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Pesquisa com pacientes recrutados no Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) mostrou que o Pilates, mesmo sem associação de outros recursos terapêuticos como a diatermia (calor profundo), pode ser eficiente no tratamento da dor e dos sintomas depressivos e de ansiedade ligados à dor lombar crônica. Alguns estudos indicam que a dor lombar tem sido a principal causa de incapacitação de pessoas no mundo nas últimas três décadas, causando grande demanda aos serviços de saúde.
Segundo o estudo, comumente, a dor lombar está ligada à presença de músculos fracos, sem resistência e encurtados. Os exercícios de Pilates trabalham o fortalecimento e a estabilização de músculos profundos, como o transverso do abdômen, o multífido lombar e os músculos do assoalho pélvico, além de músculos globais que, no conjunto, são essenciais para a proteção da coluna, explica ao Jornal da USP a fisioterapeuta Sandra Amaral, autora da pesquisa. Como resultado, o paciente desenvolve uma musculatura mais forte e ganha amplitude dos movimentos livres de dor, melhorando assim a postura. “Além disso, os exercícios físicos contribuem para a liberação de opioides endógenos, substâncias internas do organismo que controlam a dor e causam bem-estar geral”, diz ela.
Na literatura médica, o tratamento térmico profundo via diatermia por ondas curtas tem sido indicado para redução da dor. A ideia é que “o calor posicionado em uma determinada região com dor promove a redução da rigidez articular e do espasmo muscular, o que leva a um aumento da atividade metabólica e mais aporte de oxigênio e nutrientes, estimulando o reparo do tecido conjuntivo e melhorando a dor”, relata Sandra Amaral. No estudo, no entanto, a associação do Pilates à diatermia não foi mais efetiva do que a prática isolada do Pilates.
Os resultados, obtidos em ensaio clínico randomizado (com sorteio aleatório dos voluntários da pesquisa) com 36 participantes, foram publicados no Brazilian Journal of Medical and Biological Research e fizeram parte da dissertação de mestrado de Sandra, defendida na FMUSP, sob o título Efeito da associação da diatermia por ondas curtas e exercícios baseados no Pilates na dor, depressão e ansiedade na lombalgia crônica inespecífica: ensaio clínico randomizado.
O tratamento
Durante o ensaio clínico, o tratamento foi aplicado em dois grupos diferentes de pacientes: o primeiro grupo recebeu 12 sessões de exercícios de Pilates conjugados com a geração de calor na região lombar via diatermia. O segundo (grupo controle) também realizou as sessões de Pilates, mas recebeu o “tratamento” por diatermia com o aparelho desligado – para que a pesquisa fosse capaz de diferenciar o chamado efeito placebo. Para ambos os grupos, as sessões de Pilates foram realizadas por 40 minutos, totalizando 12 exercícios com 15 repetições lentas cada e um intervalo de recuperação de três a cinco respirações. Todos os participantes foram instruídos sobre posturas melhores durante o sono e na execução de atividades da vida diária e do trabalho.
As avaliações foram realizadas no início do estudo, após três e seis semanas de tratamento e após três meses. As variáveis dor, depressão e ansiedade foram analisadas por meio do questionário de dor McGill, inventário de depressão de Beck e da escala de ansiedade – ferramentas técnicas que permitiram aos pacientes a descrição da intensidade e das experiências de dor e dos sintomas.
Resultados promissores
Segundo a pesquisadora, embora houvesse expectativa de que as duas técnicas conjugadas pudessem proporcionar melhores resultados aos pacientes, o estudo indicou que a diatermia contínua por ondas curtas não gerou melhora adicional nas variáveis avaliadas em pacientes com dor lombar crônica inespecífica em comparação com o grupo que recebeu tratamento placebo. Portanto, apenas exercícios baseados em Pilates foram suficientes para ajudar os pacientes com dor lombar crônica.
“Ambos os grupos de pacientes tiveram melhora da dor e da depressão durante todo o processo de tratamento, avaliado desde a primeira sessão até o follow up (seguimento) de três meses. Ou seja, o tratamento acabava na 12ª sessão, e após três meses realizávamos mais uma avaliação para saber se ele continuava tendo efeito positivo. Para as variáveis dor e depressão, este efeito continuou sendo positivo após três meses. Já para a variável ansiedade, o efeito foi positivo somente durante as sessões de fisioterapia com Pilates. No seguimento, a ansiedade voltou a subir.”
Raquel Casarotto, orientadora da pesquisa e professora do curso de Fisioterapia da USP, sugere que sejam feitos novos ensaios clínicos com foco especial na avaliação diária dos pacientes, para verificar efetivamente se a diatermia associada ao Pilates não traria efeitos significativos para a dor lombar. No estudo feito por Sandra Amaral, a avaliação foi feita em espaços de tempo maiores, no início do tratamento, após três e seis semanas, e após três meses.
Apesar do número relativamente pequeno de pacientes acompanhados e outras limitações do estudo, como a não divisão dos pacientes por idade, a autora da pesquisa diz que até o momento não havia nenhum ensaio clínico randomizado investigando a associação do calor profundo aos exercícios baseados no Pilates para dor lombar crônica. Assim, os resultados encontrados em sua pesquisa trazem dados preliminares, mas relevantes para subsidiar profissionais da área de saúde quanto à escolha e direcionamento da terapia mais adequada para alívio de dores lombares. Em sua opinião, isso significa economia de tempo, recursos e estrutura médica, contribuindo na eficácia do tratamento.
Adoecimento psíquico
Não foi por acaso que a pesquisa considerou os sintomas psíquicos associados à dor lombar: é muito comum uma pessoa que sofre de dor crônica ter concomitantemente depressão e ansiedade. Isto acontece porque a dor crônica, que tem como principal característica a não resolução do quadro clínico num intervalo grande de tempo, pode elevar o estresse e diminuir a qualidade de vida, trazendo a ansiedade e a depressão como consequências.
Ocorre também que a dor crônica diminui o volume da substância cinzenta cerebral, causando perdas cognitivas e alterações sensoriais, podendo contribuir para o aparecimento destes problemas.
Um estudo citado na pesquisa sugere que pacientes submetidos ao treinamento de Pilates tiveram suas funções mental e física melhoradas consideravelmente, diminuindo a depressão em 67% e a ansiedade em 53%. Uma possível explicação é que o Pilates aumenta os níveis de β-endorfina, um neurotransmissor que tem efeitos antidepressivos, diz a fisioterapeuta.
As causas de dores lombares são variadas e algumas vezes inespecíficas, com gatilhos indo desde fatores físicos – como ficar em pé ou caminhar por muito tempo, sentar-se ou deitar-se na mesma postura por períodos prolongados, levantar peso sem ter a musculatura condicionada – até fatores psicossociais e afetivos, como insatisfação no trabalho e a própria depressão.
Mais informações: e-mail sandramaral@alumni.usp.br, com Sandra Amaral
FONTE: Jornal da USP