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Condições que afetam principalmente idosos já foram confundidas no passado, e precisam de tratamento multidisciplinar
Um estudo feito na Escola de Educação Física e Esportes (EEFE) da USP buscou reunir os principais trabalhos da área da saúde que envolvem a sarcopenia – declínio da massa e função dos músculos ligados aos ossos – e a fragilidade muscular para discutir estratégias de tratamento para os dois quadros, especialmente em pacientes com doenças cardiovasculares. O artigo liderado por Guilherme Fonseca traz os insights mais recentes sobre os mecanismos biológicos que são a base do problema e conclui que ainda é preciso investir na formulação de um plano de enfrentamento mais eficaz dessas condições – que podem estar relacionadas com diversas doenças crônicas, mas são reversíveis com a intervenção precoce.
A chamada sarcopenia primária é a que se desenvolve durante o envelhecimento sem nenhuma outra causa específica identificada. Mas o problema também pode estar associado a alguma enfermidade, como câncer, diabetes e doenças cardiovasculares. A fragilidade, por sua vez, muitas vezes era confundida com ela quando feita uma análise superficial, que não compreende todos os aspectos que devem ser avaliados. Atualmente, entende-se que a sarcopenia é a parte diretamente física da fragilidade, que é definida como um conceito maior. “Nós discutimos a fragilidade de uma forma mais ampla, porque engloba as partes física, cognitiva, psicológica e emocional. [O conceito] foi ganhando componentes que estabeleceram que ela não afeta apenas o físico do indivíduo, mas também a capacidade de reagir a adaptações internas e estresse externo, e a incapacidade do organismo de enfrentá-los o determina como frágil”, explica Guilherme Fonseca.
“A sarcopenia e a fragilidade podem ser entendidas como uma via de mão dupla para as outras doenças”, aponta. Ou seja, por serem condições comuns na velhice, o paciente pode desenvolver problemas cardiovasculares antes delas, mas o contrário também é possível. Isso pode acontecer com o diabete mellitus: caso primeiro venha o diabete, a dificuldade em captar glicose pela célula pode levar a uma diminuição de nutrientes que reduz a massa muscular e pode levar à sarcopenia. Mas se houver a condição muscular prévia, como o tecido atingido é o que consome mais glicose, sua degradação acarreta em diminuição do consumo da molécula, o que aumenta os níveis da glicemia e leva a um quadro de pré-diabete, podendo evoluir para diabete.
Tratamento multidisciplinar
Como prevenção das duas condições, o mais indicado é a prática de exercício físico. Para a sarcopenia, o mais apontado é o treinamento de força. Para a fragilidade, ele também se aplica, mas adicionando exercícios aeróbicos, nos quais é possível manter uma intensidade mais baixa durante um período prolongado. O treino deve ser feito de duas a três vezes por semana, envolvendo os grandes grupos musculares, como membros superiores, inferiores e músculos do tronco, abdominais e torácicos.
Cada sessão deve ter de oito a dez exercícios, exigindo em torno de 60 a 80% de contração voluntária máxima. Já para os aeróbicos, como caminhadas, corridas e natação, a frequência pode ser aumentada para cinco vezes na semana, com duração de 30 a 60 minutos, com intensidade também moderada”, orienta Guilherme Fonseca.
A ingestão calórica deve ser aumentada para que corresponda tanto ao gasto necessário do corpo diariamente, como consumo de energia extra que as práticas de exercícios irão gerar. Sobre os nutrientes, a dieta deve ser rica em proteínas para o maior fortalecimento muscular, “a recomendação atual para a população geral é de 0,8 g de proteína por quilo de peso. Mas os pacientes com sarcopenia precisam de mais, chegando a 1,5 g por quilo de peso. E para a ingestão calórica, 30 kcal por quilo de peso”, recomenda o pesquisador.
O tratamento multidisciplinar se faz necessário tendo em vista a possibilidade dessas condições serem acompanhadas por doenças crônicas. O profissional de educação física cuidando dos treinos, o nutricionista sendo responsável pelo cuidado com a ingestão calórica e de nutrientes, psicólogos para a parte emocional e cognitiva, terapeuta ocupacional para as atividades diárias e, dependendo do grau da fragilidade, o acompanhamento do fisioterapeuta também é necessário. Esse tratamento não deve incluir a parte farmacológica, já que até agora não existe comprovação científica para a aplicação de medicamentos efetivos contra a sarcopenia. A prescrição de hormônios anabólicos, como a testosterona, tampouco é recomendada.
O médico entra na parte clínica, tratando as doenças bases que vêm acompanhando a sarcopenia, como diabetes e pressão alta. “Deve deixar o indivíduo no estado compensado, para ele não descompensar, a pressão dele não ficar subindo e descendo, assim como glicemia também”, detalha o autor.
Apesar das recomendações, ainda é deficitária a bibliografia sobre a sarcopenia, e há a necessidade de pesquisas que apontem quais são os mecanismos que levarão ao desenvolvimento da condição, que poderá causar fragilidade em pacientes com doenças cardiovasculares. “Mais estudos precisam demonstrar qual é a melhor forma de tratamento, estabelecendo diretrizes para profissionais da educação física no preparo físico, de nutricionistas na reparação nutricional e principalmente na parte farmacológica, que ainda é pouco desenvolvida e precisa de um aporte científico e legal para ser utilizada”, alerta Guilherme Fonseca.
O artigo foi publicado na revista científica Cardiovascular Research, e está disponível neste link.
Mais informações: e-mail guilhermefonseca@usp.br, com Guilherme Fonseca