Quimioterapia e os desafios específicos na terceira idade

A quimioterapia, todo mundo sabe, é um tratamento bastante comum para pacientes diagnosticados com câncer. Funciona como um agente poderoso no combate à doença, ao destruir as células cancerígenas que estão formando o tumor e impedindo, também, que elas se espalhem. Mas o tratamento pode ter particularidades, dependendo das faixas etárias, e na terceira idade os efeitos colaterais podem ser diferentes.

Para a professora Fernanda Maris Peria, do Departamento de Imagens Médicas, Hematologia e Oncologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, especialista em Oncogeriatria, quando o assunto é avaliar a idade do paciente para o tratamento com a quimioterapia, ela afirma ser fundamental saber a  distinção entre idade cronológica, aquela do nascimento, e a idade biológica.

Ela explica: “Assim como existem algumas pessoas que têm uma certa idade, mas aparentam ser muito mais jovens ou mais velhas, isso acontece também do ponto de vista dos órgãos internos, com a diferença de que para eles não existem cirurgias plásticas, botox ou preenchimentos. Então, o que acaba acontecendo nesse paciente idoso é que a reserva dele a um estímulo agressivo é bem menor”.

Em outras palavras, a capacidade do corpo de lidar com situações de estresse, agressões ou doenças, ou seja, a quantidade de recursos que o organismo possui para enfrentar condições adversas, é menor. “E é esse fato que torna os idosos mais propensos a experimentar efeitos colaterais significativos”, detalha a especialista.

Ela ainda discorre que o maior desafio é identificar a idade biológica dos órgãos do paciente, a fim de personalizar o tratamento de maneira mais adequada. “Não necessariamente, se eu tenho 49 anos, todos os meus órgãos têm a mesma idade biológica. Às vezes, meu coração pode ter a vitalidade de uma pessoa de 30 anos, enquanto meu rim pode ter a saúde de alguém de 60 anos. Essa disparidade ocorre devido a diversos fatores, como genética, hábitos de vida e exposição a agentes agressivos”.

Mas a especialista destaca que, embora os efeitos colaterais se manifestem de forma mais intensa em pacientes idosos, eles são os mesmos para todos.

Montagem no Canva por Julia Valeri e texto por Fernanda Maris Peria

“Além dos efeitos colaterais comuns, algumas drogas presentes na quimioterapia podem causar toxicidade específica em órgãos como coração, rim ou sistema nervoso, levando a problemas adicionais para os idosos, que podem já ter desafios de saúde nesses órgãos”, ressalta. Portanto, Fernanda Maris ressalta que é importante considerar as comorbidades dos pacientes idosos ao escolher um tratamento, especialmente se algumas drogas podem afetar órgãos já comprometidos. Ela também compara a adesão rigorosa ao plano de tratamento a seguir uma receita de bolo – qualquer desvio pode resultar em problemas.

Protocolo

“O que existe hoje, é uma padronização, chamada AGA, Avaliação Geriátrica Ampla, para todo o paciente de terceira idade que está prestes a passar por sessões de quimioterapia”, a especialista assegura. A Avaliação Geriátrica Ampla envolve uma análise detalhada da condição do paciente e precisa ser cuidadosamente discutida entre o geriatra e o oncologista. Esse processo é essencial para garantir que o tratamento seja adaptado às necessidades específicas e às condições de saúde do paciente idoso, garantindo a eficácia do tratamento e minimizando os efeitos colaterais.

Ela expõe que, na consulta com o oncologista, o profissional faz uma análise detalhada dos prós e contras do tratamento. Ele fornece informações cruciais sobre a agressividade do tumor, a probabilidade de resposta ao tratamento, as opções terapêuticas disponíveis e os principais efeitos colaterais associados a essas intervenções, ele também avalia a possibilidade de melhora na qualidade de vida e na sobrevida do paciente frente ao tratamento proposto.

“Por sua vez, o geriatra contribui com uma avaliação especializada, considerando as características específicas do idoso em questão, como fragilidade em relação à idade e às condições de saúde. Ele desempenha um papel crucial ao determinar se o paciente possui fragilidades significativas, aumentando assim o risco de complicações com qualquer forma de tratamento”, aborda. No Brasil, esse procedimento é recomendado para pacientes a partir dos 60 anos, enquanto na Europa e nos Estados Unidos é indicado a partir dos 65 anos, embora as populações de maior risco estejam geralmente na faixa dos 70 a 75 anos.

A especialista, no entanto, enfatiza que decidir sobre a viabilidade do tratamento exclusivamente com base na idade não seria uma abordagem adequada. “Lembro claramente que, há 20 anos, transcrever quimioterapia para pacientes com mais de 70 anos que tinham câncer de próstata era contraindicado, devido à idade avançada. Escrevi isso várias vezes nos prontuários naquele período, mas se olharmos agora, onde a média de idade dos pacientes com câncer em todo o mundo gira em torno dos 65-67 anos, isso significaria impedir esses pacientes de viver mais tempo e com uma qualidade de vida melhor”

Ela diz que a chance de resposta ao tratamento não difere significativamente entre idosos e adultos jovens. “A principal preocupação reside nos diferentes efeitos colaterais que esses regimes de tratamento podem ter em um organismo jovem em comparação com um organismo idoso”, conclui.

Mas o que é a quimioterapia?

A professora Fernanda Maris esclarece que a quimioterapia consiste em um grupo de várias medicações que têm em comum a tentativa de destruir as células que estão se multiplicando. “Essas células podem ser tanto as células tumorais quanto as nossas células normais, como as células do cabelo, unhas e a mucosa da boca”.

Existem diversos tipos de quimioterapia, que variam desde medicações administradas via intravenosas até quimioterápicos orais, intramusculares e subcutâneos. “A escolha do método depende das necessidades específicas de cada paciente e do tipo de câncer em questão, sendo essencial adaptar o tratamento às características individuais de cada caso”, analisa.

Montagem no Canva por Julia Valeri e texto por Fernanda Maris Peria

FONTE: Jornal da USP

Quimioterapia e queda de cabelo

A queda de cabelo durante a quimioterapia é um dos efeitos colaterais mais indesejados. O tratamento para o câncer envolve o uso de medicamentos que destroem as células cancerosas, mas acaba trazendo consequências na qualidade de vida, na aparência e também na autoestima do paciente.

Os medicamentos da quimioterapia se misturam com o sangue e são levados para todas as partes do corpo, destruindo as células doentes que estão formando o tumor e impedindo, também, que elas se espalhem. A queda do cabelo pode ser total ou parcial e pode acontecer entre 14 a 21 dias.¹

A quimioterapia é indicada após a consulta médica e a liberação dos exames laboratoriais. O paciente agenda a aplicação da medicação com a equipe responsável e precisa seguir as orientações conforme a prescrição médica.

Por que a quimioterapia causa queda de cabelo? 

A quimioterapia provoca a queda do cabelo, porque danifica os folículos pilosos, responsáveis pelo crescimento dos pelos. Esse efeito colateral dependerá do medicamento utilizado.

Geralmente a perda de cabelo não é imediata e ocorre, geralmente, após as primeiras semanas ou ciclos de quimioterapia e tende a aumentar com a continuidade do tratamento. Com o término da quimioterapia o cabelo volta a crescer renovado.

Existem casos em que a perda de cabelo não tem como ser evitada. Nessas situações, a recomendação é que o paciente se prepare para essa mudança na aparência. Recorrer à terapia, ou buscar apoio de amigos, familiares ou pessoas que já passaram por experiência semelhante, pode trazer algum conforto. A recomendação é que você fale sobre os seus sentimentos com alguém que te ajude a lidar com a situação. ²

Algumas pessoas preferem cortar o cabelo mais curto antes do início do tratamento, tornando a perda menos traumática.²

Cuidados com o cabelo e couro cabeludo 

Como aprender a lidar com o inevitável é uma das premissas para viver bem durante o tratamento da doença. Recomenda-se também que o paciente descubra nas atividades do cotidiano, uma motivação ou algum motivo para manter-se com uma boa saúde mental.

Ter uma rotina de autocuidado pode contribuir para uma melhora na autoestima. Confira, a seguir, algumas dicas: ²

  • Escolha um xampu suave para limpar o cabelo e o couro cabeludo.
  • Utilize uma escova de cabelo macia para arrumar o cabelo remanescente.
  • Use protetor solar no couro cabeludo quando estiver ao ar livre.
  • Cubra a cabeça durante os meses mais frios para evitar perda de calor do corpo.
  • Evite secar o cabelo com altas temperaturas.
  • Evite o uso de produtos químicos.
  • Evite fazer permanente.
  • Utilize fronhas com tecidos macios.

Como evitar a queda de cabelo durante a quimioterapia? 

A queda de cabelo é um efeito colateral comum em pacientes. Isso acontece devido à atuação da medicação, que foi desenvolvida para atacar células que se multiplicam rapidamente, reduzindo os tumores e aumentando a chance de cura após a cirurgia.

O problema disso é que existem células normais do corpo que também se multiplicam rapidamente, como as células do sistema imunológico, e também as células responsáveis pelo crescimento do cabelo.³

Existem, porém, um tratamento que pode reduzir o volume da queda de cabelo, conhecido como a Touca Inglesa.  É um equipamento que resfria o couro cabeludo do paciente para evitar a queda de cabelo típica da quimioterapia. Embora o seu uso seja mais difundido na rede privada, o tratamento também é oferecido no Instituto Nacional de Câncer (IncaNCA), no Rio de Janeiro. Com a utilização dessa espécie de capacete foi observado que é possível preservar entre 50 e 60% dos fios. 4

Como é a utilização da Touca Inglesa?  

A Touca Inglesa é utilizada meia hora antes do início da quimioterapia e até uma hora e meia depois da sessão. Ela resfria o couro cabeludo gradualmente. A diminuição da temperatura, que fica na casa dos 18 °C, reduz o fluxo sanguíneo local. Assim, o quimioterápico não alcança as células do couro cabeludo. Essa tática auxilia na preservação dos fios.

Outra sugestão é cortar o cabelo para diminuir seu peso e evitar esfregar o couro nas lavagens. Vale lembrar que, essa opção não impede a queda, mesmo que passageira.4

Cuidados durante a quimioterapia 

A queda de cabelo e de pelêlos do corpo são apenas alguns dos efeitos provocados pela medicação da quimioterapia. Caso você precise passar por esse tipo de tratamento, informe-se com o seu médico sobre outros possíveis sintomas que podem aparecer.

Além da alopecia, o paciente pode apresentar outras reações adversas, como enjoo, náuseas, prisão de ventre ou diarreia, feridas na boca, hiperpigmentação, anemia, leucopênia e trombocitopenia.

É importante lembrar que esse efeito é temporário e reversível. O cabelo voltará a crescer após o término da quimioterapia. Além disso, o INCA possui serviço de voluntariado que empresta perucas durante o tratamento. Ao sentir-se angustiado, converse com o médico e/ou enfermeiro sobre seus sentimentos e, se necessário, procure o serviço de psicologia.¹

Referência:

¹ Quimioterapia. Instituto Nacional de Câncer – INCA. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/tratamento/quimioterapia. Acesso em 16 de abril de 2023.

² Alopecia. Oncoguia. Disponível em: http://www.oncoguia.org.br/conteudo/alopecia/194/109/. Acesso em 16 de abril de 2023.

³ Toda quimioterapia faz cair o cabelo?. Oncologia Em Destaque. Disponível em: https://www.einstein.br/especialidades/oncologia/oncologia-em-destaque/edicao-102/toda-quimioterapia-faz-cair-cabelo. Acesso em 16 de abril de 2023.

4 Para o cabelo não cair na quimioterapia. Oncoguia. DIsponível em: http://www.oncoguia.org.br/conteudo/para-o-cabelo-nao-cair-na-quimioterapia/14383/7/. Acesso em 16 de abril de 2023.

FONTE: Blog FazBem

Novo medicamento combinado com quimioterapia pode melhorar a sobrevida de pessoas com leucemia mieloide aguda

Pesquisadores avaliaram o benefício do ivosidenibe combinado à quimioterapia. O estudo internacional contou com pesquisadores de várias regiões do mundo e os resultados foram publicados no The New England Journal of Medicine.

As possibilidades de tratamento para pacientes mais velhos, com mais de 60 anos, com leucemia mieloide aguda (LMA) são restritas. Em busca de aumentar e melhorar a qualidade de vida das pessoas que convivem com esse câncer, pesquisadores de várias regiões do mundo, incluindo o Brasil, avaliaram o benefício de um novo medicamento, ivosidenibe, e os resultados promissores na sobrevida foram publicados no artigo Ivosidenib and Azacitidine in IDH1-Mutated Acute Myeloid Leukemia no The New England Journal of Medicine, em abril.

A LMA pode ser explicada por diversas mutações genéticas nas células-tronco que provocam queda nas células saudáveis, causando anemia, sangramentos e infecções. “A doença é um câncer do sangue e da medula óssea potencialmente grave e uma parcela de cerca de 10% dos casos tem mutação no gene IDH1, que serve como alvo para o ivosidenibe, afetando diretamente as células da leucemia. Foi o que usamos na pesquisa”, explica Rodrigo Calado, médico hematologista, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e um dos autores do estudo.

Os cientistas recrutaram 146 pacientes com diagnóstico de LMA com mutação no gene IDH1 e que eram inelegíveis para a quimioterapia convencional, que é a primeira fase do tratamento e busca eliminar no sangue e reduzir na medula óssea as células da leucemia. Os voluntários foram divididos aleatoriamente em dois grupos sendo um deles controle, que recebeu placebo e quimioterapia, e o outro que recebeu o ivosidenibe e a quimioterapia.

“A terapia combinada com ivosidenibe e quimioterapia foi associada a eventos adversos semelhantes aos atribuídos ao tratamento padrão e foi eficaz em prolongar a sobrevida livre de complicações, aumentando a probabilidade de remissão completa e prolongando a sobrevida global entre pacientes do estudo”, explica o professor.

Ainda, de acordo com Calado, o estudo mostra que o uso do medicamento pode ser expandido para outros casos com mutações em genes específicos. “A pesquisa também sugere que outros tipos de câncer com mutação no IDH1 também possam se beneficiar desse tratamento”, conclui.

O estudo foi coordenado pelo hematologista Pau Montesinos e contou com pesquisadores da Espanha, França, Polônia, China, Itália, Brasil, Canadá e Estados Unidos.

Mais informações: rtcalado@fmrp.usp.br

Autor: Giovanna Grepi
Arte: Ana Júlia Maciel

FONTE: Jornal da USP