea acrescenta que ela é muito mais do que isso: “Para que um movimento se torne automático, ele precisa ser executado repetidas vezes sob vários contextos. O indivíduo tem que registrar os erros que aconteceram para que o sistema nervoso registre as sequências de neurônios que tiveram mais sucessos para que esse movimento acontecesse. Então, quando eu realizo um movimento pela primeira vez ou nas primeiras vezes, eu tenho uma exigência bastante grande de várias áreas do meu sistema nervoso. A partir disso são ativadas áreas do meu cérebro, do meu córtex cerebral, relacionadas a essa intenção e elas conversam com outras áreas solicitando alguma ajuda para que esse movimento seja planejado”.

Processo da memória muscular

Por mais que a modificação das fibras musculares seja importante para o movimento automatizado, é o sistema nervoso e os seus componentes que estão nos bastidores. “É uma memória que, embora aja no sentido de causar contrações musculares, ela é guardada dentro do sistema nervoso e esses músculos só são acionados porque o sistema nervoso é capaz de gerenciar essa ativação muscular numa determinada ordem. Estamos falando da automatização de movimentos”, diz a fisioterapeuta.

Os núcleos da base, conforme Andrea, são fundamentais na automatização. Eles são estruturas encontradas na substância branca do cérebro e têm a função de modular os movimentos do corpo: “Uma das áreas que são solicitadas para que haja o sequenciamento ideal para esse movimento são os núcleos da base. Eles vão ser recrutados para que o planejamento adequado e, principalmente, a iniciação do movimento aconteça. Eles processam a informação que chegou até eles e devolvem essa ‘receita’ de como o movimento deve ser realizado para o córtex cerebral que vai fazer a conexão com as áreas de execução do movimento. A ordem que essas áreas são ativadas é muito importante para que o movimento aconteça da maneira correta e para que o indivíduo tenha sucesso na ação que ele vai realizar”.

Entretanto, eles não estão sozinhos e se juntam aos engramas. “Para que o movimento automático aconteça, o sistema nervoso, especialmente a região dos núcleos da base, participa bastante desse processo de construção do que a gente chama de engramas. Eles são sequências de ativação de redes neurais que ativarão, consequentemente, determinados músculos para que uma ação motora aconteça. Então, a construção desses engramas é essencial para que a gente consiga automatizar essas atividades que fazem parte da nossa rotina”, explica Andrea.

Exemplos de memória muscular

Tudo isso é realizado para destinar a consciência para problemas mais importantes enquanto o corpo realiza a ação motora automatizada, além de economizar energia, já que uma sequência nervosa mais rápida será escolhida para o movimento em questão: “O nosso processamento consciente tem um gasto energético bastante grande e a nossa consciência precisa estar direcionada a algumas ações específicas, que muitas vezes não estão relacionadas ao movimento”, diz a especialista.

Por exemplo, é comum se distrair e pegar um caminho corriqueiro quando se dirige, já que, provavelmente, os pensamentos estavam destinados a outros assuntos. “Isso que a gente chama de realizar ações sem um processamento consciente é como se o nosso sistema nervoso, com as repetições, fosse fazendo uma depuração do ato motor, retirando conexões que não são importantes para a execução daquela determinada tarefa”, completa a especialista.

“Quando a gente fala da capacidade de andar, a gente tem algumas regiões do sistema nervoso envolvidas. Esse movimento de mexer os membros inferiores precisa estar mais automatizado, porque os meus níveis superiores de consciência precisam estar preocupados com outras ações que não o movimento das minhas pernas. Então, a minha atenção, por exemplo, precisa estar direcionada para o objetivo daquela marcha: para onde eu estou indo, qual velocidade eu preciso ter na minha marcha, qual o horário – eu estou em cima da hora, eu estou atrasada ou não?; eu estou entrando no prédio do meu trabalho, qual é o andar que eu trabalho? Ou seja, as áreas do meu sistema nervoso ligadas a esse processamento mais consciente estão como que ocupadas com outras funções: elas estão preocupadas com o contexto, mas não são a ação motora de fato”, acrescenta a fisioterapeuta.

FONTE: Jornal da USP

Exercício físico bloqueia entrada de substâncias nocivas no cérebro

Pesquisas do Instituto de Ciências Biomédicas da USP mostram que, em pessoas hipertensas ou com insuficiência cardíaca, o exercício físico aeróbico é capaz de prevenir danos na barreira hematoencefálica, melhorando o fluxo sanguíneo.

Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP receberam diversos prêmios ao encontrar, em um simples e antigo hábito, uma solução para melhorar o controle da hipertensão arterial. Em estudos com ratos, foi observado que o exercício físico aeróbico é capaz de corrigir a disfunção da barreira hematoencefálica, tanto na hipertensão crônica como na insuficiência cardíaca, restaurando o fluxo sanguíneo do cérebro mesmo na persistência da doença.

A barreira hematoencefálica é uma estrutura que tem a função de regular o transporte de substâncias entre o sangue e o sistema nervoso central, barrando a entrada de substâncias tóxicas e de hormônios plasmáticos em excesso. Esses hormônios, quando em excesso, são capazes de ativar neurônios que estão envolvidos na regulação do sistema cardiovascular, levando à disfunção autonômica e ao desequilíbrio da circulação sanguínea. Isso facilita o aparecimento de lesões em órgãos-alvo, podendo comprometer coração, cérebro, rim, entre outros órgãos.

“Além de corrigir o controle autonômico da circulação, o treinamento aeróbico também contribui para reduzir de 10% a 15% os níveis da pressão arterial nos hipertensos”, afirma Lisete Compagno Michelini, coordenadora do Laboratório de Fisiologia Cardiovascular, responsável pelos estudos.

Filtro de substâncias

Encontrada nos capilares cerebrais por onde o sangue circula, a barreira hematoencefálica é composta de células endoteliais intimamente ligadas umas às outras por junções, que limitam a passagem de substâncias hidrossolúveis (solúveis em água). Não há limite para a passagem de substância lipossolúveis, como oxigênio e gás carbônico, através da célula endotelial. O problema são as macromoléculas.

“Em indivíduos saudáveis, a passagem de macromoléculas, como substâncias tóxicas e hormônios plasmáticos, feita através de vesículas sanguíneas, é bastante limitada. No entanto, observamos que em hipertensos e portadores de insuficiência cardíaca há um aumento expressivo no número dessas vesículas em áreas autonômicas, o que eleva a permeabilidade da barreira hematoencefálica. Por outro lado, observamos que o treinamento aeróbico reduziu em muito a formação dessas vesículas, além de normalizar a permeabilidade da barreira hematoencefálica”, explica.

Segundo Michelini, já se sabia que em casos de acidente vascular cerebral (AVC), traumas e doenças neurodegenerativas a integridade da barreira era comprometida pela quebra das junções oclusivas, o que permitia livre acesso das substâncias. “Em nossos experimentos, observamos que na hipertensão e insuficiência cardíaca não há quebra em áreas de controle cardiovascular, mas sim, aumento da permeabilidade por facilitação do transporte das vesículas, o que pode ser prontamente corrigido pelo treinamento aeróbico”, destaca.

As descobertas feitas pela equipe reforçam a importância do treinamento físico para a melhora do controle autonômico da circulação, pois além de ser um importante aliado no tratamento farmacológico dessas patologias, possibilita a diminuição da quantidade necessária de medicamentos e, consequentemente, há menos efeitos colaterais. “O exercício físico, assim como diferentes fármacos, favorece a vasodilatação vascular, ajuda a balancear desvios do sistema renina-angiotensina, responsável por regular a pressão arterial, e melhora o controle autonômico da circulação”, afirma.

Os estudos foram realizados no âmbito do projeto temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) Barreira Hematoencefálica – Um novo paradigma no tratamento da Hipertensão e foram publicados em periódicos de circulação internacional (veja abaixo). Outros estudos estão em fase de revisão por pares ou em fase de conclusão.

Desde que teve início, em junho de 2019, o projeto já recebeu, por meio de estudos vinculados a ele, seis premiações nacionais e internacionais, como o título de melhor trabalho publicado recentemente em seleção da Sociedade Americana de Fisiologia; o prêmio de pesquisadora revelação da International Society of Hypertension, concedido à pós-doutoranda Hiviny de Ataídes Raquel; e o 3º lugar no prêmio Álvaro Ozório de Almeida da Sociedade Brasileira de Fisiologia 2022 concedido à mestranda Sany Martins Pérego.

O projeto temático tem vigência até maio de 2024. O grupo segue estudando o funcionamento da barreira hematoencefálica, agora com o objetivo de avaliar se o transporte vesicular aumentado na hipertensão e insuficiência cardíaca, mas reduzido em ambas as situações pelo treinamento aeróbio, são mediados pela disponibilidade do hormônio angiotensina II e/ou de citocinas pró-inflamatórias. O grupo irá ainda verificar se os resultados obtidos na hipertensão primária, de origem neurogênica, são também aplicáveis à hipertensão secundária, ou seja, derivada de uma outra condição.

Texto: Redação
Arte: Adrielly Kilryann

FONTE: Jornal da USP