Musculação e consumo de proteínas são fundamentais para evitar perda de massa muscular
Especialistas comentam a importância de manter hábitos saudáveis durante a vida para evitar grandes transtornos ao corpo em situações adversas de saúde
A reserva muscular adquirida por um indivíduo ao longo da vida é essencial para a superação de traumas, cirurgias e recuperação de doenças, como no caso do ator Kayky Brito, vítima de atropelamento em setembro de 2023, em que os médicos afirmaram que sua rotina de atividade física e musculação foi fundamental no processo de recuperação. Guilherme Peixoto da Fonseca, professor da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da Universidade de São Paulo, discorre sobre a importância da musculação para a construção de reserva muscular e para a prevenção da perda de músculos.
Segundo o especialista, a condição que causa perda progressiva e generalizada de massa muscular recebe o nome de sarcopenia. Ele conta que a sarcopenia pode ser dividida em primária, a qual costuma ser mais natural e atinge geralmente os idosos, e a secundária, que acontece como resultado de condições inadequadas, como sedentarismo, doenças ou acidentes. Além da quantidade de músculos perdida com a sarcopenia, Fonseca reforça que esse transtorno afeta a força e a função dessas estruturas.
Conforme o professor, o corpo humano está em um constante processo de perda e ganho de massa muscular, em que a construção é obtida a partir de processos anabólicos de síntese, que aumentam a massa muscular, e a degradação é resultado dos processos catabólicos, ou seja, de redução dessas estruturas. “Durante a manutenção da massa muscular, estamos nesse equilíbrio constante entre o que está sendo sintetizado e o que está sendo degradado. Ao longo da vida, pode ocorrer um desequilíbrio, que reduz a síntese e, por consequência, aumenta a degradação, resultando numa redução da massa muscular, ou seja, a sarcopenia”, conta.
Construção de músculos
Fonseca explica que cada indivíduo gradualmente aumenta sua massa muscular e atinge o pico por volta dos 40 anos, momento em que começa uma pequena redução dessa massa. A partir dos 60 anos, segundo ele, a diminuição torna-se mais acentuada e, por isso, é necessário o acúmulo dessa massa magra durante toda a vida, pois o tecido muscular é muito plástico e se altera rapidamente.
De acordo com o docente, se uma pessoa consegue atingir o máximo de reserva muscular de acordo com seu ambiente fisiológico, seu corpo responderá melhor a situações de estresse físico. Ele explica que, do ponto de vista energético, os músculos consomem muita energia, portanto são utilizados como fontes de nutrientes para a recuperação de pacientes em situações adversas.
“Essa reserva muscular vai ser muito importante em algum momento da vida em que uma pessoa tem uma condição clínica desfavorável, como uma imobilização, hospitalização, um quadro agudo ou um procedimento cirúrgico. Esse acúmulo vai fazer com que o paciente se recupere melhor, porque os nutrientes necessários para sua reabilitação, em boa parte, vêm da parte muscular”, diz.
Doenças e diagnóstico
Conforme Tiago Fernandes, também professor da EEFE, a ferramenta mais recomendada atualmente para o diagnóstico da sarcopenia é a sugerida pelo consenso europeu, European Working Group on Sarcopenia in Older People (EWGSOP), publicado em 2019, no qual se enfatiza o comprometimento da força muscular como componente principal do quadro. Ele enfatiza que não existem, até o momento, marcadores ou exames laboratoriais para diagnosticar a doença.
De acordo com o docente, a perda da massa muscular pode ser encontrada em diversas doenças, sendo elas tanto crônico-degenerativas, tais como obesidade, diabete e a insuficiência cardíaca, quanto a oncológica, a aids e as distrofias musculares de origem neurogênica. Ele afirma que essa perda é considerada um preditor independentemente de mortalidade. “Portanto, o estado geral de doença que envolve perda de peso marcante e perda de massa muscular leva ao quadro que chamamos de caquexia. A caquexia costuma ser sinal de alguma doença, como câncer, aids ou insuficiência cardíaca; e os sintomas incluem perda de peso, perda de massa muscular, falta de apetite, fadiga e diminuição de força”, afirma Fernandes.
Assim como complementa Guilherme Fonseca, além de ser resultado de algumas enfermidades, a própria sarcopenia pode provocar doenças, como a diabete tipo 2. Segundo ele, o tecido muscular é responsável por consumir grande parte da glicose circulante, então, conforme um paciente tem reduzida a sua massa muscular, tem menos tecido para consumir a glicose presente.
“Portanto, a glicose começa a se acumular na corrente sanguínea, que vai elevar a glicemia e pode desenvolver um quadro de pré-diabete e, futuramente, pode evoluir para o diagnóstico de fato da doença. Apesar da redução de massa muscular aumentar a incidência de diabete tipo 2, tem-se evidências que o inverso também é verdadeiro, pois o indivíduo que tem diabete pode desenvolver mais facilmente a sarcopenia”, relata Fonseca.
Síntese de tecido muscular
Os especialistas afirmam que a construção de massa muscular para prevenção da sarcopenia e as doenças decorrentes desse quadro clínico pode ser realizada principalmente por duas práticas: a musculação e a alimentação rica em proteínas. Fernandes comenta que a combinação dessas duas práticas contribui para uma reserva de massa muscular e óssea no futuro, garantindo autonomia, mobilidade, melhora da imunidade e redução no risco de diversas doenças. “Além disso, quando os músculos estão fortes e ativos, eles exercem mais tensão nos ossos durante a atividade física, o que estimula a produção de novo tecido ósseo”, informa.
Para Guilherme Fonseca, a atividade física mais recomendada para a construção desse tecido é o treinamento resistido, popularmente conhecido como musculação, no qual é fundamental incluir exercícios com os grandes grupos musculares: peitoral, costas, membros inferiores, quadríceps, parte posterior da coxa, glúteos e tronco.
“Essa resistência pode ser gerada por máquinas, elásticos e o próprio peso corporal, numa frequência de duas a três vezes por semana. Já a parte do consumo de proteínas pode ser feita via alimentação ou suplementação. Se uma pessoa come muito pouco de manhã, tenta aumentar um pouco esse consumo no almoço e na janta. Então, a associação treinamento de força e consumo de proteína é essencial”, finaliza.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
FONTE: Jornal da USP